quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

SER OU NÃO SER

12-23\02\09


Já são dez horas e a lua cheia está simplesmente linda. Foi difícil esperar tanto pela lua cheia. Visto uma roupa de algodão bem confortável e o mais confortável calçado fechado que tenho. Afinal tenho que andar muito por entre o bosque. “Deixa ver: lanterna, lanche, água. Acho que não preciso de mais nada, pois o lugar não é perigoso. É só uma floresta...”.

“Vou de moto ou de bicicleta? Acho que vou de bicicleta. Não tenho pressa mesmo”. Pedalo por uns quarenta minutos até chegar à mata e a prendo numa árvore. Caminho por mais uns quarenta minutos e “Que é isso? Ah! São elas de novo”.
- Boa noite, meninas! Estamos aqui de novo...
- Boa noite, Benito. Veio ver quem você procurava mesmo sem saber que existia?
- Sim!
Ireni continua a examinar as plantas e colher algumas.
- Qual é seu nome, menina?
Ela olha nos meus olhos e dessa vez seus olhos se mantêm em silêncio. Ambas se afastam. E desaparecem na névoa que as envolveu depois de um sorriso para mim. Continuo meu trajeto seguindo o já conhecido caminho.

A rocha. Pouco maior que eu. Uns dois metros e meio de altura talvez. Seu topo deve ter uns trinta centímetros, meio arredondado. Depois um afinamento leve e mais embaixo, uns oitenta centímetros. Curioso. Mais ou menos na metade de sua altura, em seu canto direito há um buraco que não tinha percebido na outra vez e a rocha não é muito grossa ali, na borda externa do buraco. Em compensação seu meio deve ter uns cinqueta ou sessenta centímetros de largura. Afina mais um pouco até sua base.
Encosto-me na rocha esperando.

Meia noite. Estou ansioso.
Quem eu procurava sem saber que queria encontrar.

O som de seu andar. Depois seus imensos olhos negros me olham com a calma de sempre. “Como ele deve ser sábio!”. Levanto-me com um sorriso meio bobo, acho. Um centauro deve causar uma reação assim nas pessoas. Seu corpo equino malhado e seu peito humano branco se mostram inteiramente. Seus cabelos negros e brilhantes como noite salpicada de estrelas balançam ao vento.

- Benito!
Estende-me sua mão como aprendera que deveria fazer para cumprimentar um humano.
Nada falo. Sua presença me impõe um silêncio.
- Tudo bem?
- Sim. Apenas estava pensando se você viria. Se não era loucura minha.
- Loucura sua?
- É... Ainda acho estranho saber que vocês existem...
Seu primeiro sorriso.
- Entendo. Também pensei se realmente poderia confiar num humano.
- “Você existe”. Decido. Convenço-me.
- Confio em você.
- Vamos andar?
- Onde você quer ir?
- Não sei. Não conheço a floresta como ela está agora... Não natural como se mostra em quase todos os seus momentos.

“Andamos devagar. Quero dizer. Devagar para ele”.

“Falei bastante. Escutei mais. Falamos sobre as estrelas. Sobre a fauna, flora, minerais. Sobre Ireni e a menina. Sobre a rocha. Ele ensinando e eu aprendendo”.

- Quem é você?
- Como assim, Régio? Sou humano...
- Não é isso. Como você é?
- O que você é? Sei que é um centauro. Mas você é de carne e osso? É da Terra? É ser mágico, como os do Sítio do Pica-Pau Amarelo? O que... o que é você?

Um silêncio de ambas as partes.
É interessante. Muito. Saber o que ele é. Mas será importante? De verdade?
- Não preciso saber quem é você, Benito. É um humano inteligente, agradável e, acredito, confiável. E gostaria de saber mais sobre você. Mas não preciso saber quem é você.
E eu? Eu preciso saber o que é ele? Minha parte humana insiste que sim. Exige que sim. Sou racional. Afinal, o homem é um animal racional. Mas preciso mesmo?

Conversamos muito. Pensamos mais. E a presença do outro é o que tinha de melhor. Quero o centauro para mim. Meu centauro de estimação. “Não! Como posso pensar isso? Ele é ... É... O que ele é? Gente não é. Ele é um ser vivo, inteligente, consciente. Digno de todo o meu respeito e afeição”.

