domingo, 27 de dezembro de 2020

NÃO SEI VIVER, EMANUEL

 ou ESTE TERCEIRO DIA ATÉ HOJE NÃO VEIO

 

 

Escribir por necesidad

Porque es también denuncia el oficio

Para ubicar los espejos cara a cara

Y vernos en el silencio que escogimos

Escribir para que nos crucifique la historia

Hacer que grite y llore y nos deshonre

Para que no quede en el olvido

Escribir para nombrar a los culpables

Para nombrarnos uno a uno tras el vidrio

Porque hacen falta los versos y la bronca

Porque lo hemos dejado morir en la calle

Y de frio.

(Coronel¹).

 

Se alguém for falar mal de mim, não o faça pelas costas. Chame a mim, pois sei coisas terríveis sobre mim que a maioria nem imaginaria.

Diz Benito Bardo Junior. É importante separar as coisas. Rubem escreve o cronto, mas quem vive e conta a história é Benito.

Política e religião é o assunto da conversa e o que segue é após algumas dezenas de minutos após se sentarem num quintal em Belém do Pará.

- Anteriormente falei ao senhor que aqui em Belém temos o caso do deputado Éder Mauro Cardoso Barra e do delegado Marivaldo Pamplona da Silva, mais conhecido por Marivaldo do Pirarucu. Éder e Marivaldo realizavam juntos um esquema de nomeação de familiares, agiotagem, contrabando e grupos de extermínios.

Diz o professor Ariano, o Mouro. Ele para um pouco, olha pra lua enquanto bebe um gole de cerveja e continua:

- Inclusive o documento “‘Relação de devedores da União que financiaram campanhas eleitorais de candidatos ao cargo de Deputado Federal’ emitido pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, Procuradoria-Geral Adjunta de Gestão da Dívida Ativa da União, Coordenação-Geral de Estratégias de Recuperação de Créditos” comprova que Marivaldo tem uma dívida não previdenciária financiando o candidato a deputado Eder. Prenderam o delegado e encontraram muitas provas dos crimes cometidos pelos dois. Mas em menos de seis horas, “não se sabe como”, um delegado conseguiu cem mil reais para pagar sua fiança. E ambos estão soltos.

O assunto muda parecendo não ter nenhum anexo com o a fala acima.

- Quando eu era jovem praticava uma religião. Até que ainda a respeito. Não a sigo mais porque não creio mais que religiões religam o ser humano a Deus. Essa religião ensina: “só existe o bem porque Deus criou apenas o bem e não criou o mal; e só Deus pode criar. O mal é apenas uma ilusão, uma fantasia humana.”. Acho que ainda acredito nisso... Não sei.

Benito interrompe sua fala para beber sua cerveja e observar a castanheira banhada pela lua. E continua:

- Mas o que quero dizer é o quanto me chocava ao ouvir no catolicismo o Salve Rainha “degredados filhos de Eva gemendo e chorando num vale de lágrimas”. Eu sempre dizia “não sou um degredado filho de Eva. Sou um filho de Deus e não vivo num vale de lágrimas. Vivo no Vale do Aço; vale de gente forte feito aço”. Porque no Leste de Minas, onde moro, tem o município de Ipatinga que fica no Vale do Aço. A microrregião tem esse nome porque minha cidade tem uma importante indústria de aço bruto e na cidade próxima, Timóteo, há uma indústria de aço inox.

Benito interrompe sua fala outra vez. Bebe mais um pouco e, sem olhar para nada nem ninguém, continua:

- Bem, fui crescendo, crescendo não só em tamanho, mas em idade, em feridas e fui observando as coisas. O ser humano é o lobo do homem. Ainda creio ou acho que acredito que na Imagem Verdadeira o que Deus criou não se desfaz. Mas temos um apego enorme a ilusão. Não sei dizer estou falando certo, mas me dói muito... É muito doloroso pra mim saber que o ser humano ininterruptamente prefere o mal ao bem. Talvez eu esteja exagerando ao dizer continuamente. Mas se não é sempre é quase sempre. E não quase nunca. Não sei viver, pois é doloroso demais ser gente. Não sei viver, pois não há sociedade, mas sim alcateias. Mas ainda tento. Tento através das minhas aulas; que pelo menos alguns consigam ser pessoas de bem e não apenas de bens. – Ri amargo. – Quando escrevo e denuncio tudo isso espero que as pessoas parem e pensem e tentem “não vamos fazer mais isso. Vamos modificar”. Não sei vou conseguir. Acho pouco provável, mas ainda assim resisto.

