domingo, 12 de março de 2023

COLETA SELETIVA DO PODER DE DEUS¹

DEIXE SEU LIXO RECICLÁVEL AQUI



Acocorado numa parede, mãos no rosto, cabeça entre os joelhos.

A névoa se assemelha a muita fumaça de cigarro 🚬. 

Em 21 de fevereiro de 2023, no Mato Grosso, Edgar e Ezequias perderam muito dinheiro num jogo de sinuca. Ao ouvirem as zombarias dos vencedores saíram. E voltaram pouco depois. Armados mataram sete pessoas, inclusive uma menina de doze anos.

A munição cortava a névoa, perfurando corpos, móveis e, ao meu redor, a parede.

Gritos e outros barulhos retiravam o ar de meus  pulmões.

Acocorado num monumento, mãos no rosto, cabeça entre os joelhos.

Em 08 de janeiro de 2023 a escuridão no cérebro das multidões me agasalhava numa coberta gelada.

O ignorante ódio perfura a escuridão humana a destruírem objetos históricos, monumentos, edifícios, Constituição. É tudo um dejeto. Os risos e outros barulhos encobrem a coberta gelada a perfurar-me como se fosse uma dama de ferro.

Acocorado à parede dos fundos do plenário da Câmara dos Deputados Federais, mãos no rosto cabeça entre os joelho.

Oito de março de 2023, deputado Nikolas, coloca uma peruca loira, diz se chamar agora de deputada Nicole e está se sentindo mulher para "ter poder de fala" e ataca mulheres trans e toda comunidade LGBTQI+.

As palavras desse e outros acinzentam o ar como nuvens de vespas e maribondos.

O ataque a qualquer ser humano me agride por ser eu humano.

_ O comediante Chros Rock disse assistir o filme "Emancipation" para ver o personagem de Will Smith sendo chigoteado.

_ Ser humano é ser câncer.

_ Em alguns países já legalizaram a eutanásia...

_ Se seu objetivo é o sarcasmo ou agredir-me não surtiu efeito.

_ Não fui agressivo nem sarcástico. Apenas quis dizer para você escolher melhor as palavras

_ Ah tá. Obrigado. Com licença mais adiante tem pessoas com quero conversar. Adeus.

Mais adiante um grupo de professores e me uno ao ajuntamento perguntando:

_ Vocês sabem o que são ofensas aos professores?

_ Não é Mc Pipokinha. - Responde a Doutora em Educação Andréa Serpa. - O que nos ofende é nossa sociedade - e seus representantes legais - consumir, valorizar e aplaudir lixo que se autoproclama artistas, enquanto chama professores e professoras de “vagabundos, despreparados, comunistas, doutrinadores, pedófilos…”. É pagar 5 mil para um professor e oferecer 5% de reajuste! Atrasar os salários e não pagar os aposentados! São as escolas insalubres, sem ar, sem infraestrutura mínima e digna! Não ter plano de carreira nem segurança! Muitos não terem hora de planejamento. Somos ofendidas de muitas e perversas maneiras todos os dias. Pelo governo, pelas coordenadorias, pelas famílias, por certas direções, pelos alunos e suas famílias. MC Pipokinha, não chega nem perto das graves e cotidianas ofensas que a Docência enfrenta. Nem perto.

_ É por isso que não tenho trabalho humano. Tenho trabalho escravo. Vou para a escola como se fosse ao pelourinho e volto tão esgotado que só quero silêncio e dormir. Não quero comer, não quero ler. Só "apagar-me".

Afasto-me do grupo pensando no que escutei.

Sento-me no chão diante de um grande arranjo de flores plantadas num buraco do cimento. Longe das pessoas para não ter ninguém para me ouvir falo com elas.

_ Eu me preocupo com o outro. Mas os outros não se preocupam comigo. Choro? Não. Não muito. Já sei que se faço algo por mim ou por outrem é porque sinto ser certo. E igualmente sei que nada devo esperar dos outros. Sou bom? Nem um pouco, pois erro muito. A questão é se esforçar em fazer o certo.

As plantas me dizem:

_ Quem falou não sabemos. Mas serve para qualquer gente: "Em meu túmulo estarão gravadas várias datas. É que me vi morrer diversas vezes nesta vida".

_ Combina com o que venho dizendo. Esperar algo de alguém é tolice. Não digo que todos vão nos deixar sozinhos. Digo que serão tão raras as vezes que alguém aparecerá que nem se deve esperar. Faço o que acho correto sabendo que Tiradentes foi abandonado, Jesus foi abandonado e quantos outros também. E eu que sou ninguém não hei de ter companhia, apoio. Só neste mês já fui abandonado pelos que pedi socorro. "A morte é uma dura verdade". Pedi o testemunho sobre mim a vinte colegas. Metade diz não querer se envolver. Três estão "indecisos". O restante não me respondeu. Não me surpreendi porque a tradição é: Ser apoiado? Sim! Apoiar? Não! "A vida é apenas uma linda mentira".

