O ar turvo
desta quarta-feira
prende-me aos lençóis.
Perpassam vultos
em meio ao frio.
A embriaguez do café
na cozinha
envolve-me.
O trabalho está à espreita.
O automóvel com o tanque
na reserva assola-me.
Banho-me nos traços
do meu rosto
e volto novamente
a ser otimista. ¹
Obax anafisa.
Casa de meu irmão. Não me sinto acolhido. Janto e saio de fininho. Vou para um hotel. Amanhã dou uma desculpa qualquer. Todos vamos nos sentir melhor. Não vai nem ser difícil justificar uma vez que nem deveria ter ido.
Escolho um bem bonito com preço accessível sem perder qualidade.
- Um quarto, por favor.
- Sim. Perdão, senhor. Poderia esperar um segundinho enquanto me organizo? Deu pane no sistema e só agora voltou.
- Claro. Sento ali e quando estiver pronto, me chame, por favor.
Espero enquanto o tempo passa e chega um casal querido por mim. Surpresa nos vermos e então nos abraçamos. Vamos para a recepção, meus amigos recebem seu quarto e sobem enquanto vou me registrar.
- Sinto muito, senhor. Mas todos os quartos estão ocupados.
- Como assim? Você disse que só faltava se organizar e que me arranjaria um.
- Pois então, senhor. O casal ficou com ele.
- Você não me disse isso. Que só tinha uma vaga.
- O que posso fazer, senhor.
- O que pode fazer? Saber trabalhar. Ter competência. Dar preferência para mim, já que cheguei primeiro.
- Desculpe! O senhor está certo. Mas agora não temos vagas.
- Se vira. Chama os dois e os mande embora.
- Não podemos fazer isso. O que eles poderiam pensar?
- E o que eu penso não conta?
- Cont...
- Chama o gerente. É com ele que eu quero falar. – A jovem tenta argumentar e não deixo. Passa-se um longo tempo e ele aparece dizendo
- Temos um apartamento, senhor. Ele é muito, muito mais caro, mas o faremos pelo mesmo preço com nossos sinceros pedidos de desculpa.
Já mais calmo, aceito, claro. E vamos eu e um funcionário. Belo hotel. O corredor é verde suavíssimo com detalhes rosa muito claro. Ainda bem que não é azul celeste. Não conheço cor mais feia. O empregado abre a porta ao mesmo tempo em que um dos apartamentos vizinhos se abre e dele sai o corpo do Híbridus.
- Menino! Que você faz aqui?
- Eu é que pergunto, que cês tão fazendo aqui?
Falamos num clima de festa e prazer de se ver.
- Tá todo mundo aqui. Farroupilha, Bruta, Casa Laboratório, Flux, nós. Estamos todos num festival de teatro e dança. Daqui a pouco vamos jantar e sair para assistir um espetáculo. Vem com a gente? Vai ser muito bom. Está sendo óóóóótimo.
- Vamos! Que horas vocês vão jantar?
- A gente se encontra lá pelas seis aqui no hotel ou então depois do espetáculo vamos para algum lugar.
- Então tomo um banho e nos encontramos no restaurante.
Enquanto conversamos o rapaz deixa minhas malas, pega a gorjeta e sai.
Entro e... Brilho. Eram umas seis horas da manhã e estava dobrando a esquina. Atrás veio uma radiopatrulha que pára à minha frente. Policiais com armas nas mãos se encaminham para um cortiço. Brilho. Dou imediatamente meia volta. Quando chegava à minha casa vejo três carros saindo de onde vim. Um amassado, outro faltando pedaço e do terceiro saía fumaça. Um quarto carro aparece, em chamas, e pára na esquina. Um neguinho, magrelinho, escapa pela janela e os policiais vêm e... (você já imagina; não preciso dizer). Um vizinho aparece não sei de onde e começa a querer conversar. Brilho. Tiros ecoam. Do cortiço? Não quero saber o que o vizinho quer. Abro meu portão e entro. Sei lá se uma bala perdida resolve me achar. Olho para trás e o vizinho me olha. Uma lágrima de sangue. Fecho a porta. Chamar quem? A polícia? Brilho.
Abro os olhos. Sento, pego o vinho que trouxe, não tomo, fecho-os novamente. Nova visão assombra.
Entro no elevador. É a prefeitura. Lentamente sobe, parando em cada andar. Um brilho me incomoda. Não no elevador nem naquela hora. É na minha cabeça. Em cada andar entram três ou quatro ou cinco e sai um ou dois. Vai lotando. E o brilho de novo. Pára no quarto andar. Saio. Parecem sair mais pessoas. O brilho. Na sala do prefeito: conversa, diálogo. Os artistas, agentes culturais, o prefeito e seus asseclas. Brilho. Não! Não é conversa. São discussões. Silêncio dentro do brilho. Entro no elevador com os artistas e agentes culturais. Brilho. Silêncio apavorante. O elevador pára entre dois andares. Medo. A porta se abre. Alguns saem. Metade do corpo para fora. Despenca. Morte. Brilho. O deputado Alexander Silcaveira adverte “Protestar faz mal a saúde”. Prefeito em Fernando de Noronha se diverte.
Desculpe! Estou falando e falando sem me apresentar. Sou um cara comum. Ou quase, né. Eu me chamo Benito e talvez já tenha ouvido falar de mim e...
... Estou sentindo cheiro de vela, sabe, quando está no fim? Brilho. É na sua casa e...
Escrito entre a madrugada de 01 de outubro a 11 de outubro de 2011.
O título original seria “Aids não tem cura. Ainda bem que não uso silicone”.
É o que uma mulher desconhecida, sem mais nem porque, me disse quando eu passava uma tarde agradável no Parque Ipanema. Mudei o título em homenagem ao Poeta.
Ofereço como presente de aniversário ainda aos meus queridos:
Shirley Maclane, Lorena Costa e Mª Ângela C. Shimabokuru.
Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas.
O cronto é minha flor para você
e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.
Comunico o passamento do nosso querido
Poeta Romero Lamego,
em 10 de outubro de 2011, grande nome da literatura municipal.
O corpo do Poeta velado na capela do Cemitério Senhora da Paz,
e o sepultamento marcado para as 13:00h do dia 11 de outubro de 2011, em Ipatinga.
Faço minhas as palavras do CLESI:
O nosso carinho especial a todos familiares e amigos do nosso Poeta, como gostava de ser chamado por todos nós, amigos das letras e amigos mais próximos.
Desejamos que siga levando o nosso amor e o nosso eterno carinho, querido Romero,
e o reconhecimento do quanto você foi forte na sua luta durante sua enfermidade!
¹ FIRMINO, Romero Lamego – Olhares Múltiplos, Semântico – 2005.
Um comentário:
Grande Rubem!!!
Excelente post meu caro, maravilhoso teu espaço...
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