segunda-feira, 29 de abril de 2013

LO SOSPECHABA


Obax anafisa.


Creación colectiva – Criação coletiva.
De Alejandro Vera y Rubem Leite.


En español:

¡Manifiéstese la Vida!
Como agua borboteando de una fuente
Manifiéstese en mí la Vida.

Lluvia en la noche
Lluvia en los ojos          
Lluvia en las flores
Lluvia en el corazón

Flores en el corazón
Corazón en la noche…
La lluvia, bendición...
Portadora de vida
Regando las flores
Regando el corazón
Hecho canción

La noche en los ojos
Los ojos de la noche…
Llorando con lágrimas de lluvia
(Los ojos son nubes)

En mí se manifiesta la Vida
Ésta la mañana de la felicidad
Sin la lluvia mi corazón no sería flor
Y es por la flor que nace el sol.
Después de todo
La flor, la lluvia, el sol
Son nuestra complicidad.


Em português:

Manifeste-se a Vida!
Como água jorrando da fonte
Em mi se manifesta a Vida.

Chuva na noite
Chuva nos olhos
Chuva nas flores
Chuva no coração

Flores no coração
Coração na noite...
A chuva, benção...
Portadora de vida
Regando as flores
Regando o coração
Feito canção

A noite nos olhos
Os olhos da noite...
Chorando com lágrimas de chuva
(Os olhos são nuvens)

Em mi se manifesta a Vida
Esta é a manhã da felicidade!
Sem a chuva meu coração não seria flor
E é pela flor que nasce o sol.
E depois de tudo,
A flor, a chuva, o sol
São nossa cumplicidade.


Eu, Rubem, ofereço aos aniversariantes:
Térsio Greguol, Elizangela Batista, Fernando Viana, Luah Kugler, Cristianne de Sá, Deusdeth Junior, Patrícia P. Cruz, Luis Yuner, Lilian de Faria, Mariana Porto e Juliano Fernandes.

Yo, Alejandro, ofrezco a mis buenos amigos que cumplen años pronto:
Isabel Barrios y Gabriel Gonzáles.

Alejandro Vera es músico y traductor inglés-español.
Y está adentrándose en las vías oscuras de las letras…

Escrito entre una noche de lluvia y una mañana de sol.
Uruguay y Brasil.
28 de marzo y 03 de abril de 2013.
Creación original en español y recreación en portugués de Rubem Leite.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

LUCES EN LA TEMPRANA MAÑANA


Obax anafisa.


Às três e quarenta e cinco da manhã em meu quarto. Um estalo. Meu cachorrinho, Vitório, foge. Outro estalo e outro. Barulho de moto que foge. Mais um estalinho. Silêncio. Um grito de mulher.
Cinco em ponto passeio com meus três cãezinhos: Haicai, que tem dezoito anos, Decidido e o medroso Vitório. Na rua Uberlândia policiais trabalham; percebo pelas luzes vermelha e azul. Luzes tristes na madrugada.
Ah! Espere um pouquinho, por favor.
Minha gatinha, Aldravia, pede que fale também sobre ela. Deseja que diga a causa de seu nome. E como ela não tem ainda nem um mês de vida e foi abandonada com uma semana vou satisfazer sua vontade. A cidade Mariana, de Minas Gerais, estado mais histórico do Brasil, criou um novo gênero literário que chamou de Aldravia. E pela primeira vez Brasil exporta uma forma de criação. Portugal, Espanha, França e Chile estão encantados com a nova possibilidade de escrever. E você, deseja saber como se faz aldravia? Não é difícil e é tão agradável quanto os cães e gatos.
É poema composto de até seis versos univocabulares, livre de amarras que venha a implicar na limitação de interpretação. É feito iniciando os versos com letras minúsculas e também é desnecessário pontuar.


flores
estalam
quando
pétalas
beijam
sol

homens
estalam
vidas
mortes
estalam
homens

nuvens
estalam
chuva
árvores
estalam
flores



Ofereço aos aniversariantes
Michael Cobain, Antonio Carlos, Isabella Ribeiro, Valdete Val, José B. Ferreira Filho, Marcone Sousa, Mila Gabriela e André Gomes.

