terça-feira, 27 de abril de 2010

PAIXÃO PELO TRABALHO

Rubem Leite

Os pais Dr. Glauber não eram pobres, mas não chegavam a ser ricos. Então ele amealhou grande parte de sua fortuna com o próprio esforço. Não havia sábado, domingo ou feriado nem Natal, Páscoa ou Dia dos Pais que Dr. Glauber chegasse depois das nove horas ou saísse antes das vinte e uma horas. Era um homem realmente trabalhador, bem sucedido, Capitalista. Porém, trabalhou pouco com sua mulher, Dna. Lilica, apenas o suficiente para ganhar dois filhos: Ricardo e Helmo. Seu objetivo de vida é lucrar e dois filhos é lucro, mais seria prejuízo.

Num belo dia, e como aprendi com Rosana Mont’Alverne, toda vez que alguém diz um belo dia é porque a coisa vai ficar preta. Pois bem, num belo dia Dr. Glauber passou muito mal e quase foi dessa para melhor. Os médicos fizerem tudo que podia e como ele “podia” pagaram os melhores e mais novos tratamentos. Inclusive um experimental com drogas, pedras e energias cósmicas. E deu certo. Após o fim do tratamento nosso setuagenário Dr. Glauber ficou três dias incompletos dormindo e quando acordou deram-lhe alta. Em casa foi recebido com uma festa que só acabou às cinco horas da manhã. Seu melhor amigo, como estava um pouco bêbado (esvaziou sozinho uma garrafa de uísque escocês de R$3.000,00), dormiu num dos quartos de hóspedes.

No dia seguinte, no desjejum (para mim, pelo horário, deveria ser almoço) Dr. Glauber começou a observar algumas coisas que antes lhe passavam despercebidas. Começou a saber o que os outros pensavam. Espantando ouviu o pensamento dos filhos, da esposa, do amigo, do empregado.

– Que merda! A praga do velho não morreu. Escapou.

A voz do sorridente Ricardo lhe assustou.

– Velho fedaputa! Já estava pensando na viagem que iria fazer no Ferrari que sonhei.

A voz do Helmo se fundia com o som “Pai, quer mais um pouco de suco”?

– Ai, que pena! Pensava que finalmente poderia gozar. Gozar a vida. Gozar tuuuudo que sempre me foi negado.

Não estava entendendo porque Lilica disse isso.

– Que foi que disse, querida?

– Nada, Glauber. Estou quietinha como você gosta.

– E eu pensando que finalmente poderia casar com a Lilica e desfrutar tudo isso que eu sempre quis sem depender da boa vontade do velho. Ah! Lilica... Sabe dá melhor que piranha de bordel chique.

Finalmente começou a perceber que ouvia a voz cerebral das pessoas.

– E eu crente que finalmente ficaria livre do velho babão. Acha que só porque moro no Nova Esperança sou vadia.

Essa talvez tenha sido a gota d’água. Dr. Glauber simplesmente se levantou, foi ao escritório e de lá saiu uma hora depois direto para o necrotério autopsiar a bala na cabeça.

Então não era bem verdade que Dr. Glauber só pensava em trabalho. Ele era apaixonado pela Cíntia.


quinta-feira, 22 de abril de 2010

O QUE TEM DE GENTE...

Borboleta pequenina

Voa de flor em flor

Levando doce amor

Ao coração da menina.


- Pode me ajudar?

- No que me for possível...

- Estou precisando traduzir para o alemão a quadra acima.

- Então tá. Lá vai:

Estraisvaisburnarbursaiscaistraisbainscãisnospãisestraise nofurdunçodocaribu

furburzussães. Qual é mesmo o segundo verso?

- Deixa pra lá. Vamos mudar de assunto. O que tem pensado atualmente?

- No que tem de gente que fala “Nos Estados Unidos não é assim”, “Na Europa é daquele modo” toda vez que se depara com algo desagradável: A fila do banco que não anda; o atendimento de algum funcionário público. Eu me espanto! Algumas vezes eu me calo por sentir que só conseguiria barraco... Mas geralmente eu pergunto se já esteve lá. Outras vezes, quando estou menos sereno, além de perguntar, convido a pessoa ir embora evadindo-se para lá. Ora! Os incomodados que se mudem... Bem! Geralmente, nunca saíram do país. Falam do que desconhecem por não terem nada a dizer.

