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segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

MENTES PERTURBANDAS NO PLANETA PESADELO

 "Temos de ser cruéis. Temos de recuperar a consciência tranquila para sermos cruéis. Que sorte para os ditadores que os homens não pensam"¹.


As quatro da manhã eu com manha no ainda escuro. Minutos depois, o Sol. E eu sem manha para enganar a mim e a outros...

Desânimo; levanto-me, faço café, limpo a casa. - Pra quê? Dez minutos depois parece que meu irmão bailou na cozinha com pés enlameados.

Olhos fatigados, válvula propussora desanimada e hora de ir ao trabalho.

A chuva branda deixa escorregadio o pátio cinza amarronzado da escola.

Os olhos, como nuvens, molham o rosto pálido esverdeado do professor.

A chuva tranquiliza o céu. As lágrimas escoam a tristeza.

Alunos que não fazem atividades; não se interessam em ser mais eles. Contentam-se em ser mais um grão do barro: sem vez, sem voz. Cobranças administrativas para agilizar o não funcional.

Pelo celular leio o discurso da vereadora Karla Coser (Vitória ES) e pensossinto:

Um pai militar, fanático por Boçalnato, aprecia-dor de brigas de galos, estudante - talvez praticante - do nazismo - possivelmente também do fascismo - ensinou seu filho desde tenra infância a atirar, dirigir sem habilitação, sua "superioridade", a ler Minha Luta, de Hitler, a ler a Bíblia, a não ler Machado de Assis, Victor Hugo, Dostoievski, Cervantes, Shakespeare, Marx, Paulo Freire...

Aos quatorze anos o garoto começou a planejar ataque terrorista - será que ele já sabia que era terrorismo ou só pensou no 'quão divertido seria' ou em 'quanta justiça haveria'? -. Aos dezesseis se traja de preto, calça camuflada, suástica no braço direito, pega as duas armas e o carro do pai, sai de casa, vai a uma escola, a mais perto de sua casa, e em seguida vai a sua exescola. Em ambas deixa mortos, feridos, traumatizados. Em Aracruz, no Espírito Santo, no Brasil ficam milhares de confusos, de amedrontados.

Depois de seu grande (de)feito vai pra casa, estaciona o carro na garagem, recarrega as armas e as põe no lugar, retira a suástica montada com fitas vermelhas e almoça em paz com seus pais.

Onde estou as aulas do dia ainda não começaram, mas já há excesso de vozes. Muitas em minha cabeça: lar, extermínio, escola... Outras tantas do professorado. Saio uns três passos da sala dos professores e volto a uns trechos do discurso de Coser: "O ódio, a exaltação às armas livremente, a normalização de símbolos nazistas são base pra esse crime que aconteceu em Aracruz. Quem apertou o gatilho junto? Essa pergunta é pra toda sociedade refletir. A questão dos tiroteios nas escolas e das violências cotidianas que professoras e alunos sofrem é muito complexo e não pode ser olhada apenas pela ótica da segurança pública. O diálogo e a construção precisa passar pela educação e pela assistência. Não é simples e, por isso, não existem soluções fáceis.".

Cansado, escoro-me ao lado de um vaso de plantas fora da sala dos professores.

_ Por que está aqui fora?

_ Gosto de estar próximo das plantas...

_ Elas não falam mal, não ofendem.

Imagino que ela se refere ao como fui tratado pela minha "chefe" dois dias antes. Digo:

_ Plantas são silenciosas. Anseio a sua serenidade, paciência.

A pessoa se vai e sussurro às folhagens:

_ Meu coração se machuca. Dois ou três dias prostrado, cansado. Chuvas e ventanias.

E as plantam me sussurram em resposta:

_ "Minha estrela vai se apagar"². O que tem que brilhar é a escrita de quem veio denunciar, encorajar.


_____

Rubem Leite.


¹ RAVELI, Nicoli. A Mente Perturbanda de Adolf Hitler Através de Trechos do Mein Kampf* Disponível https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/almanaque/a-mente-perturbada-de-adolf-hitler-atraves-de-5-trechos-do-mein-kampf.phtml Acesso 05 Dez 2022. * Minha Luta, em português.

² Música "Planeta Sonho", composição de Flávio Venturini, Márcio Borges, Vermelho.


Imagem: foto tirada a meu pedido por Pedro Henrique.


Escrito e trabalhado entre 16 de novembro e 05 de dezembro de 2022.

domingo, 26 de junho de 2022

NÃO VÊ QUEM NÃO VÊ

 

 


 

Passeando por um bosque iam mãe e filho – Cura Uínter Flordelis e Henry.

Ela carregava um Livro e uma bolsa com lanche para o piquenique. O menino, de cinco anos, choramingava reclamando por andar.

Param numa bela clareira ao pé de grandes rochas.

Ela se dedica a ler e a criança, ao brincar nas pedras, descobre a entrada de uma pequena gruta e, apesar da orientação materna, ele entra.

Com um suspiro cansado a mulher vai atrás. Uma vez dentro se depara com joias de ouro e pedras preciosas.

Uma voz soou:

“Pegue tudo que queira, mas não se esqueça do essencial. Você tem sessenta segundos...”.

Faltando dez segundos para o fim do minuto a gruta começa a estremecer e oito segundos depois ela estava fora.

 - Ó! Esqueci o menino... Mas tudo bem. Trouxe as joias e, mais importante, não me esqueci da Bíblia.

Passou-se o tempo. Uínter Flordelis perde suas posses. Por isso ela e a Legião da Religião se reúnem.

- Monstros. Monstros me perseguem. O que devo fazer?

A mãe chora e o Padre Jota Eme, admirando ainda o belo corpo da mulher, orienta:

- Você vê a eles e por isso eles veem você...

- Não... Não compreendo.

- Eles veem você porque você os vê.

Explica o Pastor A Eme. Depois dá a ela um cândido sorriso enquanto pensa: “Vou destruir todo mundo”.

- Então... Então o que devo fazer?

O Diácono Eme De Ce encerra a reunião:

- Os olhos... Pegue esta faca...