 
Acocorado debaixo do chuveiro, mãos no rosto, cabeça entre os joelhos. Quase um conforto.
Um ano de assédio moral da direção escolar se converte em uma ação punitiva da administração pública como se fosse uma chuva de projéteis. E o envelope pardo contendo o aviso me agarra cobrindo-me. Não consigo respirar debaixo do chuveiro e minha pele pinica pelo assédio projetado.

Na minha cama eu me sento com as pernas dobradas, pés na parte de trás dos joelhos. Mãos nos ouvidos 👂 e a testa apoiada no colchão.

Meus cachorros gritam por causa dos gritos dos vizinhos. Exu, em nome de Olorum, como pode a vizinha da frente chamar a filha de buceta desgraçada? De tempos em tempos grito implorando silêncio. Mas soam apenas a ruídos somados.

Minha cabeça fica cada vez mais pesada; minha garganta, irritada; gana de ficar, desgastada.

Acocorado no meu jardim não me apoio em nada. Mãos no rosto, cabeça entre os joelhos. Umas vezes vejo as flores, em outras olho as plantas e bebo um gole de vinho, ou de gim ou talvez de saquê.

O Ipsemg me cobra os documentos que um mês antes afirmou não precisar. Vou até lá e só depois de passado o prazo diz que meu irmão tem direito a pensão e para exigi-lo necessita-se documentos lentos de conseguir e sem os retroativos porque "passei do prazo de solicitação".

Agora só quero quatro coisas para garantir o pouco que posso deixar aos meus:

Terminar o empréstimo para compra de minha casa. Passá-la para determinadas pessoas. A pensão de meu irmão. Minha parte da pecúlio do ipsemg para minha irmã construir sua casa em Santa Cruz ES.

Só assim poderei ter meu descanso final.

Mas enquanto isso fico com os dizeres de Frei Betto:

_____

Rubem Leite.
Texto e fotos.
Fala do Frei Betto:
Tirada do Caralivro.
¹ Título tirado de uma placa no bairro Macuco Timóteo.
Sofrido desde janeiro e até muito, muito antes. Escrito entre 04 e 12 de março de 2023.

segunda-feira, 6 de março de 2023

EMPREENDEDORISMO

ou ACESSO AO SUCESSO É PARA TODOS OU SERIA SE HOUVESSE POLÍTICA SOCIAL PARA TODOS?


Edson, quando funcionário da antiga Acesita (indústria de aço nobre na cidade de Timóteo MG), associou-se ao sindicato. Isso causou atrito com a fábrica que o convidou a pedir demissão. Passou por muitos perrengues; penou-de muito. Mas conseguiu uma micro empresa que presta serviços inclusive a empresa onde foi pressionado a demitir-se.
Joana fazia entregas de comida em uma moto. Após baixa renda, muito esforço e um acidente vendeu a casa onde morava, alugou outra que lhe servia de residência e local de trabalho. Atravessou penúrias, mas conseguiu se firmar no ramo.
Rosalva tinha um marido sem emprego fixo que lhe permitia levar arroz e feijão pra casa. Para conseguir alimentar bem os filhos a mãe utilizou um cômodo da casa para costurar para fora. Após alguns anos muito difíceis ela conseguiu firmar-se e manter a casa.
Outra Rosalva perdeu o marido quando este tinha quarenta anos e para sobreviver fazia doces. Poucos foram seus clientes, mas pondo os filhos para venderem o que ela produzia conseguiu mérito.
Os nomes foram trocados, mas a realidade do resumo de suas histórias de vida estão conforme disseram.
Cada uma dessas pessoas merece todo o respeito por suas conquistas ao enfrentar nossa política social.

McClelland [...] realizou algumas pesquisas
no intuito de descobrir porque
algumas pessoas eram bem-sucedidas
em seus empreendimentos,
independente de seu país de origem,
da cultura, da situação política e econômica
local e do momento em que estavam vivendo.¹

_ boa tarde, senhor Paul King. O senhor é chinês. Pode apresentar o seu empreendedorismo de sucesso?
_ Bonjour! Quando vim prro Brrasil meu nomê era Pon Ping. Abri um restaurrante de comidas orientais. Mas je non conseguia clientes. Creio que les comidês exotiques do Oriente, por serem de etnia e culturrá muito estranhas sofriô prreconceito. - Ele dá um sorriso oriental. - Bien que vi mercadô parra comida frrancesá. Personnes que comem até lesma... E lesma frrancesá é mais chique que lesma do Oriente.
Para um instante pensando nos preços pagos para ter negócio bem-falado no Brasil. E conclui sua história:
_ Mudei meu nomê parra Paul King, coloquei placa: Restaurant  Français Exotique (restorran francê exotique). O prratô mais pedidô é, em chinês, zhūròu. Mas digo que é "carnê de porquê". Chamou tanto a atención de les brasilerôs que hoje es un succès.

