domingo, 27 de dezembro de 2020

NÃO SEI VIVER, EMANUEL

 ou ESTE TERCEIRO DIA ATÉ HOJE NÃO VEIO

 

 

Escribir por necesidad

Porque es también denuncia el oficio

Para ubicar los espejos cara a cara

Y vernos en el silencio que escogimos

Escribir para que nos crucifique la historia

Hacer que grite y llore y nos deshonre

Para que no quede en el olvido

Escribir para nombrar a los culpables

Para nombrarnos uno a uno tras el vidrio

Porque hacen falta los versos y la bronca

Porque lo hemos dejado morir en la calle

Y de frio.

(Coronel¹).

 

Se alguém for falar mal de mim, não o faça pelas costas. Chame a mim, pois sei coisas terríveis sobre mim que a maioria nem imaginaria.

Diz Benito Bardo Junior. É importante separar as coisas. Rubem escreve o cronto, mas quem vive e conta a história é Benito.

Política e religião é o assunto da conversa e o que segue é após algumas dezenas de minutos após se sentarem num quintal em Belém do Pará.

- Anteriormente falei ao senhor que aqui em Belém temos o caso do deputado Éder Mauro Cardoso Barra e do delegado Marivaldo Pamplona da Silva, mais conhecido por Marivaldo do Pirarucu. Éder e Marivaldo realizavam juntos um esquema de nomeação de familiares, agiotagem, contrabando e grupos de extermínios.

Diz o professor Ariano, o Mouro. Ele para um pouco, olha pra lua enquanto bebe um gole de cerveja e continua:

- Inclusive o documento “‘Relação de devedores da União que financiaram campanhas eleitorais de candidatos ao cargo de Deputado Federal’ emitido pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, Procuradoria-Geral Adjunta de Gestão da Dívida Ativa da União, Coordenação-Geral de Estratégias de Recuperação de Créditos” comprova que Marivaldo tem uma dívida não previdenciária financiando o candidato a deputado Eder. Prenderam o delegado e encontraram muitas provas dos crimes cometidos pelos dois. Mas em menos de seis horas, “não se sabe como”, um delegado conseguiu cem mil reais para pagar sua fiança. E ambos estão soltos.

O assunto muda parecendo não ter nenhum anexo com o a fala acima.

- Quando eu era jovem praticava uma religião. Até que ainda a respeito. Não a sigo mais porque não creio mais que religiões religam o ser humano a Deus. Essa religião ensina: “só existe o bem porque Deus criou apenas o bem e não criou o mal; e só Deus pode criar. O mal é apenas uma ilusão, uma fantasia humana.”. Acho que ainda acredito nisso... Não sei.

Benito interrompe sua fala para beber sua cerveja e observar a castanheira banhada pela lua. E continua:

- Mas o que quero dizer é o quanto me chocava ao ouvir no catolicismo o Salve Rainha “degredados filhos de Eva gemendo e chorando num vale de lágrimas”. Eu sempre dizia “não sou um degredado filho de Eva. Sou um filho de Deus e não vivo num vale de lágrimas. Vivo no Vale do Aço; vale de gente forte feito aço”. Porque no Leste de Minas, onde moro, tem o município de Ipatinga que fica no Vale do Aço. A microrregião tem esse nome porque minha cidade tem uma importante indústria de aço bruto e na cidade próxima, Timóteo, há uma indústria de aço inox.

Benito interrompe sua fala outra vez. Bebe mais um pouco e, sem olhar para nada nem ninguém, continua:

- Bem, fui crescendo, crescendo não só em tamanho, mas em idade, em feridas e fui observando as coisas. O ser humano é o lobo do homem. Ainda creio ou acho que acredito que na Imagem Verdadeira o que Deus criou não se desfaz. Mas temos um apego enorme a ilusão. Não sei dizer estou falando certo, mas me dói muito... É muito doloroso pra mim saber que o ser humano ininterruptamente prefere o mal ao bem. Talvez eu esteja exagerando ao dizer continuamente. Mas se não é sempre é quase sempre. E não quase nunca. Não sei viver, pois é doloroso demais ser gente. Não sei viver, pois não há sociedade, mas sim alcateias. Mas ainda tento. Tento através das minhas aulas; que pelo menos alguns consigam ser pessoas de bem e não apenas de bens. – Ri amargo. – Quando escrevo e denuncio tudo isso espero que as pessoas parem e pensem e tentem “não vamos fazer mais isso. Vamos modificar”. Não sei vou conseguir. Acho pouco provável, mas ainda assim resisto.

Para passar o período natalino e de troca de ano estamos Benito, eu, Girvany de Morais, Glaussim e sua família no quintal da casa de Ariano, no Belém do Pará. E foi aí que o até então calado Glaussim diz:

- Não gosto de refutar Deus em pensamentos. Acho que Ele é muito mais que isso. O que penso é: “buscamos a aceitação de um Deus bondoso e esquece que Ele fez o mundo, o universo, as possibilidades de bem e mal”. A árvore que estava no centro do Éden é uma alegoria para o bem e para o mal. É uma parábola para a escolha humana. A escolha de pegar o fruto e entender sobre o bem e sobre o mal.

Interrompe sua fala para beber e olhar as pessoas nas outras mesas. Enquanto isso Benito diz:

- Mas será que buscamos um Deus conosco, um Deus bondoso?... – Olha a todos ao redor da mesa até fixar-se na lua acima da castanheira. Só aí continua: Creio que a busca geral é o Deus belicoso...

Glaussim pensa um instante e retorna ao seu raciocínio:

- O paraíso e o inferno são a mesma coisa. Quem torna tudo um inferno são as pessoas com suas escolhas assim como quem consegue florear a própria vida a transforma num paraíso. Enquanto muitos soltaram bombas em Nagasaki e Hiroshima outras tomavam seu café... É terrível. Mas tudo é escolha dos homens que governam e das pessoas que aceitam os governos impostos.

