PERCEPÇÕES E CONCEPÇÕES DE UM ARTEIRO ARTISTA E DE UM ARTISTA CIDADÃO.
domingo, 27 de novembro de 2022
ENTRE O SILÊNCIO E A HISTRIONIA
domingo, 20 de novembro de 2022
BUROCRACIAS NÃO EMPATIA
Há coisas engraçadas
E não consigo sorrir.
Há gente ferida no mundo.
Tem a Copasa que prefere não atender mesmo estando desocupada.
Há quem é a ferida do mundo.
Mas tinha a cadela Frida do México
E ainda há gente que sana o mundo
- tão, tão raros de se reconhecer,
Quase tão difícil de se ver -.
O professor Benito tentou agendar pelo watzap e pelo aplicativo um horário na Copasa de Timóteo e não conseguiu. Foi assim mesmo e simplesmente se recusaram a atender a ele e outras oito pessoas porque não tinham agendado (ele e outros também tentaram marcar um horário, mas sem resultados). Observação: não tinha nenhum - nenhum - cliente sendo atendido. "São ordens da empresa atender só os agendados".
Argumentou e o funcionário Shelton Martins lhe fez ameaça velada:
_ Você está sendo incômodo, desrespeitoso. - Pela maneira que falou deu a entender que chamaria "as autoridades".
_ Não estou desacatando, mas argumentado já que não tem ninguém sendo atendido.
_ Nada posso fazer. Volte segunda-feira com o agendamento que te dei.
_ Tem crianças bem novas, um idoso com necessidades especiais. Eles não podem ficar sem água de quarta-feira (ontem) até a próxima terça ou quarta-feira (sabe-se que a religação não é imediata).
_ Todos que estavam com você também eram idosos e vão ter que voltar semana que vem.
_ Mas aí está vazio...
_ Só com agendamento.
Saindo desamparado, descompassado pelo princípio de uma crise de labirintite chega em casa.
No dia seguinte pede ao vereador Professor Ronaldo uma intervenção pelos cidadãos.
Após explicar o ocorrido:
_ Benito, informei ao gerente da Copasa e ele ficou de inteirar-se mais sobre o problema. Muito obrigado pelo contato.
_ Eu que agradeço pelo seu empenho, vereador.
Retorno de um funcionário da copasa ao vereador Ronaldo:
_ Bom dia Professor...então...nos não temos a informação..do pq isso está acontecendo ainda....mas eu sempre oriento a pessoa a baixar o aplicativo....(Copasa atende)...muito melhor que ir lá perder tempo....mas esse problema(não atendimento) está mais acima e não temos voz(funcionarios) pra resolver...apenas cumprimos as ordens...infelizmente...bom dia
Além dos erros de português a machucar-lhe, Benito tem o aplicativo e o watzap e de nada adiantaram e, talvez pior é a fala "ir lá (Copasa) perder tempo"...
_ Professor Ronaldo, deixo claro que NÃO almejo punição para o funcionário, mas melhoria no atendimento. Ele, assim como eu, não tem voz de comando. É da empresa que espero humanização.
_ O gerente disse para o senhor voltar hoje que será atendido entre um cliente e outro.
_ Fico agradecido. Verdadeiramente grato. Mas e os outros cidadãos? Somente eu sendo atendido com a falta de empatia da empresa pela sociedade seria egoísmo meu. Sem nada resolver.
_ Ótima reflexão. Parabéns pela sua iniciativa.
Comentei com algumas pessoas a burocracia que cidadãos enfrentam e:
_ Não acredito, Benito. - Alguns colegas professores lhe dizem - Você é muito burro. Não aproveita as oportunidades.
Para que responder? Benito apenas deseja:
Só peço a Deus que eu seja o bobo de Clarice Lispector, em Das Vantagens de Ser Bobo; ou o imbecil de León Tolstoi em Ivan, el Imbécil.
Mas pode ser que eu não seja...
Quem sabe!?!
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Texto de Rubem Leite.
Imagem de Frida colhida na internete.
Cartaz é foto de Rubem Leite tirada num posto de saúde.
Escrito entre 16 e 20 de novembro de 2022.
domingo, 13 de novembro de 2022
A-LUNOS SEM LUZ
Ou A VOZ DO PROFESSOR SEM VOZ
Alunos e seus
Olhos seletivos.
