quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

SER OU NÃO SER

12-23\02\09


Já são dez horas e a lua cheia está simplesmente linda. Foi difícil esperar tanto pela lua cheia. Visto uma roupa de algodão bem confortável e o mais confortável calçado fechado que tenho. Afinal tenho que andar muito por entre o bosque. “Deixa ver: lanterna, lanche, água. Acho que não preciso de mais nada, pois o lugar não é perigoso. É só uma floresta...”.

“Vou de moto ou de bicicleta? Acho que vou de bicicleta. Não tenho pressa mesmo”. Pedalo por uns quarenta minutos até chegar à mata e a prendo numa árvore. Caminho por mais uns quarenta minutos e “Que é isso? Ah! São elas de novo”.
- Boa noite, meninas! Estamos aqui de novo...
- Boa noite, Benito. Veio ver quem você procurava mesmo sem saber que existia?
- Sim!
Ireni continua a examinar as plantas e colher algumas.
- Qual é seu nome, menina?
Ela olha nos meus olhos e dessa vez seus olhos se mantêm em silêncio. Ambas se afastam. E desaparecem na névoa que as envolveu depois de um sorriso para mim. Continuo meu trajeto seguindo o já conhecido caminho.

A rocha. Pouco maior que eu. Uns dois metros e meio de altura talvez. Seu topo deve ter uns trinta centímetros, meio arredondado. Depois um afinamento leve e mais embaixo, uns oitenta centímetros. Curioso. Mais ou menos na metade de sua altura, em seu canto direito há um buraco que não tinha percebido na outra vez e a rocha não é muito grossa ali, na borda externa do buraco. Em compensação seu meio deve ter uns cinqueta ou sessenta centímetros de largura. Afina mais um pouco até sua base.
Encosto-me na rocha esperando.

Meia noite. Estou ansioso.
Quem eu procurava sem saber que queria encontrar.

O som de seu andar. Depois seus imensos olhos negros me olham com a calma de sempre. “Como ele deve ser sábio!”. Levanto-me com um sorriso meio bobo, acho. Um centauro deve causar uma reação assim nas pessoas. Seu corpo equino malhado e seu peito humano branco se mostram inteiramente. Seus cabelos negros e brilhantes como noite salpicada de estrelas balançam ao vento.

- Benito!
Estende-me sua mão como aprendera que deveria fazer para cumprimentar um humano.
Nada falo. Sua presença me impõe um silêncio.
- Tudo bem?
- Sim. Apenas estava pensando se você viria. Se não era loucura minha.
- Loucura sua?
- É... Ainda acho estranho saber que vocês existem...
Seu primeiro sorriso.
- Entendo. Também pensei se realmente poderia confiar num humano.
- “Você existe”. Decido. Convenço-me.
- Confio em você.
- Vamos andar?
- Onde você quer ir?
- Não sei. Não conheço a floresta como ela está agora... Não natural como se mostra em quase todos os seus momentos.

“Andamos devagar. Quero dizer. Devagar para ele”.

“Falei bastante. Escutei mais. Falamos sobre as estrelas. Sobre a fauna, flora, minerais. Sobre Ireni e a menina. Sobre a rocha. Ele ensinando e eu aprendendo”.

- Quem é você?
- Como assim, Régio? Sou humano...
- Não é isso. Como você é?
- O que você é? Sei que é um centauro. Mas você é de carne e osso? É da Terra? É ser mágico, como os do Sítio do Pica-Pau Amarelo? O que... o que é você?

Um silêncio de ambas as partes.
É interessante. Muito. Saber o que ele é. Mas será importante? De verdade?
- Não preciso saber quem é você, Benito. É um humano inteligente, agradável e, acredito, confiável. E gostaria de saber mais sobre você. Mas não preciso saber quem é você.
E eu? Eu preciso saber o que é ele? Minha parte humana insiste que sim. Exige que sim. Sou racional. Afinal, o homem é um animal racional. Mas preciso mesmo?

Conversamos muito. Pensamos mais. E a presença do outro é o que tinha de melhor. Quero o centauro para mim. Meu centauro de estimação. “Não! Como posso pensar isso? Ele é ... É... O que ele é? Gente não é. Ele é um ser vivo, inteligente, consciente. Digno de todo o meu respeito e afeição”.

- O que está pensando? Ficou diferente o seu silêncio.
- Nada de mais importante que a nossa amizade.
- Tenho que partir, Benito. Não demora e o dia vai nascer. Você pode voltar hoje à noite?
- Sim. Nada me impediria. Na rocha?
- Sim. E lembre-se: venha sempre só.

Régio se afasta. Olha para mim e uma névoa surge e o envolve parecendo levá-lo consigo. Seu olhar é a última coisa que percebo.

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