Bebe outro gole e retorna:

- Essa árvore – olha a castanheira sob a lua –, a do Jardim do Éden, está na terra, na superfície de nossas mentes e buscar sua seiva é procurar o que nos move, a alma máter. Se a pessoa consegue de alguma forma enriquecer e olha ao lado e vê a miséria dos demais... É aí que a pessoa descobre quem ela é.

Benito pega o celular, procura uma charge e a mostra aos amigos: 


- A paz pela guerra é a ideia de vida “amelricana”. Numa aparente mudança de assunto:

- Em Ipatinga temos muitos prefeitos caçados nesses últimos seis anos. O prefeito Nardielo Rocha, que ficará até 31 de dezembro, está respondendo a uma dezena de processos. Ele é aquele que foi eleito por dizer que o adversário iria, nas escolas, acabar com banheiros para meninos e banheiros para meninas; ficando um só banheiro para todes usarem na hora do recreio. Foi eleito em nome de Jisuis. Ah! Sinceramente estou cansado de religiões. Mas diz aí, Ariano. O tal delegado está solto? Está trabalhando? O que está acontecendo com ele? E o deputado, continua no cargo? Vai candidatar-se de novo? Quais são as notícias que temos em relação a esses dois cidadãos de bem.

- O deputado está em franca campanha. Começou a andar pelos bairros de Belém. Como deputado federal deveria estar em Brasília... Agora, o delegado tem ligações estreitas com grupos de extermínios... Esses dois sabem fazer política. Prendem um grupo de traficantes, divulgam nos jornais e o povo os crê salvadores da pátria. Sendo que, na verdade, apenas acabaram com aqueles que pararam de lhes dar propinas.

Glaussim retoma a palavra:

- O mundo é instável. Seja geograficamente, seja humanamente. Vemos os movimentos das placas tectônicas, das quedas de meteoritos que este mundo não foi feito para ficar em paz. De tempos em tempos surgem formas absurdas de homens-deuses como os faraós, Júlio César, Gengiskan, Hitler, os presidentes dos Estados Unidos e o nosso Boçalnato.

- Parece que uma nuvem negra vem se aproximando com uma tempestade... – Diz Ariano. – Não consigo engolir essas coisas. É muito difícil. Não consigo engolir mesmo.

Girvany é um bom ouvinte e por isso só agora dá o seu parecer:

- Alguém já ouviu falar em crimes nas comunidades indígenas? A Bugra, de Nena de Castro, nos mostra: Eles não são perfeitos, claro. Mas qual é a proposta de comunidade deles? Uma coisa que eles não têm, mas na nossa é essencial, é a competição. Não falo de competição esportiva, mas sim de capital. Aqui, se um trabalha oito horas para conseguir construir uma boa casa outro trabalha doze para construir algo melhor.

Come um pouco e continua:

- Acompanhada por Nena, Flávia Frazão nos diz: “Não é uma ridícula questão de luta do bem com o mal.”. As sociedades onde as desigualdades não existem ou são muito poucas a proposta é viver em comunhão. – Uma breve pausa e: Temos que lembrar que as pessoas são frutos das ideologias.

- É! E como disse Paulo Freire: “Não existe imparcialidade. Todos são orientados por uma base ideológica. A questão é: sua base ideológica é inclusiva ou excludente?”. O presidente, pela milésima vez desdizendo o que disse fez um arremedo de plano de governo para vacinação do covid. Na primeira vez do plano os professores estariam em segundo lugar na prioridade de vacinação, mas mudou de ideia e nos colocou em último lugar junto com os presidiários. Minha fala não objetiva desmerecer as pessoas desprovidas de liberdade, mas sim em nos colocar no mesmo patamar de quem comete crimes. – Diz rindo: E tem presidiário ofendido por ter sido colocado no mesmo nível do professor...

 

Perdão!

Sobre o Natal e o ano novo:

Estou deprimido demais para desejar algo que não acredito ser possível estes anos: feliz.

Mas

Desejo do meu coração que tenham tido um Natal...

E quem tenham força e coragem para passar por 2021.

Espero que tenham tido uma boa preparação para o renascimento do Emanuel, o Deus Conosco, para que Ele cresça em 2021.

Mas

O povo que num domingo Lhe proclama “Hosana nas alturas” na sexta lhe proclama “Crucifica-O!”.

Em 2016 Ele foi golpeado.

Em 2017 foi sabotado.

Em 2018 Jesus foi cuspido e esbofeteado.

Em 2019 Ele foi agredido e ferido de morte.

Em 2020 Ele foi morto...

Mas vejamos se em 2021 Ele ressuscita e cresce.

Mas

Como isso poderá fazer-se?

Quem é Jesus, o Cristo, o Emanuel? O que se faz com Ele?

Mateus 07,12. Mateus 07,21-23. Mateus 18,01-14. Lucas 24, 07.

 

 

Ofereço como presente à aniversariante Liala Coelho.

Talvez em 2021 não ofereça meus textos a ninguém em especial.


Recomendo a leitura de:

“Versos Ácidos do Vale do Aço”, deste macróbio que vos fala e de nove outras grandes vidas. Comprar um exemplar é, primeiro, beneficiar seu cérebro; depois apoiar a arte/literatura local. Meu watzap é: +5533998034325.

 

¹ Silvia Martínez Coronel é uruguaia e vive em Montevideo; é colunista na empresa Periódico La Brecha; é docente de Literatura; é crítica de Arte; e é escritora. Coronel crê e incentiva “Dê de presente um refúgio. Um livro é companhia porque aquele que lê nunca está só.”. Ela repete a fala de Laura Martínez Coronel: “A criação tem o eterno poder de derrotar a morte”.