- Concordo que muitas vezes o tempo se perde nos bancos. Muitos caixas vazios e uns poucos em atividade. Em tudo temos duas opções. No presente caso também: Gemer e chorar num vale de lágrimas. Ou aproveitar o tempo que nos foi imposto. Que tal ler um pouco! Orar! Estudar! Fazer um tricô. Sei lá. Aproveitar o tempo em algo construtivo e prazeroso.

- Afirmo que quase sempre somos ameaçados no exato momento em que pomos o pé nos estabelecimentos públicos... Há um cartaz dizendo que é crime o desacato aos funcionários; mas não dizem nunca como devem ser o comportamento deles para conosco; que eles nos devem respeito. Eu, por exemplo, atrasei em muito o pagamento do INSS e quando fui acertar uma das parcelas custou quase R$300,00. Paguei. Depois observei que ela tinha sido descontando numa rescisão contratual. Voltei para mostrar à funcionária e no fim das contas, depois de muito conversar ela enfatizou “Foda-se! Quem mandou pagar? Nós só reconhecemos o que é pago em carnê. O que é pago, sem fechar antes o carnê não chega ao sistema”. Daí pergunto, o Brasil é maldito por causa disso? NUNCA! Jamais saí do país então não posso falar como é fora daqui. Mas quem procura usar a cabeça faz críticas até quando assiste a tv. Assim, vendo filmes e lendo livros percebo que a corrupção na América do Norte é tão braba quanto é aqui. Sugiro que assistam, por exemplo, o filme O Visitante (The Visitor). Não posso falar por experiência como é fora daqui, mas posso falar da maravilha que é o Brasil. Todos os tipos de clima. Pessoas solidárias. Pessoas prestativas. Muitos empreendimentos se abrem todos os anos. Eu amo ser brasileiro. Amo morar no Brasil. Amo Minas Gerais.


terça-feira, 20 de abril de 2010

A PROCURADA

Rubem Leite – 20-4-10



Ofereço como presente de aniversário a

Otto Valgas.

Escrevo ouvindo A Felicidade (instrumental), de Tom Jobim,

Superstição, na voz de Cauby Peixoto, e a

música da Pantera Cor de Rosa.


Li em março de 2010 o livro A Procurada, que me inspirou o presente “cronto”. Importante observação é que não tento explicar nem parodiar a obra de Karin Alvtegen. É apenas uma antropofagia. E o trecho abaixo é de tradução de Monica Goldschimidt, editora Record, publicado no Brasil em 2005, páginas 205-206

– Seis anos de minha vida estão apagados. Quase não me lembro do que fiz durante esse tempo. Com quem me encontrei, onde dormi. Eu bebia o máximo que podia só pra não pensar, porque se tivesse pensado teria desistido. Se você vive um tempo nas ruas, está perdido. Não existe um caminho de volta, já que você perde a capacidade de se adaptar a uma outra vida. Você já não quer se adaptar, se encaixar. Para viver na sociedade, você tem de ser capaz de se conformar, mas você não quer mais se conformar. É um círculo vicioso.


A voz gemida lamenta aguda no banco do ponto de ônibus

- Aaaaaaiiiêêêêêêêê! Jeeesuuuuus! Estou com fome. Queeeeeeeeem me dará comida?

Nem acabara de me alojar no banco a mulher chorou as palavras acima. Eu, pegando um pouco de biscoito que tinha no bolso da mochila

- Só tenho esses biscoitos. Tome.

Pegando os biscoitos com gestos largos os deixa ao seu lado no banco

- Jeeesuuuuuuuuuuuuuuuuuuuus! Estou faminta. Ninguém me socoooooooooooooorre?

Passando pela nossa frente um rapaz que se encaminha para o hipermercado defronte à Prefeitura Municipal de Ipatinga a mulher estica seu braço e grita fazendo o virar, sem parar, o rosto para nós

- Piiieeeeeedaaaaaaade Jeeeeesuuuuuuuuuuus! Ninguém me dá nada. Quero comer. Soocoooooorroooo!

Olho para a mulher, pego os biscoitos, levanto-me e vou embora para outro ponto de ônibus. À cada passo que me aproxima do novo destino a afasta de meus ouvidos, aproxima-a de meu coração e a afasta de minha cabeça. Na 28 de Abril dois homens e um menininho. Um ao celular, o outro na porta do banco, o menininho com o pintinho de fora faz xixi andando para trás deixando uma linha tortuosa na calçada. O estranho no celular sorri, o pai ri, eu me animo e o menino nem aí. Vou para o ponto de ônibus, sento, espero, pego o ônibus.


quinta-feira, 15 de abril de 2010

COLIBRI

Rubem Leite – 14-15\4\10


- Usa! Usa! Usa! Usa!

