segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

DENTES

Rubem Leite

25-01-10

Eram duas dúzias? Será que era uma dúzia em cima e outra em baixo? Apenas duas dúzias de dentes afiados, amarelos, nojentos, apavorantes? Sim! Duas dúzias de dentes sorriram para mim. Arreganhou a boca.

Um adolescente belíssimo. Loiro. Olhos azuis. Um metro e setenta e ainda, óbvio, em crescimento. Músculos em definição. Meu filho seqüestrado à metade de sua vida.

- Joel? Joel! Joel!

Duas dúzias de dentes afiados, amarelos, nojentos, apavorantes se voltaram para mim e sorriram quando o chamei. Parei! Estaquei na verdade.

- Joel! – Falei com uma lágrima. E o garoto me dando as costas vai embora. Vou atrás. Ele é rápido. Acelero o passo. Ele é mais rápido. Vira a esquina. Segundos depois alcanço e ninguém. Só estranhos. Ando acelerado pelos dois lados da rua com uma cortina de lágrimas me atrapalhando. Sento no chão encostado no muro de uma escola. Ponho as mãos no rosto e choro em alto e bom som. Transeuntes passam incomodados com meu choro. Choro de homem assusta, espanta. Você olha para mim. Pára um segundo. No segundo segundo pensa em falar comigo. No terceiro segundo você vai embora me deixando abandonado. Choro de homem incomoda, afasta. Mas não fiquei só. Meu desespero me acompanha.

Dentes afiados, amarelos, nojentos, apavorantes é a falta que sinto de meu filho morto pela mãe suicida. Dentes afiados, amarelos, nojentos, apavorantes é minha culpa.

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