segunda-feira, 12 de maio de 2014

HAJA PACIÊNCIA QUE AJA

Obax anafisa.


A madrugada promove o encontro da última escuridão com a primeira luz. E é assim que vejo imensas copas verdes adornadas com pequenas flores vermelhas, laranjas e amarelas.
- Hômi ruim aquele segurança. Perguntô que pobrema tenho pra querê mudá minha senha para especial. E num mi deu. Recusô.
- A senhora quer passar na minha frente, mesmo tendo chegado bem depois. E quer me dizer que a senhora não é ruim?
- Nossa situação é diferente...
- Conhece-me para poder dizer isso? – Articulo e volto para meus livros.
“Homem não tá querendo mulher fraquinha, não. Homem tá querendo mulher com condição” faz gesto simbolizando dinheiro. “Bastava baixar minha ficha”. “Retiveram por trinta dias. Trinta dias. Pra que precisavam de tanto tempo? Para nada”.
Entre tais e outras conversas entrecortadas saio da Câmara Municipal de Ipatinga e vou para o Pronto Socorro Municipal. Algo pertinho. Uma hora de ônibus errado. Desses que trocador não sabe nem o itinerário... Quarenta, de ônibus certo, que para na porta. Fora o tempo de espera no ponto.
Pronto Socorro. Serviço de Atendimento à Família, Diagnóstico e Ambulatório: SAFADA. Multidão sentada. Esperando, esperando e à espera.
Após marcar a consulta já agendada na Prefeitura vou, depois de mais alguns dias, ao Hospital Municipal dizer que cheguei. Dito, vou à portaria ao lado, não tão ao lado.
Primeira visão: “Art. 331 do Código Penal Brasileiro. Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: pena de detenção de seis meses a dois anos, ou multa”.
Espero o exercício da função. Dez minutos. Trinta, quarenta e cinco minutos e ainda há esperança, mas haja paciência. Melhor olhar ao redor. Quem sabe passa o tempo.
É fascinante olhar para as portas enferrujadas, quebradas, sujas, paredes e teto imundos, desbotados, descascando, com reboco à mostra, pó de cimento, fios e tubos de borracha com imensos pedaços de fita isolante à mostra, e teias de aranha. É fascinante, aos sessenta minutos, uma funcionária dizer: “O dotô ainda tá em Belo Horizonte e só agora avisô que é pra remarcá proto dia porque num deu pra vim antes”. Aja, paciência.
Na meia parede bloqueando a visão do interior dos banheiros um copo descartável com um líquido preto. Ir um dia, voltar no outro e retornar uma terceira vez e ver o mesmo copo no mesmo lugar. É fascinante.

Ai que vontade de não ser poeta
E ser pedra em um jardim
Ai que vontade de ser poeta
E ter alma cheirando a jasmim
Ai que vontade de ser poeta pateta
Mas não sou pedra e sou flor carmim



Ofereço como presente de aniversario a:
Camila Rodrigues, Janete Reis, Valdir do Carmo, Marilene Vitor, Elisângela Guilherme e Joneisson Araujo.
E aos agentes culturais aniversariantes:
Carla Alves e Robinson A. Pimenta.

URDUME é um ebook de poesias para exorcizar lamentos de amor, raiva e dor exacerbada através de sentimentos apurados e de um posicionamento significativo no mundo.
Obra bilíngüe (português e espanhol) de Rubem Leite; publicada pela editora CÍRCULO DAS ARTES. Ilustração de Bruno Grossi. Revisão de Cida Pinho e Lilian Ferreira.

Escrito entre os dias 03 de fevereiro e 12 de maio de 2014.

Leiam o texto Nos recusamos ao silêncio absoluto, de Thiago Domingues. No endereço


Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. O texto é minhas flores para você e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.

2 comentários:

Marilene disse...

Aff! Haja paciência mesmo para esperar a boa vontade desse " povo" de trabalhar,de atender as necessidades de quem precisa de um atendimento decente,um atendimento feito gente. A maioria quer mesmo é só o dimdim de fim de mês ,e ainda tem coragem de reclamar,querem aumento salarial.
É muita falta de vergonha na cara!
Não digo isso de todos ,( existe os realmente trabalham ) digo da parte podre da laranja,que ao meu ver,é a maioria.
Pronto! Falei!

( Grata estou pelo carinho,pela dedicação do texto também a mim!
Admiro o seu trabalho,sua pessoa,sou sua fã! )

Anônimo disse...

Rubem,

Artista e arteiro que é, você faz poesia da mais prosaica cena cotidiana presenciada não só em Ipatinga.
Até que alguém aja... Haja paciência!
Um grande abraço

Aya