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Rubem Leite: texto e imagem.
¹ ALMEIDA, Cacilda Maria. Cultura Empreendedora no Ensino Fundamental. Cita MCCLELLAND, David. Belo Horizonte: SEBRAE/MG, 2013. P. 60.
Escrito nos dias 04 a 06 de março de 2023.ñ

domingo, 26 de fevereiro de 2023

SER LIVRE OU ESTAR MORTO

Manhã de domingo. Abro a porta e a janela.

Admiro o céu num belo tom cinza, antes dele tem uma mata a cobrir um morro. Na frente um amontoado de casas, mais perto de mim a pequena mata, na minha frente barrancos e escombros produzidos através das chuvas de janeiro de 2023.

 

Pelo buraco no meu escombro vejo que as chuvas não são culpadas. O desastre não veio pelas chuvas, mas através delas. Não por elas.

A natureza nunca é culpada. Não é boa nem má. Ela é só... forças agindo, sempre a modificar-se. Qualquer mal provocado por meio da natureza é a realização das pessoas de bem.

Depois de colocar um pouco de leite num café bem forte e amargo o saboreio lendo uma ou duas páginas de alguns livros.

A manhã está bonita. Escolho alguns companheiros para irem comigo à pracinha com maquinários para exercícios. Na avenida Pinheiros, próximo a rotatória que separa Limoeiro de Recanto Verde. Sento na grama e retorno a conversar com minhas companhias¹: Limite Branco, Outra Educação é Possível, Rumores da Cidade e Dracul.

Dois de meus estudantes me veem e vêm até mim. Caio e André.

Caio é magro, pele clara café com leite, cabelos pretos cacheados, olhos brilhantes, de voz baixa, mas agradável e audível.

André é também magro, os braços mais escuros pelo sol do que o resto do corpo. Seus dentes naturalmente alinhados dão ao rapaz agradáveis sorrisos.

São bonitos, cada qual com suas características.

Depois de um tempo André muda o assunto para conversa séria. A política municipal. A próxima eleição será a sua primeira vez.

_ "Ter tirado meu título de eleitor me fez começar a pensar sobre meu poder de votar naquele que representa melhor o que eu acredito".

_ O que o senhor pensa disso, professor?

Penso um pouco sobre o que disse André e respondo a Caio:

_ Existe esse poder? O que acredito é real? O eleito fará o que deve, pensando primeiro no bem de toda população? Votar em quem se crer é poder?

Óbvio que me olham sem compreender. Por que fiz mais perguntas no lugar de simples responder?

_ Saíram dos bairros Limoeiro e Recanto Verde e foram aos bairros mais importantes de Timóteo? - Fazem que sim com a cabeça. - Aqueles bairros igualmente padeceram com as chuvas. Repararam? - Outra vez respondem com o movimento da cabeça. - Mas para problemas iguais reações desiguais.

Talvez um minuto a pensarmos; Caio comenta e André completa:

_ Para o lado de lá máquinas e operários. Mas neste lado...

_ Apareceu e desapareceu a Defesa Civil. E mais nada.

_ Noam Chomsky, já falei dele na turma. Chomsky diz no livro "Quem Manda no Mundo?" que mesmo nos países que se denominam democráticos, e até acreditam nisso... - não passa de ilusão a crença "o poder emana do povo".

_ Mas o senhor é professor. Deve nos ensinar o que pensar.

Um fala, o outro assente e eu continuo o raciocínio:

_ Lancei perguntas pra você e pro Caio analisarem, pesquisarem, filosofarem. Não dei respostas, André. Porque o importante é cada qual pensar por si. Não para pensarem como eu. Não para pensarem o que mandam pensar nas religiões, nas escolas, na sociedade. Mas para vocês olharem ao redor, questionar o que lhe dizem, lerem ainda mais do que leem, discutirem com argumentos e, que Deus-Olorum-Alá atenda meu desejo, que voces ajam com cérebro, coração e coragem onde viverem. E nunca parem de repensarem e agirem pro e no coletivo porque é lá, no coletivo, que estamos todos. Querendo ou não...

Já cansado de gente, mesmo daqueles que gosto, pego meus livros e me despeço.

_ Professor, o senhor pode me emprestar o livro Limite Branco? Gostei do autor e eu termos o mesmo nome.

_ Já eu me interessei pelo Dracul. Parece ser algo de terror, de Drácula.