 

Sobre vacinação dos professores:

GALVANI, Giovana. Governo descumpre promessa e retira professores da fase dois da vacinação.  https://www.cartacapital.com.br/educacao/governo-descumpre-promessa-e-retira-professores-da-fase-2-da-vacinacao/?fbclid=IwAR3P_cANtgGAP2n5wOURpab3__nmZoS3PWlPASYTxHr5dKoIHonwYXhw2JY Acesso 18 Dez 2020

Veja Saúde. Como é o plano de vacinação contra a Covid-19 do governo federal. Disponível https://saude.abril.com.br/medicina/como-e-o-plano-de-vacinacao-contra-a-covid-19-do-governo-federal/?fbclid=IwAR3w7s7YyruWFeG3j_iIgilLtbGtHOFlImASx_HNSyAxkHs4Z92b9H3q-EQ . Acesso 18 Dez 2020.

 



Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.

É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.

É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.

Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.

Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens:

Charge: pela internet.

Versos Ácidos feita pelo autor.

 

Escrito na manhã de 14 de julho partindo de uma conversa por watzap. Trabalhado entre os dias 21 e 25 de outubro; e encerrado entre os dias 23 e 27 de dezembro. Tudo em 2020.

domingo, 20 de dezembro de 2020

FELIZ MEYRY CHRISTINA E PRÓSPERO ANGU NOVO

  

Se alguém for falar mal de mim, não o faça pelas costas. Chame a mim, pois sei coisas terríveis sobre mim que a maioria nem imaginaria.

Diz Benito Bardo Junior. É importante separar as coisas. Rubem escreve o cronto, mas quem vive e conta a história é Benito.

Assim, meu primeiro celular foi por despeito. Quem eu queria incorrespondidamente tinha e por não o ter comprei um. Isso na primeira metade da primeira década do milênio.

 

Meu corpo está enfermo desde 2018. O que me faz exalar cheiros não agradáveis. Nada insuportável ou demasiado intenso, mas existentes. Perceptível para quem fica a meio metro de mim.

Na sala dos professores, sempre de modo velado, vejo as disfarçadas torcidas de nariz; ouço os risinhos discretos quando me afasto e vez ou outra pego o meio de alguma conversa na sala ao lado. E não, eles não sabem e continuarão ignorando que sei. E a prova disso é: Rubem Leite é pouco lido. Amargo demais; excessivamente ácido; ferrenho crítico do cristianismo e da Bíblia.

Algo que Benito e eu achamos engraçado é: Nos dias de aniversário de algum funcionário da escola, dia dos pais, das mães, Páscoa etc. chovem:

Parabéns! Muitas felicidades e longos anos de vida! Que Deus te abençoe! Jesus te ama! Feliz Páscoa! Feliz Dia dos Pais, das Mães, da Mulher! Feliz Natal e Próspero Ano Novo! Etc.

Mas por que achamos engraçado? Lendo o cronto entenderá.

Por não gostar dessas convenções civilizadas, aviso à diretoria para não comunicarem meu natalício a ninguém. Irritar-me-ia! – Gostou de mesóclise? Não sou Temer, graças a Deus. Por isso nada tem a temer. – Eu ficaria irritado ao ser felicitado por quem me detrata.

 

Devido a pandemia a rede municipal da cidade onde leciono seguiu dois modelos criado pela ONU (ERE e ERI)¹ para ensino em casos de catástrofes, guerras, pandemias... E elaborou como metodologia nove blocos de atividades. Cada professore cria seus blocos e a escola os envia para o setor pedagógico da Secretaria Municipal de Educação. Se for aprovado a Secretaria os devolverá para serem repassados aos alunes. Todos os blocos possuem breves explicações, exemplos e cem questões que foram disponibilizados um a um desde metade de março até dezoito de dezembro. Ao mesmo tempo a escola onde trabalho criou para cada turma um grupo de watzap para retirada de dúvidas e explicações. Em paralelo, de acordo com sua personalidade, cada professor elaborou sua metodologia de ensino para ser utilizado como orientações extras.

 

- Professores! – A vice-diretora nos chama no grupo de watzap criado para todos os funcionários do turno matutino. – De amanhã até sexta-feira vocês terão que vir a escola mostrar seus diários as pedagogas. Cada um irá pegar um papelzinho com o nome de um colega para fazermos um amigo oculto. A revelação e troca de presentes será na Reunião de Conselho que teremos em janeiro.

Benito e eu rimos bastante, mas ele aceitou, claro. Fazer o quê?...

Por outro lado:

Numa segunda-feira um pai escandalizado entrou no grupo de watzap e disse:

- Essas perguntas têm conteúdo ideológico e malicioso. Estou indignado. Independente de qual partido você “torce” não coloque em nossos filhos. Enviei essas perguntas às pessoas competentes para puni-lo. A escola é para ensinar; é pra falar a verdade.

Vejamos a charge para responder as questões referidas pelo indignado: 


Agora vejamos as perguntas:

Questão 09: Quando o presidente desobriga a vacinação ele está beneficiando o povo ou o covid-19? Por quê? Questão 10: Sendo você um estudante sabe bastantes coisas. De acordo com o que aprendeu, responda as questões abaixo: a) Os gestos corporais e as expressões faciais dos vírus indicam o quê? b) E a expressão facial do presidente, o que indica? c) Qual é o verbo que está conjugado na fala do presidente? d) Quantos verbos no infinitivo têm na fala do presidente? Quais são eles? e) Da fala do presidente há quatro palavras que não são verbo, escreva-as.

E o pai continua:

- Escola é lugar de ensinar. E é pra ensinar a verdade. Se você “torce” para algum partido fique só procê. Ensine a verdade, mas isso daí é partidarismo. Dá pra ver claramente que esse professor de Português se posiciona contra o governo. O aluno tem que saber português. Assim tem que ser a visão de um professor, não de um militante.