 

 

___

Rubem Leite.

Escrito entre os dias 23 e 25 de junho de 2022.

Trabalhado na manhã de 26 de junho de 2022.

 

Padre Jota Eme – O padre Jean Rogers Rodrigo de Sousa, conhecido por José Maria, foi excomungado pelo Papa Francisco após rigorosa investigação coordenada pela Igreja Católica. O Pe. José Maria cometera diversos estupros a freiras e noviças. (Junho 2022).

Pastor A Eme – O pastor Arilton Moura, junto com o pastor Gilmar Santos, coordena o esquema do gabinete paralelo do MEC para “destravar por meio de propina demandas estaduais e municipais do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)”. [Mariah Aquino, no jornal Metrópolis, junho 2022].

Diácono Eme De Ce – O prefeito e o vice-prefeito de Curitiba (Rafael Greca e Eduardo Pimentel) acompanhados pela Polícia Militar, assessores e políticos afins, ladeiam o diácono Marcos Daniel de Camargo enquanto este benze armas de guerra a serem utilizada pela Polícia Civil. (Janeiro de 2022).

domingo, 19 de abril de 2020

O MONSTRO E A MOCINHA



Era um final de tarde. Pelas ruas da cidade, a mocinha, dessas dos filmes dos anos sessenta, setenta. Com seus cabelos loiros compridos. As luxuosas roupas recatadas. A mocinha corria pelas ruas gritando:
- Socorro, socorro. Help me. Salvem-me.
E atrás dela: monstros. Dezenas, centenas, milhares.
- Grrr. Raurrr. – Movendo suas terríveis garras assustadoras.
E ela correndo com seus cabelos loiros ao vento. Passando pelas ruas com prédios de quatro, seis, dez andares; um ao lado do outro. Poucas árvores nas ruas. E ela gritando:
- Socorro, socorro. Help me. Salvem-me.
E correndo, correndo, correndo com seus cabelos loiros ao vento nas ruas desertas e os monstros atrás com suas mandíbulas escancaradas:
- Grrr. Raurrr.
E ela: “Aiiiiiiiiii. Aiiiiiiiiiiiiiiiiiii.”. – Correndo, correndo, correndo, correndo, correndo, correndo. Passando pelas ruas pedindo socorro. Mas ninguém a ajuda. Todos estavam dentro de seus apartamentos morrendo de medo, preocupados, protegendo-se. E ela gritando:
- Socorro, socoooooorro. Help me. Salvem-me.
E correndo, correndo. E os monstros atrás:
- Grrrr. Raurrrrrr.
Finalmente ela chega a sua rua. Rua com mansões. Só mansões. E ela gritando e os monstros atrás e ela correndo.
Na hora que ela chega na frente da casa onde morava começa a bater na porta: “Socooorro. Deixa-me entraaaaaar.”. Na sacada do terceiro andar chega uma pessoa. De roupão negro, olhos negros, cabelos negros úmidos pelo delicioso banho quente que acabara de tomar.
De cima olha para a mocinha na rua.
Embaixo, a mocinha vê sua empregada e lhe grita:
- Socorro. Abre a porta. Deixa-me entrar.
Essa pessoa, com um suave riso maligno:
- Sabe aquele papel em branco que assinou? Pois bem. Você passou para mim toda a sua riqueza. Todos os seus bens. Todas as suas propriedades. Tudo! Esta mansão agora é minha. Meu bem.
E os monstros se aproximam.
- Mas… Mas somos amigas. – Sem entender nem o sorriso e nem o brilho dos olhos da ex-empregada, continua: Deixa-me entrar. Salve-me. Heeelp me.
E os monstros se aproximam cada vez mais.
Com o seu negro roupão felpudo naquele frio fim de tarde segura um xícara de chocolate quente. No agora seu quarto lhe espera a taça de champagne. E a nova proprietária com seus cabelos negros úmidos de prazer, digo, de delicioso banho diz:
- Tá achando o quê? Coronavírus é brincadeira para estar na rua? Eu lhe disse: Não vote no Boçalnato… Moro não é herói… Fique em casa!
Enquanto isso, os monstros covid-19 agarram a mocinha e ela: “Aaaaaaii”.
- Tome esse vidro de cloroquina. – E rindo lhe joga o frasco.
A mocinha, feliz com o remédio receitado pelo Mito, toma o comprimido. Seus olhos escurecem, seu fígado deixa de funcionar, seu coração sofre uma parada.
Facilitado pela cloroquina o covid-19 devora a ex-mocinha de filme hollywoodiano.


Em seu roupão negro e sorrindo docemente no alto da sacada a jovem pergunta a você, sim a você que está lendo este cronto:
- Tem-se mantido em quarentena?
-
- Quer um pouco de cloroquina? Tenho mais.
-
- Tenho uma folha em branco… Assine-a, por favor, meu bem.




Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.
É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.
É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.
Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.
Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Imagem do autor pelo autor.

Criado no final de tarde de 09 de abril de 2020. Trabalhado entre os dias 13 e 19 do mesmo mês e ano.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

CASA VERDE


Larôyê Exu! Exu é Mojubá! A vós, Mensageiro Exu, meus respeitos! Eu te peço, Exu:
Mensageiro dos Orixás e do próprio Olorum, proteja-me da inveja e do olho gordo; mantenha meus caminhos abertos no amor e nas finanças; oriente minhas palavras escritas e faladas. Larôiê Exu! A vós, Santo Antônio, meus respeitos!
“Pode até não ser uma janela aberta para o mundo, mas certamente é um periscópio sobre o oceano social.    (Ambujanra)