- O que está pensando? Ficou diferente o seu silêncio.
- Nada de mais importante que a nossa amizade.
- Tenho que partir, Benito. Não demora e o dia vai nascer. Você pode voltar hoje à noite?
- Sim. Nada me impediria. Na rocha?
- Sim. E lembre-se: venha sempre só.

Régio se afasta. Olha para mim e uma névoa surge e o envolve parecendo levá-lo consigo. Seu olhar é a última coisa que percebo.

DOIS CONVITES

Olá amigos, Duas coisas, ou melhor, dois convites.
Um da Flux Cia. de Dança e o outro Wenderson Godoy.
Ei-los:

A Flux Cia. de Dança convida você para acompanhar a apresentação de TRANS/FORM/AÇÃO - "Para Quem? Ah sim, um Bilhete". O trabalho será apresentado a partir das 21h, no Café Teatro Bar, no Espaço Cultural Casa Laboratório, situado na Av. Brasil, 640, Iguaçu em Ipatinga/MG, tel.: (31) 3821-6805. Na oportunidade teremos ainda show com músicos regionais.

Aguardamos você!


"Experimentemos um bilhete escrito para o “outro” e vejamos até onde somos capazes de
nos entrelaçar pelo corpo/verbo, depois observemos ainda a transformação"!

Produção:

Carlos Passos - (31) 8892-0784
Cleuciane Ferreira - (31) 8861-6321
Jackeline Xavier - (31) 8875-4508



Oi, td jóia?

E aí como andam as coisas por aí?
Passei aqui para convidar para o lançamento do catálogo da exposição do Grupo de Pesquisa em Arte Contemporânea, que acontece dia 07 de março às 19h na sala multimídia da galeria do centro cultural USIMINAS, lembrando ainda, que a exposição acontece até dia 15 de março, quem ainda não viu ainda dá tempo.
Os artistas que expõem são: Wenderson Godoy, Janaina Chavier, Jucélia Maris, Tiago Carvalho e Kenia Camargo.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

REBELDE SEM CAUSA

Olho para um lado, quase por cima do ombro direito e na minha cabeça:
Um dia após o Natal. Cansado de estar deitado e lendo saio por aí. Perto de minha casa tem uma mata e em três anos ou mais nunca me aventurei por ela. O que será que encontrarei? Um casal ou duas pessoas fazendo o que eu gostaria de estar fazendo? Um cadáver recém largado lá por algum traficante?

Mas eu, Benito, sou um rebelde sem causa, não um suicida.
Rita Lee diz que “o mundo é tão... chatinho”.
E acho que ela está certa.
Não gosto de estar aqui, onde a vida se resume em perder ou vencer.
Para os vencedores, tudo.
Para quem perde, só a pequenês.

Eu sou um rebelde sem causa, não um suicida.
Rita Lee diz que “o mundo é tão... chatinho”.
E acho que ela está certa.
Não gosto de estar aqui, onde a vida se resume em perder ou vencer.
Para os vencedores, tudo.
É uma delícia o sabor da vitória. Eu sei.
Do solitário na quadra da escola fiz o melhor lançamento de vôlei.
Todos me olharam... parabenizaram...
Tenho também três brigas. Gritos de incentivo ao sangue. Perdi uma. Ganhei uma e a outra não sei.
Quando vejo uma vitória ou, dependendo do ponto de vista, derrota e o mundo se rejubilando com o vencedor em volta do perdedor só com sua dor... Não consigo achar graça.

Eu sou um rebelde sem causa, não um suicida.
Rita Lee diz que “o mundo é tão... chatinho”.
E acho que ela está certa.
Não gosto de estar aqui, onde a vida se resume em perder ou vencer.
Para quem perde, só a pequenês.
É um horror o sabor da derrota. Eu sei.
Quando penso nas minhas derrotas. Quanta vergonha.
Um treinamento. A técnica: escolher um para todos irem contra. Fui chamado, fui tratado “vampiro de energia”. Rirri. Mantive-me forte. Sóbrio na solidão. Coração machucado. Olhar firme.
Quando olho para quem perde. Quanta dor me vêm.
Não gosto de estar aqui.

Eu sou um rebelde sem causa, não um suicida.
Rita Lee diz que “o mundo é tão... chatinho”.
E acho que ela está certa.
Não gosto de estar aqui, onde a vida se resume em perder ou vencer.
Para os vencedores, tudo.
Para quem perde, só a pequenês.

