domingo, 24 de maio de 2015

A ÁRVORE NO MEIO DO JARDIM

Carlos Glauss

Dedicado ao meu amigo Rubem, que é uma árvore de cidade.


Numa cidade, cheia de carros e pessoas passando de um lado para o outro, havia uma rotatória com uma árvore no centro. E sobrevivia sufocada entre os prédios. Sua resistência era tamanha que fez a copa aumentar e alongou seus galhos para captar melhor a luz do Sol. Dava pra ver nitidamente que a árvore sentia e se esforçava para viver ali. Suas raízes eram grossas como veias de madeira exibidas por cima da grama verde. Se ela tivesse pés, poderia se dizer que era uma “pesuda”, ou melhor uma “raizuda”. A base e o tronco eram largos como uma muralha. Até para subir na árvore era difícil. E quem curtia tudo isso eram os pardais, rolinhas e pombos. Ah! Esses sim faziam da suas copas o melhor dos condomínios! E tinha melhor lugar para fazer um ninho?
Todos os dias, o Sol nascia, por detrás dos prédios e seus feixes iluminavam a árvore que esperava ansiosa pelas nove horas, para finalmente poder captar a maior quantidade de raios solares. Os pássaros brincavam. As formigas e cupins transitavam pela grama.
A árvore solitária tocava uma canção feita com sons de galhos aos ventos e observava: a vida de todos e a correria do dia. Logo veio o pardal, pousou em seu galho e disse:
- Bom dia Árvore-Grande! Sempre ouço sua música dos galhos com o vento! Parece estar bem feliz hoje, não é?
- Bom dia Pardal. Estou feliz com essa brisa sim! Queria mesmo é que chovesse. Mas a gente redescobre formas de ser feliz até com o soprar do vento, não é mesmo? – Sorriu a árvore.
- Verdade, Árvore-Grande. Eu que sei como esse vento ajuda. Tem hora que estou cansado de bater as asas, daí aproveito o vento e uso meu planar! Economizo energia e fôlego para ficar mais rápido. – Sorriu o Pardal – Isso ajuda até na hora de capturar umas tanajuras!
- Ah Pardal, bem que você podia me trazer notícias de uns grãos que lancei no ultimo vendaval. Você voa tão rápido e passa em tantos lugares, bem que poderia me falar daquelas montanhas por detrás dos prédios... Quando eu fui plantada, lembro-me daquelas lindas muralhas verdes, onde se escondia o Sol-Poente... Que saudade! Agora, com esses prédios grandes, nem dá mais pra ver... Lancei minhas sementes ao vendaval e queria saber se elas vão nascer... – Suspirou a árvore melancolicamente.
- Ah sim! Pode deixar Árvore-Grande. Quando eu for até a montanha-verde, trarei notícias. Vou indo caçar mais insetos. Até mais! – E voou rumo às montanhas.
- Até. Despediu a Árvore-Grande enquanto o vento balançava seus galhos.
Logo, antes que o barulho dos carros ao meio-dia aumentasse, um casal de Pombos chegou reclamando da fumaça:
- (Cof, cof, cof) Oi Árvore-Grande? Tudo bem? – Disse um dos pombos em meio à tosse.
- Olá Pombo-Cinza, tudo bem. Está tossindo muito. O que aconteceu? Indagou a árvore.
- Acho que são esses carros... Aumentaram muito nos últimos anos (Cof, cof, cof!). Sai tanta fumaça de carro, caminhão e ônibus, que a gente que voa aqui embaixo, sofre com o ar poluído... Meu avô dizia que era melhor ir para o interior, mas lá nem tem tanta comida pra mim... Prefiro a cidade. Tem lixo de pão, bolo, papel de bala e um monte de coisa que o povo da cidade desperdiça... A gente faz a festa com o lixo da cidade, mas sofre com a poluição. Não é mesmo querida?
- É sim! A fumaça atrapalha muito, mas nossos amigos moram aqui... Acho que a gente não se adaptaria longe deles... A turma dos Pombos-do-Centro é a melhor opção pra gente... – Suspirou a Pomba-Branca.
- (Cof..Cof..Cof) Eu queria poder ser forte como você Arvore-Grande. Você nem passa mal aqui na rotatória. Como você aguenta essa barulhada de carro e fumaça? Indagou o Pombo-Cinza
- Ah, Pombo-Cinza... A gente precisa adaptar às circunstancias. Já tenho muitas responsabilidades aqui. Veja bem, graças a essa rotatória, eu ajudo a melhorar o ambiente dessa cidade cinza e barulhenta. Ao meio-dia, o sol está forte e dou sombra para as formigas, besouros, cupins e minhocas. Além disso, ajudo a refrescar o chão da rotatória e garantir uma melhor umidade no solo para as graminhas e para mim. Quando o Sol está prestes a se pôr, eu abrigo os pardais e rolinhas em meus galhos. Tem dia que até os humanos param por aqui para descansar... Tudo tem seu lugar...Se eu fosse escolher, com certeza queria umas companheiras iguais a mim plantadas aqui. Uma floresta seria algo maravilhoso para esse lugar.
- Nossa, Arvore-Grande! Eu pensava que você ficava só parada, mas você tem mais trabalho do que a gente, né Pomba-Branca?
- É sim! Arvore-Grande é muito resistente e útil. – Respondeu a pomba.
A árvore sorria para os pombos. Eles despediram-se:
- Vamos indo Árvore-Grande. Vamos voar para outro local em busca de algo para comer. Até logo.
- Até.
Os pombos foram embora. Com a buzina dos carros, o transito engarrafava e a árvore fitava um homem pedindo dinheiro perto do semáforo. Estava com roupas sujas. Parava de carro em carro pedindo algo. Eram ignorados por muitos. O pedinte reclamava e praguejava. Atenta a Árvore-Grande o observava. No projetar da sombra, e com o Sol do meio-dia o homem veio até a árvore e sentou-se debaixo dela:
- Ainda bem que essa arvore tá aqui. Sol tá rachando... Tá difícil demais. Ninguém quer dar esmola nessa cidade... Acho que vou ter que meter a fita mesmo. – Falou o homem enquanto tragava um cigarro.
A árvore no silencio fitava seu comportamento. Ela não entendia por que ele não fazia como o pardal e como os pombos e saia para caçar. Também não conseguia entender por que o homem tragava aquela fumaça nociva e tóxica, se o melhor mesmo era curtir a brisa e a sombra. Como boa árvore de cidade, ela permanecia quieta.



Recebido na manhã de 20 de maio de 2015.

Um comentário:

Jurandir Barbosa disse...

isso aí nobre poeta/irmão, texto belíssimo e muito bem construído.

grande abraço