segunda-feira, 25 de abril de 2011

A OPORTUNIDADE ESTÁ DENTRO DAS MUDANÇAS¹ ou VIVER É MUITO PERIGOSO²

Uma flor é só uma flor é só uma flor é só uma flor é só uma flor

Disse algo assim uma poeta estadosunidenses


Eu digo

Gente não é só gente não é só gente não é só gente não é só gente

Uma pessoa não é só uma pessoa

Olho para o céu e vejo

Uma flor voando com outra flor e outra flor e outra flor e outras

Seus polens proliferando

Flores negras nos pulmões rosados

Os ossos trepadeiras de flores mórbidas

Peles se rompem em seivas rubro branco enegrecidas

Estranhos bailes se fazem nas casas nas ruas

Ruas e casas que não mais existem

– Tudo é um jardim botânico das flores do mal –

Botões surgem retorcidos murchos infectos

Mortos em vida

Vida nos mortos


Os artistas dizem

A vida é vida e não é só uma vida

A vida quer viver

A vida vai viver

A arte para vida

A vida dá arte


Você pergunta

O que fazer

A mulher diz

Não morrer para lutar

O homem diz

Lutar para viver

O velho diz

Plantar para colher

O jovem diz

Colher para plantar

A criança olha e vê

Um botão de vida nascer

Palavra


Ofereço como presente de aniversário aos meus queridos

Luis Yuner, Juliano Fernandes, Flávio Santos e Diego Martins.

Ofereço aos meus colegas de Licenciatura Letras da UnB – pólo Ipatinga, em especial

Mª Gloria M. Goncalves, Marivalda M. Lima, Maxwel L. Silva,

Nildilene C. M. Ribeiro, Paulo G. C. Pimenta e Raiane C. Brito.

Perdão pela desobediência das regras poéticas.

Escrito a pedido da grande musicista Sônia Frei, que tomou como causa. Veja o resumo:

Urânio empobrecido, uma estranha forma de proteger os civis líbios... Nas primeiras 24 horas de bombardeios a Líbia, os aliados gastaram 100 milhões de libras esterlinas em munição dotada de ponta de urânio empobrecido. Trata-se de um resíduo do processo de enriquecimento de urânio que é utilizado nas armas e reatores nucleares, sendo uma substância muito valorizada no exército por sua capacidade para atravessar veículos blindados e edifícios. Esse urânio empobrecido pode causar danos renais, câncer de pulmão, câncer ósseo, problemas de pele, transtornos neurocognitivos, danos genéticos em bebês e síndromes de imunodeficiência, entre outras doenças. O artigo é de David Wilson – Stop the War Coalition – 27/03/2011

Sônia, seu pedido virou para mim uma ordem. Obrigado!

Escrevi na manhã de 25 de abril de 2011.

¹ Masaharu Taniguchi.

² João Guimarães Rosa.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

TUDO A SEU TEMPO

Ofereço como presente de aniversário aos meus queridos

Valdete R. Fernandes e Álax Nasário.

E também ofereço aos meus colegas na Licenciatura Letras UnB, em especial

Laudemir A. Silva, Lorena A. Souza, Luzia B. O. Vieira,

Marcos A. Benevides, Mª Aparecida Pereira e Mª Fernanda R. Silva.

Escrita entre os dias 15 e 20 de abril de 2011.

Obax anafisa


A tarde vai sem pressa. Na vizinhança um rádio toca, parece músicas cristãs que me arremetem ao Tiririca. Sento no sofá e me recosto e acabo me deitando com uma playboy nas mãos. Ontem vi meu colega e melhor amigo ser parabenizado pelo nosso chefe. Eu não. Já pensou? Fiquei calado, impassível, agüentando tudo. Sexta-feira, momentos antes do fim do expediente, vai o patrão falar “Benito ultrapassou sua meta. É raro um colaborador igual ao Benito. Preciso de mais Benito na empresa”. E eu ouvi. E eu sorri. Minha vontade, preciso dizer? É óbvia! Mas eu sorri. Primeiro porque preciso do emprego, não posso dar bandeira. Segundo, somos amigos. Apesar dos pesares, somos amigos. Então eu deveria me alegrar por ele, não deveria? Mas não consegui. Sorri. Por uma das janelas podia se ver minha inveja e na outra a culpa pelo sentiment...

- Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaiiiiiiiiiiiiiiiiiiêêêêêê! Ai! Ai! Aiêêê!

Ponho-me de pé e vou até a janela. Idiota! E se for uma briga e sobrar para você? Uma bala perdida te achar? Mas agora é tarde. Do segundo andar já estou vendo a mulher caída no asfalto. Vejo Benito na janela. É que somos vizinhos, mas finjo não percebê-lo. Uma vizinhança se aproxima da vítima e outra fala para Benito “É Jacimara”. Jacimara? O viado do apartamento ao lado? Fico olhando, angustiado, extasiado. O cara até que é gente boa. Já recebi uma cantada, educada. Não colou porque não sou boiola. Nada contra, mas não gosto de me envolver com essa gente. Mas a cantada foi boa. Usei para catar uma gata e né que deu certo? Papei gostoso. A policia aparece. Rápido, para uma travesti. Rarrá! O Rubem tem razão. Você já viu coisa mais bicha que carro de polícia? Algo que sai pelas ruas com uma coisa imensa, indiscreta, por cima piscando e gritando “uiuiuiuiuiuiuiuiuiui”? Rarrá! Ela é socorrida enquanto ouço dizerem “Foi um rapaz que a esfaqueou porque ela é travesti”. Outro diz “cinco rapazes saíram dum carro e perseguiram três travecas. Jacimara caiu e a encheram de facadas. Mas pegaram o cara. Um adolescente”. Outro ainda disse... Não me interessa. Saio da janela e vou para o banheiro mijar. Esquento algo no fogão, como e durmo vendo tv.

- Ispera aí! Ispera!

Acordo com o grito junto a um barulhão de moto. Alguém chora.

- Que foi, amiga?

Pergunta alguma mulher para outra.

- O criente foi embora sem pagar.

- Mas você é otária mermo.

As duas somem com sua voz na madrugada. Saco! Agora perdi o sono. Fazer o que domingo de madrugada? Da rua, só o fim da noite. Até que a lua está bonita. Vou fazer um café e tomar com leite. Acho que vou para Pedra Branca. É fiofó de mundo, mas para quem tá duro lá consegue dá duro para as gatas de lá. Rarrá! Vou deixá-las felizes. Uuuum xô vê: Café com leite, tv e madrugada. É acho que consigo dormir mais um pouco. E a lua tá tão bonita. Ah! Esse café com leite, essa madrugada e essa lua deixam a gente comovido como o diabo.

Olhos pesados.

Olhos se abrem.

Espreguiço e me arrumo para ir para as mulheres. Amanhã tem batente e vou ter que sorrir para o Benito, para os colegas e para os chefes. Vai ser duro sorrir para o pessoal. Mas para o Benito até que não porque gosto dele. O cara é todo certinho, mas fazer o quê? Todo mundo tem o seu defeito. Mas isso será amanhã. Para cada dia a sua cruz. A minha hoje é batalhar para alegrar a mulherada.


Ofereço obax esperando que encontre anafisa.

Convido a ler o cronto OLHANDO PELA JANELA

que será postado amanhã, dia 21 de abril, na coluna CRONISTA DE 5ª

da revista cultural Nota Independente. O endereço é www.notaindependente.com.br

Tem alguma ligação com o cronto acima.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

O TERCEIRO PÊSSEGO

Ofereço como presente de aniversário à

Tamara Cândida e ao Fred Alvin.

E ofereço aos meus colegas em Licenciatura em Letras:

Eunice B. Bezerra, Hingrid C.L. Linhares, Ivanete F.C. Valverde, Ivone M. Andrade, Janete A. Reis, Julio C.S. Souza, Justino C.P. Santos.


Pairando pelo ar. Talvez um pirilampo, talvez um bem-te-vi, talvez um fantasma, talvez uma fantasia. Mas com certeza eu. Eu com você. Então, torcendo para que queira, lhe digo aceite obax que lhe ofereço.