Vejamos agora a pergunta 16, pois ela se casa com as duas acima: Estudamos entrevistas em blocos anteriores. Aprendemos o que é, como fazer e como registrar as entrevistas. Se tiver dúvida pesquise no google; e se ainda continuar com dúvida, pergunte ao professor ou à professora de Português. Atenção! A entrevista será exclusivamente por watzap. Lembre-se de ser fiel ao que disse e como disse a pessoa entrevista. A pessoa entrevistada será a professora de ciências da escola. a) Pergunte à professora o nome completo e o grau de estudos dela. b) Qual é a importância da higiene? c) Por que é necessário escovar os dentes e quantas vezes por dia isso deve ser feito? d) O que acontece com quem contrai (pega) o corona? e) O que pode acontecer com quem não recebe vacina contra caxumba, poliomielite e outras?

Como o irritado falou no grupo, não em particular, transferi a pendenga para a direção escolar. Numa vídeochamada o diálogo foi assim:

- Analisando as questões nove e dez é claramente perceptível que somente duas coisas foram trabalhadas: Gramática e interpretação textual. – Diz o professor. – O texto pode ser escrito ou pode ser visual, ou seja, imagens. Foram trabalhados gramática e interpretação textual. É importante lembrar também que o bloco passou tanto pelo crivo da pedagogia escolar quanto da pedagogia municipal. Ou seja, tem o respaldo da Secretaria Municipal de Educação.

- Entendi o posicionamento do pai e respeito a posição dele.

- Também respeito a posição do pai, diretor. A questão, como ele mesmo disse, é ensinar a verdade. As questões e a charge apresentam o que estão acontecendo; sem crítica político-partidária. O que elas discutem é a verdade, os fatos através de uma análise crítica.

- A equipe pedagógica avaliou as questões?

- Sim! Foi avaliada pela Secretaria Municipal. Mas o mais importante das questões nove e dez é o estudo de verbo e a interpretação textual. Trabalhar no educando a observação facial da pessoa que está falando algo.

- Então se as questões foram elaboradas pelos três professores de Português e a equipe pedagógica avaliou como sem cunho político-partidário não há nenhum problema. Quanto ao senhor e aos demais professores oriento: não debatam nem discutam essas questões no grupo.

- Foi exatamente esse o nosso procedimento. Uma vez que o bloco passou por todos os trâmites essa esfera de discussão com o pai já não cabe a nós, mas sim ao âmbito administrativo.

- Então está tudo certo. Agiu corretamente...

- Mas o nosso posicionamento de professor é trabalhar a verdade; é promover reflexão nem contra nem a favor de qualquer governo, mas analisar a todos os governos. E não analisar apenas os governos. É para analisar a vida. Analisar o que padre ou pastor fala, o que o vizinho está dizendo e até mesmo o que nós, professores, estamos falando. É importante que haja diálogo, discussão, interpretação textual. É o que os professores de Língua Portuguesa buscam fazer. Ensinar a verdade é diferente de partidarismo, pois é apontar os fatos.

- Huuuum. É... É isso mesmo.

- Ah! Um outro ponto relevante é a questão dezesseis, pois discute a questão da vacinação, a importância da higiene, da escovação dentária, das vacinas, como se contrai o coronavírus e como proteger-se. Então, na verdade, as questões nove, dez e dezesseis discutem a saúde e a doença sobre o prisma da ciência.

- Então não há mais nada a discutir. – Pensa por alguns segundos e volta a falar. – Professor, já pegou o nome de seu amigo oculto? É importante a troca de presentes. Ah! E feliz Natal e próspero ano novo!

 

Já no grupo de watzap da turma a discussão retorna as oito da manhã: “É absurdo! Essas ideologias... Já não basta ideologia de gênero ainda têm que ficar fazendo ideologia política? Absurdo!”. Mas não ecoa nos demais pais. Não sei se por discordância ou se por comodismo. Como Guimarães Rosa “Eu quase que nada que não sei. Mas desconfio de muita coisa.” Assim, pelo que observei até hoje da sociedade, suspeito que é a segunda hipótese. A eterna espera de um messias, de um mito salvador. Esperá-lo é mais cômodo do que conquistar seus direitos.

Quase onze da noite, no meu celular aparece uma mensagem de watzap de algum desconhecido. É o pai:

- Feliz Natal! O senhor pode explicar a questão dezesseis? Eu e meu filho não estamos entendendo.

Não resisto e sorrio. Mas ninguém vê, já que estou em minha casa atendendo os dois fora do meu horário de plantão.

- A questão dezesseis é muitíssimo simples. É uma entrevista. Em alguns blocos atrás estudamos e fizemos entrevista. Esta questão é um reforço do que foi aprendido. Ou seja, o aluno questionará à professora de Ciências sobre vacinas, higiene e saúde. Fiquem atentos. As questões nove, dez e dezesseis têm uma ligação. Todas falam de saúde, mas a nove e dez priorizam gramática e interpretação textual; onde o texto pode ser escrito ou pode ser imagético mais o estudo de verbo. As três questões têm como objetivos o estudo e compreensão de saúde e doença. Então preste bastante atenção nestas três questões para que mantenham o bem-estar e o conhecimento dos fatos, da verdade.

O professor vê que visualizam a resposta, mas nada mais dizem. Então nós dois rimos apesar da vontade de chorar pela sociedade que vivemos.

Ah! E cuidado com a vacina: Vocês irão transformar-se em jacarés. Eu não. Serei um crocodilo do rio Nilo ou dos igarapés.

 

 

Ofereço como presente aos aniversariantes:

Joe Arthuso, Victor F. Matos, Wilson Filho, Ziza Saygli, Bruna A. Menezes e Deiverson Tófano.

 

Recomendo a leitura de:

“Voz dos corvos”, de António MR Martins:

http://poesia-avulsa.blogspot.com/2020/12/voz-dos-corvos.html

 

¹ O que são ERE, ERI, EaD?

O EaD – Ensino a Distância – é algo permanente, com professores preparando suas aulas que serão repassadas aos estudantes via tutor.

