Obax anafisa.
O camelô e a
Praça Primeiro de Maio estão vazios de cidadãos. Eu passo entre os cachorros
abandonados e as pessoas que se vendem ou compram seus produtos. Um ônibus pára
e corro para ele. Minha mãe está lá; ocupa uma parte do banco. Olhando-nos sento
ao seu lado e vamos em silêncio, desatentos ou desinteressados a quem passa
pelas ruas. Uma hora na barulhada de trabalhadores. Esqueci o número da casa e
ligo para um amigo.
Amigo: Doze
Eu: Doze
Amigo: Três
Eu: Três
Amigo:
Oitenta e sete
Criança:
Cinquenta e sete. – Uma criança me vendo repetir números se intromete e inventa.
Eu, em silêncio irritado, olho para os pais sorridentes dela.
- Trocador,
pode me avisar quando chegar o ponto mais próximo do número 12.387?
- Sim!
Paramos.
Ponto final. Casa 14.300.
- Ei, você
não me avisou.
- Não tenho
obrigação.
Caminhamos, eu
e minha mãe, pelas casas feias na avenida indecisa se fica sem árvores ou se as
tem mirradas e empoeiradas. Suados chegamos num buteco-armazem. Três atendem
outros dez, agora doze.
Na minha mão,
uma sacola com dinheiro. Tudo que tenho, que guardei. Um sujeito olha para mim
- Veio por
causa? – Sua voz baixa e seus olhos mostram que sabe o que quero. Afirmo com um
aceno.
- Ele num
aceitará e nem te perdoará. – Aponta com o olhar para um magro, careca, suado e
camisa aberta no balcão. – Tem certeza que quer mesmo? Então vai. Rua
Maguinolita quatrocentos. Três ruas acima. Vai e não volta. Não te queremos
aqui.
Saímos.
- Oi! – Somos
abordados por um homem de trinta anos, roupas escuras com detalhes em prata,
borda preta nos olhos. – Ele mentiu para vocês. – Olha para o interior do
boteco e continua: Não gosta de gente como nós. É aqui na avenida, número 12.357.
Mas não sei se adianta. A mãe é igualzinha ao porco do boteco e... e agora é
tarde. Muito tarde para se aproximar.
Andamos. Minha
mãe em total silêncio de amargura e eu em silêncio de arrependimento. À nossa
volta, casas feias e árvores mirradas, empoeiradas, iluminadas pelos postes.
Olho para a lua cheia, sua luz reconforta. À minha frente, a casa.
Ofereço aos
aniversariantes
Diane Mazzoni, Ana P.
Rocha, Rafael Cabral, Maria das Graças, Marcello Rodrigues, Nena de Castro, Carol
Ribeiro, Cristina Abreu e Francklin Meireles.
Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. O texto é minhas flores para você e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.
Embasado
num sonho escrevi entre os dias 05 e 29 de outubro de 2012.
2 comentários:
Interessante, fragmentos de informações e pistas numéricas. Me lembrou o filme Afogando em Números, de Peter Greenaway. Convido-o a entrar no meu blog também:alinedeandrade.blogspot.com.Abraços.
Os números sempre me fascinaram... São tão representativos!
E um texto baseado em um sonho? Resultado maravilhoso!
Postar um comentário