Quatro e meia levanto e saio com meus cachorrinhos. Por o pé na escada foi a gota d’água. Começou a chover. Como as gotas grossas são esparsas termino a descida, abro o portão e fico debaixo da marquise ouvindo a chuva aumentar enquanto correm felizes em seu ponto auto do dia. Diminuiu e parou. Ninguém na rua. Vou pelo caminho de sempre ouvindo o canto da madrugada. A usina, carros na avenida, algum rádio e... falta um músico... ninguém ao redor! Vem ao meu encontro a chuva que me abraça, desvencilho-me e volto para casa.

Pela manhã, meio termo canta Elis. Uma carta antiga eu releio. É uma escritora trocando criação. Ao fim da manhã pêssegos eu comprei três. Ao fim da tarde comi querendo Inês. Dois estavam sem gosto e um, o último, valeu a pena. Será assim que acontecerá comigo? Só no fim? Qual é mais “noir”? Arma e fumaça no ar numa Companhia Bruta.

Mamãe prepara o café. São cinco e três. Às oito horas aula de iniciação teatral e outra à tarde. De noite reunião fraterna de homens. São cinco e quatro. Irei, se conseguir internete e tempo, postar minha participação no fórum no curso de letras. Passei dois dias fazendo-a. São cinco e cinco. Está difícil fazer o grupo para a matéria Atividade Diversificada. São cinco e seis. Cinco e sete. Cinco e oito. Vou rezar, repreparar a aula, ler um pouco, tomar café e ir para o curso. Cadê o conflito que dizem ter que estar aqui? Cinco e nove. Cinco e dez.

Pairando pelo ar eu com você. Então contente pela sua companhia até aqui digo: espero que tenha visto anafisa? E me despeço.


Obax e anafisa são flores e pedras preciosas em banto.

Escrita na tarde de 06 de março e reescrita até 13 de abril de 2011.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

SILÊNCIO DO CRESCIMENTO

Ofereço como presente

aos meus tutores e professores de Licenciatura Letras (UnB – pólo Ipatinga)

Evanice F. Dias, Sandra G. Lacerda, Rosiele S.C. Carvalho, Mariane P. Reis, Heloiza A. M. Fonseca, Cristiana C. Franco, Sandra M. M. Souza, Jaqueline T. Assis, Deusalina M. P. Silva, Justino C.P. Santos, Sandra R. Vitor, Kelly C. Assunção, Marizéli Fernandes, Luciana C. A. Simões, Marcel A. Roque.

Que eles me perdoem “carquer” erro ou “faia”.

E dou como presente de aniversário aos meus queridos

Carlos Passos, artista da dança, e Café Teatro “Confusion”.


No silêncio há crescimento. Nele nada se percebe (O silêncio é fecundo – Fecundo sempre ligado ao silêncio. Por quê?). Voltando para meu dentro vejo o dentro do outro. O silêncio mata com a preguiça... quando se cala... com o medo... quando critica. Ah! E quantos julgam e condenam...

O corpo carnal não existe (Corpo e mente = terra e ar). Ou não se apercebe. Conheço e aceito, e sofrimentos se aliviam, terminam. Agradeço à Vida. Agradeço aos que me iluminaram: “Esses que ficam aí atravacando meu caminho. Eles passarão. Eu passarinho”¹.

O Palácio Celestial de Deus é meu. Sou um santo que vive em prazeres não sensórios da alma. “Eu passarinho”. No Lar da Luz eu sou um candeeiro. No Lar da Vida passei pelo madeiro. “Eles passarão. Eu passarinho”.

No silêncio há crescimento e eu aqui falando porque, feito passarinho, eu canto. Feito passarinho alço vôo despercebido. E então... o silêncio.


Escrito pela primeiramente em 1.996,

com o nome Anthônio Raphaell.

E reescrita entre 09 de março e 05 de abril de 2011,

com o nome Rubem Leite.

¹ Mário Quintana

terça-feira, 29 de março de 2011

O NOSSO LIVRO

Ofereço aos meus colegas da turma A no curso Licenciatura Letras, pela UnB, pólo Ipatinga e como presente de aniversário ao Maíto Quintela.