Conseguem ver no celular
Mas não os livros.
Jesus é outra coisa. Jesus é coisa séria.
As Igrejas de extrema direita clamam é por Zejus.
Metade de novembro e a turma encheu-se dos que ainda não alcançaram média.
_ Bom dia.
Começa a aula enfrentando, afônico, o ruído da sala.
_ O ser humano pertence a que reino? Animal, vegetal, mineral ou é uma espécie à parte?
Ninguém responde.
_ Vamos, gente! ... Somos da espécie animal...
_ Não sou animal não.
Protesta uma das faladeiras caladas para responder.
_ Então é o quê? Pedra!?! Planta!?!
_ Num sei. Mas num sô bicho.
_ A palavra animal vem de "anima" que significa energia que dá movimento a tudo que vive. Somos capazes de transformar energia em algo que nos permite continuar vivos, a reproduzir e a locomover.
_ Num importa. Num sô bicho. A Bíblia diz...
Preferindo não entrar numa discussão infrutífera continua sua aula. Mas se sente triste por um ambiente acadêmico estar infectado por "convicção, não por provas".
_ A diferença entre nossa espécie e demais seres vivos é o poder de raciocinar, filosofar e de expressar...
_ A gente num é animal não. - Teima no assunto.
_ Apesar do poder de refletir muitos preferem sequer pensar. - Calculando o rebate: CONTUDO, para nos comunicarmos foi necessário adaptar diversas partes do corpo com outras funções primárias, indo do diafragma, pouco acima do genital, até o topo do crânio. E...
_ E o que isso tem com Português?
Interrompe outro aluno e um terceiro acrescenta:
_ Não gosto quando fala contra Deus.
_ Português é comunicação e para comunicar é importante saber como produzimos palavras, ideias. Seja no nível biológico seja no nível filosófico.
Olhando a turma por dois, três segundos retoma a fala antes que no lugar de ouvirem para compreender, ouçam para responder:
_ Nunca falo contra Deus. Creio e respeito Deus. Não me importo como chamem a Grande Vida ou o Criador. Respeito sempre. O que sempre falei e falarei é contra o preconceito, contra a ignorância. Discuto sobre os religiosos cheios da presunção: "superioridade da minha crença". Critico os traficantes ou mercadores da fé. Nenhuma religião é superior a outra e todas devem ser respeitadas, mesmo se não praticadas.
E retoma, com sua afonia cada vez pior, a falar para ouvidos moucos sobre compreensão e transmissão dos discursos: o que estão me falando? como melhor expressarei minhas ideias.
_ Ah, professor! Para de falar e conte uma história como fazia antes.
Sem ter quem ouça fala para os que apenas escutam:
_ Em uma enchente, um devoto subiu no telhado de sua casa e pediu socorro a Deus. Apareceu uma canoa e o fiel a recusou dizendo "Deus vai me salvar". Veio um barco e não aceitou o socorro. "Deus vai me salvar". Surgiu uma lancha e outra vez recusou a ajuda. "Deus vai me salvar". Por fim, um helicóptero e... "Deus vai me salvar".
A enchente cobriu a casa e o homem se afogou. No Céu:
_ Por que não me salvou, Senhor?
_ Mandei quatro pessoas e você recusou todos os socorros que enviei.
Finalmente bate o sinal. Encaminha-se para a sala dos professores, mas para um instante na biblioteca escolar, escolhe um livro e observa o grafite de Rafa Mattos.
Depois, mais duas aulas antes de enfrentar o complicado, trabalhoso e ruim "diário on-line" adquirido pela prefeitura.
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Texto de Rubem Leite.
Foto do autor: biblioteca escolar Rubem Alves, E.M. Limoeiro, Timóteo MG.
GONTIJO, Bernardo. Por que nós somos animais. Disponível https://www.universidadedascriancas.fae.ufmg.br/perguntas/por-que-nos-somos-animais/ . 13 Nov 2022.
Pensado e escrito entre os dias 08 e 13 de novembro de 2022.
domingo, 6 de novembro de 2022
MESSIAS NÃO. BARRABÁS E SEUS ELEITORES
Ao meu redor,
o pós por do sol.
À minha frente,
a chuva no vulto das árvores.
Sim ao som da chuva à frente.
Ao meu atrás,
gritos a gotejar ferida
qual água mole em pedra dura.
