Somos pedra
e carne ardente¹
Não são dez horas de vinte e sete de
dezembro e o sol está escondido pelas nuvens branco-cinza.
No Feirarte ainda há pouco público e o
pessoal das barracas conversam enquanto se organizam. Falam do Natal recém
passado:
Natal
em família sem briga ou intriga não é Natal.
A
ceia só acaba quando chega a polícia. Caso contrário fica até dia 26...
Meu Natal teve gostoso almoço. E teve
acusações de furtos, deboches, ameaças de brigas. E assim continuou no dia 26.
– Meu primeiro Natal com espírito cristão: intolerância. Espero que nunca mais
se repita. Prefiro meu Natal pagão onde se reverencia ao Menino Deus sem as
idiocracias cristãs.
Três brigando e eu me sentindo numa sala de
aula carregada de alunos do sexto ano em plena algazarra desordenada.
Agonia. Agonia. Uma sala de crianças de
onze anos é mais controlável que dois adultos machistas mais a esposa de um
deles.
- Me tengo
agarrado mis huevos…
- Macho por macho sou mais eu...
Parece que os adultos são imaturos como os
meninos.
Para que a vida? Lizardo de Assis diz no
livro Opus, na página 74:
Sugamos, predamos, futucamos
Parasitamos
O outro.
E
este outro nos faz o mesmo.
É isso? É isso! Não sei viver. Não aprendi
a viver e não foi por falta de aulas...
Alguém vê uma foto que postei no Caralivro
e me diz “Bom dia!”. Já sei como ele age. Hoje, ou amanhã ou em breve me pedirá
algo.
O sol está surgindo e são agora vinte para
as onze. As pessoas vão chegando, mas tão aos poucos que Marcelo diz não voltar
semana que vem se a tarde continuar rala de pessoas.
Nos últimos cinco dias o Centro de Ipatinga
e em todos os outros lugares olho ao redor e vejo apenas pessoas ralas.
Não sei se vivemos num formigueiro ou se
numa alcateia. O que sei é que não há sociedade.
Dois mil e vinte e um já alcança junho.
- ¡Hola,
don Benito! Mañana será cumple de mijo.
- Lo sé. Su
nuera e hijo planean ir domingo a una cascada pasar el día. Me invitaron pero
soy un bicho que se encanta quedarse en la madriguera.
Ella charla
alguna cosa y continúo:
- Mira esa foto:
- Esa es la
más joven flor de anturio. Está en mi ventana. La compré en enero pocos días
antes del nacimiento de Rael. Junto al anturio está el ombligo del niñito. Es
costumbre brasileño plantar el ombligo en una planta pues es una bendición para
el niño crecer bien. Anturio es una planta natural de Colombia que Salió al
mundo.
- ¡Ay! Tan
hermoso, don Benito. Está hermosa la flor. – Reír alegre. – Me alegra la vida. Me
alegra la vida.
Sexta-feira, dia 28 de maio, a Prefeitura
Municipal de Timóteo resolveu vacinar os professores; mas só os professores. E
isso para os docentes retornarem às aulas presenciais na segunda-feira, dia 31.
Vacina! Não para os pedagogos, nem para
funcionários da Secretaria ou dos Serviços Gerais. E estes se sentiram
irritados. Mas com quem? Com os professores. Não com o poder público, mas com
os professores.
Desmotivado pelos comentários contra os professores não mostrei a foto que tiraram quando me vacinaram:
Já começou a metamorfose. Os cabelos até
arrepiaram. Acho que serei o Cuco do Sítio do Picapau Amarelo.
Tomamos a AstraZeneca. A segunda dose é noventa
dias depois da primeira. Mas o corpo produzirá imunidade três semanas após a
segunda dose. Vacinar é importante, mas para o retorno imediato é inútil.
Vacinar é importante para daqui a quatro meses não corrermos riscos de nos
infectarmos nem de infectar ninguém. Para não morrermos nem matarmos. E se isso
acontecer – e vai acontecer – vão dizer que a culpa é de quem?
- Ah! Vocês poderiam manifestar... fazer
greve...
- Fizemos no início do ano. Seguimos a lei
e comunicamos a paralização com setenta e duas horas de antecedência. A
prefeitura entrou na justiça e conseguiu uma liminar obrigando a não
paralização.
Maio acaba amanhã e no domingo passado o
Feirarte estava mais do que lotado. E a terceira evolução do covid-19 está
chegando. O que aprendemos?
Machado de Assis diz em Entre Santos: O ser
humano alforria o cadáver da velha escrava para não pagar o enterro. Fala também:
As pessoas são usurárias como a vida e avaras como a morte.
- Não entendi. – Um me diz. – Conte a
história toda.
- Para entender tem que esquecer, no
momento, a história. E há de olhar para as pessoas. Ver o que elas fazem umas
com as outras, como elas agem.
- Você diz “as pessoas... elas fazem...”
como se fosse melhor.
- Sou uma pessoa? Um ser humano?
- Ah... Sim!
- Então eu me encaixo nessa descrição.
- Não sou assim.
- Se você diz... – Falo com um sorriso
debochado; pouco... pouco debochado e muito amargo.
Ofereço como presente aos aniversariantes:
Naja Batistela, Marcio Castro, Eder Rodrigues, Valdiene Gomes, Cyd
Ramos, Marcelo S. Marinho e Adinagruber C. Lima.
Recomendo a leitura de:
“OPUS: Selecta de poesia em Língua Portuguesa”; um dos autores e
Lizardo de Assis. Mais informações: temas.originais@gmail.com
“QUINTAS – livro I das Quintas”; antologia. Maiores informações: www.jornalaldrava.com.br
“Promessas Azuis: haicais”, de Goretti de Freitas. Prefácio deste
macróbio que vos fala. Mais informações: +55 31 93426003
¹ Miguel Paulista. Poema III. OPUS:
Selecta de poesia em Língua Portuguesa. 2018. P. 96.
Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog
literário: aRTISTA aRTEIRO. É professor de Português, Literatura, Espanhol e
Artes. É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do
Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua
Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”. Autor dos artigos
científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e
Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola,
Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e
“Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro
Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Imagens:
Antúrio: foto tirada pelo autor;
Vacina: foto tirada por Matheus Menezes.
Escrito entre 27 de dezembro de 2020 e 30 de maio de 2021.
Um comentário:
Mas a vacina no Brasil ainda é um ritual de chances, e as opções disponíveis podem não serem as melhores. Ficar sem vacinar é ficar disponível pra proliferação do vírus, então, não vacinar os serviçais e administrativos das escolas é colonizar nova mutação do vírus em semanas nas trocas de espaço com vacinados. De sorte, o vírus tem chance de ser pior no futuro, como organismo de quem interrompe um tratamento antibiótico por desmazelo... Aí, prepare-se ! O obscuro mundo humano não descobriu a cura da ignorância...
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