Rubem Leite
08-12/5/10
Escrevo ouvindo Fita Amarela, na voz de Silvo Caldas
e Vapor Barato, nas vozes de Gal Costa e Zeca Baleiro.
E ofereço a Daniel Viana e Cia Bruta de Teatro.
E à aniversariante Lucília Profiro
À gameleira verde, especialmente verde, o capim de ribanceira verdeja com gosto.
Sento-me com as costas apoiada na árvore, pego um raminho do capim e o mordisco. Levei algo para comer e um livro chamado “Poesia de Bolso”, vol. 04 editado pelo CLESI. O vento sopra agradável. Leio os poemas de Gabriel Nascente. Dou uma cochilada. Acordo e como um sanduíche (pão de centeio e queijo minas). Leio os poemas de Rui Barreto. Cochilo com a brisa e quando acordo como pão com soja, mel e queijo, bebo parte do suquinho e volto a ler, dessa vez os poemas de Valéria Amaral. Ontem eu li Carlos Cavalcanti, César Cardoso e acho que amanhã lerei Mª Helena Moreira, Marcelo Maccaferri e Lígia Porto concluindo assim o livro. Por hora, enquanto leio, cochilo e como as frutas que levei,
Paf
...
...
Paf
...
...
Água
...
Sal
...
Água
...
Sal
...
Lágrima
...
Lágrima é só
...
Lágrima é só água e sal
...
Espinho!
Ó espinho!
Não me machuque
Eu sou sua flor
Lágrima é só água e sal
E eu sou sua flor
Espinho não machuca a flor
O vidente se fez cego
E o corpo cego se enrola em fitas
O lago alumínio brilha com velas boiantes
E eu danço com todas as cores
Eu sou poeta das cores
Mas só o preto me possui
Junto com um vento crescente, o balançar dos galhos da gameleira e os raios de sol que prometem ser de despedida, ouço o patear de um cavalo que me acorda. Preto. Completamente preto. Nenhuma outra cor. Não! Sua crina... Seus olhos... Seu focinho... Não são negros. Sua crina, branca?! Amarela?! Verde?! Seus olhos, vermelhos. Com certeza, vermelhos. Seu focinho... Seu focinho. Parece não ter cor. Parece ser fogo. Não estar em chamas e sim ser o próprio fogo. Não é isso... Não consigo descrever. Sobre o garanhão um cavaleiro alto – agigantado por eu estar sentado e ele montado –, magérrimo, branquíssimo – não albino –, longos cabelos pretos cobrem as orelhas impossibilitando vê-las ou mesmo vislumbrá-las, olhos azuis, finos lábios vermelhos, nariz longo e fino, mão imensas – palmas amplas e dedos longuíssimos –, grandes pés – é o que as botas de couro escuríssimo e canos altos sugerem –, toda a roupa é tão preta quanto o cavalo; não dando para distinguir um do outro. É um homem feio. Charmoso, másculo, imponente. Mas feio. Um segundo, se tanto, durou sua chegada e minhas observações. Meu cérebro assimilou, como se o observasse um dia todo. Nada fala. Nada falo. Só nos olhamos. Os três. Eu, o cavalo e o cavaleiro. Um segundo. Um minuto. Dez e ele desce. Suas roupas se apartam do cavalo, parece, como um elástico se esticando – ampliando, não se separando –. O vento mudo me esfria. Sempre e continuamente nossos olhos se tocam. Os meus, os do cavalo e os do cavaleiro. Nada falamos. Ele estende sua mão esquerda, pego e ele me levanta. Nossos olhos se olham. Seus azuis deprimem os meus castanhos. Ele sobe no cavalo. Monto também. Nenhum olhar se encontra. O cavalo olha para frente. Eu olho para frente. Ele, mais alto que eu, atrás de mim, olha para frente. Uma só visão para todos,
Agora é você. Dê-nos sua carne e nós nos damos a você. Venha ser um conosco e com o garanhão como ele, o garanhão e eu somos um.
À gameleira verde, especialmente verde, o capim de ribanceira verdeja com gosto.
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