SIETE
ASTROS
Potira
itapitanga.
His air in
my hair
Transformed
my
Anger in hunger
And I ate
my hate for your family.
Em português
A manhã já está muito quente quando o telefone toca. Ao atendê-lo olho
pela janela a linda sibipiruna florida à minha frente.
- Alô!
- Ranulfo? Tudo bem? Aqui é Roberci, está lembrado de mim? O irmão do
Rinaldo.
- Ah? Oi! Sim, estou lembrado. – Estranho uma ligação de quem tem quase
vinte anos que não tenho notícias. – Como encontrou o número de meu telefone?
- Olhei no catálogo.
- Ah! O que deseja?
- Tenho algo para te entregar. – Pausa de segundos – É do Rinaldo.
- Como ele está?
- É sobre isso que quero te falar... Onde a gente pode se encontrar?
Alguns segundos pensando e...
- Já ouviu falar do Sarau com Arak?
- Não!
- Bem... É uma vez por mês, na segunda segunda-feira, às 19:30h no Tuffik
Cozinha Árabe, bairro Novo Cruzeiro.
- Eu sei onde é. Bom restaurante... Podemos nos encontrar lá então no...
deixa-me ver o dia... nove de novembro?
Sete e meia eu chego e meia hora depois Roberci entra. Alto, forte,
cabelos pretos, pele entre o pardo e o branco. Levanto-me para cumprimentá-lo,
formalmente, e sentamo-nos, formalmente.
- Bem, Roberci, o que você queria me entregar do Rinaldo? E por que ele
mesmo não me trouxe? Onde está seu irmão?
- Ranulfo... Rinaldo está morto.
Acredito que você, que me lê, imagina que eu tenha ficado chocado. E
fiquei mesmo, mas acrescento que a mágoa pela longa ausência dele não ficou
calada... Quando ele sumiu eu fiz tudo para encontrá-lo.
- Morreu? De quê?
De olhos baixos, tira um envelope do bolso na camisa; segura-o alguns
segundos e finalmente me entrega.
- Leia!
Abro o envelope que não estava lacrado e
Campinas, 20 de junho
de 1987¹
Ranulfo,
Meu amigo, muitas
coisas se passaram, que ficaram na saudade... O tempo, parece, não é mais como
antes, o tempo agora voa rápido e sem destino.
Agora, realmente, não é
mais como era antes, tudo e todos nos separaram. Esta nova casa toda branca,
fria e gelada, com a morte ao meu lado, em um dos leitos.
Meu amigo, meu
confidente, como posso te revelar as dores e enfermidades a que estou
submetido? Nosso amor, nosso profundo amor, a nossa profunda amizade, tudo isso
ficou para trás, quando eles nos separaram.
Eles não, ela, essa
doença que além de destruir pouco a pouco, de consumir meu corpo pedaço a
pedaço, meu levou de ti.
Lembra-se daquela
noite? Daquela! A primeira vez que ficamos juntos, “para nunca mais nos
separarmos”, parecia tudo tão incrível... Afinal eu era noivo e apaixonado,
mas, depois daquela noite, nada mais me interessava. Eu que fora antes
completamente contra o homossexualismo, agora fazia parte desse grupo.
É como eu já disse,
tudo no passado são saudades, para o amor mesmo entre dois homens o que não
falta é coragem, mas uma coragem é uma vontade enorme de viver. E agora? Como
posso te amar, te querer, como posso ter coragem se não há mais vida para
viver? (Ponto final...)
Rinaldo.
Enquanto lia, o sarau foi ficando cada vez mais animado. Um músico, um
contador de histórias, uma poeta, um ator, um contador de causos e alguns consumidores
de arte e cultura.
- Por quê? – Olho para Roberci com raiva e ele mantém os olhos baixos. –
Por que só agora você me entrega isso?
- Que importa o porquê. Ele já está morto e você continua vivo. – “Eu
pensava em você naquela época”; pensa, mas como nada diz Ranulfo não fica
sabendo. – Aliás, você não deixou sua vida nem por causa dele...
- Não se atreva! Não se atreva a tentar culpar-me por seus erros.
- Meus erros? Os viados aqui são vocês! O erro é dos dois que não têm respeito
pelas famílias.
- Não respeitamos famílias? Nós iríamos formar uma! Você! Você e seus
pais é que foram contra as famílias.
- Olha! Só vim trazer isso.
- Por quê?
Sem entender a pergunta, Roberci me olha e meus olhos lhe dizem.