Não aos gritos ferinos atrás.
Ao meu redor,
a redoma do início da noite
é o que tenho.
Em 2018, ao ser confrontado através de zombarias, eu disse: "É uma pena que quatro anos não serão suficientes para o povo aprender o mal que fez ao escolher Jair Barrabás Boçalnato".
Não precisei de clarividência, pois era e ainda é clara a evidência das trevas elegidas.
Anos antes, ao Lula ser eleito por primeira vez, declarei que as pessoas haveriam de querer que em apenas quatro anos fossem corrigidos todos os problemas construídos em mais de quinhentos anos.
Dito e feito. E a prova foi o apoio ao golpe de 2016 e a eleição duas translações depois.
Lendo O Fabricante de Gorro¹: "Um homem inocente não tem porque ocultar seus pensamentos" pensei: Os inteligentes omitem seus isolamentos. Os indigentes ocutam seus ferimentos. Mente-se, omiti-se, pela indecência em todos os momentos.
Não perco tempo esperando retorno das pessoas. Elas pouco darão. A maioria está imersa nos próprios problemas. Por isso, ou não olha para os outros ou não os vê.
Digamos: a cada cento e cinquenta pessoas de nosso convívio, uma ou duas nos querem bem, três ou quatro nos querem mal ou não nos querem, e o restante nos quer, mas nem bem nem mal... E assim como são conosco nós somos com os demais. O que nos resta? Seguir o próprio caminho na maior serenidade e silêncio possíveis. Serenidade para não nos magoarmos, silêncio para não ferirmos e os dois para sentir a natureza.
O compositor Domiguinhos disse: "Traga-me um copo d'água, tenho sede e essa sede pode me matar. [...] A planta pede chuva quando quer brotar. O céu logo escurece quando vai chover". E só quero nesse momento dizer a você o que li num muro: "Você é forte. Só está cansado". Vá e Vença! O Sol renasce uma e outras vezes mais.
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Texto e fotos de Rubem Leite: vistas de minha casa, em Limoeiro-Timóteo MG.
¹ de Phlip K. Dick.
RECOMENDO:
A leitura de Sequestraram a Democracia, de Glaussim:
https://www.recantodasletras.com.br/contosdesuspense/7641748
Refletido e trabalhado entre 28/10 e 06/11 de 2022.
domingo, 23 de outubro de 2022
ENTÃO APENAS DIGO
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Rubem Leite.
Escrito entre os dias 18 a 23 de outubro de 2022.
¹ Marcos 10,18.
Foto do autor.
domingo, 16 de outubro de 2022
DORMIR
"Por o primeiro pé na primeira ausência de mim"*.
Dizem que Victor Hugo, ao ver uma gárgula numa igreja francesa, falou "por que não sou de pedra igual a você". Através de um de seus personagens, José Saramago disse "se o seu coração é de ferro, aproveite-o bem. O meu foi feito de carne e sangra todos os dias.
Quero ler, estou cansado. Quero escrever, estou cansado. Quero ver um filme, estou cansado.
Elogio, brinco, critico, sou mal interpretado. Faço isso e aquilo, não agrado. Fico quieto, em silêncio, sou acomodado. No trabalho meu muito lhes é pouco. Fico sem força para sequer fazer o mesmo.
Queria dizer sobre o professorado: É uma missão mais que profissão, mas não nos veem nem como profissão. Que temos o poder de mudar o mundo, mas não conseguimos nem mudar o estudante. Que somos a elite intelectual da cidade, mas há até quem vota no Boçalnato. Que somos respeitados e amados, mas só gostam de nós enquanto dizemos o que querem e não os fatos - seja comportamental ou acadêmico.
Em casa, os gritos dos vizinhos da frente e meus cães latindo a eles... Sinto-me sem lar, lugar pra ficar nem pra ir.
Muito tempo atrás um pastor chutou um ícone da Senhora Aparecida e nestes últimos dias outros fizeram o mesmo.
Lembro que naquela ocasião Rita Lee comentou o fato dizendo que a agressão foi contra uma mulher negra. Não foi a uma estátua do homem "branco" Jesus.
E o que mudou de lá pra cá?
Não vejo nada.