Levantou-se da cama e não haviam paredes que o guardassem.
Mas o que é guardar um homem? Seria guardá-lo dos perigos ou ele era o perigo.
O céu branco de nuvens parecia indicar estiagem por mais do que minutos ou poucas horas.
Caminhou pelo jardim nublado.
Ao passar entre dois troncos cujos galhos formavam uma porta, entrou numa escadaria e assumiu o seu lugar para escutar o amigo que lhe falava:
- Ahh véi, adianta falar nada com ele não, melhor deixar isso quieto que evita problema, cê não é do meu sangue, mas cê é mais que irmão pra mim e se sujar pr’ocê acaba sujando pra mim também. Deixa essa porra pra lá… – Lucas dizia com ar de preocupação, enquanto descia as escadas devagar.
No pé da escada Diego chega sozinho a uma loja. Um mercadinho, na verdade. Duas mulheres falavam em inglês com o dono sem que este as entendera.
Demorou, mas o sujeito acabou entendendo. Queriam um pacotinho com tirinhas de salgadinho. O protagonista pegou uma faca e pagou-a. Atravessou a porta dos fundos para chegar ao pé da escada.
- Esse ficou show… – Diego disse ao examinar o baseado, mais para o contentamento de Lucas do que por verdadeira apreciação de sua arte. – Lei do Duende, quem bola acende. – Recitou o ditado com um sorriso enquanto levava a boca o cigarro recém nascido.
O escadão estava agora perfumado pela fumaça que como solvente estava diluindo as ânsias dos rapazes, la embaixo, a quebrada seguia em seu ritmo de sempre. Trabalhadores indo e vindo pelas ruas e vielas, senhorinhas de pele escura subindo e descendo os morros e escadas com suas sacolas, alcoólatras serrando uma pinga no boteco, um ou outro nóia na esquina provocando medo em alguma tia que se achava boa demais para viver ali, tudo normal.
Sem Diego perceber, Lucas dá vários pequenos passos à direita. Quando só, Diego se percebe em outro lugar.
Quando vê o rapaz de pele bem negra e cabelos muito crespos, uma senhora rapidamente pega o celular.
- Filho, me ajuda. Vocês jovens parecem já nascerem sabendo lidar com isso. Não sei adicionar alguém no watzap. Me ensina?!
O rapaz guarda discretamente a faca e mostra a senhora como se faz.
Agradecendo, a mulher atravessa o ponto de ônibus onde estavam e chega a outro lugar. O rapaz segue em diante. Ao dobrar a esquina retorna à escadaria. Diego estava com a cabeça inquieta, sabia que poderia estar correndo risco, o que o deixava mais calmo era o recado que Lucas o deu mais cedo, dizendo que o Marquinhos falou que ia arrumar problema com ele não, que era para esquecer essa treta e deixar essa ideia errada para trás. Pelo menos Lucas era um cara de confiança.
Dois homens sobre uma moto parada aos pés do escadão, Lucas estava de pé a uma distância segura, apontava o amigo com o dedo indicador, que demorou a entender o que estava acontecendo. O revolver na mão do ocupante de trás da moto nem sequer tremia. Lucas chorava.  Calado, Diego sentiu uma fisgada no peito, depois escutou um barulho alto que se converteu em zumbido; sentindo frio e sede, dormiu.
Acordou em um apartamento. Vários colchões no chão; cada um ocupado por alguém. Não é a primeira vez que Diego desperta nesse ou em outras pocilgas. E só aí que Diego percebe o tempo. Aproxima-se de um senhor.
O mais velho oferece ao garoto um saquinho tendo o mesmo que as gringas compraram.
Abre o pacotinho.
- Bacalhau!?! Gostava mais da maneira como você enrolava o baseado. Tão dedicado; um verdadeiro mestre. Quase um doutor na arte religiosa de bolar um beck.
Devolve ao sujeito e vai a cozinha lavar a mão. O cheiro de sangue somado ao do peixe salgado não sai. Passa sabão e pouco adianta. Raspa a mão com a faca recém comprada sem sentir-se limpo. Põe a faca de lado. E chora. Não consegue usá-la; ainda.
O senhor vai até ele, põe a mão no ombro do mais jovem, puxa-o para si. O garoto abriga a cabeça no ombro do homem que entre as costelas de trás perfura com a faca nova o coração e a mantém até o jovem parar de soluçar. Antes de silenciar-se Diego diz:
- O fedor da pólvora não é pior nem melhor do que isso.
- Amigo, são tantos choros… O seu, o de sua mãe, o meu. Um dia poderei – o adolescente desvanece – não sentir?
Diego se levantou da cama e não haviam paredes que o guardassem.
Caminhou pelo jardim nublado. Ao passar entre dois troncos cujos galhos formavam uma porta, chegou em um campo de futebol.


_______
Costumo dar muito murro através do que escrevo.
Contudo, muita gente nem sente de tão anestesiada que estão.
E o Brasil é uma imensa casa verde.

Ofereço como presente aos aniversariantes:
Thaís Weber, Virginia Martínez e Isaac Andrade.

Recomendação importante: leia:
“No Escadão”, de Thiago Menezes:
https://milagulhas.blogspot.com/2020/01/no-escadao.html

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.
É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.
É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.
Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.
Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).

Imagens:
Portal de Árvores e de Rubem Leite: feitas pelo autor.
Menezes Silva: propriedade do próprio.

Menezes Silva é formado em Letras, pós-graduado em Neuroaprendizagem e prática pedagógica.
É professor de Língua Portuguesa na rede municipal de Timóteo, professor e coordenador no Núcleo Atitude em Ipatinga pela Rede Educafro Minas.

Escrito por Rubem Leite entre 25 e 27 de janeiro de 2020.

domingo, 1 de dezembro de 2019

BARULHOS E ASAS NEGRAS



Precisamos de pessoas leais à causa
e não de pessoas fieis a partidos.

Deixaram o fusca na rua Uberaba para não pagarem a zona azul de estacionamento rotativo. Afastaram-se por trás do carro sem olhá-lo e sem verem a neblina que os cobria sorrateiramente. 

