domingo, 30 de maio de 2021

CONDENA-SE A QUEM É VISTO, NÃO OS CULPADOS

 

Somos pedra

e carne ardente¹

 

Não são dez horas de vinte e sete de dezembro e o sol está escondido pelas nuvens branco-cinza.

No Feirarte ainda há pouco público e o pessoal das barracas conversam enquanto se organizam. Falam do Natal recém passado:

Natal em família sem briga ou intriga não é Natal.

A ceia só acaba quando chega a polícia. Caso contrário fica até dia 26...

Meu Natal teve gostoso almoço. E teve acusações de furtos, deboches, ameaças de brigas. E assim continuou no dia 26. – Meu primeiro Natal com espírito cristão: intolerância. Espero que nunca mais se repita. Prefiro meu Natal pagão onde se reverencia ao Menino Deus sem as idiocracias cristãs.

Três brigando e eu me sentindo numa sala de aula carregada de alunos do sexto ano em plena algazarra desordenada.

Agonia. Agonia. Uma sala de crianças de onze anos é mais controlável que dois adultos machistas mais a esposa de um deles.

- Me tengo agarrado mis huevos…

- Macho por macho sou mais eu...

Parece que os adultos são imaturos como os meninos.

Para que a vida? Lizardo de Assis diz no livro Opus, na página 74:

Sugamos, predamos, futucamos

Parasitamos

O outro.

E este outro nos faz o mesmo.

É isso? É isso! Não sei viver. Não aprendi a viver e não foi por falta de aulas...

Alguém vê uma foto que postei no Caralivro e me diz “Bom dia!”. Já sei como ele age. Hoje, ou amanhã ou em breve me pedirá algo.

O sol está surgindo e são agora vinte para as onze. As pessoas vão chegando, mas tão aos poucos que Marcelo diz não voltar semana que vem se a tarde continuar rala de pessoas.

Nos últimos cinco dias o Centro de Ipatinga e em todos os outros lugares olho ao redor e vejo apenas pessoas ralas.

Não sei se vivemos num formigueiro ou se numa alcateia. O que sei é que não há sociedade.

 

Dois mil e vinte e um já alcança junho.

- ¡Hola, don Benito! Mañana será cumple de mijo.

- Lo sé. Su nuera e hijo planean ir domingo a una cascada pasar el día. Me invitaron pero soy un bicho que se encanta quedarse en la madriguera.

Ella charla alguna cosa y continúo:

- Mira esa foto: 

- Esa es la más joven flor de anturio. Está en mi ventana. La compré en enero pocos días antes del nacimiento de Rael. Junto al anturio está el ombligo del niñito. Es costumbre brasileño plantar el ombligo en una planta pues es una bendición para el niño crecer bien. Anturio es una planta natural de Colombia que Salió al mundo.

- ¡Ay! Tan hermoso, don Benito. Está hermosa la flor. – Reír alegre. – Me alegra la vida. Me alegra la vida.

 

Sexta-feira, dia 28 de maio, a Prefeitura Municipal de Timóteo resolveu vacinar os professores; mas só os professores. E isso para os docentes retornarem às aulas presenciais na segunda-feira, dia 31.

Vacina! Não para os pedagogos, nem para funcionários da Secretaria ou dos Serviços Gerais. E estes se sentiram irritados. Mas com quem? Com os professores. Não com o poder público, mas com os professores.

Desmotivado pelos comentários contra os professores não mostrei a foto que tiraram quando me vacinaram: 

Já começou a metamorfose. Os cabelos até arrepiaram. Acho que serei o Cuco do Sítio do Picapau Amarelo.

Tomamos a AstraZeneca. A segunda dose é noventa dias depois da primeira. Mas o corpo produzirá imunidade três semanas após a segunda dose. Vacinar é importante, mas para o retorno imediato é inútil. Vacinar é importante para daqui a quatro meses não corrermos riscos de nos infectarmos nem de infectar ninguém. Para não morrermos nem matarmos. E se isso acontecer – e vai acontecer – vão dizer que a culpa é de quem?

- Ah! Vocês poderiam manifestar... fazer greve...

- Fizemos no início do ano. Seguimos a lei e comunicamos a paralização com setenta e duas horas de antecedência. A prefeitura entrou na justiça e conseguiu uma liminar obrigando a não paralização.