_ Não, não emprestarei, mas na próxima segunda-feira, sem ser amanhã, darei um exemplar de presente para vocês.

_ Legal! - Os dois dizem contentes, e eu sorrio.

Atravesso a rua e observo os jovens caminhando, falando ou talvez conversando. André e Caio ainda não perceberam, mas se querem e quando souberem... Sei o que suas famílias farão.

Os pais de Caio dirão: "coisas do demônio" e o chafurdará na igreja. O André será levado a psiquiatras ou "clínicas de recuperação".

Mais alguns anos depois poderão ser o que são; ou então vão se esconder e quando não aguentarem mais fingir hão de apodrecer-se e em seguida voltarão a atuar como os personagens obrigados a interpretar.

Cansado, retorno ao meu escombro. Revejo no celular as fotos dos amanheceres da semana que ontem terminou e me fixo em uma.

Vejo e repenso: Amo o meu cantinho. Se tem um lugar bom para ser misantropo é aqui. É bonito demais da conta.

No livro Dracul, de um parente colateral de Bram Stoker, a menina Matilda repete o que aprendera na Igreja: como e o porquê deve-se escolher manter o sofrer no lugar de morrer.

Encho a metade de um cálice de vinho para beber ao fazer o almoço. Enquanto cozinho o arroz bem condimentado chamo por watzap o meu filho na Argentina. Sem atendimento chamo a mãe do garotão. Após umas falas educadamente insossas pergunto o que realmente quero saber.

_ Ele não está aqui. Está viajando e não quer conversar comigo nem com os irmãos e principalmente com você. Un padre que conoció por un año. Solamente dos veces de seis meses.

_ Não me culpe. Você só me disse que eu era pai quatro anos atrás. E eu quis muito me aproximar.

_ El pibe quiere silencio y quedarse solo por largo rato. Estoy ansiosa. Mas ele quer apenas silêncio e solidão.

Um pouco mais de conversa amena e nos despedimos. E falo para os cachorros e gatos:

_ Espero que onde meu filho esteja seja um lugar para gostar da misantropia e não um lugar de amargura.

_ Mas você não está num lugar amargo? Escombros!

Ouço o comentário de quem me lê e respondo:

_ Não. Dos escombros vou reerguendo um novo cantinho de sossego e beleza.

A comida está pronta.

_ Com licença, pessoas. Mas agora vou comer e voltar a amada soledade. Até a próxima.

Fecho a porta e pela janela me encanto com o jardim enquanto como.


_____

Rubem Leite: Cronto e fotos.


¹ Livros citados e alguns participam do cronto:

ABREU, Caio Fernando de. Limite Branco. São Paulo: Companhia das Letras, 2022.

ROCHA, Lucas. Rumores da Cidade. Rio de Janeiro: Globo Alt, 2022. P. 26 e 27, 34 e 35.

STOKER, Drake. Dracul: a origem de um monstro. [Trad. Marcia Blasques]. São Paulo: Planeta, 2018. P. 20.

TOLENTINO, Luana. Outra Educação é Possível: feminismo, antirracismo e inclusão em sala de aula. Belo Horizonte: Mazza, 2018.


Escrito entre 23 e 26 de fevereiro de 2023.

domingo, 19 de fevereiro de 2023

MORAL DA HISTÓRIA: ZEJUS NÃO É JESUS

Zejus se acerca da goiabeira:

Sai daí que vai cair.

Jesus nos Ianomâmis

É o fim da ladeira:

Sai daí se não vou cair.

Era uma vez num reino muito, muito distante. Tão distante que o tempo demora a chegar e a voltar.

Debaixo de uma goiabeira vivia uma linda sapinha que queria ser gente.

Numa bela manhã ela conheceu um sapo mexicano do Deserto de Sonora. Bufo Alvarius era assim que se chamava a paixonite de nossa linda sapinha.

A heroína de nossa história deu um beijinho no Bufo, achou interessante, deu uma lambidinha. Mas o que ela não sabia era que Bufo Alvarius era na verdade da cabeça louca dela um bruxo. E ele deu no pé porque ninguém merece uma sapa louca.

E o que aconteceu?

A linda sapinha passou a ver coisas esquisofrên... digo ver coisas esquisitas.

Primeiro ela viu Hitler, Mussolini e aprendeu muitos ensinamentos.

Em seguida viu Zejus no alto da goiabeira e gritou: "sai daí, minínu. Se não ocê vai cair".

A aparição, digo: a alucinação comovida com a preocupação da linda sapinha disse com voz alta, mas baixa, perto, mas distante, sonora, mas silenciosa; pois só acontecia na cabeça dela.

_ Se você ler sete vezes tudo que Olavo de Carvalho escreveu você se transformará em gente.