- Meu pai morreu dois anos atrás e mês passado mamãe também se foi.
Mexendo nas coisas dela encontrei a carta. Quando Rinaldo a escreveu e me
entregou para lhe enviar mostrei ao pai. Ele a confiscou e acabei me
esquecendo. – Meu coração se espanta por ele se esquecer, por não dar
importância ao sentimento alheio; mas meu cérebro não se surpreende; e eu
lamento. Roberci, que não tinha parado de falar enquanto eu refletia, continua:
E desde então minhas mãos ficaram ardendo... Eu tinha que te entregar.
Nesse instante, em uma mesa próxima, Geisa se levanta e recita o poema A
Flor de Maracujá, de Catulo da Paixão Cearense. “(...) I o sangue de Jesus
Cristo, / Sangue pisado de dô, / Nus pé du maracujá, / Tingia todas as frô, / Eis
aqui seu moço, / A estória que eu vi contá, / A razão proque nasce branca i
roxa, / A frô do maracujá”.
Depois que ela fala dou um gole no “caipiarak” e Roberci, bebericando uma
cerveja, me diz: “Antes tarde do que nunca”. – Eu somente lhe olho.
- Aqui está o Deserto Verdejante, também conhecido por charuto árabe, que
pediu. – Fabiola me fala enquanto deposita o prato na mesa. Agradeço e quando
ela se vai:
- Roberci, agradeço sinceramente por, como você disse, “antes tarde do
que nunca” me entregar o que é meu por direito. Mas alguns amigos meus estão
chegando e não quero mais você aqui. Pode deixar que eu pago a conta.
Ele me olha e eu a ele. Levanta-se e sai. Com ele já na porta, Vinicius
Siman com Mateus, seu amigo, e Jeferson Adriano com Franquilaine, sua namorada,
assentam-se em minha mesa.
- Quem era? – Vinicius pergunta.
- Ninguém que vale a pena. Vamos, comam comigo. Deve estar uma delícia.
- Como o céu está bonito. – Diz Franquilaine e Mateus sorri.
- Está de pintar o sete... – Completa Jeferson.
Pela imensa janela vemos à direta da lua minguante uma linha reta
descendente: uma estrela, Vênus e outra estrela; à sua esquerda, compondo uma
linha reta íngreme e descendente, duas estrelas e junto a última delas,
paralela à lua, outra estrela. Sete astros formaram um sete branco no mais
escuro e lindo céu. Enquanto isso, na rua e alheio a tudo que não seja ele, Roberci
se lembra dele sozinho no quarto enquanto os três eram jovens. Mas Ranulfo não conhece
seus pensamentos. Mas, eu e você, sabemos!
En español
La mañana ya está calorosísima
cuando el teléfono suena. Mientras lo contesto miro por la ventana la linda caoba
florida a mí frente y me recuerdo de Elsa Mariposa, la médica de Cuba.
- ¿Hola?
- ¿Ranulfo? ¿Cómo estás?
Quién te hablas es Roberci, ¿recuerdas de mí? El hermano de Rinaldo.
- ¿Ah? ¡Hola! Sí,
recuerdo quien seas. – Extraño la ligación de quien no tengo noticias hay casi
veinte años. – ¿Cómo encontró el número de mi teléfono?
- Procuré en la guía
telefónica.
- ¡Ah! ¿Qué deseas?
- Tengo algo para
entregarte. – Pausa de segundos – Es de Rinaldo.
- ¿Cómo él está?
- Es sobre eso que
quiero hablarte… ¿Dónde podemos encontrarnos?
Algunos segundos
pensando y…
- ¿Ya has escuchado
hablar del Sarao con Arak?
- ¡No!
- Bien… Es una vez por
mes, en el segundo lunes, a las siete y media de la noche en el Tuffik Cocina
Árabe, barrio Novo Cruzeiro.
- Sé dónde se queda.
Bueno restaurante… Podemos encontrarnos allá entonces. Déjame ver el día… Nueve
de noviembre, ¿puedes ser?
Siete y media yo llego y
a las ocho en punto Roberci entra. Largo, fuerte, pelos negros, piel entre el
pardo y el blanco. Me levanto para saludarlo, formalmente, y nos sentamos,
formalmente.
- Oyes, Roberci, ¿qué
querías entregarme de Rinaldo? ¿Y por qué él mismo no me troje? ¿Dónde está tu
hermano?
- Ranulfo… Rinaldo está
muerto.
