domingo, 5 de dezembro de 2021

DIVINO E SAGRADO

 

Se eu quiser falar com Deus

Tenho que ficar a sós

Tenho que apagar a luz

Tenho que calar a voz.

Tenho que dizer adeus

Das as costas, caminhar

Decidido, pela estrada

Que ao findar vai dar em nada

Nada, nada, nada, nada...

Do que eu pensava encontrar.


Como eu não sei rezar

Só queria mostrar

Meu olhar, meu olhar, meu olhar.

 

O vídeo com minha leitura do cronto está no canal aRTISTA aRTEIRO, no youtube:

https://www.youtube.com/watch?v=RpYvtBQLUVY

 

Mais um domingo. Depois deste haverá mais três antes de 2022. É domingo e ainda tenho que levantar-me para mais um dia, provavelmente para mais uma semana inteira. Possivelmente viverei os outros domingos e adentrarei no novo ano. O último ano de destruição do Brasil.

Saí da cama para urinar, lavar o rosto, por água para ferver, arrumar onde dormi, passar o café, fazer minha prece matinal e continuar o dia até dormir outra vez.

Quase sete e meia fui comprar desodorante e pão. No jardim umas flores roxas baixo sol forte no céu seminu. Quis tirar uma foto, mas foto da natureza fica melhor quando nublado.

No caminho vejo quatro pessoas. Um velho com andador e talvez seu filho o ajudando a entrar num carro. Enquanto passo por duas senhoras. Uma diz para a outra “Nosso Deus é poderoso” e a que ouve diz para o velhinho “Nosso Deus é tremendo”. Escuto quatro vozes: Aleluia!

Entristeço-me! “Nosso Deus?!?”. Acaso há outros? O que tem é um só Deus com nomes distintos. Feito eu: uma só pessoa que pode ser chamada de Benito, ou Professor, ou Poeta e outras formas que também já ouvi e algumas atendi.

Porque razão as pessoas insistem tanto em conservar seus preconceitos; raramente mudando seus conceitos.

Sim, eu sei. Mudar os conceitos implica dizer que esteve errado toda a sua vida pregressa. Eu, que tenho tantos medos, não sou covarde. Mudo de ideia com quase facilidade; mostre-me um novo melhor. Talvez resista, mas penso, logo filosofo e em seguida poetizo meu novo eu. 

Finalmente em casa e as nuvens vestem o céu. Agora sim fotografo a flor ouvindo canários, galos, bem-te-vis e vendo o voo de pássaros.

Mas meu cérebro não se cala. Ai, quantas e quantas pessoas pensam que o “Céu” será conforme seus ideais e crenças. Mas Deus é imensurável para um e outro defini-lO. O Paraíso – ou como o nomeia – não é budista, judaico, cristão, islâmico, umbanda, candomblé, desta, dessa ou daquela; não meu, seu, de alguém ou aquém. É de Deus. E só.

Meu cérebro fala consigo quando minha língua se guarda. Ao falar comigo crio a voz que me explica um pouco da verdade. Mas sempre um pouco; nunca muito e menos ainda o tudo.

Fecho os olhos e vejo as flores. Tampo os ouvidos e ouço as aves. Paro meu corpo e voo como pássaro. Quando meu coração parar no fim de minha estrada não sei se serei flor, pássaro, pedra, grilo, vento, nuvem, sol, estrela, silêncio, som. Serei o que tiver que ser: o tudo ou o nada.

Flores, canto e voo de pássaros; algo que valha, senão a semana, pelo menos o dia.

 

 

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO. É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”. Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens: foto do autor.

Músicas:

Se eu quiser falar com Deus, de Gilberto Gil;

Romaria, de Renato Teixeira.


Escrito e pensado na manhã de 05 de dezembro de 2021.

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