No Parque Ipanema existe tanta beleza e paz. Não é uma solidão. E apesar de eu estar rodeado por pessoas a maioria e na maior parte do tempo está um pouco longe; eu posso ficar sozinho refletindo no meu silêncio tendo como ajuda os meus livros, meu espírito protetor ou anjo, se preferir, e com certeza Deus. É! Deus! Por que não?

Agora apouco havia alguns garotos subindo na mangueira e brincando. Assusto-me pensando numa queda deles sobre mim. Parei de me preocupar e pedi aos espíritos protetores deles que os guardem. O que mais te assusta, a queda de alguém ou queda em você?

A chuva de ontem transbordou o lago e alguns, poucos, peixes se encontram mortos na grama. Isso contesta a paz? E o que a morte de uns peixinhos num laguinho que transbordou diante do tsunami japonês de março? Então isso contesta a paz? Deixando-lhe a indagação olho o grupinho que se aproxima usando um calçado esquisito, com um meio arco na sola fazendo-os pular enquanto correm. Será para alcançarem maiores distâncias com menos esforço? Será para desgastar menos os joelhos, colunas ou sei lá? Ou será que eles usam apenas por frescura, para aparecer, por modismo? Pássaros que não sei o nome cantam. Passeio pelo parque vendo quase tanto quanto olho. Então finalmente paro e penso. Mas pensar está me assustando. Não seria incomodando? Então pego um livro. Olho para sua capa e penso em alguém. Alguém não me quer então guardo o livro. Pego outro e direto já o abro para não pensar. Mas os livros fazem pensar. “Deus me deu um amor no tempo de madureza”¹. Os livros fazem pensar. Mas pensando bem o pensar que os livros dão não são penar. Então me enlevo nos pensamentos. Com alguém... sem alguém... eu aceito o que tenho ou não tenho e leio. Continuo a ler. E decido ir para casa. Em meu leito. Deleito com mais um livro, um vinho seco, queijo. Leio até dormir ao crepúsculo. Mas o crepúsculo já foi a muito. Queria dormir com um macho e acordar com uma fêmea. Crepúsculo e aurora. Mas dormi com uma mulher e acordei com um homem. Noite e dia. Com ela tive uma noite dura. Mas noite dormida. Com ele minha manhã até foi amena. Acordei, fui ao trabalho, depois à Biblioteca conversar com Bil. Ele me mostrou algumas capas de livro que criou para publicações de escritores locais. Bons trabalhos. Com Zumbi peguei Noites do Sertão, de Guimarães Rosa e li Dão-Lalalão “o quente colorido, qual, que é do riso de mulher muito mulher: que não se separa de todo da pessoa, antes parece chamar tudo para dentro de si”. Então escrevi. Escrevi um bilhete para ninguém. Não para alguém, veja lá. Mas para ninguém. Escrevi e deixei sem pensar, na verdade, em alguém ou ninguém. É só agora que escrevo para você que me dou conta disso. Escrevi e deixei e saí. Outra vez para o Parque Ipanema. Outra dia ou outra semana volto ao Zumbi dos Palmares e continuo a leitura onde parei. Um novo conto Rosa. Ainda bem que não é azul. Não gosto de azul. Se ainda fosse preto e branco. Cento e três anos em preto e branco cabem no “meu tempo de madureza”. Cento e três em quarenta e dois anos. E vou para casa, depois do Parque Ipanema. Durmo, acordo, saio, trabalho, parque, leito, acordo, saio, trabalho, parque, recosto, acordo, saio, trabalho, parque, durmo, acordo, saio, trabalho, biblioteca. Bilhete resposta. Quem diria. Diz coisas boas que eu gostaria ouvir. Não ouvi, mas li. Respondo então indicando outro livro. Vou embora aguardando resposta sem saber se virá. Mas veio e com indicação de outra obra. Vou à indicação e vejo “Você não sabe por quantas vezes, que no silêncio à distância, eu peço, eu chamo por você, que não me ouve que não me vê, que venha acabar com esta dor que angustia, que me dói a alma e me desnuda a fantasia. Que aniquila o pensamento, provocando um só tormento, de não o poder ter, seja só por um momento, para termos a bela ilusão de vivermos, num só abraço, o doce gosto da sedução”². Contra-respondo com a estrofe do mesmo livro “O dia rompe saudoso, observo um beija-flor que beija a flor amoroso como o quê, me dado com amor”. E deixo meu nome e email. Saio com uma esperança. Não mais quero alguém. Também não estou à espera de ninguém. É possível que uma pessoa me procure e de dois nos tornemos um. Pode ser que sim. Pode ser que não. Um amor no tempo de madureza.


