LA LLUVIA Y LA
VIDA
Quando um homem não valoriza o que faz, acaba não se
valorizando. Quando um homem diminuiu o seu valor, acaba diminuindo o valor de
sua vida. Quando a vida perde o valor, que sentido há em vivê-la?
(KONDO, 2015)
Em português
O domingo está chuvoso, mas ainda assim o Feirarte
aconteceu; capengando, mas teve.
- Na rua, sapatos velhos jogados entre galhos secos e
o pó preto da fábrica. Na rua, gente se joga na sujeira que se fabrica. Da rua,
ninguém por eles briga. Na rua, sapatos velhos, gente viciada, ninguém e
pó-bre-pre-to.
Declama Uque, um dos quatro hippies que conheci. E
Igor, o único novinho deles, diz:
- Somos tronco e membros... Mas onde está a cabeça?
- Onde? Não quem é a cabeça?
- O que eu disse, disse!
Nauhlm (pronuncia-se algo anasalado: Naulm), o mais
velho e mais filosófico dos quatro, proclama que somos seres tríplices; tudo é
tríplice. Ou seja, universo, galáxia e sistema solar; ou planeta, continente e
país; ou país, estado e cidade; ou manhã, tarde e noite; ou corpo, mente e
espirito; ou vida, desejo e morte; ou pai, mãe e filho; humanidade, sociedade/comunidade
e família; ou...
Enquanto isso tudo acontece, Lobo fica calado. Só
ouvindo, observando e no celular. Então eu disse:
- Donga, desconhecido como Ernesto dos Santos, mas é
reconhecido como o autor, junto com Mauro de Almeida, de “Pelo Telefone”. O
tango foi registrado em 27 de novembro de 1916 e é considerado pela Biblioteca
Nacional do Brasil como o primeiro samba. É engraçado que a letra original
sofreu uma paródia falando da tolerância da polícia em relação aos cassinos; e
esta acabou prevalecendo em detrimento daquela.
- 27 de novembro? Então poucas semanas atrás fez um
século... Mas... O que interessa isso? – Falou com o tato que a sociedade tem
para o povo.
- Fabrico vidas falsas / Sou, portanto, criatura
malsã, / Minhas personagens não existem / Por isso há quem se mantém.
- Que valor você tem? – Diz com seus ouvidos moucos
ao poema.
- O meu. Apenas o meu.
- Nenhum, então.
- É bem possível. Ou talvez eu seja uma história de
André Kondo.
- Nunca ouvi falar.
- Surpreenderia-me se o conhecesse.
A música não me agrada, a conversa é interessante e –
delícia! – a chuva ainda cai.
En español
El
domingo está lluvioso, pero ni mismo así el Feirarte se quedó vacío; tuerto,
pero ocurrió.
- En
la calle, zapatos viejos lanzados entre ramas secas y el podrido polvo de la
fábrica. En la calle, gente se lanza en la suciedad que se fabrica. De la
calle, nadie por ellos pelean. En la calle, zapatos viejos, gente viciada,
nadie y el podrido-pueblo-polvo…
Declama
Uque, uno de los cuatro hippies que conocí. E Igor, el único menudo de ellos,
dijo:
- Somos
tronco y miembros… Pero, ¿a dónde se queda la cabeza?
-
¿Dónde se queda? ¿No quién es la cabeza?
-
Que dije, ¡dije!
Nauhlm
(se pronuncia algo nasalizado: Nauln), lo mayor y más filosófico de los cuatro,
proclama que somos seres tríplices; todo es tríplice. O sea, universo, galaxia
y sistema solar; o planeta, continente y país; o país, departamento/provincia y
ciudad; o mañana, tarde y noche; o cuerpo, mente y espíritu; o vida, deseo y
muerte; o padre, madre e hijo; o humanidad, sociedad/comunidad y familia; o…
Mientras
todo eso ocurre, Lobo se queda callado. Solo escuchando, observando y en el
móvil. Entonces dije:
- Donga,
desconocido como Ernesto dos Santos, pero es reconocido como autor, junto a
Mauro de Almeida, de “Pelo Telefone”, “por el teléfono” en español. El tango
fue registrado en veintisiete de noviembre de mil novecientos dieciséis y es
considerado por la Biblioteca Nacional de Brasil como el primer samba. Una cosa
divertida a saber es que la letra original sufrió una parodia hablando de la
tolerancia de la policía en relación a los casinos; y esta se prevaleció en
detrimento de aquella.
- ¿27
de noviembre? Entonces pocas semanas pasadas la canción completó un siglo…
Pero… ¿Qué nos interesa eso? – Habló con el tacto que la sociedad tiene para el
pueblo.
-
Fabrico vidas falsas / Soy, por lo tanto, criatura malsana, / Mis personajes no
existen / Por eso hay quien se mantiene.
- ¿Qué
valor tienes? – Dijo con sus oídos sordos al poema.
- El
mío. Solamente el mío.
- Ningún, entonces.
- Es
bien posible. O tal vez yo sea una historia del brasileño André Kondo.
-
Nunca he oído hablar de él.
- Me
sorprendería si lo conociese.
La
música no me gusta, la charla es interesante y – ¡delicia! – la lluvia aún cae.
Ofereço como presente aos aniversariantes
Mikael V. Zeleke, Ione Dumont, Lenilson Fonsêca, Patricia
Rodrigues, Heloisa Davino, Martínez John, Dado Aragon, Renata Sousa, Lucas
Alvisi, Kemilly Almeida, Marilene Tuler, Aninha Pjl, Fábio S. Rodrigues, Mila
Eduarda, Gerci Santos, Thaylyny Emanuela, Drika Nunes e Jamille Amaro.
Recomendo a leitura de “Em tempos de golpe, a importância
de assistir ‘3%’”, de Vinícius Siman; “Ruim Bão”, deste que vos fala; “Uma
Feliz Coincidência”, de Sued; “Los Condenados de la tierra. Frantiz Fanon”, de
Javier Villanueva; e “Ferreira Gular”, de Rosa da Serra.
KONDO, André. Contos
do Sol Renascente. Jundiaí: Telucazu Edições, 2015. Página 30.
Escrito entre 27 de novembro e 12 de dezembro de 2016.
Um comentário:
Caro Rubem, honrado com a citação. Obrigado!
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