E a linda sapa louca acreditou no Zejus. Leu sete vezes os livros e adivinha o que aconteceu?

Ela se transformou numa feia menina e passou a se chamar Doidamales. Cresceu, virou pastora, ministra do desgoverno Boçalnato e disse:

_ Pastor moçambicano quis fazer o jejum de Jesus e morre de anemia e insuficiência dos órgãos digestivo. Só não é santo porque se é queimadinho veio lááá de baixo.

_ Queria eu fazer piada do que você disse, Doidamales. E também do referido pastor. Mas são tão ridículas a sua fala assim como essa morte que minha piada ficaria mais fraquinha que a saúde e sanidade de vocês dois.

_ Benito, esse também não é motivo de piada. Não? - Cráudia Diézus entra na conversa. - Só falta debochar das carpinhas da Micheque.

_ Cráudia, se puder entender o que direi ficarei agradecido. Minha piada não seria a morte em si. Nunca a perda de alguém é engraçada. Meu humor seria sobre a vaidade, a arrogância, a estupidez humana em se ver melhor ou superior aos outros. Ele quis seguir o exemplo do Profeta, do Filósofo Jesus no amor, na solidariedade, na sabedoria? Não! Ele quis mostrar-se uma espécie de super-herói. Mas o corpo não suporta tanto tempo sem água. Não há dignidade na causa de sua morte; foi apenas ridícula.

Benito suspira e continua:

_ Toda morte humana me dói. Em algumas exalo essa dor com poemas. Em outras, com humor. Pois humor é uma das mais perfeitas formas de denunciar os horrores. Mas esse pastor não há como denunciar horror. Sua morte só foi vaidosa e tola.

Como a Cráudia Diézus teceu duas loucuras, Benito da uma pausa antes de ser mordaz:

_ A Micheque Boçalnato esvaziou o laguinho, conhecido por espelho d'água, do Palácio da Alvorada para tirar as moedas e doar a uma casa de caridade dirigida pelo Pastor Capeta. E disse, com a çabiduria do Isprítu Çântu: "É normal peixe morrer quando é tirado d'água".


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Rubem Leite: texto.

Imagens tiradas do Caralivro.

Escrito entre 30 de janeiro e 19 de fevereiro de 2023.

domingo, 12 de fevereiro de 2023

SONS

Sonoridades - sons e barulhos - é o que te ofereço para conversarmos.


A chuva da realidade cai no morro da pretensão e este desliza soterrando o raciocínio.

Morre-se de medo ou satisfação?

Conversando sobre o genocídio Yanomami.

Apresentamos fatos e argumentos diverdos.

O interlocutor simplesmente repete (mudando palavras) o mesmo e único "inargurmento".

É fobia de ver que errou ou prazer em ser ruim?


Sonoridades é o que te ofereço.

Trinta e dois dias no futuro, escrevo num ponto de ônibus em frente ao Depósito Lamacon (Limoeiro Timóteo) onde costumo comprar com meu genro materiais de construção. Parece propaganda, mas é só satisfação e bom atendimento. Sou professor e escritor, não agente de propaganda.

No ponto, esperava a hora de conhecer a nova escola, no bairro Macuco. A E.M. Clarindo Carlos Miranda, onde trabalharei duas manhãs 🌄 e meia. Lá verei bom atendimento dos funcionários e estudantes.

Até agora nada falei de conflito. Será que não mesmo?

As fortes chuvas - tidas como rés, mas o crime é humano - derrubaram o muro de arrimo, barranco e partes do piso e da casa onde moro. Mas não porei fotos 📷 porque não faltaram em outros crontos meus.

Disse casa onde moro, mas o certo seria toca onde hiberno.

Antes dessa madrugada de 08 de janeiro de 2023, as fortes chuvas não me soavam mal; até ninavam meus sonos. Agora as escuto, assusto e volto a dormir.

Na noite após os trinta e dois dias da queda acordei com os barulhos da chuva e de coisas pesadas caindo. Mas se eu tiver que ir, irei. Faça eu o que faça. Como a uma ex-aluna:

Adolescente foge da cidade

para não desaparecer pela

morte por um traficante.

Na cidade onde se escondeu

a morte a encontrou

num desabamento por chuva.

Em casa 🏠, o sol ainda a decidir se abre ou não os olhos. Sem esperá-lo, levanto, faço um café solitário.

Solidão é silêncio, sossego, serenidade.

Da varanda-área de serviço vejo na calçada um homem elegante, cabelos, olhos, roupas pretas e bem alto me olha.

Com a indecisão do sol, se brilha ou chove, e vendo-o úmido:

_ Entre!

_ Obrigado! Amei o convite.

_ Aaaai! O que você está fazendo?