A obra é meu segundo trabalho escrito originalmente em espanhol e só depois o reescrevi em português.
Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. O texto é minhas flores para você que me lê e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.
Escrito entre os dias 02 de fevereiro e 22 de abril de 2013.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

ASSUSTADO


Obax anafisa.


A avenida 28 de Abril está dúbia. Belas árvores sugerindo a admiração da via pública e muita sujeira incentivando a fechar os olhos para nada ver. Entre uma opção e outra fiquemos com dois transeuntes.
...
- Mãe Menininha abençoa e os pastores Filie Esse Ano, Mala e Faia e mais outros amaldiçoam.
- Ah! Benito, Deus é Bênção ou maldição?
Depois de um silêncio acompanhado pelos sons urbanos:
- Havia um caçador que, depois de um longo dia de caça, estava no meio de uma floresta imensa. Era melhor se acomodar em algum lugar porque escurecia. Depois do que pareceram horas, ele se deparou com uma cabana em uma pequena clareira. Decidiu ver se poderia ficar lá por aquela noite. Então se aproximou e encontrou a porta entreaberta. Como não havia ninguém lá dentro o caçador se deixou cair sobre uma cama. No meio da noite, abriu os olhos e quando olhou em torno ficou surpreso ao ver as paredes adornadas por vários retratos. Todos pintados com detalhes incríveis. Horríveis! Humanos animalizados e bichos humanizados. Sem exceção todos pareciam estar olhando para ele, suas características torcidas de malícia. O caçador foi se sentindo cada vez mais desconfortável, mas mesmo assim, exausto e com esforço, conseguiu, virando o rosto para a parede, ignorar as muitas faces de ódio e caiu em um sono agitado. Na manhã seguinte o caçador acordou com os raios de sol e descobriu que na cabana não havia retratos, mas sim janelas¹...
- Não entendi. O que a história tem a ver?
- Pense!
Em alguns instantes de silêncio cada um escutou a si. Então continuo:
- Perguntaram-me: “Por que as pessoas podem criticar político, pastor, padre, mas ninguém pode criticar o comportamento homossexual?”. Sabe o que respondi?
- Não! O quê?
- Quer comparar o desrespeito, roubalheira, incentivo ao ódio, segregação e até extermínio, mais o uso do Nome de Deus em vão, com o amor entre duas pessoas?
- Nossa! E aí?
- Aí, que a pessoa retrucou: “O que esta sendo comparado aqui não é ódio e o amor... E sim que existe liberdade de expressão, que todos podem falar o que pensam sem medo de ser preso ou processado... Ou seja, poder falar de político, pastor, padre, gordo, magro, homem, mulher e homossexual como igual”.
- Quiquiqui! E o que você falou para o sujeito?
- Apenas: É mesmo? Posso chamar um político desonesto de honesto? Sim, claro. Mentir é permitido... Principalmente quando é uma coisinha agradável. Mas ódio e amor estão em comparação sim. Uma coisa é você dizer a verdade e outra é ir contra alguém ou grupo de pessoas sem nenhum motivo justo ou real, ou porque nos disseram que está errado... É errado ser homossexual? É errado ser gordo? Já foi considerado, digamos assim, errado ser negro...
- E o que você fez, Benito?
- O que melhor faço: Arte. E chamei o Rubem para escrever algo.
- E o Rubem escreveu?
- Sim! Veja o poema bilíngüe dele:


Yo estaba cantando
Y mi ciudad estaba lloviendo.
¡No! No apenas llovía en ella.
La ciudad era la lluvia
En una flor amarilla.
La ciudad era mi novia
Y la lluvia era su cortina de belleza
En una tarde de delicadeza.
Eu estava cantando
E minha cidade estava chovendo.
Não! Não apenas chovia nela.
A cidade era a chuva encarnada
Em uma flor amarela.
A cidade era minha namorada
E a chuva era sua cortina de beleza
Em uma tarde de delicadeza.