Escrita pela primeiramente em 1.992 ou talvez 1.996,

com o nome Anthônio Raphaell.

E reescrita entre 08 e 29 de março de 2011,

com meu nome artístico, quase de pia, Rubem Leite.

Primeiramente eu não sabia que nome dar ao cronto. Depois achei “Sentcimento”. Finalmente descobri o curta O Nosso Livro, dirigido por Cláudia Rabelo Lopes e Luciana Alcaraz; roteiro de Leandro Matos, Claudia Rabelo Lopes e Catalina Jordan Cruz; e protagonizado por Vera Holtz e Marcos Caruso. Ver www.portacurtas.com.br

¹ Campos de Flores, de Carlos Drummond de Andrade.

² Primeiro o poema Doce Ilusão, depois a segunda estrofe do poema Fecunda Lembrança, da poeta ipatinguense Marília Siqueira, na obra Utopia.

terça-feira, 22 de março de 2011

FEIJOADA COM PAGODE ou NOITE NA RUA DO BURACO



Importante observar que o mote do cronto é a ilustração. Seu criador e Rodrigo Lima.

Escrito entre a tarde de 30 de janeiro a 22 de março.

Ofereço como presente de aniversário aos

Maria Cloenes, Vagner Crivellari e Mara Coutinho.





Na cozinha Dna. Maria prepara a feijoada para vinte pessoas numa festa para oito: Quatro amigos. Alemão, louro como só ele na sua calça comprida, esbofeteia o pandeiro; Zulu, seu amigão do peito, na sua eterna bermuda, acaricia o cavaquinho. Ele é de longe o homem mais bonito do que por longos anos seria conhecida como Rua do Buraco. Os dois dividem o teto. Sobre a mesa, cachaça e copinhos. A casa onde estão tem dois quartos. Uma para dona Maria e outro para os rapazes. Tem mais um cômodo que é saaala, coziiinha. O banheiro fica fora, com os dejetos indo direto para o rio. Sentado à mesa, Valdo, pião da Usiminas, é o mais negão na festa e o de voz mais bonita. Dançando está seu irmão Miro. Quem tem mais molemolência do que ele? Comemoram a primeira folga do Valdo. Estão a espera de Carlinda e Maria Flor, namoradas dos irmãos. Ah! Falta ainda Máicon, o caçula da casa. Alemão e Zulu moram no barraco ao lado, o da beira do ribeirão Ipanema. Um barracão de partilha. Uma sala partilhada com cozinha, um quarto onde os dois dormem partilhando a cama mais o banheiro direto sobre as águas. Partilhando águas com os dejetos. E é onde compartilham a vida.

Sete pessoas muito felizes cantam, dançam e comem. Máicon ainda não chegou. Seus quinzes anos lhe mostram Dulce e festejam juntos algo que é só deles e que descobriram juntos. No quartinho da garota seus corpos dançam, suas gargantas instrumentalizam e cantam, bebem seus suores e se comem. Isso é que é feijoada da boa. Pensaria ele anos mais tarde.

A festa é 06 de outubro de 1.963. E o dia seguinte? Massacre de Ipatinga. A polícia mineira, dizem os estudiosos e os professores, é a mais violenta do Brasil. E dizem que a polícia ipatinguense é, ou foi, a mais violenta de Minas.

A festa não parou até o amanhecer e o dia foi passando. Todos nos dois barracões dormiam enquanto a greve começou e enquanto acontecia a nossa estória não parou.

- Eles estão é pedindo confusão. – Bradou o presidente da indústria.

- Querem é bala. – Confirmou o chefe da polícia.

