domingo, 24 de fevereiro de 2019

NÓS SABEMOS



Longe, muito longe daqui e a um tempo que quase se perdeu nos corações havia um digno, belo e forte Galo branco e preto, mas havia também uma raposa tão má que se chamava Máfia e ela amava a cor azul; azul do céu. Mas só gostava da cor, não do céu. Por isso, quando morreu, sua alma ficou para assombrar. Um dia ela conheceu um rei e, sem este saber, tornou-se sua conselheira...

- Mestre, o rei quer que o senhor morra.
- Não, não é só ele que me quer morto. – E de maneira enigmática continuou: Diga à raposa que em breve, mas não agora, meu destino se cumprirá. – Um minuto de silêncio e: “Mundo mundo vasto mundo se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não uma solução. Mundo mundo vasto mundo mais vasto é meu coração. Eu não deveria te dizer, mas”¹: tenho desejado tanto reunir seus filhos como a galinha, esposa do grande Galo alvinegro, reúne seus pintinhos debaixo de suas asas. Mas você escuta uma raposa e não a mim.

Figueiras floreiam e parreiras frutificam sem saber dos males ao redor.

- O Galo cantará, mas antes você há de negar-me três vezes. Quando isso acontecer, olha bem pra ele. Essa ave tem aprendido muito comigo e quem sabe você não aprende com ela tudo que tenho ensinado...
E assim foi. Passados uns dias o homem meditou longo tempo na lição do Galo até iluminar-se no Mestre.
Porém a raposa ria enquanto as mulheres choravam.
Por dois dias nenhum galo cantou e todos se perguntavam se ficaria assim para sempre. Todavia, na terceira manhã o Galo cantou enquanto uma pesada pedra se movia sozinha e da caverna saía um homem. É por isso que os galos cantam todas as madrugadas, não segundo os relógios, mas sempre na hora da ressurreição.
Figueiras floriram e parreiras frutificaram sem saber dos males ao redor. Porém nós sabemos. E o que somos: raposas ou Galos?


Ofereço como presente aos aniversariantes:
Kadosh Miranda, Christine D.P. Sathler, Tiago Gonçalves e Gineraldo Adão.

¹ Do Poema de Sete Faces, de Carlos Drummond de Andrade.

 Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.  É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. É graduado em Letras-Português. É pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”; autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
 Foto do autor lendo para um Galo: Girvany de Morais.

Escrito entre os dias 21 e 24 de fevereiro de 2019.

Um comentário:

Cyd Ramos disse...

Muito bom. Você, meu amigo, é um bruxo! As poções mágicas de suas palavras, nos proporcionam grande prazer em ler e meditar.