sexta-feira, 13 de março de 2009

CÊ TÁ BRINCANDO

01-09\3\09

“Dez horas. Finalmente. Régio, tô chegando!”. Percorro o já bem conhecido caminho até a rocha e não demora e ele chega.
- Benito, meu amigo.
Sorrio e apertamos as mãos.
- Boa noite!
- Boa noite, Régio!
- Espera! Um barulho... e o cheiro é de humano.
Eu me congelo. Não é possível que o “fedaputa” do Lóri me seguiu.
- É verdade, mesmo! Um centauro, Benito!
- Vocês se conhecem?
Nada consigo falar para o Régio. Somente tenho vergonha e raiva.
- Eu te segui querendo um pouquinho do que você tomou e vejo isso...
- Cala a boca, Lóri.
- Vocês se conhecem!
A raiva na voz do Régio me dói.
- Um humano! Você contou para um humano comum. Tanto te pedi e você me trai.
- Régio! Por favor.
Não é raiva. É decepção na voz do centauro. O que me dói pior. E o seu olhar que tanto gosto não está mais calmo. Está... Está... Está triste. Não vejo raiva. Por favor, sinta raiva. Machuca menos.
- Tenho que voltar.
- Régio, por favor.
- Adeus.
E a cara de palerma do Lóri que só fica olhando a merda que fez.
- O que tá acontecendo, Benito!
A vontade de socá-lo é imensa, mas o que me controla é a lembrança de como tudo aconteceu:

- Cê tá brincado. Um centauro? Rarrarrá.
- É sério, Lóri. Conheci um centauro é fizemos amizade.
- Que droga é essa que cê usou. Quero também.
- Posso te provar...
- Então prova.
Penso melhor. “Que arrependimento ter falado. Prometi ao Régio não contar para ninguém. Não quero perder a amizade dele. Principalmente por causa do Lóri”.
- Cê tá certo. Foi só uma pegadinha.
- Mas me conta aí. Onde arranjou a droga. Quero também.
- Eu viajo por mim mesmo e repetindo Clarice Lispector: “Quero estar alerta, e por mim mesmo. Fui convidado para uma festa onde na certa fumavam maconha. Mas minha alerteza me é mais preciosa”. Acho que viajo tanto dentro de mim que não preciso de drogas. Foi uma fantasia que tive e imaginei centauros e bruxas.

Volto à realidade.
- Benito! Tudo bem? O que está acontecendo?
Não consigo nem responder. De tanta raiva dele e decepção comigo mesmo.
- Benito! Que legal aquele centauro. Ele ficou com raiva por eu ter aparecido?
- Você é um in-te-li-gen-te bur-ro.
- Quê?
- Por que você veio? Agora nunca mais o verei. Por que não some, sua merda desgraçada? Sai da minha frente.
Minhas últimas palavras foram entre lágrimas.
- Benito! Está com raiva só por causa de eu ter aparecido? Pensei que era viagem sua a estória do centauro. Aliás, muito melhor ver o bicho de verdade do que na cabeça apenas.

Nada respondo e saio pela mata, mas procurá-lo onde? Só me resta voltar para casa.

- Benito, onde você vai?
- Não acredito que você ainda está falando comigo. Que não entendeu o que estou sentido. O ódio que estou de você. O ódio maior ainda por mim por ter falado para você.
- Desculpa. Vamos conversar. A gente procura o bicho e...
- Ele não é bicho. E sua voz me deixa com mais ódio ainda.
- Vamos para casa e lá a gente conversa para achar alguma solução e...
- Não vamos para casa. Eu vou para a casa. Você se vira e arruma um lugar bem longe de mim para morar.
A surpresa de Lóri é imensa e tenta falar mais, mas saio depressa perto dele.
- Benito!
Corre atrás de mim, segura meu braço e lhe dou um soco que acho que quebrou minha mão. Espero que a tenha quebrado.

Passaram-se todas as noites de lua cheia do mês. Amanhã começarão outras. Só peço a Deus que ele venha para a gente conversar. E eu pedir perdão.
Ele não veio. Nenhuma das noites.
Passou-se mais um mês. E estamos entrando em outro.
- Não vou desistir. Ele vai voltar. Ele vai voltar.

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