Sou um rebelde sem causa, não um suicida.
Hoje a vida é tão boa. Não há mais Ditadura no Brasil.
Só há o panes et futebol et carnaval.
Hoje a vida é tão bela. Não há pelo que lutar.
E por que não me sinto feliz? O que está errado? O quê?
Quero uma causa.
Não para lutar, mas para viver.
Quero um mundo onde não haja vencedores e muito menos perdedores.
Talvez aí esteja o erro. Não temos a causa:
Fazer da Terra o Mundo Ideal.

Olho para um lado, quase por cima do ombro esquerdo e na minha cabeça:
Segunda de carnaval. Cansado de estar deitado e lendo saio por aí. Já falei da mata e da aventura que tive nela. Vi uma bela mata com um cupinzeiro e algum lixo. E só.

Quero fazer da Terra o Mundo Ideal
Do Brasil seu mais lindo Jardim
E de Minas, seu coreto.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Este mês trazemos o poeta e artista mineiro de Belo Horizonte Bruno Grossi, com o conto “UM SÓ DIA”, e, a escritora e jornalista paulista de Ribeirão Preto Liana Parentes, com o conto “FOBIA”.
Os dois, cada um com seus recursos e sua maneira, identidade autoral, retratam os conflitos internos que podem se manifestar de maneira às vezes trágicas e bizarras, no vasto mundo paralelo que é o inconsciente humano. Boa leitura!