No ERE – Ensino Remoto Emergencial – os professores continuam trabalhando com seus respectivos alunos em uma situação de caráter emergencial e provisória como guerras, pandemias ou catástrofes naturais. Como é algo imprevisto não há como planejar previamente o ERE, pois as condições de estudos variam de acordo com a crise enfrentada. Mas, à medida que professores e alunos vão se adaptando e que se torna possível antever como agir e reagir, o ERE se converte em ERI.

Já o ERI – Ensino Remoto Intencional –, apesar de ainda continuar dentro da crise, já se torna possível à equipe pedagógica e professores planejarem de modo adequado como tornar mais eficaz os estudos para que realmente ocorra o ensino/aprendizado.

 


Rubem Leite
é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.

É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.

É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.

 Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.

 Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens:

ZÉ DA SILVA. Boa notícia pra quem?. Disponível https://www.instagram.com/p/CGla5IVHU3Z/?utm_source=ig_embed . Acesso 16 Dez 2020.

Versos Ácidos do Vale do Aço. Foto do autor.

 

Escrita iniciada na noite de 28 de julho e trabalhado entre os dias 15 e 20 de dezembro de 2020.

domingo, 13 de dezembro de 2020

HEI DE SER HEREGE E ANÁTEMA



 

No Parque Ipanema há uma toalha de mesa com bebidas, comidas e livros. Ao seu redor pessoas que os trouxeram.

Benito lê um poema seu:

Duas das palavras mais lindas:

Herege e Anátema.


Uma é a capacidade de escolher

Outra é Levar as mãos para cima

Oferendando algo a Deus.


Quem escolhe entre pedra e diamante

Entre o certo e o errado

O contestável e o duvidoso

É odiado, preso e morto.

Caluniado, difamado e injuriado.


Quem eleva as mãos aos céus

Sem autorização dos “Louva-Deus”

É odiado, preso e morto.

Caluniado, difamado e injuriado.

Este poema dá rumo para o piquenique.

- Alguém me explica o que leva um presidente Cristão a facilitar a venda de armas quando um dos mandamentos é não matarás?

- Leia a Bíblia e entenderá. Todos os Salmos são rogações de pragas: “que seus ossos apodreçam”, “que ele seja julgado por um corrupto”, “mooooorra!”. Davi era um assassino sem dó nem piedade. Deus manda uma ursa matar umas crianças porque riram da careca de um profeta. Deus manda um anjo matar todos os filhos mais velhos no Egito. Deus afoga toda humanidade. Em Atos Deus mata um casal porque não quis pagar o dízimo. Ódio é a essência do cristianismo. Ignorância é o ensinamento cristão. E matar é a sua prática. Não aceitar isso é não crer na Bíblia. Pois tudo isso e muito mais coisas ruins estão lá.

- Não seja um herege! – Nasce uma furiazinha.

- Ainda não sou de todo um herege, mas chegará o dia que distinguirei o joio do trigo, o diamante do cascalho e saberei escolher com quais ficarei.

- Você é anátema. – A furiazinha se torna criança.

- Ainda não sou de todo anátema, mas chegará o dia que elevarei com pureza minhas mãos aos céus oferecendo perfumes. Enquanto esses dia não chega, rogo: Senhor Jesus, afasta de mim tudo que me afasta de Ti. E Ele me responde: “Então joga a Bíblia fora e me dê um abraço, filho”.

- Joga fora quem manipula a Palavra.

- Palavra de quem? – A furiazinha se torna adolescente. – Se não tem medo de criticar e se tem coragem de pensar veja estes exemplos: Matança é o tema em Deuteronômio 02, 30-35. Violência contra a mulher é o ensinamento de Deuteronômio 22, 20-29. Pedofilia é o tema de Números 31, 17s. Terror é o tema de Juízes 03, 20ss. O Sacrifício humano é ensinado em Juízes 11, 29-34 e em Números 31, 25-54. Assassinato de crianças é o tema de Isaías 13, 13-18. A legitimidade da escravidão é o tema de Êxodo 21, 20s. Observe que não importa a morte do escravo, desde que seja no dia seguinte... Portadores de deficiências são rejeitados por Deus; eis o ensinamento em Levítico 21,18ss. A injustiça e rogação de pragas são os principais ensinamentos contidos nos Salmos; perfeito exemplo é o Salmo 108 (ou 109, dependendo da Bíblia). Quanto mais a pessoa ler a Bíblia mais ela se torna ignorante e carregada de ódio nas suas mais variadas formas. E preconceito é o resumo dessa ignorância e ódio.

- Isso são os cristãos deturpando o Ensinamento judeu... – Disse-me um amigo judeu que se encontrava na roda. Nesse momento a furiazinha se torna uma jovem fúria.

- As três religiões crentes no Deus Único – judaísmo, cristianismo e islamismo – são as mais violentas e terroristas do mundo. Deus é a Sabedoria que ilumina, o Amor que somente dá, a Vida vívida e vivificante. Mas nada é mais blasfemo que as afirmações que seus livros sagrados fazem de Deus. O judaísmo visa escravizar todos os povos não judeus. Veja o que disse Campos – para um instante e abre a impressão de uma monografia, procura algo e quando acha lê:

“Moisés sempre lembrava o povo hebreu de que foram escravos no Egito, ressaltando a importância de Deus, que libertou os hebreus em troca de obediência e abundância no futuro (Deuteronômio, 5: 15 e 15:15). A Torah legitima, todavia, a escravização de outros povos, mas nunca a escravização de hebreus, visto que estes são acolhidos na Bíblia como o povo escolhido por Deus para perpetuar as palavras deste na Terra, como consta em Deuteronômio. Além disso, dos filhos dos estrangeiros que se hospedam entre vós, deles comprareis, e de suas famílias que estão com vocês, que geraram em vossa terra: e eles serão vossa propriedade. E deixá-los-ei como herança para vossos filhos depois de vós, para mantê-los como propriedade; deles tereis seus escravos para sempre: mas sobre vossos irmãos, os filhos de Israel, não tereis domínio, um sobre o outro, com severidade’ (Levítico, 25:44-46).”.

