PRAÇA RETANGULAR COM CENTRO CIRCULAR
ou SILÊNCIO E TROVÕES
Un día seré silencio.
Hoy soy trueno.
A day I will be silence.
Today I am thunder.
Todos os dias a seis e quinze ele saía de casa para trabalhar. Eram
dois ônibus. Era um belo prédio o lugar onde ele trabalhava;
retangular: a Biblioteca Pública Municipal.
Quem diria, havia uma bela biblioteca municipal na cidade… Ninguém,
pois não tinha. Isso é apenas desejo meu – o autor – e de
outras dezenas de pessoas na cidade; de centenas no estado desejando
uma em cada canto; e de poucos milhares no Estado sonhando em cada
município.
A cidade real, não a do cronto, é de aço bruto. O estado real e
imaginário são conservadores (não refinado como poderia ser, mas
estúpido). O Estado real e imaginário regrediram a repressores.
Será isso a conservação de tanta alma bruta…
Chegava. Entrava na salinha onde trabalhava. Sentava na sua mesinha.
Puxava papo com a colega do setor que nunca lhe respondera com bom
humor. Assim fora no princípio e mesmo passado meses e anos a colega
não mudou o modo de ser com ele e com os outros. Ele foi ao
silêncio.
A biblioteca cuidava de dois cães abandonados à sua porta. E a
colega reclamava: “não param de mijar nem de ladrar”. Isso não
o surpreendia muito. O que o espantava eram os humanos não seguirem
as regras da casa nem da vida.
Uma noite, pouco antes de acordar, sonhou que era o prefeito com bela
gestão na cidade Jardim de Aço. Com toda alegria comentou com a
colega que não lhe dera a mínima importância, mas dissera:
- Por que alguém votaria em você. Por quê? – E pela primeira vez
sorrira… – Você nunca fez nada, nem limpa a sua sala.
- Mas porque limparia se há quem o faça?
- Se eleito fosse seria como todos os outros. – E riu debochada com
o jornal na mão. – Veja essa notícia. Há dois casos de
coronavírus na cidade.
Se as pessoas se assustassem com a mortandade feminina no país como
se amedrontam com um vírus com menos casos que hepatite, aids,
dengue, zica… – Pensou enquanto a olhava e voltou ao trabalho.
Tornara-se prefeito? Não, nunca fora eleito nem se candidatara. Fora
só um sonho que sonhara só. Mas bem geria seu serviço e sua mesa
na sala que ficava bem em frente ao pequeno jardim no interior da
biblioteca que também cuidava. Talvez por chegar tarde ou em cima da
hora, coisas que a colega nunca vira: a gestão do serviço, da mesa
e do jardim. Regava as plantas, varria as veredas com bancos para o
público sentar e olhava a estátua no canteiro central e circular do
retangular jardim que se chamava Praça Lima Barreto. Só pra isso
saía cedo de sua casa.
Nunca se candidatou e nem parou de cuidar da praça. E mesmo
velhinho, aposentado e cansado ia à biblioteca para cuidar do jardim
e ler.
Aaaah! Como ele lia após cumprimentar o velho Lima Barreto.
Depois voltava para casa.
Sorrindo.
No seu silêncio cuidava da hortinha de plantas medicinais que servia
a vizinhança enquanto escutava o rádio.
No seu silêncio lia algo ouvindo músicas:
“Acuchilla a los que se difienden, hace prisionero a los demás,
saquea en nombre de las armas vencedoras y ofrenda sus preces a un
dios, al compás de los cañones”¹.
“People talking without speaking, people hearing without listening
and no ane dare disturb dare the sound of silence”².
Ofereço como presente aos aniversariantes:
João P.C. Silva, Átila Nonato, Elmina Ferreira, Ramon Henrique e
Rafael Henrique.
Recomendo a leitura de:
“Coronidade das Coisas”, de António MR Martins:
“Azuis Desmaiados”, de Caio Riter:
¹ MAUPASSANT, Guy de. Bola de Sebo y otros relatos. Madrid:
Santillana Ediciones Generales, 2007. P. 12.
² Simon & Garfunkel. The Soud of Silence.
Disponível
https://www.google.com.br/search?sxsrf=ALeKk01rfbntKBprDPISbKhaGV53qapnBA%3A1583058986656&source=hp&ei=KpBbXp-MJtWr5OUPxcyp0As&q=letra+de+sound+of+silence&oq=Letra+de+Soud&gs_l=psy-ab.1.0.0i13l3j0i13i30l7.2384.10877..16257...1.0..0.346.3289.0j4j5j4......0....1..gws-wiz.......0j0i131j0i67.WJqyRiZdBuQ
. Acesso 01 Mar 2020.
É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.
É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias
do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”,
“Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura
e Literatura”.
Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso
Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo –
Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é
Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração
do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.
Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga
MG (representando a Literatura).
Foto do autor pelo próprio autor.
Escrito após um sonho na
madrugada de 20 de fevereiro de 2020 e trabalhado nos dias 29 de
fevereiro e 1º de março do mesmo ano.
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