UM SÓ DIA...Por Bruno Grossi
Ao nebuloso escurecer, meus olhos serrados de cansaço se abriram lentamente em um dia escuro, frio e melancólico. A vontade de meus membros se mexerem ficava cada vez mais distante. Peguei o relógio, que fica depositado em um velho móvel, no qual de longe se vê as ranhuras impregnadas pelo tempo, ao lado de meu estábulo e me deparei com as primeiras horas do dia. Meu pensamento ambíguo e incrédulo já me atormentava. Eram 3 da manhã, do dia 15 de setembro, dia em que, há exatos dois anos, meu pai perdia a vida em meu colo. Só e triste. Um dia marcado pela exacerbação da pobre alma, insípida e calejada. Um dia marcado para nunca mais ser o mesmo.
Desde então, minha psíquica mente me tormenta. Desisti de pensar no quão difícil era evitar minhas visões e audições e resolvi me contemplar com o que tinham me destinado. E então pensei:
- “Me suicidaram”. Suicidaram-me para um mundo diferente, no qual não se morre, apenas aperfeiçoa-se a lunática mentalidade.
Assim, pus-me de pé. Arrastei-me até o lavabo. Meus olhos inchados de preocupação pareciam não mais abrir. Mas sabia que em algumas horas, podia não mais estar ali. Aproveitei então aqueles sofridos e deliciosos minutos de apreciação da vida. A vida que me consome, que me angaria, que me mantém como uma espécie em extinção. Percebi ser apenas um simples ser que pensa e reflete sobre os seus próprios insanos e lógicos pensamentos psicotraumáticos de suma importância. Declarei então em sábias palavras o meu ardor:
- Às vezes eu choro, choro por nada, choro por tudo. Pareço sentir o sofrimento do mundo, de uma criança sem estudo, de uma criança intelectual. Pareço sair do meu corpo, um corpo ativo, um corpo parado. A alma de um vivo em um corpo deitado.Até o ponto de ônibus eu caminhei, sem olhar para nenhum dos lados. Um vazio e uma loucura alimentavam meu peito. Tinha medo de o meu próprio caminhar e do sussurro ouvido a todo tempo. Um desespero que me rasgava o peito. De um certo modo, completamente perturbado.
De degrau em degrau, entrei em meu mais tortuoso inimigo. O ônibus. Um aglomerado de mentes alheias e uma malevolência da profunda energia habitada neste ardoroso ambiente. Sentei-me no primeiro e único banco perto do vidro e permaneci imóvel, olhando para frente. Para mim mesmo sussurrei o pensamento mais angustiado de toda uma vida. Peguei uma carta em meu bolso contendo as palavras de quem não mais queria viver e li em voz baixa.
“A sombra me persegue sob a névoa. Não consigo me mover. Sou incompreendido. Preso em um muro ou em meu próprio pensamento. Meus olhos já não fixam em algum lugar. Como a lua pára pra te olhar. Estes vilipendiados olhos doem, choram e imploram para que fiquem sós. Não consigo me livrar do infortúnio calar. Sinto pessoas a me olhar como um animal devora a sua insípida carniça. Creio que irão matar-me. Sinto-me desprotegido, frágil, inútil. Sinto-me sem amor, sem dor e sem desejo. Já não sei o que fazer. Procuro a solidão para que minha trágica energia não contagie as pessoas. Para que meu olhar não cruze com os demais, assim terei meus próprios sentimentos. Meu próprio coração. Que a cada despertar encontra o silêncio. Estou surdo e cego, estou inválido. Me submeto ao inoportuno desespero. Ao incômodo calar. Viver agora dói. Não mais a quero”.
