Finalmente, Senhor! Posso ir embora.
São 23 horas de uma noite de lua minguante. Ante a porta, o marido que chega cedo em casa, ouve o lamento da mulher amada e se estanca. A princípio suspeito da fidelidade da mulher.
Não sei o que posso ter feito de tão errado para merecer tamanha dor.
Fora do quarto, num imenso corredor, tão largo que até parece um salão para os sete quartos do casarão, a prece é substituída por um imenso choro. Um minuto. Cinco minutos. O tempo passa e a mulher continua sua oração agora permeada pelo choro.
E agradeço a piedade que finalmente me chega. Ah! Morte tão esperada, você é bem vinda.
O marido ouve o choro e o lamento de sua mulher. Seu rosto, paralisado em sentimentos confusos.
Senhor! Como cristã, não posso crer na reencarnação, mas como posso ser castigada tão cruelmente? Castigada por coisas que não sei como posso ter feito. Como? Eu, que sou toda amor por meu marido? Não posso... Finalmente, Senhor! Agora mereço morrer, pois já não tenho como pagar mais por algo que nem sei.
Entre o engasgar do choro e grossas lágrimas, sua voz se perde na solidão e o marido se perde numa lágrima.
Sempre me dei inteiramente a ele, que me pagou com amantes. Uma casa maravilhosa para mim. Visitas às suas amantes. Uma linda cama para mim. O melhor sexo com seus amantes. Jóias para mim. Orgias com suas mulheres. Mas, finalmente, morro! Morro! Morro!
Um clique sufoca seu soluço. É a luz que se apaga. A mulher se deita. Um minuto. Cinco minutos. Silêncio.
A porta se abre. A mulher ronrona no sono. Ele se senta numa cadeira. Com o nascer do sol os pássaros cantam no jardim e o silêncio é absoluto no quarto. Os olhos pousados na mulher toda a madrugada.
O marido chora.
A casa acorda lentamente.
Alguém bate à porta.
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