- Há outras passagens do Torah proclamando a escravidão de outros povos. Mas essa basta por hoje. Minha origem é cristã católica e muito estudei a Bíblia; pratiquei e estudei o LAVE, mais conhecida como Lar da Vida Eterna. Também estudei medianamente o espiritismo e o budismo, e um pouco da Umbanda e do Candomblé. Olhando a História das Américas percebe-se que suas religiões são muitíssimos violentas. Resumindo: Tendo algum conhecimento dessas religiões só continua frequentando-as quem visa dominar no lugar de amar. Renegam o Deus Conosco, o Emanuel. Não! Não vou mais compactuar com nenhuma igreja.

A fúria agora é adulta.

- Benito, eu respeito a sua dor. Mas o que eu tenho para lhe dizer é que em Setembro de 1996 conheci o LAVE em uma tarde de sábado e duas almas maravilhosas. Uma delas era a sua mãe. Estas duas senhoras encheram o meu coração de luz e esperança e minha alegria voltou. Saí do seminário convicto de que iria estudar os ensinamentos do LAVE. E que o faria chegar ao maior número possível de pessoas. Depois de um tempo conheci a ti, grande Benito. Você e sua mãe esbanjam Luz e Sabedoria. Você foi a minha casa várias vezes, fazer orações, estudar comigo e R. De lá para cá são vinte e cinco anos de caminhada cheios de altos e baixos. Mas eu e R estamos aqui firme nos ensinamentos do LAVE. Volta para o grupo, amigo. Você é muito importante para nós.

- Agradeço pelo convite, mas não. Eu não quero retornar. E vou ser claro no porquê. O LAVE é um fábrica de coxinhas. Coxinha no sentido de quem é boçalnariano. A grosso modo mais de noventa por cento dos integrantes do LAVE são imbecis que só sabem dizer “Luladrão, petê mal, Boçalnato bonzinho” e outras idiotices mais. E não, não estou defendendo Lula ou o partido. Apenas digo que repetem sem conhecimento de causa. A verdade é: toda e qualquer religião, sem exceção, não re-li-ga a Deus; Afasta! O LAVE, no meu ponto de vista, é a que menos afasta o ser humano de Deus. Mas como toda e qualquer religião não é de Deus. Em qualquer crença todos os livros religiosos apregoa: a mulher é inferior. Sendo que todo homem é apenas cinquenta por cento homem, no sentido biológico. Até o terceiro mês de gravidez todo homem é feminino. A partir desse terceiro mês que o testosterona começa a ser produzido e começa a transformar o clitóris em pênis, os ovários em bolsa escrotal, a vagina se fecha e por isso a nossa bolsa escrotal tem uma espécie de cicatriz. Todos os grandes livros religiosos colocam a mulher como ser secundário. Sendo que ela é o primário. Em todos os âmbitos, e não só nas questões da mulher, do gênero, da sexualidade, o que as religiões fazem de seus seguidores? Que as pessoas deveriam ser intelectuais, mas só sabem dizer bobagem. Não têm base, não tem fundamento científico. Só ficam atrás de feiquenius. Não tenho paciência com quem é burro apesar de instruído.

No auge de sua força a fúria faz o grupo se levantar.

Ao mesmo tempo, da toalha de mesa sobre o chão, se escuta uma apaziguadora cantiga. As pessoas olham para baixo e veem os cantores:

Versos Ácidos do Vale do Aço, Um Grito em Cada Poema, O Ickabog, o volume I de Escravidão, Memórias do Cárcere, Grande Sertão: Veredas e outros livros.

As pessoas se sentam, comem e bebem um pouco. Voltam a falar de religião, política, sociedade, saúde, educação e arte. Mas agora sob as óticas de Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, Laurentino Gomes, Rowling, Girvany de Morais, Rubem Leite, Amanda, Didiu, Roberta, Paulo, Flávia, Kadosh, Carlos, Diego e Joe. É o intelecto conduzindo, não as crendices.

 

 

Ofereço como presente aos aniversariantes:

Marcelo Telo Assis e Guilherme Batista.

 

Campos, Diego de Souza Araujo. Escravidão e Hierarquia na Antiguidade Bíblica. Um estudo sobre a escravidão em suas relações com a hierarquia social: heranças e particularidades da instituição escravocrata. Disponível http://livros01.livrosgratis.com.br/cp059443.pdf . Acesso 13 Dez 2020.

Sobre heresia e anátema:

https://www.dicionarioetimologico.com.br/heresia/

https://origemdapalavra.com.br/palavras/anatema/



Rubem Leite
é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.

É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.

É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.

Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.

Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens feitas pelo autor.


Escrito entre os dias 28 de agosto e 13 de dezembro de 2020.

domingo, 6 de dezembro de 2020

SÓ TENTO APLICAR AS LEIS... ou

 

NÃO SOU EU QUEM COLOCA AS NORMAS E REGRAS,

SÓ TENTO EXPLICAR E ESCLARECER AS DÚVIDAS.

 

 

“Seguindo as orientações recebidas, alguns minutos depois, Madeleine achava-se em uma sala cheia de gente, onde vários grupos de advogados, revestidos de toga, conversavam animadamente.

É sempre coisa que aperta o coração ver esses grupos de homens vestidos de preto murmurando em voz baixa às portas das salas de audiência. É muito que em todas essas palavras haja um pouquinho de caridade e comiseração. O que transpiram mais comumente são condenações antecipadamente resolvidas. Todos esses grupos se mostram, ao observador que passa, como sombrias colmeias onde certos espíritos, zumbindo, constroem toda espécie de edifícios tenebrosos”.¹

 

“... as tiradas ordeiras da imprensa livre, naturalmente interessada em conservar privilégios, fontes de chantagem, e pouco disposta a esclarecimentos perigosos”.²

 

Dos mujeres cometieron infanticidio en una misma semana.