Uma carta suicida? Ou apenas uma carta de quem tem sentimentos mediúnicos interferidos pelo contato espacial e psicológico do desconhecido? Eu não sei. Desci do ônibus pelas ruas do centro da cidade. Olhei para os maiores prédios e me imaginei despencando de mais ou menos 20 andares. Olhei para o lado, me deparei com uma pessoa sentada em uma pedra e reparei a árida angústia que medra em teu olhar. Os pés pareciam enfraquecidos, tuas ávidas mãos dóceis e calejadas seguravam um pedaço de pão, sujo e cheio de vermes. Mas essa pessoa precisa alimentar seus filhos. Como pensar em algo limpo e saudável? O suor escaldante e o silencioso olhar me fizeram desistir de pular do edifício. O desespero e a angústia de viver me proporcionam isso.
Segui em frente. Caminhei durante muito tempo, pensando em minha simples e dispersa trajetória de vida. A falta de estímulo e conexão com o tempo real era o princípio de minha angústia. Pensei estar no fim. Disseram que eu era anormal, estranho e sozinho. Parecia um louco autista. Andei mais um pouco e me comovi com uma triste senhora imóvel, em pé, de olhos fechados, apontados para o céu. A vi sorrindo como se não a quisesse. A sua mão estava em sua testa franzida e suada, como quem sua em um estado altamente febril. Abriu os olhos e, com um olhar insano de quem não precisa mais viver, fez-se uma lágrima descer lentamente, como um único adeus. Assim, esta triste mulher saltou na frente de um ônibus e para outra vida seguiu. Um outro plano espiritual que não mais este em que vivia.
Pensei inconformado em o que mais poderia acontecer de ruim para fazer com que não desistisse assim tão fácil de minha vida que, aparentemente, parecia normal. Rapidamente, desci a rua. Desesperado e chorando, achava que a desgraça e a morte estavam me perseguindo. Mas como correr de algo que estava buscando? Algo que eu mesmo aclamava e dizia ser o melhor para mim? Uma contradição vista de um lado obscuro. Vista de cima. Minha alma acabava de sair do corpo em movimento. Meu corpo frágil e transparente, suscetível a sentimentos malévolos e impuros. Um corpo que neste momento era de carne e osso e não de vida. Corri por entre as ruas, carros e transeuntes do centro da cidade. Parei em uma rua na qual um arco embelezava o incrível viaduto. Sem nenhuma calma e com um medo agonizante, queria morrer para fugir da morte. Tomei coragem e subi no estreito pára-peito do viaduto antigo e sujo que resistia à cidade. Um viaduto que já embelezou e consagrou aquele lugar, como um símbolo, mas que ali estava desgastado, cheio de urina e fezes, depredado pela própria população, adquirindo um aspecto incrivelmente propício para a pior maneira de terminar uma vida. Quanto mais gente chegava, mais eu subia e atingia o alto ponto do arco. Assustado, atônito e “desfacelado”, não entendia porque eu era assim tão atormentado. Olhei para baixo e vi o quanto a vida era frágil, e quantas pessoas ali paradas me viam sofrer. Quando, do outro lado, me deparei com minha alma sentada no arco, olhando com um olhar que se despedia, um olhar que eu nunca teria visto, a não ser nos últimos segundos de minha vida. Como se não quisesse, mais um passo dei em direção a rua e do alto do viaduto minha vida inteira passou na indesejável e vaga lembrança que ali me destinara até o impacto.
Ali, em minhas mãos fechadas, havia um pequeno bilhete, um bilhete ensangüentado pelo cair da vida. Algo que poderia desvendar a angústia e o desespero deste feito. Um pequeno poema. Uma tradução da vida, escrita pelo poeta Rimbaud. “A estrela chorou rosa no coração de teus ouvidos. O infinito rolou branco de tua nuca a teus rins. O mar orvalhou ruivo em teus seios tingidos. E o homem sangrou negro nos teus flancos paladins”.
** Citação do poema “A estrela chorou rosa” de Arthur Rimbaud

