domingo, 19 de fevereiro de 2023

MORAL DA HISTÓRIA: ZEJUS NÃO É JESUS

Zejus se acerca da goiabeira:

Sai daí que vai cair.

Jesus nos Ianomâmis

É o fim da ladeira:

Sai daí se não vou cair.

Era uma vez num reino muito, muito distante. Tão distante que o tempo demora a chegar e a voltar.

Debaixo de uma goiabeira vivia uma linda sapinha que queria ser gente.

Numa bela manhã ela conheceu um sapo mexicano do Deserto de Sonora. Bufo Alvarius era assim que se chamava a paixonite de nossa linda sapinha.

A heroína de nossa história deu um beijinho no Bufo, achou interessante, deu uma lambidinha. Mas o que ela não sabia era que Bufo Alvarius era na verdade da cabeça louca dela um bruxo. E ele deu no pé porque ninguém merece uma sapa louca.

E o que aconteceu?

A linda sapinha passou a ver coisas esquisofrên... digo ver coisas esquisitas.

Primeiro ela viu Hitler, Mussolini e aprendeu muitos ensinamentos.

Em seguida viu Zejus no alto da goiabeira e gritou: "sai daí, minínu. Se não ocê vai cair".

A aparição, digo: a alucinação comovida com a preocupação da linda sapinha disse com voz alta, mas baixa, perto, mas distante, sonora, mas silenciosa; pois só acontecia na cabeça dela.

_ Se você ler sete vezes tudo que Olavo de Carvalho escreveu você se transformará em gente.

E a linda sapa louca acreditou no Zejus. Leu sete vezes os livros e adivinha o que aconteceu?

Ela se transformou numa feia menina e passou a se chamar Doidamales. Cresceu, virou pastora, ministra do desgoverno Boçalnato e disse:

_ Pastor moçambicano quis fazer o jejum de Jesus e morre de anemia e insuficiência dos órgãos digestivo. Só não é santo porque se é queimadinho veio lááá de baixo.

_ Queria eu fazer piada do que você disse, Doidamales. E também do referido pastor. Mas são tão ridículas a sua fala assim como essa morte que minha piada ficaria mais fraquinha que a saúde e sanidade de vocês dois.

_ Benito, esse também não é motivo de piada. Não? - Cráudia Diézus entra na conversa. - Só falta debochar das carpinhas da Micheque.

_ Cráudia, se puder entender o que direi ficarei agradecido. Minha piada não seria a morte em si. Nunca a perda de alguém é engraçada. Meu humor seria sobre a vaidade, a arrogância, a estupidez humana em se ver melhor ou superior aos outros. Ele quis seguir o exemplo do Profeta, do Filósofo Jesus no amor, na solidariedade, na sabedoria? Não! Ele quis mostrar-se uma espécie de super-herói. Mas o corpo não suporta tanto tempo sem água. Não há dignidade na causa de sua morte; foi apenas ridícula.

Benito suspira e continua:

_ Toda morte humana me dói. Em algumas exalo essa dor com poemas. Em outras, com humor. Pois humor é uma das mais perfeitas formas de denunciar os horrores. Mas esse pastor não há como denunciar horror. Sua morte só foi vaidosa e tola.

Como a Cráudia Diézus teceu duas loucuras, Benito da uma pausa antes de ser mordaz:

_ A Micheque Boçalnato esvaziou o laguinho, conhecido por espelho d'água, do Palácio da Alvorada para tirar as moedas e doar a uma casa de caridade dirigida pelo Pastor Capeta. E disse, com a çabiduria do Isprítu Çântu: "É normal peixe morrer quando é tirado d'água".


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Rubem Leite: texto.

Imagens tiradas do Caralivro.

Escrito entre 30 de janeiro e 19 de fevereiro de 2023.

Um comentário:

aRTISTA aRTEIRO - Rubem Leite disse...

Mensagem do professor Eraldo Maia:

Se há quem não dê importância à morte de quase 700 mil pessoas, que se dirá da morte de uns peixinhos, não é mesmo?