domingo, 10 de dezembro de 2017

IMBAÚBAS – ALÍVIO

ALIVIO


22171 para Vereador.
Meus amigos, minhas amigas, lanço minha candidatura a Vereador.
Único político honesto, pois não minto. Não vou fazer nada, mas quero me aposentar. Por isso candidato-me, pois descobrir que esta é a única maneira honesta para se aposentar.
Vote em mim nas duas próximas eleições, pois preciso aposentar.
Por isso, muito obrigado, meu amigo! Muito obrigado, minha amiga!

Leitura pelo autor postada no canal do youtube aRTISTA aRTEIRO:

Em português:

Desde antes de meu nascimento minha família vive em Ipatinga. Mas eu nasci em Coronel Fabriciano, ao lado de onde moro, Ipatinga. Ficam em Minas Gerais. E eu, quem sou? My name is Watson. Whatson name. Rirri. Eu sou Watson Cabin. Chamado por muitos de Watson e por alguns de Folha.
Com licença; vou pegar um recorte de jornal que guardo em Viagem ao Centro da Terra. Com ele em mãos podemos conversar melhor. – Pausa. – Pronto, podemos continuar.
Nasci duas semanas após a morte de Joelma. Eu em uma segunda-feira e o incêndio do Edifício Joelma em uma terça-feira. Percebi isso olhando um jornal velho que achei perdido em uma gaveta. Era o Globo de 02 de fevereiro de 1974. Ao lado e acima de duas feias fotos em preto e branco está escrito:

173 mortos no incêndio em SP
Do alto do Joelma jogaram-se ou caíram 21 pessoas

Mas na ocasião eu não percebi nada disso, claro. E minha família não ficou abalada. Mas penso que deve ter se comovido na intensidade da distância.
Minha casa não é incomum. Não é grande. Não é pequena. Não é bonita. Não é feia. É só uma casa no Imbaúbas com uma sala, cozinha, dois banheiros e três quartos, varanda, área de serviço e o pequeno quintal em que brincava quando criança e que, adulto, pouco vou. Mas hoje andei por ele.
Da janela entre minha cama e guarda-roupa se vê o pé de manga, única grande árvore; à sua direita se vê as flores que minha mãe planta e à esquerda, a hortinha que meu pai cuida. No guarda-roupa e principalmente nas cinco prateleiras de madeira tosca em duas paredes de meu “quarteca” estão meus livros. Poucos. Apenas algumas dezenas; talvez pouco mais que uma centena.
Olhei pela janela, saí para o quintal e me sentei debaixo da mangueira carregada de frutas verdes. Encostei-me a ela, apoiei meu rosto nas mãos e agora conversamos; você e eu.
Do prezinho até à quarta série estudei na E.E. Dom Helvécio. Do quinto ao oitavo ano estive no Colégio São Francisco Xavier. O segundo grau aconteceu no Colégio Mayrink Vieira.
Entre os fatos marcantes da minha vida gosto de lembrar-me de minha sétima série. Onde, como diz Julio Verne, “a verdadeira viagem começava. Até então as fadigas tinham se sobreposto às dificuldades e agora estas iam nascer verdadeiramente debaixo de nossos pés”. Melodramático, não? Mas em grande parte, fato.
Tímido, não tinha amigos e brincava com meu pé de manga. Ou passava o tempo entre tv e os livros que foram compondo o meu “quarteca”. Compreendeu? É como chamo o lugar onde durmo com meus livros.
Esforcei muito, cansei até, para ter gente com quem brincar, mas não conseguia. Mas com treze anos descobri a forma de ter com quem conversar. Hoje sei que não éramos amigos de verdade, mas na época foi a melhor coisa que me aconteceu.
Enquanto eu tirava sempre boas notas, Mário, o garoto grande, somente notas vermelhas. Ele precisava de ajuda e eu de companhia. Fiz os deveres com ele e alguma coisa aprendeu. Passei cola para ele e seu boletim azulou. Assim foi na sétima e oitava série. Os amigos deles conversavam comigo. Acho que sem muita vontade, mas mesmo não tendo muito o que dizer (eles gostavam de esportes e eu de Português e História) possuía ouvidos para me escutar.
Mas mudei de escola.
Fui para o Mayrink Vieira.
Fiz vários amigos que até hoje tenho contato. Coisa boa?
Destaco Luzemar. A menina que me fez homem e que fiz mulher. Cabelos e olhos negros. Belo rosto. Corpo gostoso.
Como continuava com boas notas me vali de meus méritos. E conheci Maria do Carmo, Valter, Ricardo, Pedro, José, Luzemar, outros e outras.
- Como você é magro... Parece uma folha. – Observou José e Pedro riu. Foram as primeiras palavras que dirigiu a mim e o apelido pegou. E ficou.
Valter nos chamou para seu aniversário. Ricardo levou cachaça. Nós sete a bebemos.
Fui embora; Luzemar também.
A gente se encontrou outras vezes. Ela levava maconha e a fumaça subia para a cabeça antes de sumir no ar.
Até que meus pais descobriram e o escarcéu que fizeram nos separou. Foi difícil e sofrido. Mas hoje a encontrei na rua fumando pedra. Estava suja e com machucados no corpo. Pediu-me dez reais. Dei e sem escarcéu nos separamos. Não foi difícil nem sofrido. Foi um alívio.
E minha maior dificuldade é o alívio que senti.