Ou, como diz o vento de Otro Mondo²:

Sola por la noche
Besando la luna y la hierba
Encuentro en mis recuerdos
Una oscura y bella tierra
Aunque sus bolsillos
Traigan rabia y traición
El Sol que brilla en sus ojos
Desvelan
Nueva Estación.
Só pela noite
Beijando a lua e a erva
Eu encontro em minhas lembranças
Uma escura e bela terra
Mesmo que seus bolsos
Tragam raiva e traição
O Sol que brilha em seus olhos
Descobrem
Nova Estação.


Belas árvores sugerem sua admiração e sujeira incentiva a nada ver. Entre uma opção e outra com o que ficamos? Gostaria de saber o que vamos fazer.


Ofereço como presente de aniversário:
Thayná Macedo, Jeová P. Jesus, Mariana Dias, Alessandro Lages, Maxwel Lopes e Luzia di Resende.

Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. O texto é minhas flores para você e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.

¹ Livre adaptação de uma história contada no facebook por Danhique Pietro na  manhã de 08 de fevereiro de 2013
² Poema de Eva García.

Escrito entre 08 de fevereiro e 15 de abril de 2013.

sábado, 13 de abril de 2013

¡DENSO, MUY DENSO!


“El timbre seguía sonando, el enmascarado no salía e yo desnudo, dentro de casa, lívido de miedo, sin saber qué hacer. Me acordé de que en la cocina había un machete. Abrí la puerta empuñando de forma amenazadora el cuchillo, pero era una monja vieja quién estaba allí de piel, con aquella cosa negra que ellas usan en la cabeza”.

(FONSECA, 1989)


La tarde está nublada, abochornada, cargada de relámpagos. La ventana está inquieta. El tiempo y la ventana están meramente reflejando a Miranda. La cerveza se acabó, las palomitas de maíz se acabaron, el tabaco se acabó, la película se acabó. Solo le resta dormir para no ver el paso del tiempo. Se acuesta como está, sin los calzoncillos sucios que se había quitado para lavar y que se quedaron esperándole todo lo día en lavabo del baño. Cierra los ojos, su ronquido ronronea y suena el timbre. El hombre lo ignora. Suena otra vez. Se gira a la derecha. Suena una vez más. Abre los ojos. ¡Suena! ¡Se levanta! Abre la puerta. Una vieja monja enseña los ojos, mira al medio-blando-medio-duro de quien acaba de levantarse de la cama, se atraganta, grita y se precipita por el pasillo. Debido al desánimo no sonríe ni se molesta. Va a la nevera y sigue vacía. Vuelve a su cama, cierra los ojos, su ronquido ronronea y suena el timbre. Suena otra vez. Se gira a la izquierda. Suena una vez más. Abre los ojos. ¡Suena! ¡Se levanta! Abre la puerta. Marisa, su vecina, enseña los ojos, mira al medio-blando-medio-duro, se atraganta, sonríe y adentra. Lo que viene a continuación no es difícil de imaginar. Lo que viene después lo digo yo. Ella duerme fatigada, acalorada, sin fuerzas, desgastada, pero sonriendo. Miranda se levanta, va a la cocina y vuelve con su cuchillo de placer. Finalmente el ánimo y, con él, el tener que hacer. ¡Y lo hace! Suena el timbre. Lo ignora. Suena otra vez. Levanta la cabeza. Suena otra vez. Se vuelve hacia al sonido. Suena una vez más. Se lava las manos. ¡Suena! Abre la puerta. De una acusación de exposición indecente a un flagrante de asesinato. Un año después el primer juicio.
¡Me despierto! El día no pasa, me acuesto y me duermo.
La tarde está nublada, abochornada, con pocos relámpagos. La ventana golpea, se abre, golpea. Las dos reflejan su estado de ánimo. No hay nada en la nevera, en  los armarios. Duerme para no notar el paso del tiempo. Se acuesta de la misma manera que estuvo durante el día: sucio y desnudo. Cierra los ojos, ronca y suena el timbre. El hombre lo ignora. Suena otra vez. Se gira a la derecha. Suena una vez más. Abre sus ojos. ¡Suena! ¡Se levanta! Abre la puerta. Dueña Muerte, personaje de Mauricio de Souza¹, enseña sus ojos, mira al medio-blando-medio-duro de quién acaba de levantarse de la cama, se atraganta, grita y se precipita por el pasillo. Cierra la puerta y va a la nevera vacía. Entonces vuelve a su cama, cierra los ojos, ronca y suena el timbre. Lo ignora. Suena otra vez. Se gira a la izquierda. Suena una vez más. Abre los ojos. ¡Suena! ¡Se levanta! Abre la puerta. Marisa, la vecina, enseña los ojos, mira al medio-blando-medio-duro, se atraganta, sonríe y entra. Lo que viene después ya lo sabes, incluso su muerte. Mientras ella dormía, tomó su cuchillo, la mató y la descuartizó alegremente con su cuchillo de placer. Suena el timbre. ¡Lo ignora! Suena otra vez. Levanta la cabeza. Suena otra vez. Se vuelve hacía al sonido. Suena una vez más. Se lava las manos. ¡Suena! Abre la puerta. De una acusación de exposición indecente a flagrante por asesinato. Dos años después otro juicio.
¡Me despierto! El día no pasa, me acuesto y me duermo.
La tarde... La ventana... Su estado de ánimo. Todo se acabó. No hay nada. Duerme para no ver el paso del tiempo. Suena el timbre. Se levanta. Abre la puerta. El negro de toga le recuerda a Batman casi haciéndole sonreír. El Desembargador Joaquim Barbosa² enseña los ojos, mira al medio-blando-medio-duro de quién acaba de levantarse de la cama, se atraganta, grita y sale precipitado por el pacillo. Regresa a la cama. El timbre. Marisa enseña los ojos, mira al medio-blando-medio-duro, se atraganta, sonríe, adentra, goza, muere. Suena el timbre. De una acusación de exposición indecente a un flagrante de asesinato. Largo tiempo después el tan esperado juicio.
¡Entonces me despierto! El día no pasa, me acuesto y me duermo.
La tarde... La ventana... El estado de ánimo... ¡La muerte!