 

Maio acaba amanhã e no domingo passado o Feirarte estava mais do que lotado. E a terceira evolução do covid-19 está chegando. O que aprendemos?

Machado de Assis diz em Entre Santos: O ser humano alforria o cadáver da velha escrava para não pagar o enterro. Fala também: As pessoas são usurárias como a vida e avaras como a morte.

- Não entendi. – Um me diz. – Conte a história toda.

- Para entender tem que esquecer, no momento, a história. E há de olhar para as pessoas. Ver o que elas fazem umas com as outras, como elas agem.

- Você diz “as pessoas... elas fazem...” como se fosse melhor.

- Sou uma pessoa? Um ser humano?

- Ah... Sim!

- Então eu me encaixo nessa descrição.

- Não sou assim.

- Se você diz... – Falo com um sorriso debochado; pouco... pouco debochado e muito amargo.

 

 

Ofereço como presente aos aniversariantes:

Naja Batistela, Marcio Castro, Eder Rodrigues, Valdiene Gomes, Cyd Ramos, Marcelo S. Marinho e Adinagruber C. Lima.

 

Recomendo a leitura de:

“OPUS: Selecta de poesia em Língua Portuguesa”; um dos autores e Lizardo de Assis. Mais informações: temas.originais@gmail.com

“QUINTAS – livro I das Quintas”; antologia. Maiores informações: www.jornalaldrava.com.br

“Promessas Azuis: haicais”, de Goretti de Freitas. Prefácio deste macróbio que vos fala. Mais informações: +55 31 93426003

 

¹ Miguel Paulista. Poema III. OPUS: Selecta de poesia em Língua Portuguesa. 2018. P. 96.

 

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO. É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”. Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens:

Antúrio: foto tirada pelo autor;

Vacina: foto tirada por Matheus Menezes.

 

Escrito entre 27 de dezembro de 2020 e 30 de maio de 2021.

domingo, 23 de maio de 2021

O PERAMBULAR PELAS SOMBRAS


Em português

 

Fui a casa de meu neto segurando o livro que ele me presenteou quase vinte anos atrás. Presente comprado com a grana que nos separou. Ainda hoje não aceito nada do narcotráfico. Mas a morte se aproxima e quero ir em paz.

Nervosa, li o que escrevera no livro:

Para minha avozinha:

Daqui até a eternidade te desejo o melhor em tua vida.

Cuida-te muitíssimo e sempre que necessite da mão de um amigo pense em mim.

Nícolas

22 de setembro de 2000.

Apertei o botão da campainha. Barulho na rua e silêncio na casa. Apertei outra vez a campainha. Silêncio na casa. Pressionei e silêncio. Tentei olhar pela janela, mas a cortina impedia. Toquei a maçaneta e a girei. A porta se abriu. – Nícolas! – Olhei lá dentro, mas estava escura. – Nícolas! – Entrei e caminhei pela sala e cheguei à cozinha um pouco menos escura. – Nícolas! – E só havia um cachorro numa cadeira velha e estragada. 

O cachorro na cadeira olha atrás de mim. Não, na verdade não era mais um cão. Não um vivo. Sua pele cobria só ossos. Enquanto seus vítreos olhos viam o sujeito atrás de mim.

Mas eu percebia nada além do cadáver do animal. Não até a hora que a mão gelada e pétrea do morto tocou meu ombro.

O medo me abraçou fria e pétrea como a do morto. Dois? Não, três segundos e vi sangue escorrer em meu braço. Ia gritar, mas já era tarde. Agora meu corpo anda pelas ruas e minha alma perambula nas sombras pela eternidade; com meu neto.

O medo ataca o Brasil com mão fria e pétrea.

Tendo o Capitão da Morte como bastião, cinquenta e sete milhões de mortos-vivos devoraram meio milhão de brasileiros. Talvez poucos mortos-mortos em comparação com o número de mortos-vivos... Mas esse número pequeno é mérito da ciência tão combatida. Porém, em contrapartida, não se tem ainda a estimativa das almas a virem a penar.

 

 

En español

 

EL DEAMBULAR POR LAS SOMBRAS

 

 

Entré en la casa de mi nieto sustentando el libro que él me regaló a casi veinte años. Regalo comprado con la plata que nos separó. Todavía hoy no acepto nada del narcotráfico. Pero la muerte se acerca y quiero ir en paz.