- Toni, o Poder Executivo no Brasil é historicamente possível por dialogar relação com o Poder Legislativo.
- Mas Boçalnato inverteu isso ao dialogar com o povo, não com o Congresso. Ao mesmo tempo, no Poder Econômico, o Centro está favorável ao Governo atual.
- E isso porque nos governos Lula e Dilma, os mais ricos aumentaram seu recurso, mas menos que em governos anteriores. Ao mesmo tempo em que os mais pobres aumentaram seus recursos e proporcionalmente bem mais que os ricos.
- Mas Cadu, o Brasileiro não aceita a igualdade. É preferível um receber R$5.000,00 por mês enquanto os demais recebem R$1.000,00 do que todos receberem R$10.000,00.
- Para satisfazer essa sandice, no atual governo a distribuição de recursos está voltando ao que era antes do Governo de Esquerda.
- Acho que vale agora o poema de Rubem Leite:
Diz com quantos dinheiros se compra zelo  /  Salário justo, sem perda nem abono  /  Com quantos dinheiros se compra um sono  /  O sossego de dormir sem pesadelo  /  Da paz ser amigo, não servo nem dono
- E este outro poemento do Rubem:
Dizem que Albert Einstein disse  /  “O mal sempre insiste”.  /  Pensam que religiosos pensam  /  Mas deles o bem desiste.
Um momento para pensarem nas palavras e sentirem o silêncio.
- A mídia tem a função de ensinar ao povo que tudo que é privado é bom e tudo que é estatal é ruim. É o neoliberalismo que estão plantando pouco a pouco no Brasil e na América Latina.
- E chamam os professores de doutrinadores sendo que quem ensina coisa errada é a mídia. – Uma pausa para uma leve triste risada. – Para combater o imperialismo a multidão tem que reagir.
- Onde? Onde a multidão vai reagir? No Chile estão dando tiros nos olhos dos manifestantes. Na Bolívia, na Venezuela e no Equador a situação está na mesma intensidade agressiva. Argentina, Uruguai e Brasil estão afundando-se cada vez mais no fumo da ignorância. A América do Sul está sob uma horda neopentecostal. Aliás, estamos cercados por uma legião cristã...
- A multidão, ou seja, o povo age no seu microespaço. Quero dizer no seu local de trabalho ou onde for que atue. Mas o grande embate é dentro do lar já que mais da metade é pobre de direita. 

Pouco depois duas coisas se juntam à neblina: asas negras a cobrirem todo o céu e ruídos ensurdecedores: “Em nome de Jesus... Aleluia... Está amarrado em nome de Jesus... Minha Nossa Senhora... Piedade, Senhor... Ave Maria cheia de graça... Em Nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo... Oh, glória...”. Este alvoroço cobre quaisquer vozes e clamores e mesmo após o silêncio o fusca enferruja-se lentamente na escuridão social.


Ofereço aos aniversariantes:
Júlia Nathálly, Lorrayne Sancar, Mª Clara Oliveira, Kerley H.M. Almeida, Cleber L. Assis e Ronnaldo Andrade.

Recomendo a leitura deste cronto meu:

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.
É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.
É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.
Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.
Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Imagens do autor: Fusca.

Escrito entre os dias 25 de maio e 01 de dezembro de 2019.

domingo, 17 de novembro de 2019

EU MORRI. ESTOU FALANDO DE MEU TÚMULO¹



O padé oloonón, Exu e mo juba Ójisé.²


No labirinto das memórias o tempo não conjuga com os fatos. O segundo ano de morte de uma de minhas tias, aquela com quem vivi, passou e não fui ao cemitério. O aniversário de minha falecida avó, mãe de minha mãe e dessa minha tia, passou e não fui ao cemitério.
Estive a pensar:

A casa
– de quem? –
A casa necessita
Reforma no telhado.
Infelizmente ninguém dirá
“Como o gato não subiu no telhado”...
Que falta fará?
Hão de lacrimejar?
Se chorarem será
Pelo que ainda não fez
Não pelo ser.

Em uma manhã após aquela semana meu tio disse que, breve, viria alguém avaliar o apartamento. Um dos donos – ou ele, ou a tia ainda viva, ou os filhos dos falecidos, ou uma certa prima – quer vender o apartamento.
- Coisa que nunca conseguimos antes, mas quem sabe agora... Sua mãe está com alzaime. E nem ela nem a falecida moram mais aí.

O silêncio é uma nuvem no céu.

Vida após a morte?
Sim, o dinheiro fala mais alto que a solidariedade além de nada daqui ir para o Todo.
Não, a solidariedade é muda além de nada daqui ir para o Nada.
Lutar?

Naquela mesma tarde uma de minhas primas me falou:
- Estou pensando muito no Henrique. Tem quantos anos que ele morreu? Eu gostava muito dele e coloquei o nome dele numa missa na Catedral.
- Henrique faleceu em dezoito de agosto de dois mil e um.
- Pouco mais de um mês para o aniversário dele...
Enquanto continua a falar penso nas unhas compridas e pontiagudas dos dedos das mãos de meu irmão. Nos buraquinhos fechados, mas nunca cicatrizados em seu pulso esquerdo. Ferimentos em um pedaço de pele escura e enrugada na pele clara do braço de meu irmão ainda jovem apesar de mais velho que eu.
Seus olhos abertos observavam quem os observava. Todos tentaram fechar seus olhos incômodos. Só eu consegui.
Ao amanhecer o enterro não acontecera. O legista, não sei o porquê, quis refazer os exames. Talvez por ser ele tão jovem e suicida.
Sobre a mesa o corpo completamente nu de meu irmão que, mesmo morto, tinha o pênis perfeito.
Menezes, o legista, e o estudante Matheus, seu assistente, reabriram seu peito em um corte comprido iniciado acima do umbigo e cruzando na parte inferior do esterno duas incisões que iam até a articulação do ombro; um grande Y.
O assistente pareceu-me sorrir ao olhar para a serra, para os braços e pernas do cadáver; pareceu-me lamber os beiços ao cortar com a serra médica a caixa torácica.
No pouco sangue não havia substâncias alucinógenas, o estômago quase vazio. Nada justificava as marcas de corda no pescoço. Por que ainda continua lendo? Só eu sabia e agora você...
Com o olhar triste pela vontade não toda satisfeita, o estudante Matheus fechou o corpo e o legista Menezes liberou para o enterro.