_ Estou a chupar seu sangue. Uarrarrá.

Semidesperto sonhei que iria reencontrar a velha diretoria, onde passarei duas manhãs e meia. Mas no momento não serei "gentilmente atacado"; vou para o Macuco lecionar a outra metade das manhãs.

Mais acordado, na varanda-área de serviço o chão de cimento grosso cinza tem caído um grande filtro dos sonhos, sombrinha e panelas.

Os sonoros da madrugada foram os gatos, não a chuva à derrubar os objetos.

Enfim ver o começo do ano letivo: Enquanto espero o transporte escuto os sons do meu discreto riso ao lembrar a saída de casa, o restinho de chuva nas árvores 🌳, os bem-te-vis; e no ponto de ônibus o som que me deu esse cronto: o batuque da água na calha.

Até então tranquilo momento. Mas aí vem crescente: pedestres, ciclistas, motos, carros, caminhões...

E o que tenho para enfrentá-los ou simplesmente proteger-me? Os pássaros, o vento nas árvores, meus pensamentos e o livro:

Silêncio

Ouço-o mudo ou sinfônico.


Não há nada

Junto ao medo, o desespero;

Só há sossego depois da Histrionia.

Mudo.


Há natureza,

Os bons sons da casa

Uma boa melodia no vizinho

Frequente serenidade

Sinfonia.


_____

Rubem Leite: textos e fotos.

Dos manuscritos de 24/01/23 ao trabalhado em 12/02/23.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

MINHAS PENAS, MEUS PRAZERES. JÁ NÃO OS NECESSITO.


Cantava baixinho uma versão em português de Non, je ne regrette rien e alguém lhe segura o braço. Não se espanta com o inesperado. Só ouve.
_ Você pode jogar fora tudo que te dei, mas o que te fiz você não desfará.
_ Nada joguei fora. Pode pegá-los. O que é de outros deixo no quartinho de despejo. Lembra onde fica? Não sei bem onde estão, mas devem estar empoeirados. Marque o dia e minha empregada te devolverá.
_ Mas o que te fiz você não esquecerá.
_ O que me fez tá passado, empoeirado. Só não sei onde está. Se perdeu enegrecido.
_ Tãão nobre.
Dá de ombros, pede licença e se vai. O jardim está lindo a seus olhos. Pensa "não sou alegre nem triste. Só irmão das coisas fugidias"¹ e cantarola quase afinado, mas sem irritar Edith Piaf:
"Não, nada de nada. Nem o bem que me fizeram. Nem o mal, tudo isso me dá igual"

_____
Rubem Leite: cronto e fotos.
¹ Motivo, de Cecília Meireles.
Escrito entre 05 e 06 de fevereiro de 2023.

domingo, 29 de janeiro de 2023

ESQUERDA E DIREITA

"SE EM NOME DE CRISTO ELES DESTROEM. EM NOME DE CRISTO A GENTE CONSTRÓI"*.

Esquerda:

_ Dilson Cunha escreveu e vou ler para vocês:

PIETÁ. A semelhança entre o Cristo Morto, de Holbein, e o índio Yanomami não é mera coincidência. Ambos estão despidos de suas humanidades bem como de suas divindades. Ambos trazem no semblante a dor do abandono. Ambos, cadavéricos e rígidos, estão carregados de sofrimento e putrefação. Ambos, insepultos. / Diante do Cristo Morto de Holbein, Dostoiévski, estático por cerca de quinze minutos, emudeceu e teve sintomas de epilepsia sem ser epilético. Como ficar indiferente? Como ignorá-lo? / Diante do índio moribundo estamos nós, e não há como fugirmos dele, fingirmos que não o vimos. / Vimos! E em carne e osso. Pouca carne, muito osso. Carregado de muitas e indizíveis dores. / Ah, sim, ouso parafrasear o profeta Isaías: '(…) não tinha beleza nem formosura e, olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o desejássemos. Era desprezado, e o mais rejeitado entre os homens, homem de dores, e experimentado nos trabalhos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum.' / Aí você me dirá: é sobre Cristo que Isaías está falando. / Daí eu lhe direi: sim, eu também. Porque quem não viu Jesus nesse Yanomami não o verá em nenhum outro lugar.”


Direita:

_ Ainda não há, nem nunca haverá, quem se pareça com o Messias. ELE É O ÚNICO, O SALVADOR, QUE MORREU NA CRUZ POR NÓS.


Esquerda:

_ Lembre-se do que Jesus falou no capítulo 25, versículo 40 de Mateus. Mas antes falarei do versículo 35 do mesmo capítulo: "tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber".


Direita:

_ O Messias é inigualável. O que isso tem a ver com O Inigualável?