Nerviosa, leí lo que escribiera en el libro:

Para la abuelita:

De acá hasta la eternizas te deseo lo mejor en tu vida.

Cuídate muchísimo y siempre que necesites la mano de un amigo pensé en mí.

Nícolas

Sep. 22’2000

Presioné el botón de la campanilla. Alboroto en la calle y silencio en la casa. Presioné otra vez la campanilla. Silencio en la casa. Presioné y silencio. Intenté mirar por la ventana, pero la cortina me impedía. Toqué la manzana y la giré. La puerta se abrió. – ¡Nícolas! – Miré a dentro, pero estaba oscura. – ¡Nícolas! – Entre y caminé por la sala y llegué a la cocina un poco menos oscura. – ¡Nícolas! – Y solo había un perro en una cadera vieja y rota. 

El perro en la silla mira tras mí. No, en verdad no era más un perro. No uno vivo. Su piel cubría solo huesos. Todavía sus vítreos ojos veían al tipo tras mí.

Pero yo percibía nada más allá del cadáver del animal. No hasta la hora que la mano helada y pétrea del muerto me tocó el umbro.

El miedo me abrazó fría y pétrea como la del muerto. ¿Dos? No, tres segundos y vi sangre escurrir en mi brazo. Iba a gritar, pero ya era tarde. Ahora mi cuerpo anda por las calles y mi alma deambula en las sombras por la eternidad; con mi nieto.

El miedo ataca a Brasil con mano fría y pétrea.

Con el Capitán de la Muerte como bastión, cincuenta y siete millones de muertos-vivos devoran medio millón de brasileños. Quizás unos pocos muertos-muertos en comparación con el número de muertos vivientes… Pero ese pequeño número es mérito de la ciencia tan combatida. Sin embargo, por otro lado, todavía no hay una estimación de las almas que han de sufrir.

 

 

Ofereço como presente aos aniversariantes:

Varlei Castro, Elisio ElijArts, Herbert Gabriel, Danielle Grego e Joey Garcia.

 

Recomendo a leitura de:

“O Chamado do Monstro”, de Patrick Ness; editora Ática.

“Promessas Azuis”, haicais de Goretti de Freitas: Pix – chave: (31)993426003

“Assassinato no Centro Cultural do Shopping” e “O Melhor Brinde”, ambos de Glaussim:

https://www.recantodasletras.com.br/contos-de-aventura/7238010

https://www.recantodasletras.com.br/contoscotidianos/7259399

 

Diquinha de português:

Crase e a palavra “casa”.

Lembrando: crase não é acento grave. O acento é indicador de crase, mas não crase. Crase ocorre quando há o artigo feminino “a” mais a preposição “a”.

A palavra “casa” pode significar muitas coisas diferentes e por isso ela tem regras próprias para o uso ou não de acento grave.

Sem a presença de crase => casa com sentido de lar, residência: Voltarei a casa quando a reforma estiver pronta.

Uma informação pertinente sobre o exemplo acima: verbos “ir” e “voltar” exigem o artigo (quem vai, vai a algum lugar e quem volta, volta a algum lugar), então a impressão que fica deveria crasear. Então, porque não ocorre crase? Porque casa com sentido de lar é um substantivo que não admite artigo porque se pressupõe que já esteja definida. Assim se diz: Volto para casa ou cheguei em casa (sem artigo).

Com a presença de crase => casa com sentido de prédio, construção: Por favor, dirija se à casa ao lado.

Outra informação pertinente: casa associada a adjunto adnominal a crase é obrigatória, mesmo quando casa for sinônimo de lar, residência. Pois a casa estará especificada de algum modo (adjunto adnominal): A proposta é que voltemos à casa de Tiago. [... casa é a residência, mas o adjunto adnominal “de Tiago” exige a crase]. Não é uma casa qualquer, mas foi especificada como de uma pessoa.

 

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO. É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”. Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens:

Vitório: meu cachorrinho poucas semanas antes de morrer velhinho; foto tirada pela artesã e fotógrafa Erika Aviles;

Do autor pelo autor.


Manuscrito originariamente en español en la tarde de 29 de julio de 2020. Trabajado entre los días 08 de abril y 23 de mayo de 2021. 

domingo, 16 de maio de 2021

MORTÊNCIAS

 

O desejo de segurança nos põe em riscos.

El deseo de seguranza nos pone en riesgos.