Duas noites após o sepultamento o coração morto bateu uma vez e parou. Minutos depois bateu uma segunda vez. Mais um minuto e duas batidas. Outra pausa até bater lenta, mas continuada.
Suas unhas furaram o caixão, cavaram a terra ate seus olhos verem a lua e seus pulmões respirarem o ar desnecessário.
Fora do buraco observou a cova até esta fechar-se. Deu um passo e parou. Contemplou onde saíra. Sorriu; como se presenteasse ao espalhar a grama numa simulação de vida germinada. Sendo que o que fizera não passara de espalhar a grama trazida pelo olhar até cobrir o lugar que deveria ser o de seu descanso.
Sei disso porque uma semana depois fiz quase o mesmo.
Antes de eu escrever esta história Henrique veio ver-me.
Duas da manhã ele me chamou do telhado da casa ao lado. – Este que você vê, mas no escuro:

Confuso pelo sono e pelo que acreditava ser impossível, saí do quarto e abri a porta da casa. Parecendo flutuar, saiu do telhado e chegou à varandícula. Beijou-me sem entrar em casa. Meu pau ficou duro, mesmo sendo por meu irmão. Gozei. Voltei para cama. Morri.
Fora os hóspedes, em casa ainda há Faire, Ramon, Juli, Janio. A quem presentearei com meu beijo? Um beijo que não reviverá... Não sei. Mas a venda do apartamento não mais será um problema.

Ao contrário dos presidentes do Brasil, Chile, Equador e Bolívia – propagantes da morte viva – o estudante Matheus será um excelente floreador da vida morta. A delícia da morte é real. Quem pensa diferente, que viva longos anos...


¹ Clarice Lispector e a Depressão. Trecho da última entrevista com Clarice Lispector em 1977, concedida a TV Cultura. https://www.youtube.com/watch?v=NkPZkEjGncc&list=LLIH2YzhXzK4qmn97DyBrAbA&index=27&t=0s
² Vamos encontrar o Senhor dos Caminhos, Exu. Meus respeitos àquele que é o mensageiro.

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.
É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.
É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.
Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.
Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Imagem do autor: Telhado pela janela.

Manuscrito nos dias 07 a 10 de novembro de 2019. Trabalhado entre os dias 16 e 17 do mesmo mês e ano.

domingo, 1 de setembro de 2019

SALA VAZIA BURACOS NO TETO



Que me acontece
Olho pela janela
Vejo um céu de Van Gogh
E só há uma toalha
Azul e manchada
Com essa impressão olho a Teca. Esquelética, olhos arregalados olhando o nada, sem abanar o rabinho, mal reagindo a carinhos. E troco de sensação.
Abro a porta do quarto. Na sala olho para o encontro da parede com o teto: dois buracos feitos pelo tempo; ao redor musgo verde e mancha preta. Cheiro o fracasso.
Fracasso de quê?
Da cozinha minha mãe me diz para ir à garagem ajudar meu pai.
- Mas, mãe. O pai morreu tem vinte e sete anos...
- Não diga bobagens, menino. Vai logo.
A lua cheia mal atravessa as nuvens; apenas o suficiente para vislumbrar o quintal. Perto da casa a hortinha e as flores no quintal de vinte metros de comprimento com árvores carregadas de frutas a subir os seis metros do morrinho. Em seu topo um barracão.
Na lateral esquerda da casa fica a garagem. Seu amplo portão verde e bem cuidado está sendo fechado por meu pai. Atrás dele, na rua, o fusca vendido poucos meses após sua morte e... Cadê reação? Ele para e me olha sem sorrir nem franzir o cenho. Talvez com doçura. Quem sabe... Termina de fechar o portão quando corro até ele. Empurro o portão marcado de pedradas dos moleques do bairro; o cadeado enferrujado não me deixa abri-lo. Pela greta entre o portão e o muro vejo um jovem bruxo dançando com fogo a iluminar na noite.
Volto para casa chamando a mãe. Ela não responde. Não a encontro.
No meu quarto... onde Teca está? Cadê a cama, o guarda-roupa? Só tem um colchão sujo e roído; pela janela a toalha enganando-me de novo, mas agora a percebo também rasgada...
Na sala vazia de móveis só os buracos no teto. Na cozinha: azulejos encardidos, piso manchado e pia suja.
O quintal com terra seca; sem horta, flores ou frutas. Subo a escadinha – agora toda esburacada – para o barracão.
Suspiro aliviado. Teca está no seu ninho cuidando dos filhotes.
- Fiiiilho...
Olho para a voz de minha mãe e só vejo a casa. Olho pra cachorrinha e
Que me acontece
Olho pela janela
Vejo um céu de Van Gogh
E só há uma toalha
Azul e manchada
Com essa percepção olho a Teca. Esquelética, olhos arregalados olhando o nada...


Ofereço como presente aos aniversariantes:
Cleverton Nunes, Matheus Menezes, Didi Peres, Luiz A. Morais e Maxwell Pêgo.

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.
É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.
É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.
Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.
Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Imagens:
Foto do autor – Girvany de Morais.
Jovem Bruxo, de Lupia – contatos: https://www.facebook.com/fotografialupia/

O poema foi escrito na noite de 25 de março de 2019; na madrugada do dia seguinte sonhei o que deu origem ao que acabou de ler. O cronto foi trabalhado inicialmente nos três dias seguintes após a digitação e depois em 01 de setembro do mesmo ano.