- Uga! Usa!

- Uga! Usausa!

Discutem escondidos os três guerreiros apontando a mulher com o casal de adolescente buscando água na fonte. No ataque

- Bra! Bra!

- Afro al!

- Afro as.

- Alas asal.

Os guerreiros prendem os irmãos enquanto a mulher foge desesperada. Arrastam os acorrentados por três dias. Doze são os prisioneiros mais os quatro os guerreiros que se juntaram aos nossos conhecidos. Totalizando – entre guerreiros, escravos e oferendas – quarenta e nove.

Gargalhadas. Piadas. Zombarias. Ofensas. Tapas. Fome. Sede. Cansaço. Desesperança.

Barulho de passos e gritos de guerra chegam de repente assustando.

Trezentas e tantas cabeças armadas até os dentes com pedras e lanças chegam para salvar os dois irmãos.

Gritos. Gritos. Sangue. Sangue. Sangue. Choro. Choro. Dor. Medo. Angústia.

Voltam para casa os trezentos e tantos guerreiros levando os dois irmãos e quinze escravos e oferendas.


E ainda hoje isso se repete nas empresas, nas ongs, nas nações.

E eu? O que ainda estou fazendo aqui?

Corpo verde, azul, amarelo e vermelho, barriga amarela, cada pena do rabo é amarela, verde e vermelha. Um beija-flor. O beija-flor atravessa o pó da Via Láctea osculando cada estrela, polenizando cada orbe. Tudo num átimo no íntimo do meu olho direito. Perfazendo o mesmo na íris esquerda. Moral da estória? Sei lá. Diga-me você. Apenas viajo.


Semente lançada não encontrou o solo. Perdeu-se.

Persisto.

Semente lançada encontrou o solo. Venceu.

Flor em flor germinam em frutos.

Sementes germinam novas flores.

Vejo ao longe um jardim.


terça-feira, 13 de abril de 2010

HINO NACIONAL DO BEIJO DE JOVEM

Rubem Leite

Dia do Jovem

Dia do Hino Nacional

Dia Internacional do Beijo


- Quero um beijo.

- Um beijo?

- Aqui?

- Um beijo tipo internacional.

- Agora?

- Um desses de marcar dia. De merecer ganhar um dia no calendário popular.

- Ah!

O casal adolescente na praça 1º de Maio, no Centro de Ipatinga. Parecem se inspirar na foto de fim da 2ª Grande Guerra onde o soldado pega uma desconhecida na rua e a beija. O rapaz olha nos olhos da garota que lhe prende o olhar; com a destra pega nas costa da menina que lhe segura; trás para si aquela que o atrai. Beijam. Dezenas, centenas de pessoas passam pelos dois. Alguns olham com interesse, outros com inveja, e mais um tanto com indiferença. Beijam.

- Me conta. – Fala a garota se inspirando no conto O Primeiro Beijo, de Clarice Lispector que lera pela manhã. – Você já beijou alguém antes de mim?

- Ah! – Intejeita o rapaz diante da pergunta que mulher pede sem querer a verdade. Complicando a vida dos dois... – Eu...

- Sim ou não. – Insiste manhosa ou maldosa.

- Já! Por amor à Pátria...

- ???

- Ela era muito feia. Então coloquei a bandeira na cara dela e beijei por amor à Pátria. – Diz rindo. Vendo a cara da namorada completa depressa – Mas você não. Beijo você como se entoasse o Hino Nacional.

- Está dizendo que sou feia?

- Não! Não é isso.

- O que então?

- Eu te respeito. Te amo. Você é minha “amada, idolatrada, salve salve”.

Um minuto pensando em silêncio e

- Então tá. Mas chega de falar e vamos trabalhar. – Diz silenciando o namorado com um beijo que não acaba.


segunda-feira, 12 de abril de 2010

REMOENDO

Rubem Leite – 11-12\4\10

Escrevo ouvindo “Boa Noite, Amor”, na voz de Jair Rodrigues

e, principalmente, “La Cigarra”, na voz de Renato Teixeira

e ainda “O Estrangeiro”, na voz de Caetano Veloso.