 

Bate o músculo vital. Não é sinal de vida, é alguma coisa sofrida a bater fatal.

Late el músculo vital. No es señal de vida, es alguna cosa sufrida a latir fatal.

 

Mortências políticas de “higienização” indígena:

 

Pergunta o indígena:

- Para que precisa de tanto ouro?

Responde o português:

- Porque eu e meus companheiros padecemos de uma doença no coração que só o ouro pode tratar.

 

Mortências políticas educacionais:

 

É muita falta de solidariedade os professores e alunos ficarem em casa só por causa de uma gripizinha. Imagine a solidão da Loira do Banheiro sem ninguém lá pra ela assustar...

 

Ser professor é cansativo. Temos as políticas contra nós, a polícia contra nós, Boçalnato e seu governo contra nós, os alunos contra nós e os pais contra nós.

Veja o que uma mãe reclamou e outras concordaram com ela:

Me desculpa aí professores mas ou eles prestam atenção no celular ora fazer o que vcs estão pedindo ou fazem o bloco desse geito vcs confundem a cabeça deles vcs acham que só pq eles estão em casa deve fazem assim ou um ou outro ainda fica precionando pra mandar no privado.

Respondi:

Está desculpada. Mas não entendi a dificuldade. A aula atual do (nome do aluno) é Português; não outra matéria. No grupo coloquei um áudio explicando conjunção, um dos assuntos estudados no bloco 02. E também coloquei um questionamento para saber se entendeu o que é conjunção. Necessito a resposta para poder ir para frente ou explicar mais uma vez o assunto. Qual é a dificuldade?

 

O que diz

Não significa

Nada

Quem o ouve

Não diz

Nada

Não sente

Nada

 

Mortências políticas religiosas:

 

Amanhã acordarei de novo.

- Assim como um pastor de ovelhas cuida de seus cordeiros eu, Pastor de Cristo, cuido de meu rebanho.

- O pastor cuida do rebanho para roubar-lhe a lã e depois matá-la... Cuidamos para roubar e matar bovinos, porcos, galinhas, galos. Filhos, cachorros, gatos. Cuidamos pelo que nos vão dar.

Outra vez, amanhã acordarei.

De novo.

 

Lincoln disse: “não é possível enganar todas as pessoas o tempo todo”. Ilusão. A Bíblia engana.

 

Crianças creem que tudo é para elas ou por causa delas. Monoteístas também. 

Mortências políticas gerais:

 

Gente! As academias são perigosas porque lá os vírus ficam mais musculosos, mais fortes.

 

Ah! Balas!

As balas bailarinas...

Há as que bailam a morte

Sorte são as que bailam doce.

 

sol

meio-dia

humanidade

noturna

gente

vazia

 

Mortências políticas federais:

 

- Em todas catástrofes são os pobres que mais sofrem; mesmo quando foram os ricos que as provocaram.

- Esses pobres sempre apoiam quem lhes exporá... Então...

- Entendo sua angústia e compartilho dela.

- Como diz minha tia, a sábia Lady Zefa, “sabugo só quebra no c* do pobre!

- É rir pra não chorar.

- “O opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos”, disse Beauvoir.

- E como ela está certa. Mas ela também expressa que é difícil agir contra ao que foi inculcado mesmo quando vai contra a própria pessoa. Mas é difícil não se indignar com tal gente. Como é difícil.

 

No Brasil tem dois documentos essenciais e de uso diferentes. Carteira de Identidade (o mesmo que RG = Registro Geral) e CPF (Cadastro de Pessoa Física).

No período da Ditadura quando os militares matavam uma pessoa eles diziam “CPF anulado”.

Hoje o Brasil tem quase quatrocentos mil mortos pelo covid; vítimas do descaso do Boçalnato.

Semana passada ele tirou uma foto de si; rindo muito com uma réplica bem grande de um CPF atravessado por uma faixa escrita “CPF anulado” referindo-se aos mortos pelo covid-19.

E o lema dele é “Deus acima de tudo. Brasil acima de todos”. Esse lema era usado por Hitler e pelo nazismo. Nem todos que dizem Senhor estão com Deus. Aliás, quanto mais a pessoa fala de Deus menos O tem no coração. É como diz o Segundo Mandamento.

 

Boçalnato recebe o gado no Palácio da Alvorada.

