segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

SOMOS FILHOS DA MÃE

Obax anafisa.


- Você é filho de...

Olho curioso para a funcionária do posto de saúde.

- Sua mãe é... Ah! Deixa pra lá.

- De quem?

- De ninguém. Pode deixar.

- Rarrá! Sou filho de alguém. – Rindo digo e rindo ela concorda. – Preciso de um atestado declarando que estou apto a lecionar. – Pequena pausa. – Se bem que acho que o atestado deveria ser de psicólogo... Cuidar de alunos não é fácil.

A jovem sentada vira rápido o tronco e diz olhando para mim

- Podemos marcar consulta para psicólogo.

Eu estranho a expressão dela, mas não captei ou entendi o que quis dizer. Então falei rindo: Não! Foi pedido clínico geral então é o que devo levar.

A funcionária mexe no computador, acha meu nome. Vejo e, junto, o nome de minha progenitora.

- Eis minha mãe.

- Pois é como pensei. Posso marcar a consulta para seu psiquiatra para amanhã.

- Meu psiquiatra?

Confuso por alguns segundos, mas clareando minha consciência penso que ela me confundiu com meu irmão. E penso “Devo ter cara de doido mesmo. Rarrá! Ser artista é padecer no paraíso...”. Talvez esteja chocado por parecer que chamei meu irmão de doido. Ou pode ser que nem tenha se tocado. De qualquer forma, não me expressei pejorativamente. Pois meu irmão precisa de psiquiatra, mas se tem um doido em casa sou eu. Rarrá!

Também me sinto curioso para saber de onde ela me conhece para pensar que eu era meu irmão. Eu e ele pouco nos parecemos. Mas não me empenho em descobrir. Rindo, digo que ela deve estar nos confundindo.

A menina me olha espantada. Pensa alguns segundos e pergunta para confirmar se somos filhos da mesma mulher. Confirmo rindo “Somos mesmo filhos da mãe”.

Marca para o dia seguinte a consulta que pedi e pergunta se pode marcar para meu irmão também, porque, segundo o prontuário, já está na época de nova consulta.

Vou para casa. Volto com minha mãe e irmão no dia seguinte. O médico me atende. Ao saber que queria atestado médico confirmando minha aptidão para lecionar fica uma fera. Se acalma ao me ver tranqüilo. – Estou realmente numa semana boa. – “Não entendo o Governo Estadual. Já faz duas décadas que é proibido esse tipo de atestado. Tem que ser por médico do trabalho. Como posso atestar sua aptidão se não foi feito nenhum exame? O máximo que posso fazer é dizer que você ‘não apresenta sinais evidentes de moléstia infecto-contagiosa, alteração mental ou dos órgãos dos sentidos’. Não faço os exames necessários porque, apesar de eu ser também médico trabalhista, aqui no posto sou pago como clínico geral”.

Não lhe digo o que penso. Que se ele é médico do trabalho por que não poderia fazer os exames? São tantas as burocracias que nem vale a pena. Sinta-se à vontade para entender como puder o meu silêncio. E para comentar comigo também.


Ofereço como presente de aniversário à

Luciano S. Brska, Edson Rossatto, Wellington P. Santos, Janeth Arrebola.

Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas.
O texto é minhas flores para você

e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.

Escrito entre 07 e 13 de fevereiro de 2012.

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