Para passar o período natalino e de troca de ano estamos Benito, eu, Girvany de Morais, Glaussim e sua família no quintal da casa de Ariano, no Belém do Pará. E foi aí que o até então calado Glaussim diz:

- Não gosto de refutar Deus em pensamentos. Acho que Ele é muito mais que isso. O que penso é: “buscamos a aceitação de um Deus bondoso e esquece que Ele fez o mundo, o universo, as possibilidades de bem e mal”. A árvore que estava no centro do Éden é uma alegoria para o bem e para o mal. É uma parábola para a escolha humana. A escolha de pegar o fruto e entender sobre o bem e sobre o mal.

Interrompe sua fala para beber e olhar as pessoas nas outras mesas. Enquanto isso Benito diz:

- Mas será que buscamos um Deus conosco, um Deus bondoso?... – Olha a todos ao redor da mesa até fixar-se na lua acima da castanheira. Só aí continua: Creio que a busca geral é o Deus belicoso...

Glaussim pensa um instante e retorna ao seu raciocínio:

- O paraíso e o inferno são a mesma coisa. Quem torna tudo um inferno são as pessoas com suas escolhas assim como quem consegue florear a própria vida a transforma num paraíso. Enquanto muitos soltaram bombas em Nagasaki e Hiroshima outras tomavam seu café... É terrível. Mas tudo é escolha dos homens que governam e das pessoas que aceitam os governos impostos.

Bebe outro gole e retorna:

- Essa árvore – olha a castanheira sob a lua –, a do Jardim do Éden, está na terra, na superfície de nossas mentes e buscar sua seiva é procurar o que nos move, a alma máter. Se a pessoa consegue de alguma forma enriquecer e olha ao lado e vê a miséria dos demais... É aí que a pessoa descobre quem ela é.

Benito pega o celular, procura uma charge e a mostra aos amigos: 


- A paz pela guerra é a ideia de vida “amelricana”. Numa aparente mudança de assunto:

- Em Ipatinga temos muitos prefeitos caçados nesses últimos seis anos. O prefeito Nardielo Rocha, que ficará até 31 de dezembro, está respondendo a uma dezena de processos. Ele é aquele que foi eleito por dizer que o adversário iria, nas escolas, acabar com banheiros para meninos e banheiros para meninas; ficando um só banheiro para todes usarem na hora do recreio. Foi eleito em nome de Jisuis. Ah! Sinceramente estou cansado de religiões. Mas diz aí, Ariano. O tal delegado está solto? Está trabalhando? O que está acontecendo com ele? E o deputado, continua no cargo? Vai candidatar-se de novo? Quais são as notícias que temos em relação a esses dois cidadãos de bem.

- O deputado está em franca campanha. Começou a andar pelos bairros de Belém. Como deputado federal deveria estar em Brasília... Agora, o delegado tem ligações estreitas com grupos de extermínios... Esses dois sabem fazer política. Prendem um grupo de traficantes, divulgam nos jornais e o povo os crê salvadores da pátria. Sendo que, na verdade, apenas acabaram com aqueles que pararam de lhes dar propinas.

Glaussim retoma a palavra:

- O mundo é instável. Seja geograficamente, seja humanamente. Vemos os movimentos das placas tectônicas, das quedas de meteoritos que este mundo não foi feito para ficar em paz. De tempos em tempos surgem formas absurdas de homens-deuses como os faraós, Júlio César, Gengiskan, Hitler, os presidentes dos Estados Unidos e o nosso Boçalnato.

- Parece que uma nuvem negra vem se aproximando com uma tempestade... – Diz Ariano. – Não consigo engolir essas coisas. É muito difícil. Não consigo engolir mesmo.

Girvany é um bom ouvinte e por isso só agora dá o seu parecer:

- Alguém já ouviu falar em crimes nas comunidades indígenas? A Bugra, de Nena de Castro, nos mostra: Eles não são perfeitos, claro. Mas qual é a proposta de comunidade deles? Uma coisa que eles não têm, mas na nossa é essencial, é a competição. Não falo de competição esportiva, mas sim de capital. Aqui, se um trabalha oito horas para conseguir construir uma boa casa outro trabalha doze para construir algo melhor.

Come um pouco e continua:

- Acompanhada por Nena, Flávia Frazão nos diz: “Não é uma ridícula questão de luta do bem com o mal.”. As sociedades onde as desigualdades não existem ou são muito poucas a proposta é viver em comunhão. – Uma breve pausa e: Temos que lembrar que as pessoas são frutos das ideologias.