Na despedida, Boçalnato mostra sua sapiência dizendo: “Insignes partintes, adeus.”

E, contente, seu curral responde: “Adeus, insigne ficante!”

 

Mortências políticas municipais:

 

Em Ipatinga teve hoje manifestação pró Boçalnato com direito até a grito de ordem: Muuuuuuuuuuu!

É mentira que Boçalnato se preocupa só com o próprio umbigo. Para ter umbigo tem que ter nascido não defecado.

 

Tem avenida de nome errado

E a cidade é no dia seguinte.

O povo está ferrado

O prefeito é um acinte.

 

 

Ofereço como presente aos aniversariantes:

Robinson A. Pimenta, Rosangela Sulidade, Oliver Silva, Thay L. Silva, Geraldo Valentim, Beto de Faria e Sinésio Bina.

 

Recomendo a leitura de:

“O Outro Passo da Dança”, de Caio Riter. Pela editora Artes e Ofícios.

“O viver do novo acordar”, de António MR Martins:

http://poesia-avulsa.blogspot.com/2021/05/o-viver-do-novo-acordar.html

 


Rubem Leite
é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO. É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”. Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens:

Bala bailarina – foto tirada do livro O Outro Passo da Dança, de Caio Riter com ilustrações de Joãocaré, pelo autor deste cronto.

Do autor pelo autor.

 

Escrito entre 20 de abril e 16 de maio de 2021.

domingo, 9 de maio de 2021

REPARE NO “IGUAL A”… PENSE NO “IGUAL A”…


09 de maio este ano é o Dia das Mães; um dia mãe – e cada mulher – não será só a “rainha do lar”, mas sim soberana da própria vida.

13 de maio é abolição da escravatura; uma data quase bela. Só não chega a tanto porque não houve abolição, mas sim abandono e leis eugênicas.

 

O acesso às escolas públicas foi franqueado à população livre e vacinada. [...] A matrícula em escolas públicas era, porém, expressamente proibida aos escravos.

O suposto geral era que o ensino primário seria suficiente para as camadas pobres. Já o ensino secundário não era obrigatório e, como consequência, acabava restrito a uma parcela seleta da população livre. Tanto o curso secundário como o superior, aqueles que facultavam a entrada para as atividades intelectuais mais prestigiosas e para os cargos públicos, ficavam nas mãos das classes senhoriais, sendo que o restante da população deveria contentar-se com a dedicação aos trabalhos manuais.

Para as garotas que frequentavam o ensino primário, a doutrina cristã, a leitura, a escrita e o cálculo mais elementar pareciam suficientes, juntamente com as aulas de bordado e costura. A formação de meninas visava à vida no lar, doméstica, sendo a pública reservada aos homens. Por isso, os poucos casos que alcançavam o secundário eram geralmente destinados para o magistério feminino.

Libertação era entendida pelos proprietários de escravos e pelo Estado como uma espécie de presente; desses que se “recebem” e que “impõem” a obrigação de demonstrar gratidão e retribuir.

Libertos nascidos no Brasil eram considerados livres, mas não gozavam dos mesmos direitos dos cidadãos nascidos livres.

 

 

Não nasci preto; não me denigre. Minha avó veio da África e aqui outro preto africano lhe fez filhos. Graças à escravidão minha avó foi salva pelo loiro Senhor Jesus que se apiedou dos escuros africanos e os trouxe para limpar suas sujas peles.

Não nasci preto, não me denigre. Minha mãe era preta brasileira e seu senhor lhe fez filhos.

Não nasci preto, não me denigre. Se minha mãe tivesse importância eu seria cria de preta brasileira. O que influi é meu branco pai.

Os ventre-livres são brasileiros sem serem cidadãos, pois são pretos. Mas não nasci preto nem ventre-livre.

Me chamam de macho. Mas se eu fosse macho só serviria para procriar se fosse preto ou ser artesão se fosse ventre-livre. 

Não nasci preto; nasci de branco numa incubadora preta. Nasci de branco sem ter pai; o que tenho é padrinho. Alguns dizem que ele é pai meu e de outros. Mas meu padrinho é branco, portanto é homem direito.