Creo que vos, que me leés,
imagina que me quedé chocado. Y me quedé mismo, pero acreciento que el disgusto
por la larga ausencia de él no se quedó callada… Cuando él desapareció empeñé
todas mis fuerzas para encontrarlo. Esforcé mucho, pero fue en vano.
- ¿Murió? ¿De qué?
Saca un sobre del
bolsillo de camisa; lo mantiene algunos segundos delante sus ojos bajos y
finalmente entrégamelo.
- ¡Lee!
Abro el sobre que no
estaba lacrado y
Campinas,
20 de junio de 1987¹
Ranulfo,
Mi amigo, muchas cosas se pasaron, pero nunca las olvidé… ¡Jamás! El
tiempo, parece, no es más como antes, el tiempo ahora vuela rápido y sin
destino.
Ahora, realmente, no es más como era antes, todo y todos nos separaron.
Esta nueva casa toda blanca, fría y helada, con la muerte a mi lado, en uno de
los lechos.
Mi amigo, mi confidente, ¿cómo puedo revelarte los dolores y
enfermedades a que estoy sometido? Nuestro amor, nuestro profundo amor, nuestra
profunda amistad, todo eso se ha quedado atrás, cuando ellos nos separaron.
Ellos no, ella, esa enfermedad que no solamente devora poco a poco,
trozo a trozo, mi cuerpo, me llevó de ti.
¿Recuerdas de aquella noche? ¡De aquella! La primera vez que nos
quedamos juntos, “para nunca más separarnos”, parecía todo tan increíble… No
podemos olvidar que yo era comprometido y apasionado, sin embargo, después de
aquella noche, nada más me interesaba. Yo que fuera antes completamente contra
el homosexualismo, ahora hacía parte de ese grupo.
Es como ya dije, no olvido del pasado, para el amor mismo entre dos
hombres lo que no falta es coraje, pero un coraje es una voluntad enorme de
vivir. ¿Y ahora? ¿Cómo puedo amarte, quererte, cómo puedo tener coraje si no
hay más vida para vivir? (punto final…)
Rinaldo.
Mientras leía, el sarao
fue quedando cada vez más animado. Un actor, dos contadores de historias, tres cantantes,
cuatro poetas y algunos consumidores de arte y cultura.
- ¿Por qué? – Miro
Roberci con rabia y él mantiene los ojos bajos. - ¿Por qué solamente ahora me
entregas eso?
- Que importa la causa. Él
ya está muerto y tú continúas vivo. – “Yo cavilaba en tú en aquella época”; piensa,
pero como nada dice Ranulfo se queda sin saber. – En verdad, no dejaste tu vida
ni por causa de él…
- ¡No se atreva! No se
atreva a intentar culparme por tus errores.
- ¿Mis errores? ¡Los
maricones son vosotros! El error es de los dos que no tienen respeto por las
familias.
- ¿No respetamos
familias? ¡Iríamos formar una! ¡Tú! Tú y tus padres es que fueron y están
todavía en contra las familias.
- ¡Mira! Solamente he
venido traer eso.
- ¿Por qué?
Sin comprender la
pregunta, Roberci me mira y mis ojos lo dicen.
- Mi padre se murió dos
años atrás y mes pasado madrecita también se ha ido. Meciendo en las cosas de
ella encontré la carta. Cuando Rinaldo la escribió y me entregó para enviarte
mostré al papá. Él la confiscó y sin percibí olvidé de ella. – Mi corazón se
espanta por él olvidar, por no tener ningún respeto al sentimiento ajeno; pero,
mi cerebro no se sorprende; y lamento. Roberci, que no interrumpió tu habla
mientras yo reflexionaba, continúa: Y desde entonces mis manos se quedaron
ardiendo… Yo tenía que entregarte.
En ese momento, de una
mesa cercana, Geisa se levanta y recita el poema La Flor de Maracuyá, de Catulo
da Paixão Cearense¹. “(…) Y el sangre de Jesucristo, / Sangre pisado de dolor,
/ En la planta de maracuyá, / Teñía todas las flores, / Mire, muchacho, / La
historia que he visto contar, / La razón porque nace blanca y violeta. / La
flor de maracuyá”.
Después que ella habló bebí un
poco de “caipiarak” y Roberci, bebiendo una cerveza, dice: “Mejor tarde que
nunca”. – Solamente lo miro.
- Aquí está el Deserto
Verdeante que pidieron. – Fabiola charla mientras deposita el plato en la mesa.
