Rubem Leite – 11-10-09
Quando eu era menino meu irmão mais novo soltou um passarinho. Papai diz que o que ele fez foi errado. Não sabemos se o passarinho morreu ou ficou feliz. Meu irmão cresceu feliz. É um artista. Eu mantenho o meu preso até hoje.
O sol nasceu, atravessou o céu e se pôs.
Lua minguante. Lua nova. Lua crescente. Lua cheia.
Uma manhã uma sombra entrou pela porta fechada. Atravessou-a. Na sala os cães viram a sombra, ganiram e se espalharam pelos esconderijos da casa. Na cozinha o gato olhou para sombra e saiu para a rua. Ouvi e vi o gato. Ouvi e vi os cachorrinhos. Nada mais vi. Não ouvi nem o pássaro que sempre canta na gaiola pendurada na janela de meu quarto. Eu e meu pássaro vemos continuamente a aurora vestida e cotidianamente dormimos com a noite nua. Vemos as árvores trocarem de roupas e enfeites para seus diversos bailes. A sombra visitou todos os quartos? Visitou todos os banheiros, todos os cômodos, o quintal? Na rua nenhum som de carro. Nas casas vizinhas nenhum rádio, tv ou voz. Só o silêncio da sombra. Com um caju escorrendo pela boca entro pela cozinha no silêncio da casa. Aí lavo meu rosto, bebo uma água, ponho um vinho seco num cálice e vou para meu quarto. Numa cadeira de madeira que uso como criado mudo deposito o vinho tinto, aconchego em minha cama, pego um dos livros que estou lendo e passo o tempo. E o pássaro
- Bom dia! – Que voz – Vim conhecer você.
- Você é linda.
Que riso. – Você é galante. – Ela me fala estendendo a mão. – Venha comigo.
- Sim! Para onde?
- Para sua casa.
- Ah! Moro aqui.
Seu sorriso se abre. – Venha!
Levanto e sigo. Os cachorros continuam
- Espere!
Volto, fecho o livro, colocando-o na cadeira. Sorvo todo o vinho. Abro a portinha da gaiola. O pássaro em silêncio e quieto. Enquanto pego a mão da dama o pássaro voa. Saio da casa enquanto o pássaro canta.
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