Meu padrinho é senhor que fora criado pela minha avó, praticamente irmão da minha mãe. Não sendo eu preto me fez estudar. Ainda bem que não sou mulher. Nem mulher nem fêmea podem instruir-se. O pouco que mulher aprenderia era para ser boa esposa ou professora de criancinha; mas não todas as criancinhas, só às menininhas. E fêmea serviriam para serem incubadoras e as que conseguiram se limpar de sua pretitude até poderiam ser subprofessoras de outras fêmeas também semipurificadas.

Homem X macho. Meu pai nasceu homem e se nasci parecendo macho provei que sou homem, pois não nasci preto.

Por ter provado que não nasci preto; que nasci homem pude estudar e agora trabalho como escrivão da quarta seção do almoxarifado do Arsenal da Marinha.

Não nasci preto nem sou macho. Posso votar como se fora... Posso votar igual a um homem.

 

 

Ofereço como presente aos aniversariantes:

Luã Mérus, Nancy M. Maestri, Camila Mendonça, Pablo Cardoso, Marília Costa e Eraldo Maia.

 

Recomendo a leitura de:

“Lima Barreto: triste visionário” (mais informações abaixo);

“O Verso da Vida”, de António MR Martins:

http://poesia-avulsa.blogspot.com/2021/05/o-verso-da-vida.html

 

SCHWARCZ, Lilia Moritiz. A professora Amália Augusta. Lima Barreto: triste visionário. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. P. 31-41.

Citação inicial e cronto inspirado nas páginas acima. Manuscrevi acompanhando minha mãe no hospital; dois dias antes de ser assassinada por Boçalnato e seus cúmplices (seus eleitores) através do covid-19.

 

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO. É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”. Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens: fotos da capa do livro “Lima Barreto: triste visionário” tiradas pelo autor. E foto do autor tirada pelo próprio.

 

Escrito na ala F, acompanhante de minha mãe no leito 39a, no meio da manhã de 12 de fevereiro; digitado oito dias depois e trabalhado entre 15 de abril e 09 de maio de 2021.

domingo, 2 de maio de 2021

DEGREDADOS FILHOS DE ADÃO

 

PERIGO!

Este cronto é o oitavo de uma novena a pensar criticamente a Bíblia. Se isso te amedronta pare por aqui. Está avisade. Se continuar será por sua conta e risco. Não me responsabilizo pelo desconforto que sentirá, pois é difícil não ser misantropo quando se tem neurônios funcionais.

 

Deus do meu louvor, não te cales: Nomeia contra ele um injusto para que ele saia condenado, perca o emprego, tenha os dias contados, seus filhos fiquem órfãos e sua mulher, viúva. Que seus filhos se tornem mendigos e expulsos até das ruínas. Que ninguém mostre clemência ou compadeça dele nem de seus filhos.

Salmo 108(ou 109)¹.

 

Seis da tarde minha irmã reza a Ave-Maria, o Salve Rainha, o Glória, o Credo, o Pai-Nosso e um trecho do Evangelho. Cada capítulo de sua Bíblia tem subtítulos e segue a sequência: primeiro Mateus; quando acaba, Marcos; depois Lucas e por fim João. E repete o ciclo.

Depois faz um Pai-Nosso e uma Ave-Maria para cada pessoa com quem tem algum bom laço.

Ao chegar a minha vez, entre a primeira e a segunda prece, viu um homem branco, magro, com lisos cabelos loiros ou brancos até o ombro. Não sabe se era jovem, pois a cara estava muito enrugada de ira. No olhar apenas ódio. A boca aberta chiando uma mistura de rosnado com silvado. As mãos dobravam como garras. Essa visão durou segundos. Assustou-se, mas continuou.

Ao contar-me o ocorrido pensei em um sujeito que não vejo há uma década ao menos; que apesar de poucos anos mais novo que eu já tinha fios brancos em seus cabelos pretos, mas cacheados.

Eu o amei, mas não me correspondeu. Contudo soube tirar bons proveitos por uns poucos anos.

A evolução científica não revelou nossos conhecimentos. O que ela nos revelou foi nossas ignorâncias. Já as religiões – e quando digo religião me refiro a tudo que salienta “tenho todas as verdades” e isso inclui, entre outras, o cristianismo, islamismo, capitalismo, socialismo – revela os nossos conhecimentos e ignora nossas ignorâncias.

A uma primeira vista parece que religião é melhor que ciência. Entretanto, se tenho – ou acredito ter – todas as respostas não avanço. E o que não avança regride. Como água parada: apodrece.