Tiros a mancheia foram o que aconteceu. No posto de saúde a criança que saía no colo da mãe morreu. O barbeiro que ia para o trabalho se feriu e seu parente que visitava a cidade e assistia curioso a pacífica manifestação morreu. Muitos chegaram mortos ao hospital e muito mais morreram depois. Por dias, muitos manifestantes ou mesmo simples funcionários se esconderam em bueiros, porões ou onde pudessem tentando escapar da morte. Incontáveis certidões de óbito desapareceram. Exceto sete, inclusive a da criança morta nos braços da mãe ferida mais na alma que no corpo. Incontáveis certidões de óbito desapareceram. Inclusive a do Valdo, morto na porta de casa, no dia 08, ao sair para o trabalho.

Anos mais tarde, ao contar a história no “Anunciai”, promovido pela Igreja Católica, Máicon, que foi convidado pelo grupo de jovens para contar o acontecido, foi intimado pela Renovação Carismática Católica a se retirar.

- Você não pode anunciar essas coisas aqui. – Disse a chefe do movimento.

- Por quê? – Espanta Máicon.

- Agora é hora de Deus.

- Estou fazendo o que fez Jesus. Anunciand...

- Você está é denunciando. E no local que pertence à fábrica, que nós amamos e nos ama.

- Você prefere a indústria a Jesus?

- Prefiro! Prefiro! Prefiro!

E ao contrário de Pedro, ela nunca se arrependeu.

segunda-feira, 14 de março de 2011

FEIJÃO MARAVILHA


ilustração feita por Tiago Costa.

Escrita na madrugada de 07 de março e mexida até dia 14 do mesmo mês em 2011

Ofereço como presente de aniversário aos meus queridos

Alexandre G. Costa, Rubens Serafim Jr, Marcelo Oliveira, Casa de Bamba.





Um semeador saiu para trabalhar. Primeiro o terreno é capinado, depois arado para ser feito covas onde serão depositadas as sementes. Adubar, aguar, esperar e confiar. Uma fileira de feijão preto e outra do carioca.

Só no Brasil existem mais de quatorze mil tipos de feijão, sendo que dez mil não são cultivados, nascendo apenas nas florestas. Dos quatro mil tipos cultivados 70% do cultivo e consumo é do carioquinha. Em segundo lugar, com 20%, é o preto (meu preferido) e os demais, juntos, dão 10% de cultivo e consumo.

Cresceram as plantinhas entre as brincadeiras de criança, filhos do fazendeiro, que é o semeador, e de seus irmãos, também donos da terra. Mas como é possível ser dono de quem nos sustenta? Mantém-nos?

Por gentileza, pense na pergunta que lhe fiz. Eu, como você pode ver por ter-lhe perguntando, também estou pensando continuamente nela. Enquanto pensa vou lhe complicar um pouquinho. Uarrarrá! Afinal, o que é fácil não tem graça... Ao comprar seu feijão tenha os seguintes cuidados: A granel: escolha os de mesmo tamanho, casca parecida, brilhantes, sem rachaduras e manchas estranhas à espécie (caso ela as tenha, claro. Uarrarrá!). Pegue um grão e aperte. Se rachar facilmente é porque está velho e não irá cozinhar direito. Se sentir necessidade pegue outro e faça a mesma experiência. Se quiser, faça mais uma vez, mas pelo amor de Deus não é necessário testar todos. Uarrarrá! Embalado: verifique a safra, a data de validade e se é tipo 1. Para armazenar escolha lugar seco e arejado e nem pense, pelo amor de Deus, em estocar para um ano ou mais. Pão durice e neurose têm limites, por favor. Uarrarrá!

Foram crescendo entre os nasceres e pores de sois. Entre o sol e a chuva. Olhando, quem diria, esse feijão é preto e aquele é carioca. Mantidos pelo solo e vivificados pelo sol, não brigam entre si e beneficiam os homens e os animais.

Ai! Quero, como disse Drummond, “Eu preparo uma canção que faça acordar os homens e adormecer as crianças”. Mas devido à minha incapacidade de cantar eu escrevo. Escrevo, todo prosa, versos. E tento ser um trovador trovejante. Mas nunca deixarei de ser um crontista.

Viva os poetas e que suas poesias e poemas sejam armas ou as flores que combatem as armas.