Sobre Bruno Grossi: "Eu sou regionalista. Gosto de retratar o que vejo e o que sinto. Não tenho nenhum estilo rotulado, nenhum movimento, pois acho que quando aderimos a um, fechamos o caminho para uma só vertente. Eu procuro transcender, concatenar o sentimento para um certo tema. Procuro mostrar exatamente o que estava sentindo na época da criação de cada obra. Quando trabalho pareço me transportar para um mundo desconhecido, de mãos cálidas e corações vis. As vezes pareço incompreender a minha própria certeza, como em um hermético sonho de cores nobres e caminhos farpos.
"Bruno Grossi é poeta e artista mineiro. Teve poemas publicados no Brasil e do Exterior. Recebeu prêmio e participou de festivais com seus trabalhos de vídeo-arte. Lançou em 2007 seu primeiro livro de poemas "O Grão Imastigável".
E-mail: brunogrossi.arte@gmail.com
(31) 8884.0913 – 2535.6642
www.aliviodaalma.blogspot.com


FOBIA
Por Liana Parentes

Cinco horas da manhã. Pontual, ela acordou, olhou para os lados e viu que estava só. Levantou-se, foi até o quarto de Lara e constatou, o só se transformara em solidão. Ninguém para conversar, ninguém para contar as vitórias e derrotas do dia anterior, ninguém para lhe fazer um chá, ou para ela oferecem um, ninguém para junto fumar... Sentou-se em uma das cadeiras da cozinha olhou as paredes brancas e começou a pensar em sua jornada até aquele dia. Olhando para trás naquele exato momento pareceu-lhe a vida uma eternidade, cada domingo parecia-lhe um século e ela simplesmente se recusava a viver mais um século na mais completa solidão. Os amigos, ou namorado, ou familiares, não aparecem do nada, ou da vastidão de uma solidão fria e inóspita estendendo as mãos. Um gesto tão salvador é preciso ser conquistado arduamente. Se magia existe, certamente não é para todos, o mortal comum precisa lutar e muito, para tornar real suas próprias expectativas, e, especialmente neste caso, uma única expectativa: a de não estar só. Telefone! Seria fácil pegar a agenda procurar alguns números ligar e acabar com o tal estar só, mas esta atitude ela não toma. Solidão..., resolver os anseios do coração não é tão simples, naquele momento estivesse Lisa em meio a uma multidão, ainda assim, estaria só. O que havia de fato ali era mais um domingo, longo... Domingo. E como todos os domingos ela toma sozinha o chá preparado por ela, senta-se no sofá da sala liga o som e ouve músicas. Geralmente trilha sonora de filmes e show de rock gravado ao vivo. Tipo de música mais requisitado por ela para a costumeira solidão. Todos os domingos o mesmo ritual, porque, seres humanos, precisam de rituais. Eles se apegam a eles, como se deles pudessem extrair uma centelha, uma luz, uma divindade protetora e repetir, é pisar no mesmo chão, pode não ser bom, mas é conhecido. Fora que ninguém ousa explicar a reincidência de certas atitudes.
- Ah! Certo, vou me apresentar e lhes contar agora como é estar à espreita, há anos, observando sozinho, privilegiado ou condenado pela condição de narrador, isso mesmo, sou o narrador:
Lisa neste momento está com o controle remoto na mão e o rosto totalmente sem expressão e cor. Percebo estar ela viva, somente pelo movimento ávido dos dedos sobre o aparelho. E assim ela permanece alguns minutos, com o controle remoto à mão. Então ouço um sussurro... - Não vou chorar, não vou repetir a mesma cena de todos os domingos, não. Porque não paro de tremer? Pretendo hoje me controlar, saberei deter impulso tão vil e degradante, esta sede... de quê? não sei, talvez de vida, ou de morte! Música. Eu ouvirei mais alto, espantarei este surto, este espasmo louco com o som. Uma música suave... Solidão, ora solidão é ilusão ao contrário, quem está só? Eu, sim, mas quem não está?, todos estamos, diz Lisa. Ouço no momento sobressair-se ao som da música um grito desesperado saído do interior de Lisa, como se este grito estivesse preso dentro dela há séculos. Jamais, fora dali, meu observatório, eu ouvira som mais triste e estranho, uma mistura de desespero, escárnio, fúria, algo tão insólito que, tal e qual, alguém jamais ouvira, é certo. Como pode tão pavoroso som sair de dentro de um corpo, o que a tortura? Ela então veste seu semblante mais aflito e taciturno, levanta-se, olha em redor desconfiada, parece sentir a existência de um observador. - Onde está você, diverte-se por acaso com minha agonia, quer saber por que me comporto assim? Quem sabe oh nefasto ser, estou condenada a viver esses momentos simplesmente para você observar? Não seria meu desespero sua melhor sessão de prazer? Mas se assim for, juro que lhe mato, um dia desses localizo seu seguro ponto de observação e sem piedade lhe mato, e você sabe que sou capaz de tal gesto, e como sabe!, ela diz. Algumas vezes ela me assusta, mas confesso não conseguir sair daqui, também eu sou um condenado. Condenado a observar sem nunca poder me aproximar, só observar. O choro, o choro muito alto a uma longa distância poderia ser ouvido, mas parece que só eu ouço esta lâmina que dilacera os ouvidos. Ela se debate grita mais alto ainda e atira um primeiro objeto contra a parede. Daí em diante o panorama é chocante, uma linda mulher transtornada, transformada em fera se debatendo, se contorcendo e quebrando todos os objetos ao seu alcance como se fosse uma tormenta a sucumbir misteriosamente aos caprichos da natureza. O mais completo estado de loucura permanece por mais de uma hora. A seguir o silêncio total e sombrio, apenas nota-se o movimento de um perfil esquálido, diáfano, fundindo-se com as vestes cor champanhe de Lisa. Ela desliza pela sala quase em ruínas até a janela e ao abri-la, ela murmura. - Amanhã Maria terá muito que fazer. Hum!... Eu?, eu quero sol, sol iluminando meu corpo. Neste exato momento a serenidade de sua expressão é imensa, jamais denunciaria o acontecido há poucos minutos. O calor aos poucos a regenera, a luz parece ser seu alimento completo. Num movimento suave Lisa se livra delicadamente de suas vestes transparentes, está neste momento linda e intocável... Intocável. Em seguida coloca um vestido preto, um par de sandálias da mesma cor, procura pela bolsa em meio aos escombros da sala, encontra-a, de dentro retira um pequeno estojo que tem dentro um batom vermelho cor de sangue, abre-o e desliza-o sobre os lábios, depois o fecha com a tampa dourada, recoloca-o no estojo, também dourado, guarda o estojo dourado dentro da bolsa e dirige-se à porta.Lisa está deixando sua casa, está feliz. - Bom dia João! Bom dia Sonia! Olá garotada, quando Lara chegar façam-me um favor, digam a ela para esperar-me assim almoçaremos juntas. - Quem é Lara? - Lisa sempre passa o mesmo recado, mas nunca vimos a tal da Lara, diz um dos garotos em voz baixa. Lisa caminha mais duas quadras e chega a uma padaria! - Bom dia Manuel! Capriche em meu café da manhã, estou muito faminta. Hoje... o dia está lindo, muito lindo, não está Manuel?, ela comenta em voz bem alta e sorrindo. - Sim dona Lisa, lindo, como todos os domingos, diz Manuel também sorrindo!