Remoendo! Remoendo as antipatias em meu coração estou aqui na mata com meu pai, de quem gosto muito, mas não entendo que idéia foi essa minha de vir pescar. Não tenho paciência com a inatividade e ficar remoendo os sujeitos. Passar um fim de semana inteiro no mato. Idéia jeríctica. Ele aguando as minhocas, alimentando os peixes e eu ter que fazer o mesmo. Melhor ler um pouco. E foi o que fiz. Tolerei a manhã, mas desde o início da tarde tive que ler o livro que, graças a Deus, cismei em trazer e seguir minha intuição. Na verdade, dois – Alivio da Alma, de Bruno Grossi, e Vulgo Grace, escrito por Margaret Atwood e traduzida por Geni Hirata –. Será verdade a idéia do Bruno de que “A dor das palavras é o alívio da alma”? Outra coisa para remoer, mas dessa vez vale a pena, acho.

Com esses pensamentos dei uma cochilada. Fim de tarde acordei.

- Pai, vou dar uma volta.

- Hum!

Com ele olhando para o rio afasto para o meio da mata. Um ventinho suave no rosto. Muito verde as árvores, muito marrom o chão e um pouco de cores variadas nas folhagens e flores. Um vento agradável. Passarinhos cantando. Sabiá, curió (acho), bem-te-vi (com certeza), araponga (quanto tempo não ouço um. Pena não conseguir vê-lo). Com um vento encontrei um pequeno descampado com os últimos raios de sol do dia. Fui ler mais um pouco. “Chovia e uma enorme multidão aglomerava-se na lama, alguns curiosos vindo de muito longe. Se minha própria pena de morte não tivesse sido comutada no último instante, teriam me visto ser enforcada com o mesmo prazer insaciável. Havia muitas mulheres e senhoras da sociedade lá; todas queriam ver, queriam respirar a morte como se fosse um fino perfume. Quando li sobre isso, pensei: se for uma lição para mim, o que se supõe que devo aprender com isso?(Vulgo Grace, pág. 39). Com a leitura de mais algumas páginas cochilei remoendo o trecho acima acordando com a companhia da noite. Um vento frio. Olhei chateado para o céu e só vi algumas estrelas e nada da lua. Se bem que ela pouco ajudaria já que lua minguante. Não se chora pelo leite derramado então foi melhor voltar no escuro mesmo. Bem que sou obediente e andei pela mata com uma lanterna e algo para comer como sempre insiste meu pai. “Deixa eu ver... Fiz questão de sentar de frente do lugar que vim... Então é para lá que vou”. Retornei a andar com o vento um pouco mais forte. Dez minutos. Vinte minutos. Meia hora. Uma hora. O tempo aumentando, o medo crescendo, o vento parecendo de tempestade. Uma névoa... Não! Muito pequena para ser névoa. É gás. O vento cada vez mais forte não dispersou o gás que tinha, reparei, uma forma... Uns dois metros de altura, uns cinquenta ou sessenta centímetros no seu meio, seu alto quase tem um separação... como se fosse uma quase esfera pequena acima da parte ovalada... No ar, indo de uns dez a cinqüenta centímetros, subindo, descendo, o gás. Uma parte à sua esquerda se destaca sem se desprender erguendo como se fosse um braço. O corpo gasoso, sim, só pode ser um corpo, e vivo, deslizou pelos vários metros que nos separava. Percebi uma forma levemente humana e quanto mais se aproximava, mais sólida parecia se tornar. Um corpo de homem. Sessenta por cento água. Trinta por cento gás. Dez por cento sólido. De onde será que tirei isso? Parou com os pés no chão tão próximo de mim que se erguesse outra vez seu braço me tocaria. O medo que me silenciou começou a se esvair abrindo a minha boca e ele me disse

- Não se assuste. Está perdido?

Respondo para uma coisa dessa? Você responderia?

- Não se assuste. Posso te ajudar a encontrar o caminho para onde quer ir.

- Muito obrigado! Mas não precisa se incomodar.

- Não é incômodo. Vem! Vem!

Não saio do lugar então ele vem até mim. Dou um passo para trás. Ele não para.

- Não precisa ter medo. O caminho é por aqui.

Fala passando por mim. A luz da lanterna quase não o pegando mais sigo-o.

- Meu nome é Guino. O seu?