Versión castellana de la obra en portugués “Do Pudor ao Flagrante”. Observación: No es traducción, ¡es otra versión!
Trabajo hecho en sociedad con
LILIAN FERREIRA – liliuni@hotmail.com  La aprendiz de la vida colabora en la revisión en español de los textos del blogue.  \  Licenciatura en Letras (UnilesteMG) e Filologia Portuguesa (Universidad de Salamanca) – Diplomas DELE – Español como Lengua Extranjera – Copy Editor en Optimizaclick – Marketing Digital.

Ofrezco nuestro croento a mis amigos:
Flávia Frazão, Erikes M. Sena, Didi Peres, William Delarte, Alejandro Vera, todos de la editora Círculo de Artes, en especial Elis y Marcelo.
Ofrezco también a los parejos, mis amigos:
Thiago Domingues y Luah, Bruno Grossi y Diane, Tiago Costa y Leticia.

FONSECA, Rubem. Feliz Ano Novo. 2ª edición – São Paulo: Companhia das Letras, 1989. Cuento Agruras de un joven escritor. Traducción libre de Rubem Leite.
¹ Mauricio de Souza es cartonista y empresario brasileño creador de personajes como Mónica, Cebollita, Cascarón, Magali y muchos otros. Dueña Muerte, una de ellas, hace parte de “Penadito y su Pandilla” que puede ser encontrada en el periódico mensual Mónica y su Pandilla. Más información: www.monica.com.br
Cuando publiqué en “feicebuque” el fragmento de Fonseca que introduce nuestro croento, Robinson Ayres Pimenta, me sugirió una historia así: “Hoy, en el logar de la monja, el personaje podría haber encontrado a Joaquim Barbosa en toga ‘modelito Batman’... ¿Qué tal? Haría de la ficción la más humana y bruta realidad de estos nuestros tiempos extravagantes. Como diría Ibrahim Sued, reportero social famosísimo en las décadas de 50 y 60 del siglo pasado: ‘¡El mar no está para pez y el caballo no desciende la escalera!’.”
² Joaquim Benedito Barbosa Gomes es abogado, profesor, Jurista y magistrado brasileño. Es también miembro del Supremo Tribunal Federal de Brasil.
Escrito entre el día 25 de enero y el día 12 de abril de 2013.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

DIÁLOGOS DAS VIDAS


Obax anafisa.