Caso uno.

La sala de juzgamiento tenía el aire oscuro, pesado, ruidoso. Y allá:

Meyry Pháttyma Háwrea da Silva, veinte años, negra, soltera. Natural de Ipatinga. Nascida en el día 13 de mayo de 2000. Residente en el barrio Game, madre de Khayo da Silva.

Meyry estudió con notas insignificantes en escuelas públicas y abandonó los estudios al terminar la primaria. Su comida siempre fuera arroz, poroto, carne casi nunca y, principalmente, biscochos, nocivos para la salud pero ricos e baratos.

Su madre, Ivoneth da Silva, ya amargada y cansada de la vida, no tenía paciencia para orientar bien a su hija, ni conocimiento para ayudarla en las tareas escolares. Salía de casa para trabajar a seis de la mañana y volvía después de once de la noche. Ni tiempo adecuado para comer o ir al baño tendría.

En 2015 Meyry no volvió a escuela. Necesitaba trabajar. Así como su madre salía a seis de la mañana y volvía después de las once de la noche. En ese tiempo era mucama en una casa, vendedora en un hipermercado y por la noche vendía drogas junto con su cuerpo.

Creció teniendo muchos padres y uno de ellos, a los doce años, fue el primer hombre que conoció. Su tercer padre es también el padre del hijo de Meyry.

Mientras embarazada empezó a oír voces y ver cosas.

Caso dos.

La sala del juzgamiento era silenciosa e con luz blanda; casi agradable; y allá:

María del Rosario Patricia Brasil de Veracruz, treinta años, blanca, rubia. Natural de Ipatinga. Nacida en el día 15 de noviembre de 1990. Residente en barrio Ciudad Noble, madre de Carlos Brasil de Veracruz, de siete años.]

Patricia estudió con notas mediana, casi altas, en la más cara escuela privada de la ciudad. Su madre contrataba todo año cinco maestros particulares. Uno para ayudarla en el piano, otro en las matemáticas, el tercero en español, el siguiente en inglés y el último en las demás asignaturas.

La chica jamás trabajo. Salió de la universidad para el matrimonio.

Patricia crecerá con uno solo padre pero con muchos tíos y uno de ellos fue el primer hombre que conoció cuando tenía catorce años. El segundo fue su marido.

Ricardo Veracruz es un ciudadano de bien. Elector del Bozalnato. Defensor de la familia tradicional. Por eso exigía casarse con una virgen para procrearen y fuesen vistos en las solemnidades. Sus placeres sexuales eran, de acuerdo con su óptica, limpios, pues la mujer si tener orgasmos, es una ofensa a los pudores femeninos. Eso significa que es tan desatento a los placeres femeninos que ni percibió que Patricia no era virgen.

A los veintiocho años Patricia pasó a oír voces e ver cosas. A los treinta…

Caso uno.

La negra Meyry fue a la prisión y solamente conoció el abogado en el día del juzgamiento. Considerada culpada hasta por su defensor. Fue condenada en menos de dos horas.

La prensa notició con morbo el caso; con requintes de detalles sórdidos reales e inventados.

Caso dos.

La rubia Patricia tuvo prisión domiciliar gracias al abogado que no encontrara ninguna resistencia del promotor ni del juez.

La prensa mal notició el caso; y, cuando lo hacía, era siempre sin detalles y de modo suave.

Caso uno.

El pueblo pide la muerte de Meyry. Y difícilmente saldrá viva de la prisión. Las iglesias no saben quién ella es.

Caso dos.

Patricia está en casa, con tobillera electrónica. Saliendo solamente para sus obras de caridad y para la iglesia, que alabanza la generosidad de Patricia. El pueblo no sabe quién es ella.

 

Fala a verdade, o dia está bonito. É porque o sol não está nem aí para o que acontece conosco. O sistema solar, a via láctea, o universo e seja o que for além disso não se importam com o ser humano. Aliás, gente, bicho e planta são a mesma coisa ao olhar do cosmo.

Em Ipatinga houve dois julgamentos numa mesma semana de 2020. 


Duas mulheres cometeram infanticídio. É comoção geral na cidade e no país. Ambas mataram os próprios filhos. As duas alegam ouvirem vozes e verem coisas.

Caso um.

A sala do julgamento tinha o clima escuro, pesado, ruidoso. E lá:

Meyry Pháttyma Háwrea da Silva, vinte anos, negra, solteira. Natural de Ipatinga. Nascida no dia 13 de maio de 2000. Residente no bairro Game, mãe de Khayo da Silva, de dois meses.

Meyry estudou com notas insignificantes em escolas públicas até completar o ensino fundamental. Sua comida era simples: arroz, feijão, de vez em quando carne de segunda, Fandango e etc. Frutas só na escola, mas raramente as comia. Verduras e legumes também na escola; se não tivesse como separar do que lhe interessava.

Sua mãe, Ivoneth da Silva, já amargada e cansada da vida, não tinha paciência para orientar a filha nem conhecimento para ajudá-la nos deveres escolares. Saía de casa bem cedo e de sete as onze trabalhava numa casa no bairro Cariru. Ao meio-dia pegava serviço no Bretas e lá ficava até as dez da noite. Horário para almoço?!? Só não rio porque é triste.

Meyry ia para a escola de manhã. Ao chegar em casa jogava a mochila na cama, trocava a camisa escolar que teria que conservar, mesmo que encardida, até o fim do ano, fazia o almoço, lavava as roupas, arrumava a casa. Não tinha motivo para fazer os deveres.

Mas em 2015 Meyry não entrou pra escola. Tinha que trabalhar e conseguiu seu primeiro emprego como vendedora no Bretas; sua jornada ia de meio dia às seis da tarde (afinal, era “de menor” e por isso “trabalhava pouco”) e depois aumentou sua “renda” vendendo Avon nas horas vagas.

