segunda-feira, 12 de março de 2012

LUMENS

Obax anafisa.

Fiz um aviãozinho de papel higiênico

E o uso para marcar as páginas de um livro

Que ao lerem

– minhas palavras, não o livro –

Alguns tantos se chocarão

“Diz com o gesto que o livro é o que se limpa e joga fora”

Calo-me

O que eu disser será usado contra mim

Não importa o que digo

O que faço

Tudo é laço para meu cadafalso

Só me importa:

No aviãozinho de papel higiênico

Voei por entre os ditos

Pousei entre os não ditos

Em tudo ali escrito.


Ofereço como presente de aniversário à

Lene Teixeira, Elisângela A. Santana, Maison F. Viana, Elton da Costa, Darone Chagas.

Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. O texto é minhas flores para você e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.

Escrito entre 16 de fevereiro e 12 de março de 2012.

Versos inspirado no livro

“Lumens, em prosa e verso”, organizado por Andréia Donadon Leal

Mariana: Aldrava Letras e Artes, 2011. 1ª edição.

segunda-feira, 5 de março de 2012

NADA CONTRA, DESDE QUE DISTANTE

Obax anafisa.

- Oi, meu anjo! Meu amigo B me disse via email “estamos recebendo livros do Governo Federal pela Biblioteca Nacional, temos que escolher alguns autores, você sugere algum?”. Você é um dos que pensei. Que tal procurá-lo no facebook? Poderá encontrá-lo pelo nome JTB.

- Meu anjo? Que merda, caralho! Então, muito obrigado. Se for o caso de eu ter que dar o livro, não tenho condições no momento. Agora eu não curto ser cantado por homens, na boa. Fica o recado. Às vezes, por ser educado com todos, porque realmente sou, aproveitam-se da chance para darem cantadas. Sou totalmente contra homofobia, mas isso não quer dizer que eu curta cantadas de homens. Mas não se preocupe, viu. Não é por isso que deixaremos de ser amigos.

Momentos de raiva. Depois, quase autocontrole e

- Cara, quatro coisas: 1- Não é de graça o livro. É comprado. Entre em contato com o B se quiser e se informe. 2- Desculpe! Mas você é lesado. De minha parte não te cantei mesmo. De onde você tirou isso? Anjo é apenas algo educado de ser falar. Como mandei a mesma mensagem para meus amigos escritores e para não ter que escrever para cada um em separado usei um termo que serve para homens e mulheres. 3- Se se sentir incomodado comigo é muito simples, retire-me de seus contatos. As pessoas que aceitei ou convidei foram porque achei interessante (e como parece que para você tudo tem ligação com sexo, interessante, no caso, é artístico), mas não esmolo companhia. Sinta-se a vontade para me excluir. Aliás, pode deixar que eu mesmo te excluo de meus contatos. 4- Você é preconceituoso sim. É do tipo que décadas atrás falaria “Não tenho nada contra preto”. Desde que na sua família seja apenas empregado, claro.

- Benito, se certas pessoas me chamarem de anjo, entenderei como metáfora ou brincadeira. Há pessoas e pessoas, e não quero dizer que você é isso ou aquilo, isso o tempo dirá. Por não te conhecer “a fundo” acho sim uma cantada. E o recado foi dado. Não excluo ninguém, só fui contundente no meu ponto de vista. E você ainda está me devendo o meu livro. Fora isso, você é um cara aparentemente bacana. E creio que temos de somar, não de sumir; e respeitarmos os posicionamentos sexuais de ambas as partes.

- Você é contraditório.

- O que sei é que por acreditar em sua palavra, levei um calote. Vinte reais não matam ninguém, mas fará falta no momento. Não ganho com meus livros, apenas não tenho prejuízo.

- Se até hoje não tinha te pago é porque nas três vezes que lhe pedi o número da conta você não me enviou. Mas como não gosto de dívida, mandei via correio o dinheiro. Adeus!

- Não seja tão impulsivo, isso não leva a nada. Noves fora, quando quiser me adicione, sem problemas.