Guino é bem mais alto que eu. E adulto. Branco, cabelos pretos. Rosto comprido. Calça preta, camisa branca. Não é feio. A única coisa que assusta é um gás se solidificar...

- Ah! Meu nome é Breno.

Enquanto andamos Guino não parou de falar sobre a noite, a floresta, livros (acho que viu o que estava comigo), mulheres, animais. Comida. Não sei porque resolvi olhar para ele através do meu espelho que peguei no meu farnel. Na mesma hora ele se virou pela primeira vez para me olhar e se vê. Seus olhos se avermelham de ódio, seu rosto estava horrível, suas mãos... duas garras e seus dentes enormes. No espelho, sob sua forma transparente ele me abraça. Beija meu pescoço. Meu pênis erige-se enquanto meu corpo amolece. Foi a melhor coisa do mundo. É a melhor coisa do mundo.

- Não sei quanto tempo isso me aconteceu. Foi mais ou menos aqui, onde estamos, que passei a morar com Guino. E agora convido você a morar conosco. Fazer amor conosco. Vem! Vem!


sábado, 10 de abril de 2010

REVELAÇÃO DIVINA DO SER AMORFO E ONIFORME

Eu vi, não por causa da matéria, mas da vida; não por causa da carne, mas do espírito. São poucos os que compreendem isso. Aquele que, com a mente sujeita à mudança das condições materiais, aumenta a fé quando os bens materiais aumentam e perde a fé quando eles diminuem, ou louva a Deus quando o corpo se torna saudável e descrê dEle quando alguém da família adoece, está acreditando na matéria e não em Deus. A matéria é algo que acaba se alterando; portanto, a fé embasada em graças materiais se desmorona conforme as alterações da matéria. Se Deus cura doenças, é porque visa a despertar o homem para a Verdade de que o “corpo” é projeção da mente. O “corpo” que digo ser projeção da mente, não se refere unicamente ao corpo carnal. Também o corpo astral e o corpo espiritual são projeções da mente. Quando digo que “a morte não existe”, não estou falando do corpo carnal, pois as células corporais estão morrendo e sendo substituídas a cada instante. É imortal unicamente a Vida, a qual mantém vivo o corpo. Unicamente a Vida constitui a Mim ou a ti, e fora dela não existimos nem Eu nem tu. A esta Vida chamam de Deus. Eu não tenho forma definida, sou completo e absolutamente livre. Sendo amorfo e livre, posso assumir imagem de uma divindade, de um anjo ou de um querubim. Todas essas imagens são expedientes de salvação e não são falsidades. Quem se prende a uma imagem e pensa que somente essa é a Minha imagem, não conhece a Minha natureza verdadeira, não conhece a Minha totalidade. Deves compreender a Verdade. És filho de Deus, portanto igual a Mim. Teu corpo carnal é uma das manifestações tuas e não a tua totalidade.


(Revelação Divina de 10 de abril de 1932).


sexta-feira, 9 de abril de 2010

SOL E LUA

Escrevo na manhã de 09 de maio de 2010

ouvindo “Inveja”, na voz de Cauby Peixoto

e músicas místicas de Reiki e Numerologia.


Ofereço aos aniversariantes:

Carlos Passos, Mª Arlete Santos, Fabrício Borges, Rubem G.W. Leite, Luiz Magalhães


É uma manhã de Páscoa, não o primeiro domingo, mas uma sexta-feira na choupana de um amigo morador de Antônio Dias.

Cara! Juro que não entendo. Se eu fosse o prefeito do lugar investiria muito em turismo. O nome da cidade é uma homenagem ao seu fundador, o mesmo homem que fundou Ouro Preto. Tem um casarão que pertenceu a um membro “menor” da Família Imperial, mas ainda da família, se é que me entende... E mais importante, investir em ecoturismo: tem cachoeiras, matas belíssimas e outras possibilidades.

Aliás, é às margens de uma de suas cachoeiras cercada por uma mata lindíssima que estou hospedado. Levantei antes do Sol, que quando acordou bocejou preguiçoso. Levantei antes do Rei e fui para a prainha realizar uma prática contemplativa chamada Meditação Shinsokan. Assim que Sua Majestade despontou iniciei a prece. E só então fui preparar o café: café, leite, pão integral e frutas do lugar. Voltei para a praia e ouvindo a música da cachoeira comecei a ler. Será que não é o canto das águas que as pessoas dizem ser o canto da Iara? Lendo, escrevendo, cochilando ora à sombra, ora ao sol passei a manhã. Preparei meu almoço: feijão, arroz, legumes crus e, do local, queijo, goiabada cascão (claro) e frutas.

