J.G.,
Sem nenhuma brincadeira. Eu te acho lindo,
iluminante como o sol. Realmente! Sua presença é muito afável. Tenho uma imensa
satisfação toda vez que você está aqui.
Apesar de meu marasmo, do meu querer ficar
quieto; não querer sair, ficar quietinho... Sinto-me satisfeito com sua
presença. Quando você está aqui é tão agradável. Tão agradável quanto ter um
livro.
Uma pessoa que conhecemos e gostamos postou
no Caralivro um meme, acho, de dois coelhos. Um diz “Eu me apaixono fácil” e o
outro responde “Você é carente”. No início compreendi carente como insatisfeito
e a pessoa insatisfeita é a única que nunca pode ser ajudada, pois nada nem
ninguém lhe satisfaz. Depois entendi carente como carente mesmo. Rerrê. E escrevi
na postagem:
O carente é difícil para alguém poder
satisfazer. Se conseguir sentir-se bem consigo mesmo é o melhor caminho. Ser
misantropo é outro caminho, mas não é bom.
O que não disse é que sou ou estou
misantropo. Não foi totalmente uma escolha direta, mas uma série de pequenas
observações sobre o mundo e uma série de pequenas escolhas de como reagir
somada a outra série de pequenas contrarreações me conduziram à aversão à
sociedade. E consequentemente à melancolia. Pois a misantropismo é isso:
melancolia e querer distância do ser humano. Ou será melancolia por querer
distância das outras pessoas? Não sei. Não sei. Mas estou desanimado com a
civilização.
Emília e Visconde de Sabugosa têm uma
discussão sobre a redução no tamanho das pessoas no capítulo Revelações do
livro A Chave do Tamanho, de Monteiro Lobato.
A “Humanidade clássica”, como disse
Visconde, construiu a civilização. Ou seja, “casas, máquinas, estradas,
veículos, ideias” e tudo isso se perde com a redução no tamanho dos humanos. Na
guerra na Rússia muitos soldados morreram congelados, mas Emília não se
horrorizou com essas mortes, pois já estavam matando-se. “Os homens não viam
outra solução além da guerra – isto é, matar, matar, matar, destruir todas as
coisas criadas pela própria civilização. [...] Essa tal civilização havia
falhado. Havia enveredado por um beco sem saída – e a saída que achava qual
era? Suicidar-se a tiros de canhão.”.
Sabe, um livro, pra mim, é uma das coisas
mais maravilhosas. Mesmo que ele esteja fechado, ao meu lado. A presença do
livro me dá uma tranquilidade. Produz-me percepções e sensações sobre a vida.
Como esse poema de Fernando Pessoa:
O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo.
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis
As paixões violentas por coisa nenhuma
Os amores intensos por o suposto em alguém.
Essas coisas todas –
Essas e o que falta nelas eternamente –.
Tudo isso faz um cansaço.
Este cansaço.
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada –
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles.
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder
ser.
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é,
isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço
Íssimo, íssimo, íssimo,
Cansaço.
Não me sinto cansado. Sinto desânimo. Disse
alguns dias atrás o que venho pensando há meses. Para me sentir cansado deveria
ter feito muito mais. Tenho desânimo porque minhas façanhas não podem ser
chamadas de muitas; e são tão infecundas quanto a satisfação pelo cansaço de
Pessoa. E neste momento que estou tratando-me de depressão, de ansiedade e de
covid às vezes não consigo ler; não tenho energia para ler. Mas ele, o livro,
está ali; dá-me um relaxamento.
Ou quando olho para eles na prateleira
sinto-me renovado. Não sei explicar. É algo semelhante aos cachorrinhos, à gatinha
e aos antúrios que tenho em casa. Eles dão um ânimo novo pra gente... Uma
força!
A pessoa está tão desgastada e olha para um
livro e ele te energiza. Se fechado o livro já faz assim, imagine aberto...
Lendo!
Abraços!
RL
Ofereço como presente aos aniversariantes:
Julian A. Cabral, Girvany de Morais e João F. Alcino.
Recomendo a leitura do livro e do poema indicado no texto.
Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog
literário: aRTISTA aRTEIRO. É professor de Português, Literatura, Espanhol e
Artes. É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do
Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua
Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”. Autor dos artigos
científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e
Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola,
Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e
“Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro
Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Escrito no início da linda manhã de sábado do dia 30 de janeiro de
2021. Trabalhado entre os dias 20 e 28 de março do mesmo ano.
3 comentários:
Tenho meus momentos de misantropia. O mundo está difícil de digerir nestes tempos atuais por isso fujo prps livros por que a realidade está dpida e doída.
Como sempre, um texto impecável. Abraços, Josiane Hungria.
Muito obrigado terno amigo, por nós presentear com a sua amizade e seus textos maravilhosos.
Simplesmente maravilhoso o que você escreveu Rubem, mais entendo o seu cansaço de contar o que acontece no mundo agora.Mas você fez muitas coisas lindas pelo ser humano, tenho certeza disso.
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