- Não, obrigado! Não vale a pena nos contatarmos mais. Não me arrependo de cortar relações com quem se sente ofendido com cantadas... Principalmente quando não são dadas.

Momentos de raiva e, depois, autocontrole. Então penso

Espera aí! Não decidi viver segundo o princípio do relógio do sol? Registrando apenas as horas que o sol brilha? Vou permiti então que qualquer um faça de mim o que quiser? Não! De que adianta ficar pensando nas perdas ou ofensas se tem coisa melhor para ver e pensar? Jogo fora o bagaço e conservo apenas o bom sabor, as vitaminas da laranja. Se um ladrão tentasse entrar em minha casa eu o expulsaria mesmo que quisesse levar apenas um par de tênis. Então vou expulsar o ladrão da felicidade: as más lembranças. Que lembrança agradável tenho de tal pessoa? Seus poemas! Seu livro é bom. É isso que registrarei: o poeta.


Ofereço como presente de aniversário à

Carol Magalhães, Emersom Franklin, Átila F. Silva, Marco A. Parisotto, Lúcia Ramos e Thiago Vaz.

Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas. O texto é minhas flores para você e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.

Escrito entre 27 de janeiro e 05 de março de 2012.

Para saber sobre o princípio do relógio do sol veja a revista Seicho-No-Ie, edição especial, páginas 21-24 – Masaharu Taniguchi.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

BEIJO NO ASFALTO

Obax anafisa.


É o cimento, é o asfalto. São os transeuntes, os ciclistas, as motos, os carros. São os cachorros abandonados, os drogados, as prostitutas, os prostitutos. É a nuvem no céu, o vento nas árvores, o barulho da Usiminas. São suas fumaças.

Da árvore pelo vento a semente no asfalto. Há semente na calçada. Da fumaça, corrosão concreta as abstrações. Da nuvem, gotas.

Cimento da calçada. Semente. Gente indigente. Gente inteligente, potente.

E o cimento, a semente, gente, gota.

Cimento resistente. Semente persistente. Gente inocente. Gota corrente.

Gente corrompida passa pelo cimento rompido e o grão morrido.

Grão morrido igual germinado.

Passos e o broto no buraco entre cimento e asfalto.

Crescimento do broto bruto entre as drogas, os puros e os putos.

Delicada flor lilás

E eu.


Ofereço como presente de aniversário à

Josiane Hungria, Cidinha Prado e Diego Hemetrio.

Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas.
O texto é minhas flores para você

e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.

Escrito entre 16 e 27 de fevereiro de 2012.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Rosa - Grupo do Pixinguinha (1917)

Para o casal Frei e todos os meus amigos músicos

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

SEM DIÁLOGO CEM CONVERSA

Obax anafisa.

- Do que podemos conversar?

- Podíamos falar do que lhe aconteceu, Benito!

- O quê?

- Que você é bailarino.

- É... Eu sou um artista da dança e não sabia. Senti a picada de uma abelha sádica e psicopata e fiz uma grande apresentação de balé clássico em plena avenida. E com direito a aplausos e tudo.

- Rarrarrá! Rarrarrá!

Não falo mais nada. E me perco em meus pensamentos.

- Benito!

Olho para frente e depois para onde veio a voz. Lóri! Atravesso a rua, não sei porque, e lhe ofereço do petisco que como. Eu sorri? Acho que não. Senti a cara dura. Nem triste, nem alegre. Não senti nada. O costume de gentileza me moveu.

- Vai para a casa, Benito?

- Vou!

Paramos numa esquina e lhe pergunto se seguirá pela rua que corta onde estamos.

- Sim!

Então me afasto despedindo com a cara firme. Nem triste, nem alegre, nem nada.

- Bê! Você está me escutando?

- Claro! Podíamos falar da minha vontade de dar uma de Greta Garbo e não ver ninguém, Benta.

- Isso é estranho. Você é o único homem que conheço que não gosta de sair. Que prefere ficar em casa.

Apenas lhe olho.

- Isso não é... muito coisa de... homem.