- É! E como disse Paulo Freire: “Não existe imparcialidade. Todos são orientados por uma base ideológica. A questão é: sua base ideológica é inclusiva ou excludente?”. O presidente, pela milésima vez desdizendo o que disse fez um arremedo de plano de governo para vacinação do covid. Na primeira vez do plano os professores estariam em segundo lugar na prioridade de vacinação, mas mudou de ideia e nos colocou em último lugar junto com os presidiários. Minha fala não objetiva desmerecer as pessoas desprovidas de liberdade, mas sim em nos colocar no mesmo patamar de quem comete crimes. – Diz rindo: E tem presidiário ofendido por ter sido colocado no mesmo nível do professor...

 

Perdão!

Sobre o Natal e o ano novo:

Estou deprimido demais para desejar algo que não acredito ser possível estes anos: feliz.

Mas

Desejo do meu coração que tenham tido um Natal...

E quem tenham força e coragem para passar por 2021.

Espero que tenham tido uma boa preparação para o renascimento do Emanuel, o Deus Conosco, para que Ele cresça em 2021.

Mas

O povo que num domingo Lhe proclama “Hosana nas alturas” na sexta lhe proclama “Crucifica-O!”.

Em 2016 Ele foi golpeado.

Em 2017 foi sabotado.

Em 2018 Jesus foi cuspido e esbofeteado.

Em 2019 Ele foi agredido e ferido de morte.

Em 2020 Ele foi morto...

Mas vejamos se em 2021 Ele ressuscita e cresce.

Mas

Como isso poderá fazer-se?

Quem é Jesus, o Cristo, o Emanuel? O que se faz com Ele?

Mateus 07,12. Mateus 07,21-23. Mateus 18,01-14. Lucas 24, 07.

 

 

Ofereço como presente à aniversariante Liala Coelho.

Talvez em 2021 não ofereça meus textos a ninguém em especial.


Recomendo a leitura de:

“Versos Ácidos do Vale do Aço”, deste macróbio que vos fala e de nove outras grandes vidas. Comprar um exemplar é, primeiro, beneficiar seu cérebro; depois apoiar a arte/literatura local. Meu watzap é: +5533998034325.

 

¹ Silvia Martínez Coronel é uruguaia e vive em Montevideo; é colunista na empresa Periódico La Brecha; é docente de Literatura; é crítica de Arte; e é escritora. Coronel crê e incentiva “Dê de presente um refúgio. Um livro é companhia porque aquele que lê nunca está só.”. Ela repete a fala de Laura Martínez Coronel: “A criação tem o eterno poder de derrotar a morte”.

 

Sobre vacinação dos professores:

GALVANI, Giovana. Governo descumpre promessa e retira professores da fase dois da vacinação.  https://www.cartacapital.com.br/educacao/governo-descumpre-promessa-e-retira-professores-da-fase-2-da-vacinacao/?fbclid=IwAR3P_cANtgGAP2n5wOURpab3__nmZoS3PWlPASYTxHr5dKoIHonwYXhw2JY Acesso 18 Dez 2020

Veja Saúde. Como é o plano de vacinação contra a Covid-19 do governo federal. Disponível https://saude.abril.com.br/medicina/como-e-o-plano-de-vacinacao-contra-a-covid-19-do-governo-federal/?fbclid=IwAR3w7s7YyruWFeG3j_iIgilLtbGtHOFlImASx_HNSyAxkHs4Z92b9H3q-EQ . Acesso 18 Dez 2020.

 



Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.

É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.

É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.

Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.

Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens:

Charge: pela internet.

Versos Ácidos feita pelo autor.

 

Escrito na manhã de 14 de julho partindo de uma conversa por watzap. Trabalhado entre os dias 21 e 25 de outubro; e encerrado entre os dias 23 e 27 de dezembro. Tudo em 2020.

4 comentários:

Josiane Hungria disse...

Muitas reflexões neste cronto. Tem uma frase de Voltaire que levo pra vida: "Eu creio no Deus que criou os homens, e, não no deus que os homens criaram."

Glaussim disse...

Obrigado querido amigo. De fato, o mundo é belo e bruto. O chocalhar das árvores ao vento que em instantes degenera em forma de ciclone arremessando árvores e homens ao alvitre. Quisera o caos em forma de Big Bang ser mais estático ou estável. Não. Não há nada de estático nem estável nesse mundo. Apenas ação e reação e motivação pra fazer e ter. Ainda somos acumuladores, seja de bens , seja de bajulações e notoriedades. Aqueles cujas vidas não se orientam por caminhos, são como o vento... Apenas vão!

Parabéns pelo texto. Obrigado pela homenagem.

MM disse...

Adorei!

MM disse...

Amei Rubem, suas reflexões são primorosas, prefiro Mateus 7:12, Mateus 7: 21-23, Mateus 18: 1-14, Lucas 24: 7 O que faço de Jesus: sigo-o, amo-o, obedeço-lhe.VINO MUNDO PARA SALVAR ALMAS♥️