“Alegra uma alma saber que é acreditada”.
(DOSTOIEVSKI, 1978)



- Estou confusa, Pastô Mala e Faia. Tento parar de pensar em sexo, mas o sexo me pensa.
- Sangue de Jesus tem poder. Diz isso não, irmã Filiciana. Que é pecado. Mulé num pode pensar nisso porque nasceu só pra procria. Basta fica quietinha e deixá o marido trabaiá em nome de Jesus.
- Mazuquifáçu então para encontrar a salvação, pastô?
- Já pagou o milízimo?
- Já, pastô.
- Então pensa em Jesus. E pra melhor pensar passa no nosso shopping Cobrar Corbã, do outro lado da rua e adquira um fio do pelo de um dos porcos onde Jesus botô os diabos e afogou. O fio de pelo vai acalmar e apagar o fogo do inferninho que a senhora tem aí.
A brisa passa pela palmeira no jardim e nada passa na cabeça de certos fieis.
- Pastô eu fiz direitim tudo quiô sinhô mandô e num deu certo. Continuo com o fôgu no infernim.
- Então, irmã, só tem uma solução. Pra apagar seu fogo maldito só minha mangueira bendita.
A brisa na palmeira do jardim e nada na cabeça dos fieis.
E nos infiéis:
- O senhor está diante deste júri pelo mal uso de seu poder e abuso de suas fiéis.
- Culpa de Deus que me deu mais pau que cérebro, então o coração pra atender a demanda, bombeia e distribui o sangue desordenadamente, e sempre falta pra cabeça, mais perto do céu, pois vai quase tudo pra mais perto do chão.


Ofereço aos aniversariantes.
Carlos Passos, Nívea Paula, Saddian Nunes, Carmen L. Souza, Marcos Inter, Tamara Oliveira, Márcio dos Santos, Mayra Loures, Demetrios N. Gualberto e Cleiton Zambianchi.

Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. O texto é minhas flores para você e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.
Escrito entre 24 de setembro de 2012 e 08 de abril de 2013.
DOSTOIEVSKI, Fiódor. A Casa dos Mortos. São Paulo: Editora Edibolso, 1978.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

DO PUDOR AO FLAGRANTE


Obax anafisa.


“A campainha continuava tocando, o mascarado não ia embora e eu nu, dentro da casa, lívido de medo, sem saber o que fazer. Me lembrei que na cozinha tinha um facão grande. Abri a porta brandindo o facão ameaçadoramente, mas era uma freira velha quem estava lá em pé, com aquela coisa preta que elas usam na cabeça”.
(FONSECA, 1989).