Agradezco y cuando ella se va:
- Roberci, agradezco
sinceramente por, como dices, “mejor tarde que nunca” entregarme lo que me
pertenece, lo que es mío por derecho. Pero, algunos amigos míos están llegando
y no te quiero más aquí. No se preocupe, yo pago la cuenta.
- Él me mira y yo a él.
Se levanta y sale. Con él ya en la puerta, Vinicius Siman con Mateus, su amigo,
y Jeferson Adriano con Franquilaine, su novia, se asientan en mi mesa.
- ¿Quién era? – Vinicius
pregunta.
- Nadie que vale la
pena. Vamos, coman conmigo. Creo que esté exquisito.
- Cómo el cielo está
bonito. – Habla Franquilaine.
- ¡Verdad! Hay un siente
dibujado en el cielo. – Charla Jeferson.
- ¿Andará el diablo
suelto o estará él sacando los pies del zapato? – Charla Mateus mientras sonreímos
todos.
Por el ventanal vemos a
la derecha de la luna menguante una línea recta descendiente: una estrella,
Venus y otra estrella; a su izquierda, componiendo una escarpada línea recta y
descendiente, dos estrellas y junto a la última de ellas, paralela a la luna,
otra estrella. Siete astros dibujaron un siete blanco en el más oscuro y bello
cielo. Mientras eso, en la calle y ajeno a todo que no sea él, Roberci se
recuerda de él solo en su habitación mientras los tres eran jóvenes. Pero,
Ranulfo no conoce sus pensamientos. Sin embargo, tú y yo, ¡sabemos!
Ofereço aos aniversariantes
André Brytto, Izabela Azevedo, Eduardo R.L. Toledo, Jaeder
T. Gomes, Luciana Laris e Isac Silva.
Recomendo a leitura de “Presença”, de Bispo Filho:
Diquinha de português:
O uso de “a gente” nos verbos³
Para facilitar a compreensão
dividamos o português brasileiro em três: Português Padrão Oficial, Português
Não padrão e Português Padrão Coloquial. O primeiro (PPO) é a gramática
normativa ao pé da letra. O segundo (PNP) é o português falado pela grande
maioria da população. E o terceiro (PPC) é, em palavras minhas (Rubem Leite), a
mistura dos dois primeiros; portanto, o mais belo dos três.
“O português não padrão é
uma língua ‘enxuta’, que evita as redundâncias, o excesso de marcas para
indicar um único fenômeno. (...) No caso dos verbos, ao que parece, basta a
presença do pronome-sujeito para indicar a pessoa verbal”.
Vejamos um exemplo através
da conjugação do verbo amar no presente do indicativo:
1- Português Padrão Oficial:
eu AMO, tu AMAS, ele/ela AMA, nós AMAMOS, vós AMAIS, eles/elas AMAM.
2- Português Não Padrão: eu
AMO, tu/você/ele(a)/nós/a gente/vocês/eles(as) AMA.
3- Português Padrão
Coloquial: eu AMO, você/ele(a)/a gente AMA, vocês/eles(as) AMAM.
A redução das seis formas
verbais do PPO para duas do PNP ou três do PPC incomoda muita gente porque
estamos acostumados a crer que o esquema do primeiro é um retrato fiel da forma
latina, portanto, “sinal de elite, de qualidade”. Mas não se pode dizer que
nenhuma das três variações do português esteja errada, mas as duas mais aceitas
são o PPO e o PPC.
Assim, para os meios
acadêmicos recomendo a utilização da primeira; em casa e com amigos, utilizem a
que mais lhe for confortável, a segunda por exemplo; e em conversas mais
formais não se acanhem em utilizar a terceira variação.
Potira itapitanga são duas palavras que vem do tupi e
significam “flor” e “pedra vermelha” (rubi). É meu desejo que cada leitor
encontre em meus textos flores e pedras preciosas.
¹ AMARAL, Emília; ANTÔNIO, Severino; PATROCÍNIO, Mauro
Ferreira do. Português: redação,
gramática, literatura, interpretação de texto. São Paulo: Círculo do Livro,
1999. P. 14 e 15. Exceto o nome do destinatário. Tradução livre para o
espanhol.
² La Flor
de Maracuyá es un poema de Catulo da Paixão Cearense, un poeta, músico y
compositor brasileño. Su obra más famosa es Luar do Sertão. La estrofa en el
croento es una traducción libre de Rubem Leite.
³ BAGNO, Marcos. A
Língua de Eulália. Editora Contexto. Páginas 61, 62, 64 e 65.
Escrito entre os dias 22 de outubro e 09 de novembro de
2015.
Nenhum comentário:
Postar um comentário