Esquerda:

_ Vamos agora ao versículo 40 do capítulo 25 de Mateus: "Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes". Não se esqueça que falar de Jesus é pouco. Amar como Ele amou é muito mais importante. O Ungido não necessita ser bem-falado porque Ele é o Todo de Tudo. Não precisa nada de ninguém. Entretanto, solidariedade aos demais é fazer bem a Jesus, nossa Imagem Verdadeira. Sim, somos Imagem e semelhança d'Ele.


Direita:

_ Entendo muito bem o que Mateus quer dizer aí, mas o Messias proíbe imagens parecidas com Ele, por isso não entendo o que o índio tem a ver com a comparação com o Messias.


Esquerda:

_ A comparação com Jesus foi massacrarem toda uma população porque não viam naquele povo ser humano. Quem é capaz de genocídio é anticristo. - Uma pausa para olhar nos olhos e pensar no que dizer. - A ministra dos direitos humanos nos quatro anos de governo do Boçalnato era Pastora, sabia o que estava acontecendo e ficava falando em Jesus. É importante frisar: A pastora e ministra Damares sempre viu o que faziam com o povo Yanomami e os deixou morrer. Sempre em nome de Jesus.


Direita:

Ignora o que ouviu e acrescenta:

_ Posso ajudar os outros, mas daí comparar, fazer semelhança com qualquer homem ou imagem é proibida, minha salvação não é por obra. Jai..., digo Messias vai me salvar se for da vontade dele, pela graça. Porque eu não mereço. Mas quando aceito Messias em meu coração, Ele muda minha vida, a transforma, e acima de tudo meu coração se torna sensível ao meu próximo e a partir daí eu obedeço o que diz Mateus no verso 40 do capítulo 25.


Esquerda:

_ Boa colocação a sua: Sensibilidade ao próximo! Mas suas ações e palavras, não apenas agora, mas no cotidiano têm sensibilidade? - Outra pausa para olhar bem fundo nos olhos. - Mas "nem todos que dizem Senhor, Senhor entrará no Reino dos Céus", como é proclamado em Mateus, capítulo 07 e versículo 21. Boçalnato ficava o tempo todo falando em Jesus, os ministros dele diziam ininterruptamente "Jesus", todos ligados ao 'EleNão' eram grandes religiosos, "terrivelmente evangélicos". Mas eram/são como o demônio que usam o Nome do Senhor para enganar os tolos.


Direita:

_ Ajudo o próximo que precisa, mas não é pelo trabalho que vou agradar ao Messias.


Esquerda:

_ Existem duas passagens bíblicas que parecem se contradizer. Uma fala que basta crer para ser salvo. E outra a proclamar "fé sem obras é mortas".

Os cristãos que foram a África, que vieram a América acreditavam em Deus e em nome de Jesus exterminaram, escravizaram, torturaram e fizeram tudo mais de ruim que puderam fazer. Sempre pela fé no Santíssimo. Direita, pensa mesmo que basta acreditar em Deus e falar em Jesus que suas obras estão/estarão de acordo com O Ungido? O que mais vemos é o previsto por Jesus "muitos, mas muitos mesmo virão em meu nome sem terem ligação comigo".


Direita:

_ Onde está isso?


Esquerda:

_ A senhora não sabe? Está nos versículos 23 e 24 do capítulo 24 de Mateus. E Tiago, nos seus dois primeiros capítulos, fala da importância de agir e não apenas dizer o nome de Deus, de Jesus, do Espírito Santo.


A Direita olha irritada, mas nada diz. E a Esquerda continua:

_ Ao chegar em casa cheque Tiago, capítulo 02, versículos 14 a 26. Mas no momento foquemos no trecho 18: "Poderão até dizer: 'Tu tens a fé, mas eu tenho as obras. Mostra-me então a tua fé sem as obras. Porque eu dou-te a prova da minha fé através das minhas boas obras!'."


Direita:

_ Repito que entendo muito bem o que Mateus disse no principal verso discutido e não aceito que nenhuma imagem e homem algum pode ser comparado ao Santíssimo.


Esquerda:

_ Aquele índio não era sequer uma imagem. Era uma pessoa em extrema desnutrição por causa da política de Boçalnato. Infelizmente o tratamento médico recebido pelo novo governo chegou tarde porque só agora assumiu a presidência e aquela pessoa morreu hoje. - As palavras da Esquerda parecem pérolas... e ainda assim continua: Boçalnato e sua equipe são de direita, cristã e demoníaca. Quer dizer que toda a direita é anticristo? NÃO. Mas foi da direita que surgiram o Nazismo, o Fascismo, o bolsonarismo. Lula é de esquerda e cristão. Mas não impõem suas crenças políticas e religiosas a ninguém. Todos podem protestar. Mas protestar não é destruir artes, rasgar a Constituição, agredir fisicamente pessoas e animais, colocar bombas no aeroporto no dia do Natal. E outras coisas horríveis. Nos dois governos anteriores do Lula ele mais todos os ministros gastaram aproximadamente 50 milhões de reais e tudo exposto publicamente. Nestes quatros anos do governo Boçalnato ele sozinho gastou 75 milhões e impôs sigilo para que ninguém soubesse. Mas o sigilo foi derrubado pelos juízes nesse novo governo e foi assim que ficamos sabendo quanto ele mais a família dele gastaram e com o que desperdiçaram: nove mil reais de pão 🍞 por dia, brinquedos eróticos e outras cousas igualmente ruins.


