Obax anafisa.
Da janela se
percebe a noite espreitando um meio de adentrar o quarto e nos devorar de fora
para dentro, de dentro para fora e...
- Que isso,
Benito! Uma história de terror?
- Não, cara!
É só para criar um clima, fazer um suspense.
- Besta!
- Uarrarrá!
Na verdade o que quero dizer é: Precisamos usar os conhecimentos que temos, e
nas mais variadas áreas para conseguir algo.
- É... Mas
como?
- Huum! Por
exemplo. Estou estudando espanhol e descobri que “escalera” é o mesmo que
escada para nós. E me perguntei “Por que escalera? O que tem em comum com
escada?” e não via a semelhança até que notei que ambas começam iguais: “esca”.
Pensei mais ainda e notei que escalera lembra escalar. Daí eu vi que a origem
da palavra em espanhol é escalar o que se queira, um prédio, por exemplo. E em
português? Es-ca-da. Se no espanhol vem de escalar quem sabem a nossa não vem
de es-ca-la-da?
- Nossa!
Complicado...
- Né não. É
só parar para pensar. Unindo as informações que se tem para chegar a uma
conclusão.
- Tá! Mas
qual a importância disso?
- Uai! São
tantas. Desde o simples conhecimento à “malhação”, “musculatura” do cérebro. O
princípio é o mesmo para qualquer aprendizado. E, no meu caso, compreensão e
não mera decoreba de uma língua que estou estudando.
Entra em meu
quarto o vento e simultaneamente à sua saída me despeço de meu amigo.
- Com quem
você estava conversando?
Maria
pergunta quando Benito desliga o celular e ele responde:
- Era um
adolescente que eu estou corrompendo, aliciando, desencaminhando.
- Kkkkkkkkkk.
Deus queira que você consiga, pois eles não querem saber de conserto.
- Era usuário
de drogas banais e outras mais... Largou-as para um vício maior: a leitura
- Ô glória!
Saiba que aquele que tirar do caminho ruim um pecador receberá do Senhor a
gloria por vir.
- Leitura faz
pensar, pensar faz questionar, questionar faz cobrar, cobrar incomoda. Por isso
são desencaminhados, corrompidos, aliciados. Pelo menos é que dizem os
governantes...
- Parabéns!
Tenho muitos ex-alunos encerrados na prisão, pois não quiseram mudar de vida;
apenas passaram pela escola...
- Também
alguns de meus ex-alunos pouco aprenderam. Mas acho que a semente lançada nunca
se perde. Apenas busca nas próprias experiências o necessário para germinar.
- Alguns são
presos pela falta de oportunidade. Como vi na peça européia, de sei lá quanto
séculos atrás, O pastelão e a torta: “Minha fome convenceu meu amigo a roubar
(a torta)”. Outros são presos porque tiveram oportunidade de aprender, e
incomodam...
- Por isso digo:
Leia e deixe ler!
- Que isso,
Benito e Maria? Lição de moral para o leitor? – Ironiza Paulo, que da varanda,
de costas para os brincos de princesa, nos observava antes de entrar com o
irmão, Pedro.
“Deus meu!
Espero que não”. Benito responde e Maria completa: “Foi só transferência em
palavras, obvias talvez, do pensamento geral, talvez não obvio, de muitos”.
Benito retoma a palavra: “Que bonito é falar difícil”.
- Belo livro!
– Paulo aponta para a mesa encerrando o assunto antes que Maria mandasse o amigo
para algum lugar escuso. Não estava disposto à briga alheia. Pedro começa outro
tema de conversa. – Que livro é?
- É uma
versão para crianças de Os Lusíadas, de Camões.
Paulo pega,
abre ao acaso e lê:
- “Não é
ficando encostado às glórias dos seus antepassados; dormindo em leitos de ouro;
entregando-se a exóticos manjares, a passeios ociosos, a deleites infinitos,
que se alcança a imortalidade”¹.
Pedro
continua:
- “É, antes,
buscando com seus próprios esforços as honras que possa chamar suas; é vestindo
a armadura, sofrendo tempestades cruéis, vencendo frios que enregelam e regiões
desabrigadas, é comendo alimentos apodrecidos; é mantendo no rosto, que
empalidece, a expressão firme e decidida, quando vê a bala, assobiando, tirar a
perna ou o braço ao companheiro, que o homem alcança a verdadeira glória”¹.
Ofereço como presente de aniversário:
Guebel Stevanovich, Léo Coessens, Adê Araújo, Marquim de Faria, Vinicius
Cabral e Márcio F. Amorim;
¹ CAMÕES, Luís Vaz. Os Lusíadas (seleção e adaptação: Elsa P.
Magalhães). Rio do Mouro (Portugal): Girassol, canto VI.
Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. O texto é
minhas flores para você e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.
Escrito entre 25 de março e 20 de maio de 2013.
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