Volto a praia, debaixo de um ipê amarelo e dormi, li, escrevi, li, escrevi, li, dormi. Acordei com os últimos raios de sol e com o sorriso da lua

Acordo com o pio de uma coruja olhando para mim ao quase fim do dia, ao quase início da noite. E quando abri os olhos ela fez assim com a cabeça (Sabe como é, né: balançou-a sem mexer o pescoço). Bonita corujinha marrom com manchas brancas nas asas e pretas na cabeça e nas costas. Levantei devagar para não assustá-la. Mas não se mostrou necessário tal cuidado, pois a menina não estava nem um pouco preocupada. Cumprimentei-a e fui para casa levando o livro e o caderno que usei. Seu olhar me seguiu até adentrar na choupana, que é pequena e confortável. De pedra e madeira. Fácil de limpar, graças a Deus. Varanda ampla, sala-cozinha, um quarto e o banheiro fora, com teto de vidro para ver as estrelas... Bem, foi assim que Percival, meu amigo dono da casa, me falou.

Na choupana preparo um jantar frugal para mim. Creio que você já sacou que estou sozinho, né. Perdi um grande amigo por culpa minha, estou sem namorar faz um tempinho e estava querendo desencontrar com gente. Exceto a mim. Pão, queijo minas, vinho tinto seco, frutas. Acendo umas velas e vou bem agasalhado para a varanda. Ponho tudo numa mesinha, sento na cadeira de balanço e vou namorar Iaci Acauã, a Lua Cheia. A coruja ainda está olhando para mim quando abriu as asas vou para cima e desceu crescendo até virar uma jovem vestida de marrom com os mais lindos cabelos negros que se possa imaginar indo até o meio das costas e um xale branco ou algo assim cobrindo os ombros e braços. Ela se encaminha até mim, procurando olhar nos meus olhos. Seus olhos! Era noite e seus olhos refletem Iaci como Iaci reflete o Sol. Que olhar lindo! Parou diante da escada de três degraus para a varanda.

Sou Benito Bardo Junior, artista da palavra e das cenas. Sou Benito Bardo e conheço muitos seres míticos: Caiçuara, o Curupira, Ikunataí, a Iara. Mas ainda não conhecia Matinta Perê ou Matinta Pereira. Sou Benito, não me assusto.

- Entre!

- Você não está com medo?

- Seja bem vinda!

- Ainda ontem, a léguas daqui, no Ipaneminha, em Ipatinga, visitei um homem e ele rezou o Credo, o Pai-Nosso, a Ave-Maria e me chamou de amaldiçoada por simplesmente ouvir suas preces sem me assustar. Parecia pensar que eu desconhecia Deus.

Sorrio!

- Você é Matinta Perê?

- Você é Benito? Já ouvi os Curupiras e Caiporas falarem de você.

Sorrindo aceno com a cabeça e ela continua

- Sou um ser Matinta Perê. Sou Amana Acauã, de nome.

- Nome indígena? Você não me parece índia.

- Sou índia euro-africana. Sou brasileira.

- Mas entre. Sente-se e coma comigo.

Ela entrou, sentou, comemos. Peguei suas mãos entre as minhas e ficamos nos olhando nos olhos. Vi um fogo que me abrasou. Entramos. Deitamos. A noite foi avançando ela foi se envelhecendo acarinhando-me cada vez melhor. A manhã foi aproximando ela foi se remoçando renovando minhas forças.

Antes do Sol nascer preparamos um café: café, leite, queijo, pão, mel e frutas. Alimentados fomos para a praia. Enquanto assentava e assumia posição de prece ela, coruja, alçou vôo para os braços de Iaci Acauã que se ia. Diante do Astro-Rei contemplei a Imagem Verdadeira adorando Deus em mim, venerando-O em tudo e em todos.


A propósito, já que contei uma estória sobre um ser sobrenatural, recomendo a leitura do livro “Histórias mal-assombradas em volta do fogão de lenha”, de Adriano Messias. Editora Biruta. Que me foi emprestado pela grande poeta e cronista Nena de Castro. A obra é muito interessante. É contada tendo como protagonista um adolescente. Se quiser falar pessoalmente com o autor, esteja à vontade: adrianojornalista@yahoo.com.br