domingo, 18 de agosto de 2019

DIPLOMACIA SEM ARMAS É MÚSICA SEM INSTRUMENTOS



Olha as meninas histriônicas a beberem cerveja. “Prefiro as araras, mais harmônicas” e volta sua atenção a quem lhe interessa no momento: Tênis claro, jeans cobrem montes possivelmente paradisíacos, camiseta preta. Pele clara, quase branca. Olhos pretos. Curtos cabelos cacheados quase crespos. Sentado meio de costas, meio de banda. Não se conhecem ainda. Gosta disso.
Na mesa próxima três escritores conversam sobre pessoas e livros. Ri para si: em sua agenda há um grande 17. Observa os títulos dispostos na mesa vizinha: Quase Quarenta, Quase Proibido; A Elite do Atraso; Quem Manda no Mundo?. Os autores são Flávia Frazão, Jessé Souza e Noam Chomsky. Não conhece nenhum deles e o desconhecido lhe atrai, mas não o conhecimento. Ouve os três. Girvany de Morais fala da dor alheia; empatia, dor comungada. Sorri. Gabriel Miguel fala da dor social. Pensa em dor “comum gado” e sorri. Vinícius Siman fala da dor própria. Sente a ereção e sorri.
A tarde não para e a noite vai a um barracão no fundo do lote afastado de outras moradas na rua poeirenta. Tudo bem limpo e cada coisa bem ordenada em seu lugar.
Na parede da sala, recorte de jornais falando de GTM e LHC na escola de Suzano. Na parede do quarto, artigos de bdsm.
No canto da porta, perto da cama, tênis lado a lado com o jeans dobrado por cima e este abaixo da camiseta dobrada. Tudo bem ordenado.
Braços magros bem esticados com as mãos acima da cabeça e com músculos distinguidos. Pele branca coberta de vermelho cremoso. Olhos bem abertos, rápidos. Deliciosos cabelos entre meus dedos.
Beija a testa, os lábios, o umbigo fazendo suspirar de prazer e envergonhar-se disso. Sorri para a timidez. Alterna mordiscos e lambidinhas nos mamilos fazendo gemer de prazer e envergonhar-se disso. Sorri para o pudor. Olhos nos olhos que se desviam dos seus. Suave lhe segura o queixo a conduzir seus olhos aos seus. Tenta fechá-los, mas os abrem em segundos. E lhe olha nos olhos. Medo, vergonha e prazer.
Sua língua dança no erógeno centro. Cheira lenta e profundamente o púbis negro. Seus lábios dançam no erógeno centro. Saboreia o sumo que, finalmente, escorre. Ouve a melodia do orgasmo.
Com a boca ainda molhada pelo suco beija-lhe os lábios. Sem violência a língua abre caminho à sua língua e se mesclam. Seus olhos voltam a abrir-se para olhá-lo com medo, vergonha e prazer para voltarem a fechar-se.
Sem prensar senta em sua barriga a acariciar seu corpo; da barriguinha ao pescoço. Seu fluído branco se mescla ao seu fluído vermelho quando a sagrada faca ritualística entra e sai suave do peito ao coração e deste àquele. Reverente a observa no ar antes de deitar-se sobre o corpo apaixonado para dormirem juntos seu último sono.


Ofereço como presente aos aniversariantes:
Marilda Lyra, Carlos Glauss, Rômulo Gomes, Leila Marques, Magali Ramos, Davi Klystie e Marcia Regina.

Recomendo a leitura de:
“Socos e Alívios”, de Girvany de Morais:
033991042299 (zap);
“Epifanias”, de Gabriel Miguel:
“Os Trunfos da Riqueza”, de António MR Martins:

¹ Fala do Zero Três (Eduardo Bolsonaro) na abertura do seminário ‘Desafios à Defesa Nacional e o papel das Forças Armadas’. Disponível https://veja.abril.com.br/politica/diplomacia-sem-armas-e-musica-sem-instrumentos-diz-eduardo-bolsonaro/ . Acesso 18 Ago 2019.

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.
É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes.
É graduado em Letras-Português. E pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”.
Autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”.
Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Foto do autor – Girvany de Morais.

Manuscrito no Feirarte na tarde de 17 de março de 2019. Digitado dois dias depois. E trabalhado entre os dias 13 e 18 de agosto do mesmo ano.

domingo, 2 de junho de 2019

VIDA E MORTE UMA SÓ JORNADA



Eu defendo as universidades e institutos federais.
Contra o corte de verbas e a perseguição.
Defendo as Ciências Humanas.
Pensar é um direito de todos.

O que é um morto-vivo? Como ele é?
Ter dois cargos de português, nessa sociedade cruel, que não respeita o idioma nem o professor. Opa! Faltou falar que o governo é cruel também.
(Professora Miriam).
É um médico do pronto socorro de hospital público que não descansa. É um professor que ensina nos três turnos.
(Profª. Ortencia Santos).

Abri o portão e ao fechá-lo vi no registro de água ao pé do muro uma moitinha de mato com flores roxas. No céu azul do fim da manhã havia nuvens claras adormecidas. Era um encanto.

