Pronomes pessoal reto e oblíquo, possessivo e outros.
O mais "importante" e menos bonito é o Eu enquanto o Nós é quase tão "importante", porém como é lindo. E dos possessivos o Nosso ganha dos outros e só não supera o De Todos.
Mas isso, em nossa sociedade, soa ridículo. Vivemos o Mito de Sísifo, tão esclarecido por Albert Camus.
Há quem é ouro ou cobre
Mas nem tudo é nobre
No último dia útil
(Hoje é vinte e nove)
Salário do pobre
Sai nada sutil
Boca aberta corre
A dívida? Cobre
Sua vida, funil.
Quase me sinto Meursault (fala-se Mersô), também de Camus. Praticamente sem emoções a demonstrar; tão ferido estou. E queria, como tal, ser indiferenter ao mundo.
Mas não sou Meursault e sim Benito. Sonhei:
Eu estava indo pra escola, mas passei primeiro na casa do artesão e poeta Kadosh.
A primeira coisa a ver era o belo jardim. Depois uma grande casa simples e com muitos moradores, um longo quintal em declive com árvores e um cristalino riacho atravessando pedras.
Não sei o que aconteceu com minhas roupas; se molhou, se rasgou. Só sei que tive que jogar fora. Até meus óculos entortaram.
E tinha que ir dar aula.
Um me emprestou uma bermuda dins super vinhádu. Outro me emprestou uma camisa que berrava: biiiiiiiiiichaaa.
E saí pelas ruas.
Um grupo de mulheres "cristãs" - de velhas a crianças - riu e as afrontei com uma coragem que nem sei se tenho. Encontrei alunos que me cumprimentaram; uns estranharam, mas nenhum desrespeitou.
Na escola as funcionárias me olham, e como olham. Teve uma que falou alguma coisa, mas dei-lhe um chega pra lá. Até enfiei o dedo no nariz da dita cuja e falei que visto como quiser e se não gostar do que vê que fique cega...
E fui dar as minhas cinco aulas.
Uma de minhas estudantes diz-me:
- Nenhuma pessoa sem noção é mais sem noção quando dá uma de com noção.
Isso enriquece meu pensamento:
A vida é um absurdo.
Diz Albert Camus.
Acorda, sai da cama, limpa-se, alimenta-se, sai pra trabalhar, aguenta muita coisa, volta pra casa, limpa-se, alimenta-se, dorme.
Trinta dias seguidos.
Com o salário compra: roupas para trabalhar, comida para trabalhar, remédios para trabalhar etc. para trabalhar.
E o círculo do absurdo repete doze meses, várias décadas.
Morre. E a morte é absurda.
- O pagamento do piso salarial dos agentes de saúde será pago em julho de 2022 reforça a política permanente de valorização dos servidores públicos de Timóteo. - O vice-prefeito e também secretário de educação declara no "tuíter" da PMT.
- E o piso dos professores? Cadê? - Questionam R.C. e C.F.
Responde o dito secretário de educação e vice-prefeito:
- Já foi pago no mês de maio. - Mente.
- Não! Não recebemos nada. - Contesta Benito. - Só se forem pisadas... Eu, por exemplo, tive foi é pesadelos.
- Professor! Não se cansa?
- Muito mais do que o senhor pensa. Mas professor não é Sísifo nem Meursault.
Porém talvez um dia o Nós e o De Todos seja a sociedade. Mas... Será? Quando?
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Rubem Leite
Pensado, trabalhado e escrito entre 25 e 31 de julho de 2022.
Foto do autor: filtro dos sonhos produzido pela artesã Erika Aviles em comemoração a um ano morando em nossas casas em Timóteo MG.