Rubem Leite –
Em algumas de minhas mexidas estou ouvindo diversas músicas em saxofone e bebendo vinho seco merlot (até parece que sou algum entendido e não um mero apreciador. Uarrarrá!).
Ofereço como homenagem aos poetas e como presente de aniversário à percussionista Lucimara Nunes.
Aconteceu a Oficina “Processos Criativos – estudos e criações de cena”, ministrada por Rita Clemente, de BH-MG. E “desaconteceu” o espetáculo “Histórias de Chocar – ensaios de amor”, pois deu pane na aparelhagem do Teatro Zélia Olguim, recém inaugurado.
Ambos entre
Está difícil levantar. Acordo às 04:15h, mas com o horário de verão está duro sair no que, na verdade, são 03:15 horas. Uma hora depois – Cinco no relógio, quatro na verdade – saio com Haicai, Decidido e Vitório. Enquanto abro o portão uma viatura faz sua ronda. Os cachorros saem desembestados. Sigo para minha direita e na Ituiutaba vou também para a direita. Ao virar percebo à esquerda dois rapazes.
- Q c qué?
Um me pergunta agressivo, finjo não ouvir e mostrando não ser nenhum perigo me agacho e chamo “til, til, til, til, til, til”. Vitório e Decidido, que estavam perto deles, vêm até mim. Haicai, que ainda estava na Uberaba, minha rua, também vem sorrindo. Uberaba é uma rua feia. Mas é nela que tenho minha casa minúscula e com quatro pessoas mais três cachorros, mas própria. Estou contente.
Não entrei ainda na rua João Napoleão da Cruz, que fica atrás (ou na frente... de qualquer maneira é paralela) da Uberaba, e a viatura passa outra vez. Dá para vê-la passar pelos garotos que notoriamente fumam craque então ela pára, continua enquanto eu passeio. Quando retorno minutos depois vejo os rapazes no fim da rua e a viatura passa outra vez, não sei para quê, se não faz nada. Entro
O vinho acabou, mas não porei mais no cálice. Entretanto o saxofone continua. Será que você está pensando “Mas já?”. Bem! Escrever toma tempo e coordenar idéias, mais tempo ainda. Por isso “Não tem mais vinho”.
Amanheço com dificuldade, passeio com os cachorros, oro, saio, vivo o dia e na Câmara dos Vereadores me encontro com Luiz Ribeiro, artista da dança muito jovem. A gente cumprimenta e se despede. Depois se esbarra de novo, conversa e se despede. E uma terceira vez no dia nos topamos, conversamos, levo-o para casa para falarmos sobre a Lei Municipal de Incentivo à Cultura e nos despedimos marcando para 6ªfeira o início do Projeto que ele quer propor. Vou para Oficina e Rita diz “Não se faz teatro porque se tem um grande ator. Antes do ator há o espaço (o metafórico e o físico)”.
Volto para casa, durmo e acordo com um pouco menos de dificuldade. Estudo um livro que me inspira uma estória. O livro é “Para Realizar o Amor e a Oração”, do Prof. Seicho Taniguchi. Muito bom!
Era uma vez uma caneta, dessas comuns. Sua tinta preta copiava Palavras da Verdade ou ajudava a destacar os profundos Ensinamentos até que uma bela manhã a mão que a movia se irritou com muitas coisas, inclusive com dificuldade da caneta em trabalhar aquele dia, a quebrou no meio e depois se arrependeu. Pedindo perdão a colou com fita adesiva. A caneta machucada na alma ficou mais difícil de trabalhar com aquela mão. Sabe! Uma vez uma boca disse para a mão que o problema do mundo é que inventaram a palavra “desculpa”. Não é uma verdade absoluta, mas tem seu significado... Uma bela tarde outra mão movimentou a caneta e ela registrou palavras culturais. Então a primeira mão deixou-a ir com a nova mão. Sentiu um apertinho dentro de si, mas deixou-a seguir seu caminho. Uma bela noite recebeu um bilhete carinhoso da caneta, entendeu então que estava perdoado e que a harmonia conduz cada um a quem lhe é mais adequado, mais parecido, afastando os opostos e unindo os semelhantes. E foram felizes para sempre sabendo que o para sempre nem sempre acaba.
Na garoinha saio com os cachorros e penso nas palavras de Rita “No teatro, tudo precisa ‘ser’ significado”, penso no acidente com o ônibus da APAE. Nas bandeiras a meio mastro da Polícia Militar e da Prefeitura Municipal de Ipatinga. Nena de Castro, minha amiga, falou para mim que apesar da Prefeitura não ter feito mais que sua obrigação ao cuidar das vítimas e suas famílias a fez com tanto desvelo e atenção que a emocionou. Não agiu como sendo apenas uma obrigação, mas sentido dor pelo acontecido. Ela, poeta e cronista, falando sobre a tragédia escreveu ontem em sua coluna num dos jornais local palavras que encachoeiraram meus olhos (sou mineiro, portando meus olhos não marejam, eles se encachoeiram ou enlagoam), penso em um ex-aluno de teatro, que continua a seguir a carreira artística e que elogiou meu severo método pedagógico. “Nenhum outro professor de teatro que tive me ensinou o que aprendi com você”. Vaidades à parte, fiquei contente, claro. Pensei tudo isso enquanto escutava uma voz de mulher cantando alto “Meu coração é só de Jesus. Ei, psiu. Beijo me liga eu to curtindo a noite. Te encontro na saída! Minha alegria é a Santa Cruz. Volta logo pra São Paulo ou eu vou pra Madri”. Volto para casa, termino o texto e continuo o dia.