A Direita quer falar, mas só conseguem balbuciar incoerências. Então a Esquerda retorna a palavra:

_ Quinhentas crianças ianomâmis morreram por desnutrição. Isso é genocídio da direita boçalnariana. E o Coisa Ruim tem a cara de pau de dizer que não se passa fome no Brasil e que os números apresentados são invenções mentirosas do governo eleito. Interessantemente triste é que Roraima, onde vive o povo ianomâmi, é o único estado onde não tem sequer um único representante da esquerda. Seja no Legislativo municipal, estadual ou federal nem representante da esquerda no Executivo municipal ou estadual. Pense na relação entre a tentativa quase "bem sucedida" de extermínio de uma população e na linha de governo do estado. Pense!


Direita:

_ E o que quientas crianças mortas tem a ver com o Messias? Quer dizer: MESSIAS NÃO SE COMPARA COM NADA, NEM NINGUÉM. Volto a comentar sobre o seu dizer "a comparação com Messias foi massacrarem toda uma população": APESAR DE TUDO, MESSIAS NÃO SE COMPARÁ A NINGUÉM. - Depois do grito volta a falar do presidente. - Não sei se Lula é cristão, a verdade é que não vejo isso refletindo; político que vai preso por roubar não reflete Cristo.


A Esquerda pensa: estava demorando o "E o Lula hem?". Mas diz, sentindo "lançar pérolas aos porcos:

_ Está comprovado juridicamente que a prisão de Lula foi para ele não concorrer à presidência. Não há uma única prova sequer contra Lula. Esse fato é reconhecido nacional e internacionalmente. Nem ele nem Dilma cometeram atos de corrupção ou criminosos. Está juridicamente comprovado tanto no Brasil como em outras nações. Países europeus, Canadá, Estados Unidos, Vaticano e outros reconhecem a inocência do Lula. Por favor, pelo amor que a senhora tem pelo Brasil pesquise sobre isso quando tiver tempo.


Direita:

_ Volto a argumentar qual a ligação entre a morte dos selvagens e o Inigualável Messias? Nada nem ninguém se compara a Ele.


Esquerda:

_ A referência a Jesus não vou discutir mais. Mas ali eu disse que o ex-presidente, a ex-ministra dos direitos humanos e outros cometeram genocídio. Contudo esses genocidas são cristãos. Atenção! O cristianismo não é mal. Contudo, muitos cristãos usam a religião para o mal. Não é Cristo nem o cristianismo que são ruins. E muitos cristãos são realmente de Jesus. No Brasil, por exemplo, entre vivos e mortos: Pe. Júlio Lancelotte, dom Evaristo Arms, Chico Xavier, pastora Lusmarina Campos e muitos outros. Mas há os perversos e a esses não citarei, pois não merecem reconhecimento.


Direita:

_ Então não vou fazer você mudar de ideia nem de religião, nem você a mim. Então comigo não vai poder falar de política a não ser da política suja dos que nos governam.


Esquerda:

_ Não entendi. A senhora quer que falemos só de sujeira daqueles que não gostamos mesmo que seja mentira? Se há provas da inocência de quem não gostamos não importa? É melhor continuar com ódio e desconhecimento? E se há provas de culpa de quem gostamos devemos ficar calados para não mudarmos nossos conceitos? Por favor, explica-me porque não entendi.


E nenhuma explicação é dada pela Direita. Será que ela existe? Sem ter o que argumentar dá um soco e sai correndo.


Esquerda:

Vai pra casa, pega uns livros, lê um pouco. E chora! Não pela agressão. Seu choro de hoje é pelos ianomâmis; e suas lágrimas escorrem com a tinta da caneta.


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Cronto de Rubem Leite.

IMPORTANTE: leiam o texto de Glaussim a discutir os estragos causados não pelas chuvas, mas pelo capitalismo:

https://www.recantodasletras.com.br/poesias-de-desilusao/7704149

* Lusmarina Campos.

Imagens retiradas do Facebook, sem autores definidos.

Escrito entre 18 e 29 de janeiro de 2023.