Não é coisa de homem... Devo dizer que isso me irritou? Como assim não sou homem?

- Acho que não estou rico porque se tivesse, penso, não iria ver ninguém nem recebê-los. Assim não aprenderia tanto como acontece ao conviver com outros.

- Benito! – Benta continua a falar sem se aperceber que não mais a ouvia. E por falar em ouvir... perco-me numa discussão que tive sobre educação:

- Não entendi o texto... Os alunos houvem ou ouvem? – Pergunta Gina Cava.

- Com “h” é do verbo haver. – Interfiro. – Então “os alunos houvem”, com h, não tem sentido. Com “o” é do verbo ouvir “os alunos ouvem”, a frase tem sentido.

- A carência de educação se revela até na minha capacidade de “houvir”. – E ri D. Laerte.

- Benito! Eu entendo o sentido da frase. Até porque falo português há, com h, exatamente quarenta e um anos. O suficiente para ter aprendido a diferença entre (h)ouve, com h ou com o.

- O que esperar de um país onde escritores escrevem houvir com h e ninguém iscuta? – D. Laerte continua rindo mordaz.

- Como professor de português, fica difícil para mim não interferir. Sou professor de português, mas enfrento uma barra porque deixo claro para meus alunos que não falamos português. Isso foi uma ideia de pomba descerebrada do Marquês de Pombal... Se o Brasil fala português, Portugal fala latim.

- Benito! Difícil para “mim” não interferir? “Mim” conjuga verbo?

- Viu? O Brasil não fala português. – Respondo bem humorado.

- O Brasil fala brasilês e escreve muito bem do jeito que fala. – Proclama D. Laerte. – A Língua é viva e desconhece normas. Quem gosta destas são os gramáticos, que cumprem sua função cientificista, mas não tem o poder de interferir no atributo humano da “expressão”. Por isso digo, “agente iscreve, iscreve, e cada um ler da meneira que quer...”

- Mas o que importa, gente! É que a situação é caótica, talvez não nas mínimas ações. – Vaticina F. Rei. – Mínimas não no sentido da iniciativa em si, que é grandiosa e nobre, mas no sentido em que as autoridades (in)competentes são inertes. Não preparam adequadamente os professores, não respeitam o cidadão. Até dão comida para o povo, mas não alimentam a alma.

- BENITO!

Benta me traz de volta para suas conversas intermináveis.

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Ofereço como presente de aniversário à

Juan Fiorini, Alessandra Cássia, Renato Fraternidade, Therezinha Armani, Edílson Mendes, Alberto Carvalho, Alex de Sá, Christine Sathler, Helena L. Lopes.

Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas.
O texto é minhas flores para você

e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.

Escrito entre 13 e 20 de fevereiro de 2012.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

SOMOS FILHOS DA MÃE

Obax anafisa.


- Você é filho de...

Olho curioso para a funcionária do posto de saúde.

- Sua mãe é... Ah! Deixa pra lá.

- De quem?

- De ninguém. Pode deixar.

- Rarrá! Sou filho de alguém. – Rindo digo e rindo ela concorda. – Preciso de um atestado declarando que estou apto a lecionar. – Pequena pausa. – Se bem que acho que o atestado deveria ser de psicólogo... Cuidar de alunos não é fácil.

A jovem sentada vira rápido o tronco e diz olhando para mim

- Podemos marcar consulta para psicólogo.

Eu estranho a expressão dela, mas não captei ou entendi o que quis dizer. Então falei rindo: Não! Foi pedido clínico geral então é o que devo levar.

A funcionária mexe no computador, acha meu nome. Vejo e, junto, o nome de minha progenitora.

- Eis minha mãe.

- Pois é como pensei. Posso marcar a consulta para seu psiquiatra para amanhã.

- Meu psiquiatra?

Confuso por alguns segundos, mas clareando minha consciência penso que ela me confundiu com meu irmão. E penso “Devo ter cara de doido mesmo. Rarrá! Ser artista é padecer no paraíso...”. Talvez esteja chocado por parecer que chamei meu irmão de doido. Ou pode ser que nem tenha se tocado. De qualquer forma, não me expressei pejorativamente. Pois meu irmão precisa de psiquiatra, mas se tem um doido em casa sou eu. Rarrá!