En español:

Desde antes de mi nacimiento mi familia vive en Ipatinga. Pero nací en Coronel Fabriciano, alrededor de donde vivo hoy, Ipatinga. Se queda en Minas Gerais. Y yo, ¿quién soy? My name is Watson. Watson name. Jijí. Soy Watson Cabin. Llamado por muchos de Watson y por algunos de Hoja.
Con permiso; cogeré un recorte de jornal que guardo en Viaje al Centro de la Tierra. Con él en manos podremos charlar mejor. – Pausa. – Pronto, podremos continuar.
Nací dos semanas después de la muerte de Joelma. Yo, en un lunes y el incendio del Edificio Joelma en un martes. Percibí eso mirando un jornal viejo que encontré  perdido en un cajón. Era de 02 de febrero de 1974, alrededor y arriba de dos feas fotos en blanco y negro está escrito:
173 muertos en el incendio en San Pablo
Arriba del Joelma se lanzaron o cayeron 21 personas
Pero, en la ocasión no percibí nada de eso, claro. Y mi familia no se quedó abalada. Sin embargo, pienso que si conmovieron en la intensidad de la distancia.
Mi casa no es rara. Ni grande. No es pequeña. No es bonita. No es fea. Es solamente una casa en el Imbaúbas con una sala, cocina, dos cuartos de baño, balcón y un pequeño patio donde jugaba mientras niño y que, adulto, poco voy. Pero, hoy anduve por él.
De la ventana entre mi cama y guardarropa se ve el pielde mango, único gran árbol; a su derecha se ve la flores que mi mamá planta y a la izquierda, el huertito que mi papá cuida. En el ropero y principalmente en la tosca estante de mi “habiteca” están mis libros. Pocos. Solamente algunas decenas; tal vez poco más que una centena.
Miré por la ventana, salí al patio y me senté debajo del árbol cargado de frutas aún no maduras. Me acosté a él, apoyé mi rostro en las manos y ahora charlamos. Tú y yo.
Mis primeros años de estudio fue en la escuela Don Helvecio. Mi primaria fue en el colegio San Francisco Xavier. Mi secundaria se ocurrió en el colegio Mayrink Vieira.
Entre los factos más importantes de mi vida me gusta recordar mi séptima serie. Donde, como habla Julio Verne, “el verdadero viaje empezaba. Hasta ahora los cansancios habían se sobrepuesto a las dificultades y hoy se van a nacer verdaderamente bajo nuestros pies.” ¿Melodramático, no? Sin embargo, en gran parte, facto.
Tímido, no tenía amigos y mi pie de mango y yo jugábamos. O pasaba el tiempo entre tv y libros que fueron componiendo mi “habiteca”. ¿Comprendió? Es como llamo donde me acuesto con mis libros. Esforcé mucho, hasta me cansé, para tener gente con quien jugar; pero, no conseguía. Sin embargo, a los trece años descubrí la manera de tener con quien platicar. Hoy sé que no éramos amigos de verdad, pero en la época fue la mejor cosa que me ocurrió.
Mientras yo tenía siempre buenas notas, Mario, el muchacho grande, solamente notas rojas. Él necesitaba de ayuda y yo de compañía. Hice los deberes con él y algunas cosas él aprendió. Le pasé chuleta y su boletín escolar azuló. Así fue en los dos últimos años de primaria. Los amigos de él charlaban conmigo. Pienso que sin mucha voluntad, pero mismo no teniendo mucho que decir (a ellos les gustaban deportes y yo de español e Historia) tenía oídos escuchándome.
Pero, cambié de escuela.
Fue al Mayrink Vieira.
Hice varios amigos y hasta hoy hablamos. ¿Cosa buena?
Destaco Luzemar. La muchacha que me hizo hombre y que la hice mujer. Pelos y ojos negros. Bello rostro. Cuerpo exquisito.
Como continuaba con buenas notas me valí de mis méritos. Y conocí María del Carmo, Valter, Ricardo, Pedro, José, Luzemar, otros y otras.
- Como es flaco… Parece una hoja. – Observó José y Pedro rio. Fueron las primeras palabras que me dirigieron y el apodo pegó. Y se quedó.
Valter nos invitó a su cumple. Ricardo llevó cachaça de Brasil. Nosotros la bebemos.
Me fue de la fiesta; Luzemar también.
Nosotros nos encontramos otras veces. Ella llevaba mariguana y el humo subía hasta la cabeza antes de sumir al aire.
Hasta mis padres descubrieron y la algarabía que hicieron nos separó. Fue difícil y sufrido. Pero, hoy la encontré en la calle fumando piedra. Estaba sucia y todo su cuerpo se quedaba lastimado y herido. Me pidió dinero. Di y sin gritería nos separamos. No fue difícil ni sufrido. Fue un alivio.
Mi mayor dificultad es el alivio que sentí.