Desci a rua para buscar meus netos. À meia distância da escola tinha uma loira sangrando, queixo pendurado, pálida e a rosnar:
- Petêêê.
A loira sangrenta, pálida, rosnava enquanto andava torta em minha direção, com os braços à frente pra me pegar.
Amedrontada, peguei na calçada uma pedra que não sabia o motivo de estar lá e bati na cabeça da mulher, bati mais uma vez, bati outra e de novo.
Ela caiu no chão, com o crânio perfurado. Virei-me para fugir a minha casa¹. Mas me recordei dos netos e fui correndo à escola.
Não vi mais nenhum morto andando e mal reparei nas pessoas.
Peguei as crianças sem cumprimentar quem quer que fosse e corremos a casa¹.
- Vó, por que estamos correndo?
- Vamos, meninos. Só correm. Vamos. Vamos.
- Que aconteceu, vó?
- Anda, menino.
- Mas vó...
- Parem de perguntar e corram.
À porta da casa¹ uma viatura à minha espera por causa da mulher que matei. – Mas será que fui eu que a matei?
Tentei explicar que era uma morta-viva, mas me olharam com... – Zombaria? Aversão? Pena? – ... pela louca que eu estava parecendo.
Subiram a rua três homens cinza, rasgados, sangrando e rosnando:
- Lula maaal...
Andavam tortos com braços à frente em direção aos policiais e a mim. Meus netos já estavam dentro de casa, como mandei.
Os policiais mandaram os zumbis pararem. – Por que será que eles sempre fazem isso nas histórias com monstros? – Aproveitei para entrar e trancar o portão.
Os policiais morreram. Dois continuaram caídos, mas um acompanhou pela rua acima os cinzentos que rosnavam:
- Boçalnato... bonziiinho.
Meia hora depois chegou minha filha – mãe dos meus netos – gritando para entrar. Com ela dentro de casa percebi seu braço ferido.
Preocupada com nossa segurança planejei matá-la. Mas era minha filha... Será que podemos desfazer-nos de parentes próximos contaminados pelo vírus cultus ex ignorantia?
Fui ao meu quarto para pensar. Olhei para Nossa Senhora de Fátima e rezei uma Ave-Maria. Olhei para Santo Antônio e rezei “Meu Santo Antônio, querido amigo, amado irmão, rogai por mim, sua discípula. Ó meu Santo Antônio, guiai-me a Deus-Pai, meu criador, assim como levou em suas mãos Jesus Menino. Ó meu Santo Antônio, guiai-me a Deus-Filho, meu Amor, meu Salvador, assim como levou em suas mãos Jesus Menino. Ó meu Santo Antônio, guiai-me ao Espírito Santo, meu eu, meu iluminador, meu Jisso, assim como levou em suas mãos Jesus Menino. Meu Santo Antônio, querido amigo, amado irmão, rogai por mim, suas discípula”.
Senti ele me dizer “pegue o livro de Rubem Leite para desfocar seu cérebro da catástrofe”. Assim fiz e sentei na cama e li: “Do alto ao meio da árvore uma pequena pluma branca baila suave. Do meio ao fim do trajeto desmaia e cai quase pesada. É a vida, é a morte. Uma só jornada.”. Saí do quarto, já decidida. Curioso... Como um livro que não fala do que passamos nos diz o que fazer? Ou será que fala em outras palavras? Bem, o que importa é que já não tinha dúvidas. Sem poder descartar-me de minha filha a prendi num cômodo.
Uma semana depois da catástrofe, numa tentativa de acabar com as mutações provocadas pelas indústrias siderúrgicas, de extração e outras de Minas Gerais. Todas elas se utilizando de novas tecnologias... Aconteceu intencionalmente o rompimento das barragens de Laranjeiras e de Forquilha.
As rádios e as tv’s noticiaram ininterruptamente uma gravação anunciando o “acidente”, mas, ao contrário dos ocorridos em Brumadinho e Mariana, que foram vicissitudes por falta de manutenções adequadas e, por isso, verdadeiros crimes ambientais e humanos; não meros acidentes. Esta foi para acobertar... Outro crime ambiental e humano. 

Depois que terminou a gravação, Fátima olhou pela janela e a lua estava quase dando seu lugar ao sol. Acessou o youtube para ver o filme “Narradores de Javé”. Quando o sol dourou as nuvens por baixo, as águas chegaram a casa¹ no momento que uma velhinha dizia: “Us nossos mortos vai viver debaixo d’água? Num pode!”².


Ofereço como presente aos aniversariantes:
Eder Rodrigues, Valdiene Gomes, Alcides Ramos, Marcelo S. Marinho e Adinagruber C. Lima.

Recomendo a leitura de:
“The End”, de António MR Martins:
Socos e Alívios”, de Girvany de Morais.
LANÇAMENTO: 19 horas do dia 12 de junho de 2019; no Salão do Livro Vale do Aço; Café Literário; Centro Cultural Usiminas.
A obra é um soco composto por minicontos problematizando reais temas sociais presentes em nossa sociedade. É também um alívio de sonhos e desejos de uma vida melhor.

Por me ajudarem, de uma forma ou de outra na definição do que é um morto vivo e em como eles são, agradeço aos professores:
Wilson Oliveira, Jeane B. Souza, Rose Simões, Mª Eliene Santos, Rodrigo Gonçalves, Ortencia Santos, Rodrigo Gonçalves, Ana Mª Daio, Dayane Soares, Silvia Santos e Profª Miriam.

¹ Diquinha de português:
Crase diante da palavra casa.
(Por me ajudarem nessa explicação, agradeço aos professores e professoras Camila Albuquerque, Nancy Reichardt, Silvia Santos, Jair Santos, Miriam, Rose Simões e Mariangela Ferreira Busuth Busuth).

Como a palavra ‘casa’ pode significar basicamente duas coisas (lar e prédio) ela tem uma regra para cada.
1) Com sentido de ‘residência; lar’ não se usa crase porque se entende que residência é substantivo que não admite artigo porque se pressupõe já está definida.
Exemplos:
“Voltarei a casa quando mamãe voltar”. = Voltarei a residência (lar) quando mamãe voltar.
Observe que ‘casa’ funciona como direção do movimento expresso pelo verbo voltar. E voltar exige a preposição ‘a’ (quem volta, volta a algum lugar: voltarei a). E ‘casa’, sendo palavra feminina, é precedida pelo artigo ‘a’. Então talvez você me pergunte: Uai! Por que então não leva crase? Porque, como foi dito acima, quando ‘casa’ é entendida como ‘residência’ já se imagina algo definido; sem necessidade de alguma coisa que a defina, como o artigo definido ‘a’. Uai!
No cronto está escrito: ... “e corremos a casa”.
Aqui também se vê ‘casa’ funcionando como direção para onde se corre. Contudo, o verbo ‘correr’ pede preposição ‘para’ ou ‘de’: corre-se da rua ou da casa e corre-se para rua ou para casa. Então a oração não recebe acento grave simplesmente porque a preposição não é ‘a’.
No cronto está escrito: “À porta da casa”. A crase existe por estar ligada ao substantivo ‘porta’, não a ‘casa’.
Resumindo: Se ‘casa’ significar ‘residência’ não recebe crase, exceto se:
Mesmo com sentido de residência, se ‘casa’ for especificada de algum modo, ou seja, tiver adjunto adnominal, há que crasear.
Exemplos:
“A proposta é que voltemos à casa de Tiago”.
No cronto está escrito: “Virei-me para fugir à minha casa”.
‘Casa’ = residência;
‘de Tiago’ = adjunto adnominal.
‘minha’ = adj. adnominal. Mas tem um facilitador aqui. Por ‘minha’ ser um pronome possessivo feminino torna-se facultativo o uso da crase. Em outras palavras, se antes de um pronome possessivo feminino tiver o encontro de pronome ‘a’ e de artigo ‘a’ coloca-se crase somente se quiser.
Veja a explicação do professor Jair Santos: ‘Quando a casa no sentido de lar, residência não vier especificada, a crase não ocorre. Exemplos: Cheguei a casa. Sem crase. Cheguei à casa de meus pais. Com crase, pois ‘de meus pais’ é um especificador’.
2) Com sentido de prédio, edifício, construção há necessidade do acento grave.
Exemplo: “Queira se dirigir à casa ao lado!”.
NILC. A Crase e a Palavra Casa. Mini Gramática. Disponível:

² CAFFÉ, Eliane. Narradores de Javé (trêiler). Disponível https://www.youtube.com/watch?v=GlaFRraqeOg . Acesso 09 Mar 2019.

Observe que interessantes explicações sobre “MORTOS-VIVOS”, dado pela professora Rose Simões:
Mortos-vivos são seres míticos e fabulosos. Trata-se de um ser que está morto e permanece morto (sem funções biológicas que mantenham ou sustentem a vida”, mas age como se ainda estivesse vivo, podendo mover-se, ter percepção ou mesmo consciência.
O exemplo mais conhecido são os zumbis. Zumbis são corpos de pessoas ou animais falecidos reanimados por meios desconhecidos (podendo ser por maldição ou encantamento) e podem ser reanimados corpos recém-falecidos ou corpos em estado avançado de decomposição. Eles são mortos que não tiveram descanso e voltam à vida num tipo de transe, ou que foram subjugados por alguma forma de encantamento. Possuem a pele apodrecida e usam roupas esfarrapadas, possuem um cheiro forte e horrível. Normalmente, perdem partes do corpo, como os dentes ou os dedos devido a sua decomposição. Perambulam sem rumo, geralmente à procura de vingança. Normalmente os zumbis são apresentados como seres desprovidos de raciocínio e inteligência, sendo totalmente instintivos ou obedecendo as ordens de quem ou o quê os tenha reanimado.
Mortos-vivos também podem ser desprovidos de corpo ou qualquer forma física, como os fantasmas, já se tratando de manifestação da alma ou espírito de um ente falecido e não sendo feito de matéria, mas da própria essência do pensamento deste, pertencendo então a planos de existência extrafísicos (não acessíveis ao plano material), mas podendo tornar-se perceptíveis de maneira objetiva (manifestando-se visível e/ou audível ou movendo objetos físicos) e, por vezes, tangível às pessoas vivas (adquirindo temporariamente propriedades físicas semelhantes a da matéria, fenômeno conhecido como materialização) ou manifestar-se de maneira subjetiva ao aparecerem em sonhos a uma pessoa ou como uma ilusão subjetiva.
Segundo o espiritismo, essa noção de espírito se refere aos espíritos desencarnados (aqueles que já não possuem um corpo) e a manifestação perceptível de um espírito desencarnado é chamada de perispírito, que, segundo adeptos dessa religião, se utilizam de uma substância fluídica chamada ectoplasma para se manifestarem.
Em muitas lendas os fantasmas são retratados em estado de transe, confusos ou sendo guiados por traumas ou desejo de vingança, mas ainda podendo manifestar-se como seres conscientes ou apenas como visões e impressões gravadas no local da morte.
Outros exemplos conhecidos são os vampiros e as múmias. Vampiros e outros seres que podem ter surgido de pessoas que morreram são tidos como mortos, mas são dotados de consciência e raciocínio de forma equivalente a pessoas vivas e por isso podem continuar controlando seus próprios corpos sem a necessidade de funções biológicas para sustenta-los, porém não são dotados de alma. São associados a forças demoníacas por se sustentarem por maldições, serem desalmados e manterem sua meia vida alimentando-se da essência dos vivos.

Divirta-se com o agradável jogo compartilhado pela professora Silvia Santos:
Morto/vivo remete a uma brincadeira homônima de infância.
Morto-vivo. Brincadeiras de crianças. Brincadeiras da infância que trabalham a coordenação e agilidade.
Vilma Medina, diretora de http://guiainfantil.com 28 de abril de 2015.
As brincadeiras da nossa infância são inesquecíveis. No Brasil, mesmo com o aparecimento das novas tecnologias e o crescente aumento de tablets e smartphones, as crianças continuam curtindo algumas brincadeiras que passam de geração em geração.
Uma dessas brincadeiras é chamada “morto-vivo”. E crianças acima de cinco anos já podem brincar. Essa brincadeira estimula a atenção, coordenação motora, agilidade, condicionamento físico, concentração e a expressão corporal. A recomendação é que participe pelo menos quatro crianças. A facilidade é que pode ser realizada em condomínios, dentro ou fora de casa, em parques ou praias.
Como brincar de “morto-vivo”:
Uma das crianças é escolhida como a líder e ficará à frente do grupo. É ela quem vai dar o comando a ser seguido pelos jogadores.
Quando o líder disser “morto” todos terão que agachar. Quando o líder disser “vivo” todos terão que dar um pulinho e ficar em pé.
Quem não cumprir ou errar o comando é eliminado, até ficar somente um participante, que será o vencedor e o próximo líder.
A velocidade em que os comandos de “vivo” ou “morto” são dados, vai definir o grau de dificuldade da brincadeira, assim como a sequência, que ficará por conta da criança líder, com o intuito de confundir e exigir mais atenção dos participantes.

Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve todo domingo neste seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.  É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. É graduado em Letras-Português. É pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”; autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Imagens:
Registro e flores – foto do autor na manhã de 10-3-19;
Nuvens douradas por baixo – foto do autor na manhã de 10-3-19;
Rubem de chapéu – foto de Vinícius Siman.

Escrito na manhã de 09 de março de 2019 partindo de dois sonhos tidos por minha irmã (Mª Fátima W. Leite M). Trabalhado entre os dias 28 de maio e 02 de junho do mesmo ano.