Neste mesmo dia 12 de outubro de 2022 um grupo bebia cerveja na porta da basílica. Os canecos contiam a figura do Boçalnato. Um disse "deus está aqui e bebo seu sangue" enquanto sorvia um gole os demais aplaudiam.
Um devoto da Aparecida, por uma simples camisa vermelha, escapou de ser linchado refugiando-se na grande igreja.
Boçalnato disse "surgiu um clima ao conversar com três ninfetas bonitinhas" e pediu para ir a casa delas, onde havia outras quinze adolescentes. Todas estrangeiras pobres. Entenda cada um por si o que ele deu a entender. Sendo verdade, não deveria ter "surgido um clima".
- Não foi o que ele disse. - Falou uma colega professora. - Isso é colocar maldade onde não tem.
Nem lhe respondi. Penso na presidente da ONG de acolhimento dessas meninas a explicar que o presidente visitara uma ONG, não uma "casa da luz vermelha".
Mudanças, quais foram? Ou não houve?
Na noite de ontem: um vídeo de tucanos a entrar em um apartamento buscando comida. Os moradores, alegres. Nesta manhã olhei ao meu redor. Árvores, flores, canto de cigarras e pássaros, borboletas. - Soltos. - Mas, igualmente, não faltaram aves engaioladas, cães abandonados, crianças descuidadas e velhos ignorados.
A única espécie capacitada a admirar ocupa tudo, destruindo, aprisionando ao invés de apreciar.
Não sei viver. Por ignorar como não sei conviver.
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Rubem Leite.
* À Beira do Nada, de Clarice Lispector.
Foto do autor.
Escrito entre 09 e 16 de outubro de 2022.
domingo, 2 de outubro de 2022
HÁ DE VINGAR
Durante a semana que hoje começou plantarei mudas de jabuticabas, romãs e limão galego. E o céu nublado não é tristeza. É serenidade para refletir. Hoje pode ser um lindo dia se soubermos eleger. Alegria, venha!
Muito falei entre julho de 2018 a junho de 2019 o estranho horror que foi o Nazismo ter como principais apoiadores, diretos ou não, os profissionais da advocacia e os da saúde. E exatamente o mesmo ter acontecido no Brasil no primeiro quarto do século XXI.
Em 2022 se constata que aproximadamente trinta por cento da população continua com ideias fascistas; e a maioria desses nem sabe o que é isso...
Mudando de política para educação.
Semana passada, atipicamente, a diretora, a vice-diretora e uma das duas pedagogas estiveram ausentes. Duas por enfermidade e uma para reunião na Secretaria de Educação.
Aproveitando a sobrecarga:
- O que estão fazendo aí?
- Ah... Nada não professora.
- Raspa fora. - A professora observando que três alunas do nono ano estavam perto do botão de sinal de saída às onze da manhã. - Aqui não é para entrarem sem permissão.
As três então foram de sala em sala:
- Professor, a pedagoga falou para mandar a turma pra quadra.
Foi um caos.
No dia seguinte um professor necessitou voltar para casa ainda na segunda aula por ter adoecido. Não aguentou o descaso dos alunos. E estamos todos - os professores - indo para o mesmo estado.
"Sem luz" é o significado da palavra "a (não, sem) luno (luz)"
Disse acima "mudar de política para educação", mas a verdade é que tudo é política. O que é o comportamento estudantil senão o resultado político de desmonte da educação?
Do ponto de ônibus no bairro Limoeiro, em Timóteo à rodoviária em Coronel Fabriciano e de lá para o ponto de ônibus em Ipatinga muitas pessoas misturavam roupas de diversas religiões e Boçalnato. E nas ruas santinhos separavam a imundície humana, destacando-a e a encobrir a beleza das flores.
Uma das coisas mais amadas por mim é a bandeira do Brasil. O boçalnarismo deixou-me a sequela de, ao vê-la: nos dias que a labirintite me ataca, ter ânsias de vômito e nos outros dias sentir asco. Por Deus, que eu me cure e sinta a paz de seu verde e estrelas; que seu amarelo e em sua "ordem e progresso" retorne o amor.
Um dia depois, segunda-feira:
Observei que ainda sou esperançoso. Achava absurdo um terço da população ser "adepta" à ignorância e ao ódio. Mas constato que, de fato, metade da população é "viciada" no mal.
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Autor: Rubem Leite
Imagens: fotos do autor.
02/9/22