E igual à mãe, trabalhava de manhã numa casa, de tarde no hipermercado e de noite na BR vendendo drogas e a si mesmo.

Cresceu com vários pais e um deles, aos doze anos, foi o primeiro homem que conheceu. Depois conheceu outros dois pais e este último era também o pai de seu filho.

Quando grávida começou a ouvir as vozes e ver coisas. 


Caso dois.

A sala do julgamento era silenciosa e com luz branda; quase agradável. E lá:

Maria do Rosário Patrícia Brasil de Veracruz, trinta anos, branca, loura. Natural de Ipatinga. Nascida no dia 15 de novembro de 1990. Residente no bairro Cidade Nobre, mãe de Carlos Brasil de Veracruz, de sete anos.

Patrícia estudou com notas medianas, quase altas, no São Francisco todo o ensino básico. Sua mãe contratava todo ano cinco professores particulares. Um para ajudá-la no piano, outro na matemática, o terceiro no português, o seguinte no inglês e o último nas demais matérias.

Em 2009 cursou contabilidade – nas federais que tentou nunca conseguira sequer a média necessária para ingressar –; então foi para uma faculdade privada. Formou-se com mediadas notas; mas nunca saberemos se as conseguira por mérito ou se para a faculdade proclamar sua “capacidade de bem ensinar seus universitários”. O importante, porém, é que Patrícia nunca exercera qualquer trabalho, pois seu casamento aconteceu três meses após sua formatura; com um engenheiro que a preferia em casa.

Sua alimentação enquanto solteira era equilibrada e depois de casada ficou mais controlada pelo nutricionista contratado pelo marido: arroz, feijão, legumes, verduras, frutas, carne branca; cem gramas de chocolate uma vez na semana e outros doces podiam ser uma colher duas vezes na semana: “Mulher tem que ser esbelta e cordata.”.

Patrícia crescera com apenas um pai e vários tios e um deles foi o primeiro homem que conheceu, aos quatorze anos de idade. O segundo homem foi o marido; casaram-se em 2013.

Ricardo Veracruz é um cidadão de bem. Eleitor do Boçalnato, do Zemagogo e do Gugudadá. Defensor da família tradicional. E por isso exigia casar-se com uma virgem para procriarem e aparecerem perante a sociedade. Seus prazeres sexuais eram, segundo sua ótica, limpos, pois a mulher ter orgasmo é um desrespeito ao pudor feminino. Isso significa que é tão desatento aos prazeres femininos que nem percebeu que Patrícia não era virgem.

Aos vinte e oito anos Patrícia começou a ouvir vozes e ver coisas. Aos trinta...

Caso um.

A preta Meyry foi presa no CERESP e lá mantida; viu o advogado pela primeira vez no julgamento e este já a considerava culpada. Mal foi ouvida e teve sua prisão garantida em menos de duas horas. O juiz e o promotor fizeram poucos esforços para condená-la assim como o advogado trabalhou pouco para defendê-la.

A imprensa noticiou escancaradamente o caso; com requintes de detalhes sórdidos reais e inventados.

Caso dois.

A loira Patrícia teve prisão domiciliar graças ao advogado contratado pelos pais. Foi ouvida, tão bem ouvida que o julgamento levou dois dias, pois, o juiz e o promotor fizeram muitos esforços para libertá-la assim como o advogado trabalhou muito para defendê-la: 


- Na entrada deste tribunal tem um busto de Vito Gaggiato onde consta a célebre máxima de Maomé: “A verdadeira riqueza do homem está no bem que ele faz ao mundo”. – Diz o Advogado que à semelhança de quase todos os profissionais do Direito não tem doutorado, mas exigem serem chamados de Doutores. – E Maria do Rosário Patrícia Brasil é uma alma caridosa, temente a Deus, atuante na RCC. Está sempre na igreja pregando o Evangelho e espalhando o amor de Cristo em seus atos de caridade. E continuou esta e outras explanações por longas horas; quase sem interferência do promotor que parecia corroborar cada palavra do advogado.

A imprensa mal noticiou o caso; e quando a fazia era sempre sem detalhes e de modo suavizado.

Caso um.

O povo pede a morte de Meyre. E dificilmente sairá viva da prisão.

As Igrejas não sabem que ela é.

Caso dois.

Patrícia está em casa, com tornozeleira. Saindo apenas para suas obras de caridade e para a igreja.

As Igrejas louvam a generosidade de Patrícia. O povo não sabe quem ela é.

 

 

Ofereço como presente aos aniversariantes:

Ronnaldo Andrade, Lizardo de Assis, Carlyle Assis, Cleiser Coura e Welington G. Silva..

 


Recomendo a leitura de:

A antologia VERSOS ÁCIDOS DO VALE DO AÇO:

 São dez os autores e um deles é este macróbio que vos fala.

 Para comprar seu exemplar pode procurar-me por:

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 Mensageiro (fb): https://www.facebook.com/rubem.leite.359/

 

 ¹ HUGO, Victor. O viajante, chegando ao seu destino, toma precauções para voltar. O caso Champmathieu. Fantine. Os Miseráveis. [Trad. Frederico Ozanan Pessoa de Barros]. São Paulo: Penguin Classics Companhias das Letras, 2017. Tomo I. P. 373.

² RAMOS, Graciliano. Parte I, cap. IX. Memórias do Cárcere. 51ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2020. P. 55.

 

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.

É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.

É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.

Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.

Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

 

Andrés Garcia é artesão e artista de rua. Concluiu o quinto semestre do curso de Licenciatura Filosofia na Colômbia e é revisor da parte em espanhol do presente cronto.

 

Imagens:

Fotos do Fórum de Ipatinga, pelo autor

Versos Ácidos, pelo autor.

 

Escrito e trabalhado entre os dias 28 de agosto e 06 de dezembro de 2020.