Ofereço como presente aos aniversariantes:
Camila Santos, Rayssa Rangel, Cleiser Coura, Carlos Roberto, Bernardo Baião, Adler Franz, Patricia Rodrigues, Lenilson Fonsêca, Holoisa Davino, Lucas Alvisi, Dado Aragon, Renata Sousa, Lucas Lage, Aninha Silva, Mila Eduarda, Marilene Tuler, Fabio S. Rodrigues, Mikael V. Zeleke y Martínez John.

Recomendo a leitura de:
“Pensar Historicamente”, de João Lucas Nery:
“Bang, Bang, Bang, Prendemos 726212”, de Josué da Silva Brito:
“As Ocupações dos MTST E MST SÃO OS NOVOS QUILOMBOS”, de Vinícius Siman:
e “Roubos Invisíveis”, deste macróbio que vos fala:

BECHDEL, Alison. Fun Home: uma tragicomédia em família. Tradução: André Conti. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2007.



VERNE, Julio. Viagem ao Centro da Terra. Rio de Janeiro: Fase. Cap. 17.

 Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve e publica neste seu blog literário aRTISTA aRTEIRO todo domingo e colabora no Ad Substantiam às quintas-feiras.  É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. E em breve também professor de História. É graduado em Letras-Português. É pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”; autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Foto de Vinícius Siman.

Escrito na manhã de 15 de novembro de 2015, trabalhado no dia 17 de abril de 2016; depois em 2017 entre 23 de fevereiro e 26 de março de 2017 e por fim entre 01 e 10 de dezembro.

Um comentário:

Josué da Silva Brito disse...

Genial! Quanta sensibilidade e simplicidade em narrar a vida comum! Sou impressionado, querido Rubem, com a sua capacidade de transformar um "espirro" em uma fábula genial. Toda vez que leio um texto seu me sinto transportado para um universo paralelo à Drummond que só pode existir nas Minas Gerais utópicas.