quinta-feira, 9 de maio de 2013

FLORES E FOLHAS


Obax anafisa.





No domingo às onze horas da manhã no camelódromo o homem magro, barba grisalha bem aparada, camisa azul celeste de mangas compridas, gravata com estampa em seda vermelha, terno azul marinho sem o paletó, sapatos pretos engraxados e meias também pretas.
O homem não feio passeia com um garotão bonito.
O rapaz de musculatura definida, imberbe, camiseta branca, calça dins rasgada no joelho esquerdo, botas parecendo coturnos marrons.
Os dois riem do que falavam.
- O senhor pode comprar amendoim pra mim?
- Sim, claro!
Param numa barraca e o adolescente pega um pacotinho.
- Quanto é?
- É seu filho? – Pergunta a camelô com olhar irritado.
- Não! – Responde rindo.
- É um real. – Diz a mulher com raiva pouco disfarçada.
O homem paga, o jovem come e saem olhando as árvores da João Valentim Pascoal sem dizerem que são amigos, são professor e aluno. E discutindo as coisas da vida, a língua portuguesa e nossa literatura. Falando do 7º Salão do Livro de Ipatinga (2013) e comentando o livro ilustrado que o homem lá ganhou: “Os Lusíadas: episódios fabulosos”, de Luís de Camões.
“As ninfas do rio Mondego por longo tempo choraram a morte de Inês, e para que a sua memória para sempre perdurasse, transformaram as lágrimas em fonte pura, e puseram-lhe o nome dos amores de Inês”¹. Recita o professor e o aluno responde “Pedro continuo a amá-la para lá da morte, e quando se tornou rei, mandou que o corpo de Inês fosse sentado no trono; e ali, depois de morta, a fez rainha”¹.
Enquanto os dois conversam pela cidade penso nas pessoas que plantam azáleas para e por aqueles que se vão. E penso também nos que escrevem. Ambos, creio, não fazem em vão.


Ofereço o cronto à Nena de Castro, grande jardineira das palavras e amiga melhor ainda. Força para superar o passamento de sua mãe e coragem para transformar suas dores em flores e folhas.
Ofereço também ao meu tio Du (Sebastião M. Weber), que retornou ao mundo espiritual na noite de 08 de maio de 2013. E ofereço aos seus irmãos [Mª Ettiene (minha mãe) e aos tios Beto, Celeste e Belinha] e à sua esposa, tia do Carmo.

Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. Os versos e a ilustração são nossas flores para você, que me lê, e fazemos votos de que encontre neles pedras preciosas.

¹ CAMÕES, Luís de (seleção e adaptação de Elsa P. Magalhães). OS LUSÍADAS. Rio de Mouro (Portugal): Girassol Edições Ltda. Canto III.

Escrito entre 16 abril e 09 de maio de 2013.

Um comentário:

Heloísa Davino disse...

Mas não mesmo Rubem. Pode ter certeza absoluta disso. E é mesmo fundamental que a gente se dê conta da nossa existência fugaz. Reverberar no outro, no mundo é algo que nos cabe. E quando o fazemos, somos invadidos por uma enorme alegria. Não é? Adorei vc ter levantado essa questão. Vc é mesmo um rapaz sensível e amoroso. O mundo agradece.