Liana é paulista de Ribeirão Preto, onde ainda vive. É formada em Jornalismo e atualmente trabalha como revisora e preparadora de textos de jornais e revistas da região(free lancer).
Desenvolve também um trabalho como web writer, ou seja, prepara textos para serem publicados na internet.
Contato: liana-parentes@hotmail.com

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

EU E VOCÊ. TIPO ASSIM...



Vá ao teatro!


"Eu e Você. Tipo Assim..." traz questões do universo dos jovens e adolescentes, com muitas músicas tocadas e cantadas pelos atores. O espetáculo é bem alegre e pra cima. Seus autores pontuam que buscaram ser bem fiéis à realidade dos jovens e adolescentes de hoje e, por incrível que pareça, constataram que o que transcende as épocas continua sendo o ópio do ser humano: o amor. O espetáculo é focado no jovem e adolescente, mas numa formatação que cativará todas as idades.


Portanto, não perca a oportunidade de prestigiar mais esse trabalho do Grupo Argumento.



Adquira seus ingressos nos postos de vendas da Campanha na Praça 1º de Maio e no quiosque da praça de alimentação do Shopping do Vale.



Ingressos antecipados a R$ 5,00. Na bilheteria do Teatro, ingressos a R$ 12,00.


Dias:


11 de fevereiro, no Teatro Zélia Olguin (Cariru), às 20h30m

14 de fevereiro, no Teatro do Centro Cultural USIMINAS, às 19 horas


Direção: Zé Mário

Elenco: Thalita Laira; Maíra Tamara; Tainara Maiara, Bruno Rodrigues, Adilson Alves, Carmen Corrêa e Talles Campos

Coreografia: Bruno Rodrigues

Produção: Grupo Argumento e Bruno Rodrigues

Presidente do Grupo: Maria Amélia

O RETIRANTE

Através da Commedia Dell’Arte, o espetáculo O RETIRANTE trará o lúdico e a alegria dos artistas mambembes a todos, com historias, músicas e muita diversão.


“O Retirante” narra a história daqueles que saem de sua terra natal em busca de sonhos e melhores condições de vida, e acabam se tornando coadjuvantes no desenvolvimento de outras regiões.
Através do trabalho lúdico, será passado aos espectadores um pouco do comportamento, dos conhecimentos e costumes do retirante, que se torna, com o passar do tempo, parte integrante do local aonde chega.
Venha se divertir e emocionar-se ao mesmo tempo.


Direção: Maurício Canguçu
Elenco: Thalita Laira; Gil Ferreira, Gilberto Lainha, Maíra Tamara; Tainara Maiara, Bruno Rodrigues e Adilson Alves.
Coreografia: Bruno Rodrigues
Produção: Gilberto Lainha

Dias 14 de fevereiro (sábado), às 21 horas; 15 de fevereiro (domingo) às 20h30m
Local: Teatro do Centro Cultural Usiminas (Shopping do Vale)

Ingressos antecipados a R$ 5,00 nos postos de venda no Shopping do Vale e na Praça 1º de Maio (Centro – Ipatinga) - Na bilheteria do Teatro, ingressos a R$ 12,00.

Revista CAMINHOS GERAIS


Encontra-se nas bancas do Vale do Aço a revista

Caminhos Gerais EDIÇÃO ESPECIAL 60 ANOS DE CORONEL FABRICIANO.


A maior pesquisa historiográfica sobre a cidade publicada em revista, com fotografias raras e inéditas.

É para comprar e guardar, está fantástica.


Mário de Carvalho Neto

MCN COMUNICAÇÃO DESIGN E EDITORA

Av. Dr. Pedro Nolasco, 480 - Centro - Coronel Fabriciano - MG

CEP. 35170 300
Fones: 31-3842 4193 - 9966 6920

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

olá, o Espaço Hibridus recebe para a primeira Menos Quinta Cult de 2009 o artista Carlos Penna. Esperamos você!


IMAGINAÇÃO

Nós! Eu e ela. Ela e ele. Eu e ele. Nós e ela. Nós e ele. Eles e eu. Dormimos. Acordamos.
“Com um casal? É minha primeira vez. Estranho. O que a igreja diz sobre isso? Não deve ser coisa boa. Não devia ter ido. Mas foi bom. Nem sei quem é melhor. Se Éder ou Diana. Será que dei conta dos dois? Pra mim foi muito bom. Que isso, Benito! Isso é pecado. Bem! Já ta feito. E quero mais. Mas não sei se devo. O que fazer?”.

E a chuva não para.
“Mas por que eu? Não que eu esteja reclamando, mas não sou bonito e nem posso ser chamado de gostosão”.
A chuva continua.
“Será que eles vão querer sair comigo outra vez? E se eles tiverem aids? Ainda bem que usamos camisinha. Mas e a aids? Será que peguei? Benito! Vocês usaram camisinha... E nem sabe se eles têm aids...”.

- Benito! Pare de enrolar e volte ao trabalho.
- Já to indo.
O dia transcorre normal. Chato.
“Nada para fazer no serviço. Nada. Já entrei e sai da internete diversas vezes e nada me interessa. 15:30 horas. Vou sair agora. Não quero nem saber”.

Em casa.
Éder e Diana. Vocês ainda estão na minha cabeça quando vejo meu cãozinho montar um bote para pegar um mosquito. Um passo. Para. Olhar fixo no mosquito. Mais um passo. Para e continuar a olhar. Dez segundos. Vinte. Trinta segundos. Anda. Para. Olhar fixo. Vinte segundos. Quarenta. Um minuto. Dá o bote. Pega.