Também me sinto curioso para saber de onde ela me conhece para pensar que eu era meu irmão. Eu e ele pouco nos parecemos. Mas não me empenho em descobrir. Rindo, digo que ela deve estar nos confundindo.

A menina me olha espantada. Pensa alguns segundos e pergunta para confirmar se somos filhos da mesma mulher. Confirmo rindo “Somos mesmo filhos da mãe”.

Marca para o dia seguinte a consulta que pedi e pergunta se pode marcar para meu irmão também, porque, segundo o prontuário, já está na época de nova consulta.

Vou para casa. Volto com minha mãe e irmão no dia seguinte. O médico me atende. Ao saber que queria atestado médico confirmando minha aptidão para lecionar fica uma fera. Se acalma ao me ver tranqüilo. – Estou realmente numa semana boa. – “Não entendo o Governo Estadual. Já faz duas décadas que é proibido esse tipo de atestado. Tem que ser por médico do trabalho. Como posso atestar sua aptidão se não foi feito nenhum exame? O máximo que posso fazer é dizer que você ‘não apresenta sinais evidentes de moléstia infecto-contagiosa, alteração mental ou dos órgãos dos sentidos’. Não faço os exames necessários porque, apesar de eu ser também médico trabalhista, aqui no posto sou pago como clínico geral”.

Não lhe digo o que penso. Que se ele é médico do trabalho por que não poderia fazer os exames? São tantas as burocracias que nem vale a pena. Sinta-se à vontade para entender como puder o meu silêncio. E para comentar comigo também.


Ofereço como presente de aniversário à

Luciano S. Brska, Edson Rossatto, Wellington P. Santos, Janeth Arrebola.

Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas.
O texto é minhas flores para você

e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.

Escrito entre 07 e 13 de fevereiro de 2012.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

HISTORIETAS

Obax anafisa.


“Dar a cada banalidade

o destino de cada dor”.

(Domingues)¹


1

Joaquim se aproxima de Antônio que olha para a loja de comida natural. Segundos depois chega Manuel vindo da 28 de Abril e lhes cumprimenta

- Yeshuá la Bâr, meus irmãos.

- Aquele símbolo não representa o espírito devorador que opera através do gato? – Fala Joaquim observando a loja e Antônio continua:

- Goxtei, Manel. Vamu prum buteco Enchêê o copo de cachacha lá no bar até fazer chuá chuáááá. É chuá lá no bar.

- Pois é. O diabo é uma coisa boa. Serve para por a culpa quando se faz algo errado. – Joaquim encerra com tom místico a primeira estorieta.

2

Realmente não corro risco de estar sendo seguindo por espiões.

Meu cachorro não cai de pé quando o jogo na cama. Acho que ele não é mesmo nenhum gato disfarçado, infiltrado.

3

Tem cachimbo?

Olho para o sujeito que grita às cinco da manhã.

Tem cachimbo?

Olho para trás para ver com quem ele fala.

Tem cachimbo?

Olho para o sujeito que me grita.

Tem cachimbo?

Faço que não com a mão.

Não quero craque a essa hora e nem em outra.

Assim, para que isso não aconteça, concluo: “Fugindo dos problemas, nada pode ser resolvido” (Taniguchi)².


Ofereço como presente de aniversário à

Wadson Lourenço, Rodrigo Robleño, Gleison Oliveira, Paulinho Manacá, Wagner Nascimento, Marcus F. Severo.

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Em banto, obax anafisa significam flores e pedras preciosas.
O texto é minhas flores para você

e faço votos de que encontre nele pedras preciosas.

Escrito entre 24 de janeiro e 06 de fevereiro de 2012.

¹ DOMINGUES, Thiago – 1000 Horas – http://www.palavrasegavetas.blogspot.com/

² TANIGUCHI, Masanobu – Por uma vida luminosa: Seicho-No-Ie.