A ciência, por revelar a ignorância humana, reconhece não ter todas as respostas. E sabe: que é comprovado hoje pode ser confirmado ou renegado amanhã. Isso porque novos conhecimentos surgem. Desse modo, a ciência não teme refazer experimentos utilizando-se de novas tecnologias nem se envergonha de reconhecer erros. Ao contrário, apresenta as respostas mais acertadas.

Vamos a um exemplo. Imaginemos séculos passados. As pessoas pensavam: se não está na Bíblia é porque é irrelevante. Então como a Bíblia não fala como as aranhas produzem teia ninguém buscaria saber e se procurasse o conhecimento ninguém as aplicaria ou mesmo tentaria conhecer.

E até o uso de “tentaria conhecer” no lugar de simplesmente “conheceria” poucos param para pensar na diferença sutil entre elas. Por que muitos não refletiriam? Porque basta o que está no livro dito sagrado. Veja:

Se simplesmente dissesse “ninguém conheceria” é possível imaginar rapidamente qual o motivo do desconhecimento: medo de punição ou desinteresse? Isso porque a ideia central estar no desconhece. O que te poderia suscitar como primeiro pensamento “por quê?”. Contudo, ao usar “tentaria conhecer” a ideia central fica em tentativa. O que te poderia suscitar como primeiro pensamento “esse conhecimento não importa” e só depois viria a pergunta: por que não importa? E mais tarde poderia surgir a reflexão sobre o que causou o impedimento da busca do conhecimento.

A biologia não se ocupa com normalidade da sexualidade, da moral, da ética. Ela é simplesmente ciência. Não impõe regras de conduta. O ADN conduz os seres vivos de modo inconsciente, natural. A ciência não diz: “Darwin é o biólogo! Galilei é o astrônomo!”.

A religião se preocupa com normalidade da sexualidade, da moral, da ética. Impõe regras de conduta. Dizendo que são naturais cobra falar, homem ter superforça por causa dos cabelos e virgem grávida; mas não dois homens se amarem maritalmente. E nem fala que duas mulheres possam amar-se, pois para ela mulher não tem outra sexualidade que não seja satisfazer ao marido. A religião diz “Cristo é O Ungido! Só Ele é a Salvação. Ou Maomé é O último Profeta! E depois dele nada mais precisará ser revelado.”.

Amei sem correspondência outro homem apesar de saber aproveitar-se de meu sentimento. Talvez não correspondera – e creio ser essa a mais plausível hipótese – por simplesmente não achar valia em mim.

Todavia sei os olhares que eu recebia, os risos que entrevia e os cochichos que eu entreouvia das pessoas na cercania. Mas não era novidade para mim. Hoje percebo o porquê, aos meus sete anos, um tio me dizia para eu mostrar “meu documento” se alguém perguntasse ao adulto que me acompanhava se eu era menino ou menina. Mais tarde, entre onze e quinze anos, meus colegas escolares escancaradamente me olharem, rirem e falarem de maneiras dolorosas.

Recordo de uma conhecida muito querida que conta:

- Quando adolescente acordei sentindo gotas frias no meu corpo. Abri os olhos e vi minha mãe acendendo um fósforo. Era álcool que me molhara. Escapei porque rapidamente me levantei e pulei a janela sobre minha cama. Para ela Jesus me preferia morta que lésbica.

A religião normatiza o que quer; o que seu fundado preconizou e os que vieram depois acrescentaram ou modificaram sem cons-ciência do povo. Duvida?!? Tem coragem de olhar a história das religiões? E da “sua” religião?

A ciência esquematiza o que comprova e reesquematiza sempre que obtém novos dados. Apresenta os fatos. Às pessoas cabem a tentativa de conhecer ou decisão de desconhecer.

 

 

 

Ofereço como presente aos aniversariantes:

José de Carvalho Neto, André Kondo e Nadja Soares.


¹ A injustiça e rogação de pragas são os principais ensinamentos contidos nos Salmos; perfeito exemplo é o Salmo 108.


Diquinha de português – super- e hífen:

O prefixo latino super- indica a ideia de excesso ou posição superior e só é separado com hífen quando o segundo elemento começa com “-r” ou com “-h” (super-homem, super-resistente). Nos demais casos não se utiliza o hífen (superforça, superaquecido)

 

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO. É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”. Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

 

Escrito entre fevereiro e 02 de maio de 2021.