segunda-feira, 22 de setembro de 2014

BRUTA MINA ENTRE OS CASCALHOS VELA

Obax anafisa.
Viva a árvore! Vivam, árvores!

- My English is not strenaght. But in Portuguese I destroy.
- How can someone think that? But many do so. Pains me! I love Portuguese.


Debaixo de árvores e sentados nas flores de sibipiruna caídas sobre a grama olhamos os carros, as pessoas e os pássaros.
- Para meu curso, engenharia de materiais, acho importante eu conhecer inglês, francês e, talvez o espanhol. Então, Benito, eu pretendo falar os três idiomas.
- Perdoe-me, mas não se esqueça de falar a mais importante delas. Lembrou-se de três, mas se esqueceu da essencial. Primeiro o Português; e no seu caso: inglês em segundo lugar, depois o francês e por fim o espanhol.
- Kkkk. Português, a mais chata por sinal.
- Pelo contrário, é a mais bela. A última flor do Lácio. Não acredita em mim? Imagine um pomar. Com mangas, goiabas, laranjas, cajus, caquis, bananas, mexericas e etc. Hoje você pode comer uma fruta, amanhã outra e ainda pode misturá-las à vontade. Manga, por exemplo, pode comer manguita, manga espada, manga rosa, manga coco e muitas outras.
- Legal!
- Em inglês você tem Why and bicause para se expressar. Em português você tem por quê, por que, porque e porquê. Só as duas do inglês dão conta para perguntar e responder? Dão, mas limita muito as possibilidades. Perguntando, por exemplo, em português eu posso dizer: Por que você se chama Zé das Couves? E posso dizer: Você se chama Zé das Couves. Por quê? Agora, fale em voz audível as duas perguntas.
- Por que você se chama Zé das Couves? – Pausa. – Você se chama Zé das Couves. Por quê?
- Viu que na segunda existe uma ênfase na indagação? É como se na primeira fosse apenas curiosidade, mas na segunda há uma exigência.
- Mas bastam duas, para que quatro?
- Repito, duas formas bastariam, mas limitariam as possibilidades. Porque existem diferenças na intensidade da intenção da pergunta. Sacou? Então a língua portuguesa possibilita mais nuances e sutilezas.
- Nuuh!
- O que permite mais beleza e mais clareza na comunicação.
- E é por isso que é a mais cabulosa.
- Sim, mas é mais bela. O inglês é como um corpo de homem. Tem sua beleza, não podemos negar. Mas é reto, grosso, duro, sem flexibilidade ou fluidez. E o português mais o espanhol são como mulheres com corpo de violão... Há delicadeza sem ter fragilidade. E são fluidos, suaves, curvilíneos, cheios de reentrâncias, possibilidades e nuances.
Sob a sombra, encostamo-nos à árvore de sibipiruna. Continuamos a ver os carros, pessoas e pássaros.
- Por quê?
- O quê?
- Cê sabe! ... Por que não fica?
- Porque quero ser grande.
Sob a sibipiruna continuamos a ver os carros e as pessoas. Mas passamos a escutar os pássaros.


Ofereço como presente de aniversário:
Érikis M. Sena, Jaqueline Carla, Daniela V. Aleixo, Samuel Fernandes, Edvania Oliveira, João Gabriel, Maria jany, Devon Pendleton, Jadallah Safa, Flávia V. Paravidino e Wesley V. Nogueira.

E ofereço ao escritor Marcelo Garbine Mingau Ácido por gostar do que escrevo.

Escrito na manhã de 22 de março de 2014, mas mexida e remexida entre os dias 16 e 22 de setembro do mesmo ano.


O título é o quarto verso da primeira estrofe do soneto Língua Portuguesa, de Olavo Bilac.

3 comentários:

Anônimo disse...

Incrível! Interessantíssimo! Chama a atenção para o fato de o quanto a língua portuguesa abre leques e mais leques de possibilidades para expressar sentimentos e intenções de quem realmente sabe usá-la. Parabéns, Rubem Leite!
Vera Buzo.



Paulo disse...

Ótimo texto, adorei as figuras de linguagem do estudante de engenharia aí.

Marcelo disse...

Tenho, ultimamente, escrito crônicas didáticas de humor acerca de temas gramaticais e estou gostando muito de explorar esse gênero, mas o Rubem Leite faz um hábil malabarismo prático com verbetes do nosso idioma que lhe é peculiar e caracteriza o seu marcante estilo radiante de escrever. Valeu, Rubem! Obrigado pela fartura de produções de textos tão gostosos de ler.