A tarde está nublada, abafada, relampejante. A janela está irrequieta. O tempo e a janela estão simplesmente refletindo Miranda. A cerveja acabou, a pipoca acabou, o cigarro acabou, o filme acabou. Só lhe resta dormir para não ver o tempo passar. Deita do jeito que está, sem a cueca suja que tirou para lavar e que ficou o dia inteiro lhe esperando na pia do banheiro. Fecha os olhos, ressona e a campainha toca. O homem ignora. Toca de novo. Ele vira para a direita. Toca mais uma vez. Abre os olhos. Toca. Levanta. Abre a porta. Uma velha freira arregala os olhos, vê o meio-mole-meio-duro de quem acabou de sair da cama, engasga, grita e sai correndo. Devido ao desânimo nem ri nem se incomoda. Vai à geladeira e continua vazia. Volta para a cama, fecha os olhos, ressona e a campainha toca. Ignora. Toca de novo. Ele vira para a esquerda. Toca mais uma vez. Abre os olhos. Toca. Levanta. Abre a porta. Marisa, a vizinha, arregala os olhos, vê o meio-mole-meio-duro, engasga, sorri e entra. O que vem a seguir dá para imaginar. O que vem depois eu conto. Ela dorme cansada, ardida, batida, sorrindo. Miranda se levanta, vai à área de serviço e volta com sua faca de prazer. Finalmente o ânimo e, junto, o ter o que fazer. E faz. A campainha toca. Ignora. Toca de novo. Levanta a cabeça. Toca outra vez. Vira o rosto em direção ao som. Toca mais uma vez. Lava as mãos. Toca. Atende a porta. De uma acusação de atentado ao pudor para flagrante de assassinato. Um ano depois o primeiro julgamento.
Aí eu acordo. O dia não passa, então deito e durmo.
A tarde está nublada, abafada, com poucas trovoadas. A janela bate, abre, bate. Ambas refletem seu estado de espírito. Nada há na geladeira, nos armários. Dorme para não ver o tempo passar. Deita do jeito que ficou o dia todo: sujo e nu. Fecha os olhos, ressona e a campainha toca. O homem ignora. Toca de novo. Ele vira para a direita. Toca mais uma vez. Abre os olhos. Toca. Levanta. Abre a porta. Dona Morte, de Maurício de Souza, arregala os olhos, vê o meio-mole-meio-duro de quem acabou de sair da cama, engasga, grita e sai correndo balançando a foice. Fecha a porta e vai à geladeira vazia. Então volta para a cama, fecha os olhos, ressona e a campainha toca. Ignora. Toca de novo. Ele vira para a esquerda. Toca mais uma vez. Abre os olhos. Toca. Levanta. Abre a porta. Marisa, a vizinha, arregala os olhos, vê o meio-mole-meio-duro, engasga, sorri e entra. O que vem depois você já sabe, inclusive sua morte. Enquanto ela dormia, pegou a faca, matou e destrinchou animadamente com sua faca de prazer. A campainha toca. Ignora. Toca de novo. Levanta a cabeça. Toca outra vez. Vira o rosto em direção ao som. Toca mais uma vez. Lava as mãos. Toca. Atende a porta. De uma acusação de atentado ao pudor para flagrante de assassinato. Dois anos depois outro julgamento.
Aí eu acordo. O dia não passa, então deito e durmo.
A tarde... A janela... Seu estado de espírito. Tudo acabou. Nada há. Dorme para não ver o tempo passar. A campainha toca. Com custo levanta, abre a porta. O negão de toga lhe lembra o Batman quase lhe fazendo sorrir. O Desembargador Joaquim Barbosa arregala os olhos, vê o meio-mole-meio-duro de quem acabou de sair da cama, engasga, grita e sai correndo com sua toga balançando ao vento. Volta para a cama. A campainha. Marisa arregala os olhos, vê o meio-mole-meio-duro, engasga, sorri, entra, goza, morre. A campainha toca. De uma acusação de atentado ao pudor para flagrante de assassinato. Tempos depois o derradeiro julgamento.
Aí eu acordo. O dia não passa, então deito e durmo.
A tarde... A janela... O estado de espírito...
Morte! Pudor! Flagrante!


Ofereço aos aniversariantes:
Antônio Pirralho, Roniara Domingues, Vera H.S. Rossi, Gledson Pagung, Magali Santos, Lúcio Braga, Rosane Dias, Stevan Olivar, Roberta Bragança e Marcone Alvarenga.

FONSECA, Rubem. Feliz Ano Novo. 2ª edição – São Paulo: Companhia das Letras, 1989. Conto Agruras de um jovem escritor.
¹ Mauricio de Souza é cartunista e empresário brasileiro criador de personagens feito Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali y muitos outros. Dona Morte, uma delas, faz parte de “Penadinho e sua Turma” que pode ser encontrada no periódico mensal Turma da Mônica. Mais informações: www.monica.com.br
Quando meses atrás coloquei no “feicebuque” o trechinho de Fonseca que introduz o nosso presente cronto, Robinson Ayres Pimenta, sugeriu-me uma história assim: “Hoje, ao invés da freira, o personagem poderia ter encontrado o Joaquim Barbosa de toga ‘modelito Batman’... Que tal? Fincaria o pé da ficção na mais humana e bruta realidade destes nossos tempos bicudos. Como diria o Ibrahim Sued, colunista social famosíssimo nas décadas de 50 e 60 do século passado: ‘O mar não está para peixe e cavalo não desce escada!’.”
Joaquim Benedito Barbosa Gomes é um advogado, professor, Jurista e magistrado brasileiro. É também membro do Supremo Tribunal Federal de Brasil.
Escrito entre os dias 25 de janeiro e 04 de abril de 2013.
Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. O texto é minhas flores para você que me lê e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.