Na sala minha mãe ver tv. Acaba a novela. Começa o jornal. Pica-pau? Não é na outra emissora? Como de repente mudou, assim sem mais nem menos?

E eu o que faço?
“Quero mais sexo, mas nem só de sexo vive o homem”.
“Sem lição de moral, Benito”.
“Que posso fazer, Benito? Prefiro satisfazer minha alma que meu corpo”.
“Gosto de mim como sou. Magérrimo, branco, cavanhaque. Mas prefiro ser artista”.
“Quero Éder e quero Diana. Quero, porém, muito mais a mim. Será que podemos ter, além do sexo, amizade? Diálogo? Diálogo interessante?”.
“Se pudermos isso e mais, será o supra sumo”.
“Mas, se não pudermos?”.
“Não trepa!”.
“Ce ta maluco? Pirou? Sem sexo? Prefiro a morte!”.
“Cuidado para não ter estafa sexual”.
“Que venha a estafa sexual. Melhor que ‘estresse virginal’.”
“Fala sério”.
“Estou falando sério. E que saber? Chega de papo furado”.
“Chega da papo furado, você”.

Toca o telefone. Atendo. Converso esquecendo do casal. Desligo o telefone e penso neles. Vou sair. Ver se encontro os dois ou se penso em outra coisa. Ou fazemos sexo ou faço outra coisa. Não vou viver de emaginação.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

TRANSCORRER DE UM DIA

Dois sabiás e três e quatro.
No asfalto são cinco sabiás
Na rua onde moro
E o Sol ainda está para se despontar.

No ar suave música em inglês
Do outro lado da parede de vidro
Imensa árvore e estacionados carros
Em mim, um grito.

Atrás do besouro verde no vidro verde
Uma árvore verde
E marrons-aço dos trens.

Onde há beleza?
Nos olhos de quem vê
Grandeza e delicadeza.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

“... A DOR DAS PALAVRAS É O ALÍVIO DA ALMA ...”*

Rubem Leite - 31 de agosto de 2008 - 4ª parte

Inspirado na peça Espreme Que Sai Sangue, da Cia Malarrumada – BH MG


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- “Que árvore é essa? Que bela copa a sua. E ela que não chega... Lindo tom de rosa. Ela ta demorando mesmo... Mas é lindo mesmo o tom de rosa de suas folhas. Que formigão, sô. Será que ele pica? – Sai!”. Diz Benito dando-lhe um piparote. “Aiaiaiaiai. Que demora, sô. Acho que vou ler esse pasquim”.

No pasquim:
Briga de Amigos Mata Mulher – Marcelo Oliveira e Glauco Mattos, dois grandes amigos, são separados por Juliana Martins, esposa do primeiro. Ela dá pra todos e assedia o amigo fazendo-os brigar. Brigar até descobrirem que se amam. Mas um tiro escapa matando-a.

- “Credo! Que Diana faria comigo se me pegasse com Ramon? Que idéia é essa Benito? Ta parecendo que é guei... Nunca aconteceu nada entre nós... Mas essa formiga é grande mesmo. E que ferrão... Eta mulher atrasada, sô. Vou ali comprar uma banana frita enquanto ela não chega”. Volto comendo. Sento e “Vou ler um pouquinho mais”.

No pasquim:
Grã-fino do high-society é morto por filho adotivo que era pobretão – Já que artistas “americanos” vão ao supermercado comprar um filho adotivo, porque riquinhos no Brasil não podem adotar um neguinho? Servirão depois para motorista ou jardineiro. Dois pelo preço de um: boa fama e empregado. E tem mais, a mulher mata o marido e põe a culpa no pretinho. Três pelo preço de um: boa fama, empregado e bode expiatório.

- “Eu é que to afim de matar a enrolada. Uma hora de atraso. Gente! Essa formiga está me incomodando. Vou um pouquinho mais pra lá. Que vento gostoso. Ramon é gostoso? Que isso? De onde surgiu esse pensamento? Não pode ser meu. Diana é que é gostosa. A mata é virgem porque o vento é fresco. É melhor mudar de pensamento”.

No pasquim:
‘Menina Veneno’ assassina professor de língua portuguesa – Adolescente assedia cunhado bom de boca, e língua, e o envenena por não largar a esposa para ficar com ela.

- “Quer saber de uma coisa? Eu vou é embora. Vou chamar o Ramon para gente jogar sinuca e catar umas garotas".


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* Bruno Grossi, autor da frase que uso como título.